Negócios do Esporte

Arquivo : março 2013

O padrão Globo de entretenimento
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Erich Beting

Durante décadas, a Globo construiu a fama de seu jornalismo ancorada no princípio da padronização da produção do conteúdo. Marcado pela formalidade, esse modelo começou a ruir dentro da cobertura do esporte nos últimos anos. Numa época em que as opções de entretenimento são várias, em que o comportamento do consumo de mídia pelo público jovem mudou radicalmente, não cabia mais uma cobertura televisiva sisuda sobre esporte.

Há cerca de cinco anos o Padrão Globo de Jornalismo que marcou cerca de quatro décadas da televisão brasileira começou a ser transformado, na cobertura esportiva, para uma espécie de Padrão Globo de Entretenimento. Aos poucos, a informação sisuda foi substituída por aquela mais leve, que tem um caráter informativo também, mas que presa primeiro pelo entretenimento.

O consumidor fanático chiou e condenou rapidamente o novo formato de jornalismo esportivo da emissora. Acontece que, na medição da audiência, o Globo Esporte finalmente voltou ao topo em seu horário e, também, projetos novos, como o Central da Copa e os Gols do Fantástico passaram a ter repercussão.

Em 2013, a emissora adotou de vez o entretenimento em detrimento da informação tradicional. Prova disso são as transmissões-show que têm sido feitas no futebol, sempre com convidados e papos amenos mesmo durante a partida. Mais uma vez, o fanático possivelmente vai migrar para os canais por assinatura, que são mais técnicos, ou para outros canais com o modelo tradicional de transmissão.

A novidade agora é a contratação de dois nomes fortes para o time de comentaristas. Ronaldo reforçará a equipe do futebol, enquanto Rubens Barrichello fará parte do time da Fórmula 1. Mais uma vez a ideia é que ambos ajudem no conceito de que as transmissões são parte de um pacote de entretenimento, em que as histórias dos atletas serão reforçadas para dar mais “leveza” à cobertura.

Considerando todos os conflitos que existem da presença de Ronaldo, agente de atletas que fazem parte da seleção e membro do comitê que organiza a Copa das Confederações e a Copa do Mundo, o padrão Globo de entretenimento precisa, urgentemente, consultar um pouquinho o histórico do padrão de jornalismo da emissora.

Nada contra a capacidade de Ronaldo como analista, pelo contrário, ele sempre foi alguém que soube transmitir informação e ponto de vista. O problema é acreditar que a opinião dele não estará viciada em demasia.


O problema que causa o abandono do marketing
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Erich Beting

O Palmeiras abandonou, ainda na gestão de Arnaldo Tirone, seu departamento de marketing. Antes, havia tido lampejos de trabalhos voltados à gestão da marca do clube, mas enterrou de vez qualquer ação nesse sentido há pelo menos três anos. O preço a ser pago agora pelas atitudes do passado torna-se cada vez mais salgado.

Um dos grandes conceitos deturpados que existe dentro de um clube de futebol é o de que o marketing deve ser o responsável pela geração de receita para a instituição. O problema é que essa função deve ser exercida, primordialmente, por um representante da área comercial dentro da hierarquia do clube. O marketing tem uma função distinta, mas que é extremamente crucial, que é a de gerenciar a paixão do torcedor e, consequentemente, isso atrair mais receita para o clube.

Quando há um claro entendimento dessa função, o marketing acaba sendo responsável por uma mudança na percepção do clube pelo torcedor. E isso pode fazer toda a diferença. Pensar constantemente em agradar o torcedor e criar serviços para ele que alimentem o amor que ele sente pelo time que torce são muitas vezes mais importantes do que buscar um patrocinador para o clube.

Sim, obviamente o patrocínio nas finanças do futebol representa algo bem maior do que os programas de licenciamento. Só que o relacionamento constante do clube com o torcedor faz com que ele não fique dependente do resultado do time dentro de campo para ser o que dá base para sua relação com a agremiação.

O Palmeiras hoje dá uma mostra de quanto abandonar as funções do marketing pode ser penoso para um clube. Ao ser rebaixado para a Série B e tomar goleadas como a da última quarta-feira, a paixão da torcida fica machucada. Isso, no médio prazo, afasta o torcedor menos fanático do dia-a-dia do clube e o deixa relegado apenas àqueles cuja paixão torna-se ainda maior na época de derrotas.

Desde que foi rebaixado, no final do ano passado, o Palmeiras abandonou o torcedor. Nada foi feito para ele que reforçasse a importância dele na recuperação do clube. Se compararmos a situação com o maior rival do clube, o Corinthians, o abismo fica ainda mais claro entre as diretorias. Quando caiu à Série B, no dia seguinte o alvinegro criou uma linha de produtos com o tema “Eu nunca vou te abandonar”. Esse foi o mote da reestruturação do clube, que hoje navega em águas tranquilas, campeão atual da América e do mundo.

O marketing não ganha jogo, mas ajuda e muito a convencer o torcedor de que ele é peça importante na história de um clube. Abandonar o marketing deixa o relacionamento do esporte com o consumidor à mercê estritamente do desempenho esportivo. Quando a fase não ajuda, a paixão é constantemente maltratada.

Até mesmo para a reconstrução do clube, que é a bandeira de trabalho da nova gestão palmeirense, é urgente que o marketing acorde. Do contrário, o ano de celebração do primeiro centenário será de mais tristeza ainda para o torcedor alviverde.

Abandonar o marketing é o primeiro passo para se perder consumidores. E isso, num clube de futebol, significa, no médio prazo, deixar de ser grande para se tornar um clube médio. No longo prazo, é tornar-se pequeno de vez…


O novo patamar que o esporte pode atingir
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Erich Beting

Mas afinal qual o futuro de quem quer trabalhar com esporte no Brasil? A pergunta é cada vez mais repetida em cursos e eventos ligados ao tema. A expectativa inicial, vinda da confirmação de Copa do Mundo e Jogos Olímpicos para cá, já foi substituída por um sentimento de desilusão por boa parte do mercado.

“Não vamos nos profissionalizar”. “Tínhamos a chance, mas perdemos”. “O bonde já passou e não soubemos aproveitar”. “Estamos atrasados para fazer qualquer coisa em relação à Copa”. Provavelmente o leitor do blog já parou para pensar nisso ou já se deparou com alguém fazendo pelo menos uma dessas afirmações numa eventual conversa.

A situação atual do esporte no Brasil confirma que boa parte das expectativas iniciais foram frustradas. O problema crucial em tudo isso foi, como já em 2008 apontávamos na edição de aniversário da revista Máquina do Esporte, era a falta de planejamento e, principalmente, de execução. Fomos relaxados em executar tudo aquilo que havíamos planejado, e a prova mais clara disso é o fato de que apenas um estádio foi entregue no prazo estipulado pela Fifa quando as 12 sedes da Copa foram anunciadas (já com atraso, vale ressaltar).

Essa falta de execução é o que causa a maior parte dos problemas, uma vez que vira um efeito cascata sobre o mercado. Imagine como seria hoje a percepção do brasileiro com relação à Copa das Confederações se os campeonatos estaduais já estivessem usando os estádios novos? Isso levaria também a mídia a ter uma espécie de “agenda positiva” na cobertura do evento. Logo, as pessoas e as empresas falariam mais sobre o tema e, assim, a indústria toda já estaria com o clima do evento.

Sem esse cenário, restou a quem trabalha no esporte tentar tocar o barco tendo de lidar com a frustração por ainda não enxergar um mercado mais forte, parrudo, com investimentos claros e principalmente com oportunidades mais bem definidas na própria indústria.

Hoje, o mercado esportivo tem mais dinheiro, mas sem profissionalismo. A verba entrou porque as empresas precisam investir. E isso faz com que o próprio esporte ainda não perceba que é preciso se estruturar melhor para essa mudança.

E é aí que entra uma visão de que o esporte pode atingir um novo patamar, mas que isso não está necessariamente ligado aos grandes eventos. O aumento de investimento das empresas também fará com que elas tenham de permanecer no esporte para não se passarem por “aproveitadoras”. Isso abre uma lacuna a ser preenchida.

Ontem, no Rio, a agência IMX apresentou o Rio Open de tênis com o objetivo estratégico bem definido. Fazer da competição o maior acontecimento esportivo permanente da Cidade Maravilhosa e, no médio prazo, tentar transformar o Rio numa espécie de capital do tênis. Da mesma forma, muitas outras empresas têm fechado contratos de patrocínio para além de 2016, apostando numa melhoria da experiência do consumidor dentro dos eventos esportivos.

Tudo leva a crer que vamos aprender a trabalhar melhor o esporte depois do furacão de Copa e Olimpíada. Se, antes, estávamos num período arcaico de gestão do esporte no país, a tendência é que tenhamos um nível mais apurado a partir de agora, quando os projetos não tiverem vínculo com os grandes eventos, mas sim com o retorno que o esporte dá para as marcas e para o público.

É um novo patamar no qual a indústria do esporte pode se inserir no médio prazo. Isso, porém, não tem relação direta com Copa e Olimpíada, mas com a mudança de percepção de marcas e gestores esportivos de que os benefícios trazidos pelo investimento perene no esporte podem ser cruciais dentro da estratégia de uma empresa.

Essa é a parte boa da história. A ruim, é que ainda temos muito a falhar para aprender a importância da execução no futuro da indústria esportiva.


O país que queremos para nós
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Erich Beting

O bordão “Imagine na Copa” ganha a versão mais completa quando estamos no Rio de Janeiro. Em meio às obras preparativas para Copa e Olimpíadas, temos ainda situações absurdas do cotidiano fluminense que chegam a assustar quem conhece minimamente a cidade.

Situação peculiar foi vivida nesta terça-feira. A caminho do evento de lançamento do Rio Open de Tênis, tentei contratar o serviço das empresas de táxi que atendem à cooperativa com a qual o BandSports tem contrato. A corrida era simples. Do aeroporto até o hotel Sheraton na Avenida Niemeyer, distância de cerca de 15 quilômetros e no contra-fluxo do horário.

Nas contas de quem há dez anos visita bastante o Rio a trabalho, o táxi poderia cobrar no máximo R$ 50 pelo trajeto, e mesmo assim se pegasse trânsito para chegar até o hotel. Na hora de pedir o veículo, a surpresa. Preço de corrida fechado, a R$ 104. De prontidão peguei os táxis amarelos, que têm seus problemas, mas que seguem o preceito do que é um táxi. Um veículo que funciona com um taxímetro. No final da história, ida e volta ao aeroporto num total de R$ 86, sendo que um carro quebrou no meio do caminho e tivemos de trocar de veículo.

A história pessoal não é advogar em causa própria. Pelo contrário. Enquanto me dirigia ao verdadeiro táxi, e não ao estelionatário de plantão, pensei no impacto que tem, para a imagem do Brasil, quando um turista chega aqui e se depara com uma situação dessas. Não só o estrangeiro, mas também o brasileiro que não sabe onde está pisando.

Um ágio de 200% sobre o preço normal da corrida de táxi é de envergonhar quem se preocupa minimamente em receber bem uma visita. Nessas horas, a sensação que fica é sempre a mesma: “Imagina na Copa”.

Não dá para pensar em engarrafamentos de trios elétricos se não temos honestidade nem na hora de oferecer um serviço básico como o transporte de táxi para alguém de fora da cidade.

Um dos grandes baratos de Copa do Mundo e Jogos Olímpicos no país é receber um contingente bacana de turistas que talvez não fosse se reunir em tanta quantidade e por tanto tempo como será em 2014 e 2016. Mas aí entra o ponto básico de discussão, que é saber o país que queremos para nós mesmos.

Será que a melhor maneira de impactar o turista é cobrando duas vezes mais do que o preço normal de uma corrida de táxi? Ainda mais na cidade mais turística do país, que não dependerá dos megaeventos para aumentar a receita com o turismo. O Rio sempre tem no turista uma fonte de receita, diferentemente de boa parte das outras cidades que abrigarão esses dois eventos.

Ou o brasileiro começa a forçar uma mudança de mentalidade na gastança desenfreada que se tornou o setor de serviços, ou então teremos que promulgar a malfadada frase “Imagine na Copa” até 2014 e sua variável para as Olimpíadas até 2016. Depois disso? Bom, aí talvez seja a hora de imaginarmos como a festa poderia ter sido melhor se tivéssemos planejado e executado esses eventos. Receber com honestidade o turista que chega a um lugar não depende de eventos esportivos para se tornar realidade. Depende de interesse dos moradores brasileiros em serem civilizados.

Se não, tem como não imaginar como será na Copa?


Patrocínio não é (só) exposição
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Erich Beting

Gerou uma repercussão interessante o texto de ontem sobre a saída da Medley do vôlei. Nem tanto sobre mais uma saída de um patrocinador do segundo esporte mais popular do país, mas sempre pela necessidade brasileira de encontrar um “vilão” para a história.

E, mais uma vez, choveram críticas à Globo. O fato de ela sempre se referir ao time Medley/Campinas como Campinas foi a primeira, e mais óbvia, das reclamações. Digo isso com conhecimento próprio de causa. Sempre achei que isso fosse algum problema, mas o buraco é muito, mas muito mais embaixo.

Achar que a empresa investe no vôlei já esperando que seu nome será falado pela Globo é de uma tremenda infantilidade. A regra do jogo é que a emissora não fala o nome da empresa. A marca já entra no esporte sabendo disso. Da mesma forma, o torcedor sabe direitinho qual empresa mantém seus times. O fã incondicional do esporte, mais ainda, não só sabe quem é a marca como também tem maior interesse por ela exatamente por incentivar sua paixão.

Esse cenário, aliás, só mostra que a medida de não chamar os times pelo nome das empresas não tem qualquer efeito prático. O maior resultado que ela produz, se fosse bem explorado pelos clubes, seria benéfico para o vôlei. Ao falar o nome da cidade, ela não deixa de fazer “propaganda” do município que abriga o time. Às vezes, isso pode ser uma tremenda barganha em argumento de venda para um acordo com a prefeitura de alguma cidade. Ter a TV falando o nome da cidade é uma excelente forma de promover o local, além de criar mais vínculo do time com a cidade e, assim, evitando uma debandada por pressão do próprio ente público após a saída de um ou outro patrocinador. Isso também cria, no médio e longo prazo, um engajamento do morador local com o time, muito mais do que se ele tivesse o nome de uma empresa.

Mas o princípio da discussão que quis levantar por aqui foi exatamente a falta de visão dos clubes de vôlei em tratarem de não depender só da verba de patrocínio. Ainda mais quando o modelo de venda é calcado na exposição da marca, como acontece na maioria dos times de vôlei.

A exposição da marca é um benefício que o patrocínio esportivo pode trazer. Mas não é o principal. Uma grande prova disso são os Jogos Olímpicos. As marcas não podem aparecer nos uniformes ou nas arenas. Restam às empresas trabalharem a comunicação desses patrocínios em anúncios na mídia e realizar as famosas ações para ativar as propriedades disponíveis no patrocínio. É a famosa ação de compre e concorra a ingressos, ou então aquela em que a marca seleciona clientes e/ou funcionários para assistirem a eventos na área VIP, etc.

Um dos maiores aprendizados que a indústria do esporte pode ter com a realização de Copa do Mundo e Jogos Olímpicos é a de que o patrocínio não é só exposição. Num mercado mais desenvolvido, esse conceito não só é óbvio como é princípio básico da relação entre esporte e patrocinadores.

Por aqui, até por uma situação peculiar de mídia, em que um canal de TV aberta detém mais de 50% da audiência, sempre calcamos a venda de um patrocínio como exposição “barata” na mídia. E, assim, o esporte foi ficando cada vez mais refém da exposição.

A conta a ser feita é exatamente oposta. Se a marca tiver exposição, ela se beneficia ainda mais do patrocínio. Do contrário, ela conseguirá trabalhar com o consumidor com uma experiência totalmente diferente de alguém que não tem essa propriedade de patrocínio.

O melhor exemplo disso no Brasil hoje talvez seja o mercado de corrida de rua. O relacionamento com o corredor é o maior benefício que um patrocinador tem. Exposição em marca, se for o caso, é um saboroso bônus…


O vôlei não pode ser refém do patrocínio
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Erich Beting

Há algumas semanas abordei aqui o quanto o vôlei estava dependente do dinheiro. Desempenho de ponta só nas equipes com muita verba disponível para gastar, às vezes até a fundo perdido. O problema é que esse modelo, no médio prazo, não se sustenta. Prova disso foi a saída da Medley do time de Campinas após três anos (leia os detalhes aqui).

Na história do marketing esportivo brasileiro, o vôlei teve um papel importantíssimo para turbinar os ganhos de toda a indústria. Foi por pressão de Carlos Arthur Nuzman, então presidente da CBV, que no início dos anos 80 o governo brasileiro permitiu a publicidade na camisa das equipes que disputavam esportes coletivos.

À época, isso teve impacto direto no vôlei. Empresas viram no esporte que começava a se profissionalizar a chance de fazer uma grande estratégia de marketing. Os atletas, por sua vez, conseguiram passar a se dedicar apenas para o esporte, quando até cinco anos antes, dividiam sua vida entre estudos, trabalho e treinos. Foi o salto que precisava para o país passar a ter competitividade mundial, tanto que em 1984 conquistou a prata nos Jogos Olímpicos de Los Angeles.

Só que o modelo que consagrou o início do profissionalismo do vôlei no Brasil é ainda o que clubes, federações e confederações acreditam ser o mais bem sucedido para o esporte. Há ainda a crença de que uma empresa “envelopar” um time vai trazer resultados diretos para a marca.

O problema é que o mundo mudou só um pouco nos últimos 30 anos. O vôlei raramente está na TV aberta, como era antes. Além disso, as opções de entretenimento da população é variadíssima. Investir hoje num time de vôlei custa caro para um retorno relativamente baixo. Isso, claro, se apenas uma empresa tiver de pagar toda a conta.

O tamanho alcançado pelo vôlei hoje no Brasil é muito maior do que uma empresa apenas pode suportar. Investir no relacionamento com o torcedor, buscar a prefeitura local para trabalhar a divulgação do time na cidade, criar projetos que não dependam de apenas uma empresa e, muito menos, vender a ela a exposição de marca como maior benefício são algumas das atitudes necessárias a serem tomadas pelas equipes de vôlei no Brasil.

Outro aspecto que hoje parece sub-aproveitado é o potencial do ídolo. Jogadores carismáticos e com enorme apelo ao público estão em atuação no Brasil. O que os clubes preparam aos torcedores com esses atletas? Como as empresas podem usá-los para obter retorno que vai muito além de batizar o time?

A Medley tinha tudo isso em Campinas, mas o projeto acabou assim que o interesse da empresa em patrocinar o vôlei acabou. É normal o patrocínio ter um fim. Não é normal o esporte não se preparar para quando esse fim chegar. Ainda mais o vôlei, que tem esse histórico de entradas e saídas constantes.

Enquanto seguir refém do patrocínio, o vôlei seguirá numa meia-profissionalização. E seguirá tornando o esporte cada vez mais disponível só para quem tem muito dinheiro. Nesse caminho, porém, enfrentará um grande concorrente, que é o futebol. O primeiro passo para mudar está num questionamento primordial, que foi o ponto de partida para uma nova mentalidade no basquete brasileiro.

Qual é de fato o papel da CBV na gestão da Superliga? Só a partir do momento que essa resposta ficar clara para clubes, atletas e a própria confederação é que o entra-e-sai de marcas poderá mudar.


O jeito Heineken de pensar
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Erich Beting

“A Heineken não quer ser só uma patrocinadora, ela quer fazer algumas coisas para os fãs”.

A frase resume exatamente o comportamento que a marca de cervejas holandesa tem no mercado de patrocínio esportivo. O autor é Hans Erik, diretor global de marketing da Heineken em conversa com o blog nesta sexta-feira.

Neste fim de semana, a Uefa e a Heineken promovem no Rio de Janeiro a exibição da taça da Liga dos Campeões da Europa. O mais cobiçado troféu do futebol europeu estará na Cidade Maravilhosa para reforçar a imagem da competição e também da marca de cerveja. O evento poderia se resumir a isso, mas o jeito Heineken de pensar impede que “apenas” isso seja feito.

A marca trouxe ao país Guy Luchting. Quem? Ok, vamos refrescar a memória de todos nós.

Guy é “O Candidato”. Lembra daquele garoto que venceu um concurso feito pela Heineken para escolher o próximo empregado da área de marketing da empresa? Se não souber, clique aqui para conhecê-lo. Se souber, clique mesmo assim para relembrar e repensar a estratégia do departamento de RH de uma empresa ou da sua estratégia na próxima vez que for a uma entrevista de emprego.

Seedorf é o embaixador do tour da taça, mas é Guy quem estará ali também como uma espécie de embaixador da empresa, reafirmando o estilo Heineken de pensar no relacionamento com os consumidores.

Com o pensamento de fazer a diferença na hora de patrocinar, a empresa também alçou o garoto que seria um simples estagiário do marketing para uma espécie de embaixador da companhia (depois do Brasil, Guy estará, com a taça, na República Democrática do Congo e  na Indonésia). O motivo? Na Europa, ele virou celebridade após saber que foi o escolhido para a vaga numa ação antes de um jogo da Liga dos Campeões.

O bom uso das ferramentas de marketing depende, necessariamente, de criatividade. Mas não é só ela, claro, que vai sustentar um bom programa de patrocínio no esporte. Para encerrar o estilo Heineken de pensar e agir com os patrocínios que possui, segue outro conceito defendido por Hans Erik:

“Se você não tem uma verba para fazer alguma coisa além do patrocínio, não faça. Além disso, você precisa ter uma visão clara do que a empresa faz. Se não tiver, também não faça o patrocínio”.

Por aqui as empresas começam timidamente a entender que essa é de fato a maior diferença dentro do investimento num patrocínio esportivo. Poder usar a paixão das pessoas como combustível para contar uma história com alto valor emocional. A Heineken talvez seja hoje o melhor exemplo dentro do futebol de aplicação desse conceito.

E, para se ter uma ideia de como a história do candidato é engraçada, segue um clique que fiz dele num típico momento “estagiário”.

Guy

O candidato, agora embaixador, concede entrevista durante evento


O dilema dos fornecedores de material esportivo
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Erich Beting

Quando anunciou o acordo com a Lupo, no início deste ano, o presidente do Atlético-MG, Alexandre Kalil, comemorou o valor recorde alcançado com o patrocínio: R$ 12,5 milhões, entre pagamento fixo em dinheiro (R$ 7 mi) e em produto (a preço de mercado, lá no máximo do máximo dos valores, outros R$ 5,5 milhões).

Não há dúvidas de que o negócio foi o mais vantajoso financeiramente para o Galo. Mas será que foi o melhor negócio para o clube?

Outro dia lancei pelas redes sociais a pergunta de quais temas o leitor gostaria de ver abordado por aqui. Mais de uma pessoa, torcedora do Atlético, reclamou do atendimento que a Lupo tem dado para o clube. Por que ainda não há camisas do Atlético à venda nas lojas? Por que boa parte das roupas de passeio usadas pelos jogadores ainda são da Topper, a antiga fornecedora de material do clube?

O problema que a Lupo enfrenta hoje ao tentar entrar com força no mercado esportivo brasileiro é o mesmo que outras marcas já tiveram no passado. Invariavelmente elas tiveram extremas dificuldades no início do fornecimento de uniforme para os clubes, sendo que ainda muitas delas sofrem mesmo com vários anos de atuação no esporte mais popular do país.

O maior problema que existe é a capacidade de produção e entrega de produtos dessas empresas. De todas as marcas que atuam nos grandes clubes do futebol brasileiro atualmente, apenas duas têm capacidade fabril para produzir os uniformes: Penalty e Olympikus.

Como a Vulcabras, dona da Olympikus, vive um turbulento momento financeiro, com dívidas bilionárias de curto prazo, a presença dela no mercado diminuiu. Se, até 2011, a empresa vestia as camisas de Inter, São Paulo, Cruzeiro e Flamengo, agora resta o clube mineiro e mais um mês de contrato com o time do Rio de Janeiro.

Isso fez com que o espaço deixado pela Vulcabras fosse ocupada por outras marcas, sem que elas tenham capacidade própria de produção de peças. Nem mesmo Nike e Adidas, as duas grandes do setor, conseguem atender à demanda atual (considerando o trabalho que vem pela frente na marca alemã com o Flamengo). Elas, aliás, talvez sejam as que mais sofrem para produzir camisas de futebol, já que possuem geralmente apenas uma ou duas fábricas com capacidade produtiva pequena para atender à imensa demanda dos materiais para clubes.

É esse hoje o maior problema da Lupo. Apesar de ser uma marca brasileira, a fabricante não tem capacidade para fazer, em seu parque fabril, camisas e peças para o Atlético-MG. Sendo assim, ela terceiriza o acordo de fabricação das peças para o Galo. A Filon é quem assina o contrato com o clube. A prática, aliás, não é exclusividade da Lupo. Topper, no Grêmio, Puma, no Botafogo, são dois outros exemplos de acordos que são feitos nessa triangulação entre dono da marca, dono da fábrica e clube.

O problema para a marca é que, quando a empresa produz o próprio artigo esportivo, ela consegue ter uma lógica própria de utilização de máquinas. Isso permite a ela fazer mais ou menos camisas a partir de um determinado dia. Se o parque fabril não é próprio, ela depende de uma demanda que já existe numa fábrica para produzir o material.

A terceirização não permite, por exemplo, que uma máquina pare e comece a produzir os uniformes aprovados por um clube no dia seguinte a um acordo ser fechado, ou um projeto novo ser delineado. A marca precisa conversar com a fábrica, que já tem uma lista de entregas a ser feita e que não pode ser simplesmente ignorada.

O grande problema é que os clubes muitas vezes ignoram essa realidade do mercado de produção de artigos esportivos no país. Eles exigem dos seus fabricantes um prazo que muitas vezes é impossível de ser cumprido. A maioria dos contratos, aliás, prevê que qualquer novo projeto de camisa precise de três meses para começar a ser produzido. Esse é um dos motivos, aliás, que muitas vezes não temos a produção em série de camisas com sacadas de marketing como é no mercado americano. Simplesmente não há capacidade do fornecedor de entregar isso.

O entrave está, naturalmente, no valor do negócio. Sem dinheiro, o clube pede mais do fabricante. Para pagar mais, o fornecedor exige que qualquer produção de peça de vestuário seja feita com ele. Do outro lado, as marcas prometem entregas que não são possíveis de serem realizadas, ou que não dependem dela para ser concretizada, já que ela contrata uma terceira empresa para realizar a produção do uniforme ou de camisas comemorativas, por exemplo.

A melhor alternativa seria o clube exigir um contrato que lhe desse flexibilidade para produzir camisas independentes, sem a marca do fornecedor de material esportivo. Na NBA, por exemplo, é isso que faz os times produzirem peças avulsas conforme a moda daquela semana.

Só que a estrutura dos clubes não permite que haja alguém com entendimento desse negócio para fazer essas mudanças. Da mesma forma, as luvas pagas pelos fornecedores de material esportivo amarram mais do que devem os clubes. E, nessa briga de mercado, os fabricantes prometem mais do que conseguem entregar.

O dilema na cabeça das marcas é grande.

Entrar no futebol traz um enorme bônus para a construção da marca. Ao mesmo tempo, porém, a estrutura do mercado brasileiro faz com que seja muito difícil entregar o produto dentro dos prazos exigidos pelos clubes e, principalmente, pelos torcedores.

A chave do sucesso num contrato de fornecimento de material esportivo é conseguir não apenas estampar a marca na camisa de um grande clube, mas também levar essa camisa que o torcedor vê na televisão para dentro das lojas. Sem isso, não há exposição de marca que justifique o investimento no futebol. A conta não fecha.

O problema é que muitas empresas não são capazes de entregar o que prometeram. E o prejuízo que isso pode gerar para a marca é muito maior que o benefício que a exposição na camisa de um time gera.

Com a profissionalização dos departamentos de marketing dos clubes a chance é de acompanharmos mais uma reviravolta nesse mercado nos próximos dez anos…


Enquanto isso, nos EUA…
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Erich Beting

Enquanto ainda debatemos se é possível ter alguma coisa além de futebol durante um evento esportivo, vamos deixando a banda passar e não conseguindo evoluir como uma potência para a realização de eventos no país. O vídeo abaixo foi a forma como a Red Bull celebrou o início de temporada do futebol jogado com os pés nos Estados Unidos.

Atitude de marca, entretenimento para o público e a certeza de que um jogo de futebol pode ser muito mais do que uma simples disputa entre duas equipes e se tornar um programa para o público.

Em tempo. Por aqui seria inviável qualquer ação do gênero, já que Polícia Militar e Federações Estaduais consideram “perigosa” qualquer tipo de ação que vá além de 22 atletas entrando em campo.


O que é ser um profissional?
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Erich Beting

Nas últimas semanas tive dois encontros com dois executivos que deixaram, recentemente, cargos graúdos envolvendo o esporte. No meio da conversa, ambos disseram ter sido muito boa a experiência em trabalhar com esporte, mas que a falta de profissionalismo na gestão de clubes, federações e atletas é algo que incomoda e atrapalha muito. Sem dúvida que para quem tem uma experiência anterior no mercado corporativo, o esporte é realmente um universo que mais assusta do que fascina.

Afinal, como já falado anteriormente aqui no blog, não é preciso profissionalizar o esporte para que o dinheiro entre no caixa. Um ótimo exemplo disso é o quanto cresceram as receitas dos patrocínios esportivos nos últimos cinco anos só porque o Brasil foi “premiado” com dois papéis que diziam que Copa do Mundo e Jogos Olímpicos seriam realizados por aqui.

O grande problema é que, com uma indústria esportiva minimamente existente, como era a nossa, a expectativa de quem estava nesse barco era de que os megaeventos impulsionariam o grau de profissionalização de quem trabalha no esporte. O maior problema, porém, é que ainda temos uma visão deturpada do que é ser um profissional.

No último domingo, a ESPN exibiu o documentário “Fab Five”, sobre o fantástico time universitário de Michigan do início dos anos 90. Em determinado momento do filme, um dos atletas afirma que, ao ver a Nike se “apropriando” da equipe, ele teve um estalo. “Eu era profissional sendo um universitário. Ou seja, eu vendia como um cara da NBA, mas não ganhava um centavo por isso”. Foram essas, mais ou menos, as palavras do ex-jogador.

Ser profissional, no mercado americano, é efetivamente ganhar dinheiro para viver do esporte. Para um atleta, isso representa não apenas ter um contrato de trabalho com alguma instituição, mas ter um contrato de patrocínio com uma marca de material esportivo, vender produtos licenciados com a marca dele, faturar com campanha publicitárias, etc. Isso é tão claro no modelo americano de gerenciar o esporte que o atleta universitário não pode receber qualquer tipo de incentivo monetário, apenas a bolsa de estudos. Só quando ele atinge as ligas esportivas, sejam elas as principais ou as secundárias, pode ganhar dinheiro.

É o bordão “Show me the Money” eternizado por Tom Cruise no personagem Jerry Maguire.

Já no Brasil…

Ontem mesmo o UOL publicou entrevista com Thiago Pereira, nosso nadador com o melhor desempenho na última edição dos Jogos Olímpicos. Nela, o atleta reclamava de ter de negociar para fechar contrato com um clube e, também, por estarmos a três anos das Olimpíadas do Rio e continuar baixo o investimento em esporte por aqui.

Como também já falei no blog, o grande dilema para os esportes olímpicos hoje é depender da estrutura de clubes, principalmente de clubes que têm no futebol sua principal atividade. Mais uma vez usando o exemplo americano, mesmo nas universidades, são raras as que têm equipes fortes em mais de uma ou duas modalidades. Isso faz com que exista espaço para investimentos em outros esportes.

Mas o grande problema passa pelo entendimento do que é ser um profissional do esporte no Brasil. Há 13 anos nesse mercado, uma das grandes coisas que se percebe é que as pessoas, geralmente, encaram ainda o trabalhar nessa área como uma “diversão”. Ainda vemos que um atleta tem de seguir os mesmos preceitos lúdicos de relação com a atividade esportiva que temos quando somos criança. Da mesma forma, em outras áreas, o sentimento é muito parecido. O interesse não é construir uma carreira para fazer a vida trabalhando com isso. Pelo contrário, muitas vezes há um sentimento de que é errado ganhar dinheiro trabalhando com esporte.

A atração de novos profissionais para dentro do universo do esporte depende, muito, da resposta correta à pergunta “o que é ser um profissional”. Enquanto o esporte for visto como um meio de diversão até para quem trabalha com ele, o processo de evolução será muito mais lento.