Negócios do Esporte

Arquivo : fevereiro 2012

A tola discussão sobre a Lei Geral da Copa
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Erich Beting

Ficou para o dia 6 de março a discussão dos temas polêmicos sobre a Lei Geral da Copa. E o que isso significa, na verdade?

A Fifa colocou como problema urgente do Brasil para a Copa a aprovação da lei que vai regulamentar todos os detalhes pertinentes à organização do Mundial em solo brasileiro.

Agora, os pontos que atravancam a pauta (o benefício da meia-entrada e a permissão do consumo de bebida alcoólica) são exatamente dois debates que o Brasil, desde sempre, já tinha aceitado as regras da Fifa.

E esse é o maior problema. Não apenas por aqui. O fato é que, desde sempre, a Fifa coloca uma série de regras para que um país tenha o direito de abrigar a Copa do Mundo. E, além disso, obriga os governantes do país a assinarem um documento aceitando essas condições e, também, tornando-os fiadores do evento no caso de a conta “não fechar”.

Até hoje a Coreia do Sul e o Japão sofrem com estádios deficitários, a África do Sul simplesmente contabiliza uma manada branca, e por aí vai. Na Alemanha, o governo soube se preparar para as regras da Fifa e tirar o melhor proveito delas para melhorar alguns pontos da infraestrutura esportiva do país. O resultado é claro. O legado da Copa realmente existe para os alemães.

A discussão sobre a Lei Geral da Copa não vai mudar. Vamos ter de reduzir ao máximo o acesso à meia-entrada, vamos ter de permitir a venda de bebidas dentro dos estádios e, também, continuaremos a ter de pagar a conta no caso de alguma hecatombe.

O Brasil já concordou com isso em 2006, quando apresentou o interesse em se candidatar para receber a Copa. Desde antes disso já se sabia quais eram as regras da Fifa para um país-sede.

A ânsia de receber o evento é maior do que qualquer coisa. E é isso que os seus organizadores sabem fazer, muito bem, para ditarem a regra do jogo. Não há o que ser criticado sobre a Lei Geral da Copa depois de seis anos que o país se candidatou para ser sede do evento.

O ferimento à soberania nacional já ocorreu quando aceitamos assinar sem ler a um papel que garantia que a Copa do Mundo é da Fifa, acontece com as regras delas e o Brasil precisa se adequar a isso.

É possível, porém, fazer do limão uma boa limonada. Por que não usar a gestão do evento Copa do Mundo para aprender a entregar um produto de melhor qualidade para o consumidor?

O debate que temos hoje no Congresso deveria ter ocorrido em 2005, quando ainda postulávamos a sede da Copa. E não foi feito por total ignorância da população sobre o que estava por vir. A magia do futebol é linda, de fato. A realidade, porém, é muito cruel…


O negócio da China de Zizao
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Erich Beting

O Corinthians finalmente apresentou o seu reforço chinês. Chen Zhizhao já tirou algumas fotos com a camisa do clube e na próxima quinta-feira será oficializado como “jogador” corintiano. A expectativa é de que Zizao seja uma porta de entrada do Corinthians no mercado chinês.

Em tese, a ideia é boa. Segue os moldes do que a NBA fez, há mais de uma década, com Yao Ming, gigante chinês que se tornou o primeiro atleta do país asiático a jogar na principal liga de basquete do mundo.

Só que a semelhança termina aí.

Sim, temos falado bastante sobre o jogador, há um interesse generalizado em entender mais quem ele é, como era a vida dele na China e o quanto os chineses se interessam pelo curioso caso de ter um jogador de seu país num time de ponta da terra do futebol.

Mas será que o interesse é recíproco? Quanto o mercado chinês aumentará de consumo por conta da ida de um  jogador para o Brasil?

Quando a NBA resolveu colocar Yao Ming em quadra, havia toda uma história de presença da liga no noticiário chinês, sabia-se o tamanho do mercado em que estava-se pisando, conhecia-se o hábito de consumo do povo local em relação ao basquete e, mais importante, Ming era um ídolo local de um esporte com relativo apelo popular.

Na China, o futebol está longe de ser o esporte número 1 do país. Até hoje, manifestações públicas para mais de 20 mil pessoas só são permitidas quando autorizadas pelo governo. Isso faz com que seja difícil para o futebol se popularizar em solo chinês.

Além disso, o que há de referência sobre o futebol na China é a Europa. Já se vão quase 20 anos que os clubes europeus perceberam a necessidade de se tornarem multinacionais. As ligas transmitem seus jogos para o exterior, os times fazem excursões para o oriente e mais um monte de outras ações na mídia dos países de lá para conseguirem ter lembrança de marca.

Outro problema é exatamente o fato de Zizao não ser um Yao Ming. O jogador de futebol é desconhecido no seu país e não desperta o interesse dos fãs tanto quanto Ming conseguia fazer. A mídia local, com isso, não deverá buscar notícias constantes da aventura de seu atleta em outras terras.

O Corinthians faz um movimento interessante para internacionalizar sua marca. Mas para ter sucesso no exterior, os clubes brasileiros precisam primeiro chegar até os outros países – seja por meio de partidas amistosas ou no lançamento de programas com conteúdo sobre eles nas mídias locais – para então conseguir, ao contratar um jogador de outra nacionalidade, ganhar aquele mercado. Ainda mais quando o jogador não é top de linha.

No final das contas, quem está fazendo um Negócio da China é Zizao. Quando ele poderia sonhar em, um dia, ter contrato com um dos clubes mais populares do país que tem o maior número de consumidores do esporte número 1 do mundo?


As redes sociais mudaram a razão de ser das marcas esportivas
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Erich Beting

Na semana passada, em Nova York, o grande lançamento e aposta da Nike para o mercado esportivo não foi uma nova linha de roupas ou de tênis, mas sim a evolução do seu sistema Nike+, ampliado agora para o basquete. Quatro sensores acoplados à palmilha do tênis que medem os principais movimentos dos atletas dentro de uma quadra, inclusive a altura dada durante o salto.

Poucos dias antes, no México, a Adidas apresentou suas novidades para a imprensa. A evolução do sistema Speed Cell foi a grande vedete da fabricante alemã. Agora, não apenas no futebol, mas em outras modalidades, é possível o atleta rastrear seus movimentos e mensurar velocidade, distância percorrida e outras coisas do gênero.

E, tanto no México quanto nos EUA, o grande negócio, na visão das duas empresas, é o fato de toda a performance dos atletas poder ser compartilhada nos sites das fabricantes e, principalmente, nos perfis dos consumidores em suas redes sociais. Essa é a grande mudança no mercado de esporte nos últimos anos. Num movimento que veio desde 2008, quando a Nike criou o sistema plus, as redes sociais passaram a ditar o rumo dos fabricantes de material esportivo.

Hoje, Nike e Adidas, as duas maiores do mercado, são muito mais empresas de tecnologia do que propriamente uma fabricante de calçados. A anedota usada por Mike Parker, CEO da Nike, durante a apresentação da evolução do sistema plus mostra claramente isso. Disse ele que, há algumas décadas, fazia uma viagem de avião e rascunhava o desenho de um tênis. A passageira ao lado perguntou o que era aquilo e ele explicou que desenhava um tênis. A mulher, conta Parker, questionou se ainda havia alguma coisa a ser inventada naquele mercado. Parker, então, emendou: “Hoje posso dizer que nunca estive tão empolgado com os avanços que podem ser feitos no mercado”.

E avanço nessa área significa, necessariamente, fazer da fabricante uma empresa de tecnologia muito mais do que uma mera produtora de calçados e artigos esportivos. A necessidade de atender aos desejos de comunicação dos consumidores tem feito com que o foco das empresas migrem. Agora, importante não é ter um grande produto tão somente.

Criar facilidades para conectar os diferentes consumidores é o grande diferencial competitivo, hoje, de Nike e Adidas no mercado de calçados. E isso permite que as empresas aumentem suas vendas. As duas, até agora, foram as principais marcas a investirem pesado nesse novo patamar de relacionamento com o consumidor. Em breve, com as vendas aumentando em todo o mundo por conta da conexão dos mundos real e virtual que elas conseguem fazer, as outras empresas deverão seguir um caminho parecido.

As redes sociais já mudam o comportamento das marcas. O consumidor, cada vez mais, é quem determina como é o relacionamento com o produto. Ou, nesse caso, as duas maiores fabricantes de material esportivo do mundo se anteciparam e mostram, para o consumidor, como não deixar de parecer ser algo essencial para o seu dia a dia.


Jeremy Lin e a maneira americana de olhar o esporte
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Erich Beting

O americano vive uma lua-de-mel com Jeremy Lin, americano descendente de taiwaneses, formado em Harvard, armador do New York Knicks e recém-empossado como astro maior da NBA, a liga de basquete do país.

A “Linsanity” começou há cerca de duas semanas e é hoje assunto em toda Nova York. Num campeonato que já começou com atraso por causa do locaute, não tem grandes destaques nos times grandes, como o LA Lakers, e sofria para engrenar no gosto das pessoas, o chino-americano Lin parece ser a solução.

Essa é a maneira americana de olhar o esporte. O foco é o consumidor, enquanto o atleta ou o time são as ferramentas para gerar o interesse da pessoa em consumir a modalidade.

A NBA sobreviveria sem Lin, mas com ele a história fica muito mais legal. E o massacre da mídia com relatos sobre o fenômeno do estudante de Harvard que conseguiu chegar à liga mais importante do basquete enche de vontade do público em acompanhar o esporte.

Não por acaso, os dois últimos jogos de Lin pelo Knicks bateram os recordes de audiência na televisão desde os tempos de Jordan. Nas ruas de Nova York, as camisas de número 17 do time da cidade estão espalhadas pelas lojas, de olho no consumo do turista, especialmente o chinês.

Lin não é um craque, mas tinha uma história legal para ser explorada. O americano consegue fazer do esporte um grande meio de se contar grandes histórias e, assim, aumentar o faturamento.

No Brasil, os gestores esportivos continuam a achar que seu grande feito é alimentar a mídia com polêmicas vazias. Enquanto isso o consumidor segue abandonado e ávido para gastar dinheiro.

Não é por acaso que, em solo brasileiro, os gastos em shoppings, shows e cinemas seguem aumentando em proporção bem maior que no esporte. Esses outros segmentos perceberam há pelo menos duas décadas que fazem parte da indústria do entretenimento. Já passou da hora de o esporte acordar para o potencial de consumo que está adormecido. Lin é só mais um exemplo disso.


A mudança que não virá na CBF
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Erich Beting

Ok, Ricardo Teixeira poderá em breve sair do comando do futebol brasileiro. Mas será que de fato teremos uma mudança de mentalidade e de gerenciamento do esporte mais popular do país a partir disso?

A simbologia da queda de Teixeira, justamente naquele momento em que ele viveria o seu apogeu como presidente eterno da CBF, nada mais é do que isso, um mero símbolo. E isso não é um privilégio do Brasil ou do futebol em particular.

A forma como o esporte se estruturou em todo o mundo, à exceção dos Estados Unidos, faz com que mudam-se as figuras mas raramente alterna-se a maneira de gerenciar as principais entidades e clubes esportivos no mundo todo.

É só lembrar a farra que é o entra-e-não-sai das confederações esportivas no país e no mundo.

Na Federação Internacional de Vôlei, após quase três décadas terá troca no poder. No COI, após a dinastia Samaranch, já são dez anos com Jacques Rogge na presidência. Na Iaaf, do atletismo, desde 1999 o senegalês Lamine Diack comanda a entidade. Da mesma forma outros presidentes perpetuam-se no poder e pouco muda no gerenciamento do esporte em cada uma dessas entidades.

O feudo em que se transformou a CBF é difícil de, uma hora para a outra, ser reestruturado. Ainda mais com a organização de uma Copa do Mundo a caminho como é agora. Como disse o mestre Juca Kfouri em sua coluna na “Folha de São Paulo” outro dia, talvez fosse a hora perfeita de os clubes assumirem os controles.

E realmente talvez seja isso o que torna tão intrigante a forma como o esporte nos Estados Unidos é desenvolvido de forma profissional. Não existe concepção de que haja uma entidade que esteja acima dos atletas e dos clubes/universidades. Tudo é formatado colocando o atleta como o grande fazedor do espetáculo. Mesmo os times contam e produzem toda a história sobre os seus atletas (é só ver o que fez agora a NBA com o chino-americano Jeremy Lin, sensação-relâmpago do New York Knicks).

Mas nem isso é possível. Pelo menos não com os gestores que existem nos clubes de futebol do Brasil na atualidade. A crise na CBF é boa para mostrar que as dinastias sempre acabam, mais dia ou menos dia. Mas, do jeito que as coisas estão, nada, ou quase nada, deve mudar.

É um triste relato da falta de profissionalização do esporte. E não só no Brasil.


A profissionalização forçada do esporte
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Erich Beting

Não tem jeito. O esporte será obrigado a se tornar cada vez mais profissional no Brasil. E esse talvez seja de fato um dos “legados” da realização de Copa do Mundo e Jogos Olímpicos no país nos próximos anos.

À parte da revolução que está com cara de que vai se aproximar na CBF, os clubes de futebol no Brasil puxam a fila e, aos poucos, começam a ter nos seus departamentos de marketing pessoas com formação acadêmica e, mais do que isso, atuação profissional nas áreas de marketing, publicidade e correlatas.

É uma evolução que ao poucos também começa a se espalhar para outras modalidades e tomará um caminho sem volta no país em cerca de dez anos.

Até 2016, os investimentos das empresas no esporte passarão a ser cada vez maiores e mais criteriosos. O achismo na hora de buscar uma oportunidade está sendo abandonado de vez, e isso força que o esporte esteja preparado para oferecer um bom retorno para os investidores.

Mesmo que com atraso, o Brasil começa a descobrir que investir no esporte não é só caridade, mas um negócio de fato, com prazo de duração, metas previamente estabelecidas e mensurações que vão muito além da simples exposição da marca, sem criar qualquer vínculo com o consumidor.

Num mundo cada vez com mais multiplataformas de comunicação e com a mídia totalmente segmentada, o esporte transforma-se numa eficiente forma de encontrar e se engajar com o consumidor. Só para se ter uma ideia, na Copa de 58, por exemplo, apenas o rádio e os veículos impressos eram usados como meios de busca pela informação pelo torcedor. Em 2014, são pelo menos cinco diferentes plataformas para acompanhar uma partida, além do próprio estádio.

Ainda que à força, as coisas começam a evoluir. Mais um bom exemplo vem do Corinthians, que coloca como diretor de marketing Ivan Marques, um dos sócios da agência de publicidade F/Nazca (leia mais aqui), além de manter toda a estrutura que há quase uma década está no clube.

O esporte também precisa saber fazer marketing, vender seu produto e saber quem é seu consumidor. Do contrário, vai ficar parado no tempo e, possivelmente, será ultrapassado pelos concorrentes.


O futebol e a política sempre se misturam
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Erich Beting

Estádio da Amizade, no Gabão. Durante o jogo entre Costa do Marfim e Zâmbia, o gigantesco telão no lado norte do estádio mostrava imagens de algumas personalidades presentes à decisão. Em êxtase, o p‎úblico que lotou a arquibancada celebrava a cada diferente astro que aparecia no estádio.

Até que, num determinado momento, a câmera focalizou o casal Ali e Sylvia Bongo Odimba, respectivamente presidente e primeira dama do Gabão. Assobios, palmas e uma celebração ecoou em boa parte do estádio (como dito aqui ontem, só Pelé e Eto’o tiveram ovação maior).

O fato é que o povo credita a Bongo boa parte da alegria gabonesa de receber a final da CAN e ainda por cima num belíssimo e moderno estádio.

A expressão “Sim, nós podemos”, que virou moda ao promover a eleição de Barack Obama nos Estados Unidos, foi mais uma vez usada no Gabão para conseguir organizar ao lado de Guiné Equatorial a Copa Africana. Em todo lugar que aparecia, Ali Bongo reforçava a tese de que, ao fazer de forma boa e organizada a CAN, o Gabão mostraria ser capaz de mudar a sua história e ser um “Gabão Emergente”.

O discurso contagiou a população, e o reflexo pode ser visto quando seu rosto apareceu no estádio. A Copa Africana foi usada por Bongo, de apenas 53 anos, para tentar mudar um pouco a expectativa dos gaboneses com relação a seu país. Há dois anos e meio no poder após a morte de seu pai (a família comanda o país há 40 anos), Ali Bongo buscou investimentos estrangeiros para melhorar a infraestrutura de Libreville, capital do país, e teve a “sorte” de ter o principal campeonato de futebol do continente bem no meio do caminho.

Em vez de questionar o meio bilhão de dólares gasto para fazer o estádio para o torneio, enquanto boa parte vive em casas de madeira, a população local engajou-se na ideia da importância de ter o evento para construir o futuro da nação. Enquanto a arena esportiva para 40 mil pessoas ficou pronta em agosto passado, o hospital na mesma região só deve ser completamente aberto para a população daqui a um mês. Próximo a ele, também serão entregue milhares de casas e um bairro planejado, inédito na história de Libreville.

O futebol é só o chamariz popular para que Bongo consiga convencer a população de que é possível ser melhor e não correr o risco de perder o controle da população. Futebol e política sempre andam juntos. Ainda mais em lugares onde a política do pão e circo contribui, e muito, para aliviar o sofrimento de uma população abandonada pelos governantes.

Por isso mesmo a ida dos megaeventos para os países emergentes dos últimos anos mostra claramente que o político já percebeu o poder de manipulação que o esporte tem. Na Europa e nos EUA, com crise econômica e perda de pode aquisitivo da população, a realização de grandes eventos esportivos encontra cada vez mais resistência. Enquanto isso, América do Sul, Oriente Médio, África e Leste Europeu, que sempre ficaram à margem dos grandes acontecimentos, celebram a chance de ser parte do “primeiro mundo”.


Pelé ou Messi. Quem foi o maior?
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Erich Beting

Não, querido leitor, não enlouqueci. Essa pergunta foi feita a mim por um jornalista francês que trabalha e mora no Gabão e, mais do que provado, não entende nada de bola (e isso pude comprovar não pela pergunta que dá título ao texto, mas sim por ele não entender como funcionava o sistema da disputa por pênaltis durante a final da Copa Africana de Nações!!!).

Bom, a pergunta seguiu-se a um extenso debate sobre o futebol de ontem e de hoje, os títulos conquistados e a indestrutível marca de mais de 1200 gols de Pelé. Quando vi que esse argumento caía por terra quando um espanhol (torcedor do Barcelona, é claro) disse que muitos daqueles na contagem eram de partidas amistosas, lembrei-me de um relato feito horas antes pelo francês quando desembarquei no Gabão.

Ele havia dito que Pelé tinha dado o pontapé inicial numa partida de futebol de areia em Libreville, capital do Gabão, no sábado véspera da final da Copa Africana de Nações. Pelé foi contratado pelo governo gabonês para acompanhar a decisão e, claro, apadrinhar um projeto social ligado ao futebol promovido pelo ditador Ali Bongo Odimba.

Políticas de pão e circo à parte, o fato é que a presença de Pelé na praia de Libreville fez com que, nas palavras do jornalista francês, as pessoas se hipnotizassem e celebrassem a presença do ex-jogador como raras vezes ele tinha visto no Gabão.

Perguntei, então, se eles acreditavam que, 35 anos depois de ter simplesmente parado de jogar, Messi conseguiria atrair tantas pessoas para um evento e, mais do que isso, deixasse todas elas paralisadas e hipnotizadas como Pelé consegue fazer por onde ele passa.

O fato é que dificilmente haverá outro Pelé  no mundo, em qualquer ramo de atuação. Um cara que é mundialmente conhecido, mesmo tendo jogado numa época sem TV, internet e redes sociais. Um cara que simplesmente consegue, apenas na divulgação boca-a-boca, ou geração a geração, ser perpetuado como um mito.

Messi pode fazer os gols que quiser, ganhar os títulos que disputar, mas possivelmente não conseguirá ser como Pelé. Até pode, esportivamente, ser maior do que ele, mas com certeza não terá nunca o apelo de mídia e o índice de popularidade do Rei do Futebol.

Horas mais tarde dessa discussão sobre Pelé e Messi, no Estádio da Amizade, o telão mostrava o rosto de algumas personalidades presentes à decisão entre Costa do Marfim e Zâmbia no decorrer do jogo. O único ovacionado por todo o estádio ao ser filmado não foi Platini, Samuel Eto’o (que foi muito aplaudido, é verdade) ou o ditador Ali Bongo (que também teve uma excelente recepção da torcida). Foi só aparecer o rosto de Pelé que o estádio inteiro começou a aplaudir…

A discussão sobre quem era melhor?

Quando lembrei da história de Pelé na praia de Libreville, subitamente o tema passou a ser a possibilidade de Nadal ter se dopado para jogar, discussão que deixei restrita a franceses e espanhóis…


Uma lição do Gabão ao Brasil
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Erich Beting

“Não importa quem vai ganhar a Copa. Mas sabemos que o Gabão já ganhou”. A frase era repetida à exaustão pelos organizadores da Copa Africana de Nações durante todo o domingo, antes de a Zâmbia conseguir o título inédito.

A frase referia-se ao orgulho gabonês de receber o evento e, mais do que isso, de conseguir mostrar o que o governo de Ali Bongo Ondimba pretende para o país, tornar-se o centro de prosperidade do continente africano.

Nas ruas, no Estádio da Amizade, onde o jogo foi realizado  e em todos os cantos da cidade de Libreville, transbordava o orgulho do gabonês em realizar a final da Copa Africana. Agora, a meta do país é fazer o lema “Sim, nós podemos”, se transformar no “Sim, nós fizemos”!

Na manhã desta segunda-feira, o presidente da Agência Nacional de Grandes Trabalhos do Gabão, Henri Ohayon, mostrou a jornalistas do mundo inteiro o plano de desenvolvimento do país até 2016. Sua apresentação foi aberta com a seguinte fase:

“A Copa Africana de Nações foi o primeiro passo de um projeto de 15 anos”.

A ideia de mostrar uma nova “cara” do Gabão com a final da CAN foi bem executada, pelo menos dentro de campo. O jogo entre Costa do Marfim e Zâmbia transcorreu sem qualquer problema e, mais do que isso, impressionou a festa de encerramento da competição com seu show tecnológico.

Claramente o governo do Gabão usou o momento para ganhar a população e fazê-la acreditar que o momento é de mudança e de melhoria em qualidade de vida. E esse é o ponto.

E o Brasil, o que queremos com Copa do Mundo e Jogos Olímpicos?

Não vivemos num regime ditatorial como no Gabão, o que faz com que o debate seja sempre ampliado, mas também felizmente não estamos tão atrasados em desenvolvimento humano (o Brasil é a 84ª nação no ranking da ONU, e o Gabão é a 106ª) e não temos os mesmos níveis de pobreza que é visto em Libreville, capital gabonesa.

Mas o que assusta é ver que falta um projeto claro e consistente, feito por profissionais, para mudar a cara de um país a partir de um evento esportivo de primeira grandeza.

Seguimos sem saber o que o Brasil quer ser, além de a “quinta maior economia do mundo”. Para isso, toda nação minimamente bem desenvolvida tem essa história, é preciso investir em infraestrutura, educação e saúde. Do contrário, viveremos sempre num país de quinta categoria.

O evento esportivo é apenas o chamariz para que a população seja engajada nesse projeto e possa, com isso, passar a querer fazer parte dessa mudança. Antes, porém, precisamos saber qual a mensagem que queremos passar.


Uma primeira análise sobre a lista da Deloitte: o futuro é alemão e inglês
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Erich Beting

Vou tentar escrever por aqui nos próximos dias uma análise mais detalhada da lista publicada hoje pela consultoria Deloitte sobre os 20 clubes de maior faturamento da Europa. Hoje só deu tempo de bater o olho e não me debruçar sobre os números apresentados. Mas uma coisa é certa. O futuro do futebol europeu estará nos clubes alemães e ingleses.

Sim, legal, Real Madrid e Barcelona continuam como os grandes líderes da lista. Mas tem uma coisa nesse resultado que preocupa, principalmente no clube catalão. Na divisão das fontes de receita, o faturamento com a venda de direitos de TV corresponde a 44% de toda a receita do Barça, enquanto no Real Madrid ela responde por 36% do total arrecadado. Nos dois casos, a TV é quem mais gera dinheiro aos dois times. E aí é que está o problema. A partir de 2015, o contrato de televisão na Espanha deixará de ser individual. Isso deve reduzir o quanto Barça e Real faturam com direitos de transmissão.

E aí é que chegamos ao ponto. A liderança tão soberana de Real e Barcelona possivelmente deixará de existir com a mudança da arrecadação com TV. Sem depender tanto dessa fonte de receita, Manchester e Bayern de Munique devem se aproximar rapidamente dos dois líderes.

Da mesma forma, os clubes de Inglaterra e Alemanha tendem, com o passar dos anos, a dominar ainda mais o cenário de arrecadação, já que os dois países, entre os cinco principais do futebol europeu, são os que sofrem menos com a crise econômica. Dos 20 clubes que lideram a arrecadação na Europa, 11 são alemães e ingleses. A Espanha tem Real, Barça e Valencia, a Itália conta com Milan, Inter, Juventus e Roma e a França tem Lyon e Olympique de Marseille.

O futuro, claramente, pertence a alemães e ingleses. Não por acaso, os dois países são também as ligas mais fortes da Europa atualmente, com  maior média de público e maior rotatividade de times campeões.

Isso já indica um bom caminho para o futebol brasileiro seguir.