Negócios do Esporte

O preço do ingresso não é só o que vai lotar estádio

Erich Beting

Em meio à guerra pública no Rio de Janeiro sobre os valores cobrados para os ingressos durante o Estadual do Rio, o futebol brasileiro revela, mais uma vez, todo o seu despreparo com a gestão de seu produto. Com as decisões tomadas, unicamente, no ''sentimento'', perde-se tempo demais com coisas que levam o foco da discussão para lugares que não resolverão, de forma alguma, os problemas existentes.

O Estadual do Rio é um campeonato deficitário. Em 2014, dos 126 jogos disputados, 105 tiveram prejuízo. Isso mesmo! Em 83% das partidas do Estadual do Rio, os clubes pagaram para entrar em campo (detalhes aqui).

Ok, isso não é tanta novidade. Tanto que a Federação de Futebol do Rio (Ferj) decidiu, neste ano, criar um pacotão de boas ideias para fazer com que o torcedor voltasse aos estádios. E aí é que entramos no ciclo vicioso que tanto atrapalha o esporte.

Primeiro, a Ferj tabelou o preço do ingresso. O teto a ser cobrado pelos clubes é de R$ 50. Além disso, a federação instituiu a ''meia-entrada universal''. Ou seja, tucanou o termo ''desconto de 50%'', dizendo que qualquer pessoa pode comprar meia-entrada. Isso, na prática, acaba com o direito à meia-entrada, o que já pode gerar problemas jurídicos. Sem falar no quão estúpido é fazer cair pela metade o valor a ser cobrado pelo jogo, uma vez que isso gera no promotor do evento a certeza de que a previsão de receita dele tem de ser a metade do que ele tinha originalmente.

O problema atual dos Estaduais no Brasil é que o torcedor não quer consumir o evento. Prova disso são a audiência quase sempre sofrível da competição na TV e, ainda, o não-público nos estádios.

O Rio é o melhor exemplo disso. Ao limitar em R$ 50 o bilhete, o argumento de que isso faria lotar os estádios cai por terra ao se analisar os borderôs dos jogos de 2014 do Estadual. No ano passado, os jogos que geralmente tinham ingresso mais caro que isso eram aqueles em que o mandante era um time grande. Os clubes pequenos faziam, no máximo, ingressos a R$ 30, alguns a R$ 40. Quase sempre o preço era fixo, de R$ 20.

Resultado: em TODOS os jogos com os clubes de menor torcida como mandante, o resultado financeiro da partida foi negativo. Só teve uma partida que não deu prejuízo, Friburguense x Flamengo, exatamente há um ano. Foi o único dos 21 jogos lucrativos, também, que não foi disputado no Maracanã.

Se tivesse feito essa análise antes de planejar o ''pacotão'' para levar público aos estádios, a Federação do Rio perceberia que de nada adianta baixar o preço dos ingressos se o produto que é oferecido ao torcedor desperta baixíssimo interesse.

Talvez a Ferj tenha feito essa análise e percebeu isso. Mas, aí, para desviar o foco, criou um factóide para atingir os únicos que ainda conseguem um pouco de lucratividade no Estadual, que são Maracanã, Flamengo e Fluminense. A dupla Fla-Flu, aliás, foi a única que conseguiu ter lucro em 2014 quando jogou contra clubes de menor torcida.

Não é o preço do ingresso que vai levar o torcedor para os Estaduais. É a qualidade do evento.

Para um produto vender, ele precisa, antes de mais nada, despertar o interesse no comprador.