Negócios do Esporte

Filial da Inter no Brasil é um recado ao futebol do país

Erich Beting

A Internazionale vai abrir uma filial no Brasil (a notícia está aqui). Mas por que o clube italiano montaria uma estrutura para abrigar uma equipe de futebol por aqui se, até hoje, os times europeus descobriram um negócio muito mais simples, rentável e que gera um excelente retorno de marca para eles, que é a formação de escolinhas e acampamentos de férias?

Esse é o recado assustador que está embutido por trás do movimento feito pelos italianos.

Desde os anos 80, o Brasil era visto como um bom exportador de pé-de-obra para o mercado europeu. Sem conseguir ter o talento e capacidade de improviso dos brasileiros, os europeus buscavam aqui os jogadores que viriam a ser os maiores protagonistas do futebol mundial. Zico, Careca, Romário, Ronaldo, Rivaldo, Ronaldinho e Kaká foram alguns desses jogadores que abriram mercado para os brazucas nas maiores potências do esporte.

De uns anos para cá, porém, o jogador brasileiro protagonista começou a rarear. Diversos potenciais craques se mostraram apostas furadas no Velho Continente. Adriano foi o que mais se aproximou do estrelato, mas já num futebol italiano em início de decadência. Pato talvez tenha sido o melhor exemplo de como supervalorizaram um ótimo jogador. Vários outros foram e não valeram o investimento. Ou, então, nem chegaram à terceira base, estacionando nos países periféricos do Leste Europeu ou em Portugal.

Oscar e William talvez sejam hoje os dois nomes mais reluzentes, além, é claro, de Neymar.

O problema é que, enquanto o futebol na Europa atingiu o máximo de profissionalização nas duas últimas décadas, por aqui continuamos estacionados num período um pouco melhor do que a realidade dos anos 80 e 90. Nossos dirigentes pensam e agem quase que da mesma forma. E isso contamina toda a cadeia.

As categorias de base não funcionam para montar times competitivos e com um sistema de jogo integrado ao profissional. Os empresários atravessam ou são coagidos a atravessar negócios para que o jogador movimente o máximo de dinheiro possível no menor intervalo de tempo existente.

Os treinadores também são pressionados a trazerem resultados desde os campeonatos sub-feto, o que cria atletas que não pensam em como jogar, mas apenas em como ganhar.

Tudo isso gerou um abismo.

O atleta, na Europa, faz parte de um sistema absolutamente profissional de relação. Ele é a principal peça de uma engrenagem complexa e quase sempre compreende a importância desse seu papel. Que o digam Cristiano Ronaldo e Messi, os dois melhores exemplos de como o atleta precisa ser, antes de tudo, uma empresa.

Geralmente, os clubes da Europa sempre olharam o Brasil como um mercado para explorar a paixão e idolatria que temos pelo futebol europeu e, de quebra, ficar de olho em talentos da bola para levar para fora. Enquanto isso, na África, nos Estados Unidos, na Ásia e no Oriente Médio, os planos eram outros. Franquias, redes de formação de talentos e até filiais de clubes são montadas para explorar não apenas o consumidor, mas formar o atleta.

Ao decidir criar um time de futebol no Brasil, a Inter mostra que não está satisfeita com a formação que estamos dando a nossos jogadores. A partir do momento em que o clube percebe que há uma falha na formação de jogadores do país, ele decide não apenas trabalhar com ações de marketing, mas garimpar, desde jovem, o talento brasileiro.

A Internazionale montar uma filial no Brasil não é meramente mostra de confiança no poder de consumo do brasileiro pelo futebol do clube, mas um recado de que, hoje, é mais interessante vir aqui implementar a metodologia de formação de atletas do clube do que ensinar isso a um bom jogador brasileiro no futuro…