Dinheiro sem gestão pode comprometer o futuro do futebol no Brasil
Erich Beting
O dinheiro jorra no futebol brasileiro. Novo acordo de TV (com valorização de mais de 100% em muitos casos), receita certa com patrocínios, aumento do consumo do torcedor ligado ao futebol. Tudo contribui para que os clubes estejam com uma condição de gastar como há muito não se via.
As especulações do mercado da bola mostram bastante esse cenário. Propostas milionárias para tirar um jogador de um time e levar a outro, planos mirabolantes para repatriar um atleta, valorização de salários para não perder um craque em potencial.
Como não se deixar contagiar por esse estado de euforia e manter os gastos em ordem?
Essa é a pergunta que mais preocupa hoje ao observar a ''farra'' que os clubes têm feito na hora de contratar. O mercado, hoje, está em alta, com um fluxo de dinheiro como não se via há duas décadas, pelo menos. Mas como gerenciar esse dinheiro? Aí é que está o enrosco que pode comprometer o futuro do futebol no Brasil.
Os clubes têm buscado o caminho mais simples para gastar o dinheiro que entra. Investimento no time de futebol, de olho nas urnas eleitorais e na manutenção dos mandatos. O clube, de fato, pouco melhora em estrutura (salvo algumas exceções). O jogador, sentindo o clima propício, consegue a valorização dos salários, e o impasse está criado.
Sem uma gestão racional e programada, a farra de dinheiro só servirá para formar uma bolha inflacionária no futebol. Gastaremos mais, porém não melhoraremos, de fato, a estrutura do futebol. Para piorar, o sistema de administração dos clubes pouco ajuda para mudar esse tipo de mentalidade. Por que um presidente de clube vai colocar a perder a formação de um time forte para investir num projeto que só poderá vir a dar frutos dali a cinco anos?
A necessidade de curto prazo faz com que o futebol viva hoje uma exuberância irracional, para repetir a expressão cunhada por Alan Greenspan, antigo presidente do Banco Central americano nos anos 90, quando o mercado de ações dos EUA disparava sem que todos pensassem que um dia a casa poderia cair.
É muito legal, do ponto de vista do torcedor, ver o seu time se reforçando, trazendo atletas que poderão dar um grande retorno dentro de campo. Mas será que essa equação é a melhor para o clube de futebol no longo prazo? Sem planejamento, sem atacar de fato as carências que existem (quantos clubes têm centros de treinamento, estádios ou escola de formação de atletas?)?
O tema deveria ser colocado urgentemente na pauta dos clubes. E, nessa discussão, seria fundamental revermos o conceito de estruturação política das entidades esportivas. Como dá para um presidente conseguir fazer alguma coisa em dois anos de mandato? Como ele pode ter autonomia na gestão e o resultado dentro de campo não interferir no resultado das eleições?
Enquanto essas dúvidas não forem esclarecidas, quanto mais rico for o futebol, mais irracional será o gasto ligado a ele. E, com isso, mais preocupante será o futuro do esporte no país.