Quando a Fifa irá mudar?
Erich Beting
Nunca.
A certeza eu tive há cerca de dez anos, quando li pela primeira vez o livro “Como eles roubaram o jogo”, de David Yalop (obrigado a todos que mandaram a correção do autor do livro, a memória me traiu ontem quando escrevia). O jornalista inglês conseguiu, com maestria, revelar de que forma João Havelange alcancou a presidência da entidade ainda nos anos 70 e como fez para transformar o futebol num negócio extremamente rentável e corruptível. Infelizmente esse livro está, hoje, proibido de circular em terras brasileiras por conta de uma determinação da Justiça em favor de Havelange. Mas, quem tiver a oportunidade, pegue emprestado (e devolva!!!!) para ler.
Para quem trabalha ou deseja trabalhar com esporte, a leitura desse livro faz compreender com a maior naturalidade possível os últimos acontecimentos que pudemos presenciar na Fifa. Escândalos de corrupção, venda de votos (ao que consta, em troca de alguns projetores muitos delegados da Concacaf ficaram ao lado de Joseph Blatter) e diversas outras facilidades proporcionadas pela entidade compõem um cenário muito comum ao universo do esporte há cerca de cinco décadas.
Nada do que vemos agora acontecer com Jerôme Valcke, Jack Warner, Bin Hamman ou Joseph Blatter é tanta novidade assim. Faz parte de uma cultura impregnada, de uma tradição enraizada na estrutura da Fifa há décadas. O problema é que essas decisões obscuras interferem numa das coisas que é a maior paixão das pessoas: o futebol.
Legalmente, a Fifa é uma entidade privada que deve somente a ela mesma satisfação. Por isso mesmo a sua Comissão de Ética está muito mais acostumada a comissões do que a princípios éticos. Por conta disso, também, não conseguimos enxergar uma mudança visível na estrutura da entidade, por mais sonhos que tenhamos de que a lisura do futebol que nos acostumamos a ver quando crianças também perdurasse na vida adulta.
A Fifa não vai mudar. Prova disso é que Jerôme Valcke, o que orgulhosamente afirmou que Ricardo Teixeira estava “limpo”, hoje é o segundo cara na hierarquia da entidade. Ele ocupa o cargo que Blatter ocupou durante toda a vida política de João Havelange à frente da instituição. Até aí, nada demais.
Só que, há três anos, Valcke provocou um prejuízo de US$ 100 milhões para a Fifa, ao fazer com que ela perdesse uma ação movida pela MasterCard por quebra de contrato. Foi ele quem, ainda no cargo de diretor de comunicação, fechou acordo com a Visa de patrocínio das Copas de 2006 e 2010, mesmo tendo a marca concorrente e então parceira da Fifa a preferência para renovar o acordo. Na época, Valcke foi demitido. Menos de dois anos depois, voltou com plenos poderes à entidade.
Alguém ainda acha que há qualquer chance de a estrutura da Fifa mudar? O alento, para quem sonha em trabalhar com futebol, é que a indústria da bola é tão grande que lhe permite garantir o seu sustento sem precisar, diretamente, negociar com os grandes caciques da bola. Porque, claramente, é preciso muito estômago para isso.