Negócios do Esporte

Qual Maracanã nós queremos?

Erich Beting

Um grupo decidiu protestar em frente à Odebrecht pedindo que a empresa desista da ''privatização'' do Maracanã. Privatização entre aspas, porque o contrato com o consórcio gestor do estádio é de concessão, o que não lhe assegura a posse definitiva do local. Prova disso é que o governo do Rio ainda tem o poder de decisão sobre o que será feito do complexo, como mostraram as recentes decisões tomadas por Sérgio Cabral sobre a não-demolição do Célio de Barros e do Júlio Delamare.

''Não vamos deixar a Odebrecht em paz enquanto ela não sair do Maracanã. O Maracanã tem que voltar a ser o estádio público que sempre foi''. A frase é de Gustavo Mehl, um dos líderes do movimento que ocupou a portaria do prédio da Odebrecht no Rio de Janeiro nesta quarta-feira.

Será que Gustavo Mehl frequentou o Maracanã ''público''? Será que ele se lembra da figura de ''Chiquinho da Suderj'', o administrador do estádio? Será que ele realmente está lá protestando por não concordar, como consumidor, de como o Maracanã está sendo gerenciado em menos de dois meses de trabalho desses gestores?

O protesto do Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas traz ainda a reivindicação de que ''O Maracanã é um espaço simbólico do Rio de Janeiro e do Brasil que deve se manter público e popular''.

Sim, o Maracanã é um símbolo tão icônico da Cidade Maravilhosa quanto o Cristo Redentor ou a Baía de Guanabara. E talvez isso seja o que mais assuste o consumidor. Afinal, até agora, o que mais discutimos é a ''elitização'' do futebol a partir do alto preço cobrado pelos gestores das arenas. Soma-se a isso o fim da ''Geral'' e forma-se o senso comum de que o futebol brasileiro será restrito às elites no que se refere ao consumo dele dentro de campo.

Mais uma vez, alardeia-se uma história sem tentar aprofundar-se no tema. A mudança de qualidade dos estádios não é o fator que desencadeará numa elitização do público presente neles. Prova disso está na situação atual do futebol no Brasil. Os estádios não lotaram como se esperava. Melhorou, logicamente, a ida de público aos jogos. O estádio é novo, eu quero ver como ficou. Não importa tanto o jogo que vou encontrar ao chegar lá, mas sim a expectativa que é projetada sobre o encontro com a novidade.

Só que isso é um fenômeno com prazo de validade. Assim que o torcedor deixar de vivenciar a ''novidade'', passará a questionar o produto. De que adianta termos estádios novos se o futebol jogado dentro deles não me atrairá? É por isso que, passada a euforia do relançamento dos estádios, já começamos a ver que a média de público começa a cair.

O consórcio gestor do Maracanã já percebeu isso, tanto que reduziu o preço dos ingressos para esta semana nas partidas de Fluminense e Botafogo pela Copa Perdigão do Brasil. Nesta semana, por R$ 20 será possível ir ao Maracanã para ver as oitavas-de-final da segunda competição mais importante do país.

Moral da história. Para ser popular, o estádio não precisa ser gerenciado pela esfera pública.

Considerando-se ainda a pavorosa situação financeira em que se encontram estados e municípios brasileiros, o primeiro reflexo que teria a gestão pública do Maracanã seria a falta de investimentos em conservação da área e em melhorias para o consumidor. Se o ente público não for capaz de assegurar a boa qualidade do local que administra, é melhor repassar para quem estiver interessado em fazer daquilo um negócio.

Até porque já está claro que, do jeito que o futebol brasileiro está dentro de campo, será impossível ganhar dinheiro aumentando o preço dos ingressos. Como disse aqui outro dia, é a lei de oferta e procura que rege o valor do bilhete. Como a procura ainda é pequena, será preciso baratear os valores para se ter lucro. E isso só um gestor com a obrigação de fazer o negócio ser rentável é capaz de fazer.

O Maracanã continua a ser um estádio público. Mas, felizmente, gerenciado por uma empresa privada, que vai investir nele e fazer com que o consumidor sempre saia de lá com vontade de voltar. Falar em elitização dos estádios é tapar os olhos para o que de fato representa, como produto, o futebol do Brasil na atualidade.