Negócios do Esporte

Arquivo : março 2016

Indústria do esporte só será sólida com entidades de classe
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Erich Beting

A notícia de que a Abrarenas chegou ao fim (veja aqui) é desalentadora para o mercado esportivo brasileiro.

Criada há poucos anos, o objetivo da entidade era reunir os gestores de estádios e discutir, sempre em conjunto, temas relacionados aos estádios no Brasil. Temas que iam desde a cobrança de ingressos, a proibição de venda de bebidas alcoólicas, a meia-entrada, o acesso a deficientes, etc.

Ao deixar de existir a associação dos estádios, o mercado esportivo brasileiro dá mais um passo para trás.

No Brasil, até agora, é praticamente impossível existirem entidades representativas de classes no esporte. São raríssimos os casos em que há grupos que defendam interesses de uma classe no país. Esse fato revela algo muito mais delicado para a indústria esportiva brasileira.

Não havendo entidades de classe para atuar, não há uma maior solidificação dessa indústria no mercado.

É só ver o futebol, esfacelado em questão organizacional desde que o Clube dos 13 acabou. Por pior que fosse o C13, ele representava um ponto em que os clubes se uniam e defendiam interesses em comum. Isso é importante para que algumas melhorias aconteçam. Na base do “cada um por si”, os interesses individuais sempre atrapalham o coletivo.

Ou, então, perceber o quão importante foi a criação do Bom Senso, representando os atletas e exigindo melhorias para a indústria do esporte como um todo.

No caso da Abrarenas, o fim da associação revela o sombrio cenário a respeito do futuro dos estádios no país. Ou os novos gestores das arenas passam a ser comprometidos com a melhoria da indústria, ou então teremos várias dificuldades para profissionalizá-la, já que perderemos o bonde da história ao não aproveitar para transformar o esporte num espetáculo de entretenimento.

Já passou da hora de os diferentes segmentos da indústria esportiva (atletas, dirigentes, arenas, executivos de marketing, etc.) perceberem que o crescimento desse mercado só será possível com a união de cada classe. Em bloco, os atletas negociam melhor com os dirigentes, que negociam melhor com as arenas, com a mídia, etc.

A cadeia produtiva do esporte no Brasil já tem hoje um tamanho suficiente para que as entidades representativas de classes sejam formadas. Mas é desalentador ver que fracassou a tentativa disso naquela classe que justamente concentra um dos maiores investimentos feitos no esporte nos últimos anos, que é a de arenas esportivas.

Para ter uma indústria esportiva sólida no país, é urgente que surjam as entidades defensoras de diferentes segmentos dessa indústria. Ou o esporte nunca será, de fato, suficientemente grande para gerar diversos empregos.


Seleção brasileira mostra como inovar é fundamental
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Erich Beting

Os últimos 20 minutos de Paraguai 2×2 Brasil foram eletrizantes. A entrada de Lucas Lima no meio-campo brasileiro, com Renato Augusto se transformando no único volante da equipe brasileira e o time passando a jogar com ousadia, deu uma outra esperança para o time que terminou o primeiro terço da caminhada à Copa do Mundo de 2018 numa preocupante sétima colocação e hoje afastado da lista de classificados ao Mundial.

Acuado após o segundo gol paraguaio, Dunga precisou partir, literalmente, para o ataque. Fez isso colocando uma formação de meio-campo nova, apenas com jogadores de origem ofensiva. O resultado? Pressão total da seleção no campo de ataque e dois gols marcados, com o desempate quase acontecendo no lance final da partida.

A situação vivida pela seleção brasileira é uma mostra clara de como a inovação é importante para o esporte.

Em meio ao caos e diante de sua maior adversidade no comando da seleção nesta segunda passagem pelo time, Dunga pode ter encontrado, na inovação, a chave para encontrar um novo modelo à seleção brasileira, muito mais próxima de nossa cultura ofensiva para enxergar o futebol, muito mais adequada ao futebol que é praticado nos grandes centros da atualidade.

Fazia muito, mas muito tempo que o Brasil não tinha controle total sobre um jogo como nos últimos 20 minutos do duelo com o Paraguai. E isso é revelador.

Uma das maiores características das marcas de sucesso é a capacidade de inovação que elas possuem. Historicamente, a seleção brasileira ficou marcada por isso. Na semana passada, reverenciamos Johan Cruyff em sua despedida da vida exatamente por ter sido um rompedor de paradigmas.

O futebol brasileiro está parado no tempo nos últimos 30 anos. Não nos dedicamos à inovação e, com isso, ficamos para trás da concorrência. Em meio ao caos, a seleção brasileira pode ter encontrado o seu caminho (escrevo o texto ainda sem ter visto a entrevista de Dunga após o jogo).

A Copa América poderá servir como laboratório para Dunga testar e repetir essa formação, concedendo à seleção um novo padrão tático que influenciará na forma de jogarmos futebol daqui para a frente, afinal é do topo da pirâmide que pegamos o exemplo para o restante da cadeia.

Muitas vezes nos perdemos pela incapacidade de inovar. Ou pelo receio de arriscar. No marketing esportivo praticado no Brasil, quase nunca a inovação aparece, quando na verdade ela deveria ser regra. Talvez os marqueteiros pudessem olhar os últimos 20 minutos do jogo do Brasil e se darem ao luxo de trocar a expressão “é melhor não” pela pergunta “por que não”…


TV virou refém do sistema que ela própria criou
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Erich Beting

Quando o Clube dos 13 foi implodido, há questão de cinco anos, um dos principais articuladores da mudança do sistema de pagamento aos clubes pelos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro foi Marcelo Campos Pinto, então diretor de esportes da Globo.

Hábil negociador, Campos Pinto sabia que, naquele momento, a implosão do sistema de negociação individual dos clubes era bom para ele e para a emissora que trabalhava.

A situação, naquela época, era a seguinte. O Clube dos 13, pela primeira vez na história, havia criado um modelo de venda de direitos muito similar ao que acontece na NFL, a liga que mais fatura em direitos de transmissão no mundo. Em vez de buscar as emissoras para transmitir com exclusividade a competição, a NFL entrega jogos exclusivos para todas elas.

A lógica de mercado é simples. Em vez de ganhar muito de uma fonte só, a liga espalha entre diversas empresas seus diferentes produtos, criando valores distintos para cada um deles. O modelo, que começou lá nos anos 70 a ser implementado pelos americanos, beneficiou-se de um mercado aquecido de direitos de mídia. Hoje, por ano, a NFL ganha quase US$ 8 bilhões. As emissoras disputam, com valores estratosféricos, direitos sobre uma conferência, sobre o jogo do domingo à tarde, da segunda-feira à noite, da quinta-feira, do sábado, etc.

O Clube dos 13 estava, há cinco anos, tentando ainda de forma embrionária buscar esse modelo. Como havia uma disputa mais acirrada na TV aberta (Record e Rede TV! sinalizavam interesse em participar da concorrência), a ideia era os clubes faturarem mais da TV, mesmo que no final das contas terminasse com uma única empresa ganhando a disputa.

O que aconteceu, porém, foi um embate gigantesco por poder político entre um grupo liderado por Kleber Leite e Andrés Sanchez, tendo como mentor e incentivador Ricardo Teixeira, e o outro pelos líderes do Clube dos 13, então personificados em Fábio Koff e Ataíde Gil Guerreiro.

Guerreiro era o maior articulador do novo modelo de negociação da TV. A ideia era de realizar concorrência a cada três anos, abrindo cada vez mais espaço para jogos exclusivos para quem se interessasse pelos direitos. Além disso, ele traria para os clubes a geração de imagem das partidas, conceito que é premissa básica em qualquer evento, mas que ainda está muito, mas muito distante, de ser implementado no Brasil, que ainda tem na Globo não só a detentora dos direitos de transmissão, mas também a responsável por gerar as imagens.

Em meio a essa ideia, veio a briga pelo poder. Sem vencer as eleições, o grupo Teixeira-Leite-Sanchez decidiu, então, implodir o contrato de televisão. Puxados pelo Corinthians, os clubes sondaram Campos Pinto para a negociação individual.

Para a Globo, o negócio, naquele momento, era vantajoso.

O contrato individual acabaria com o projeto de trazer mais para a mão do C13 o controle sobre a distribuição das imagens do Brasileirão e, logicamente, a divisão por diferentes emissoras da transmissão do campeonato.

Agora, cinco anos depois, o feitiço começa a virar contra o feiticeiro. O que teoricamente Campos Pinto deixou como legado para a emissora hoje é um Frankstein. Exatamente pelo fato de cada clube negociar individualmente seus contratos que houve brecha para que o Esporte Interativo iniciasse as conversas para comprar os direitos do Brasileirão na TV paga com alguns clubes.

Hoje, com a negociação na base do “cada um por si”, quem quer comprar tem um trabalho 20 vezes maior, pelo menos, para adquirir os direitos de transmissão. Em vez de sentar com um único interlocutor e conseguir um acordo pela principal competição do país, é preciso ir a cada clube e conversar individualmente com eles. Isso deixa o processo muito mais demorado e, mais do que isso, incerto.

É só ver a bagunça em que se transformou a negociação dos direitos do Brasileirão na TV paga para o período 2019-2024. Se o formato de disputa não se alterar, o torneio terá 20 clubes, mas Globosat e Esporte Interativo já fecharam acordo com pelo menos 30 agremiações.

No final das contas, a TV virou refém do próprio sistema que ela ajudou a criar. E, ao que tudo indica, pelo menos até 2024 não há previsão de que os clubes se organizem para voltar à negociação coletiva dos direitos.


Futebol começa a acordar para as redes sociais
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Erich Beting

Um anúncio divulgado praticamente aos 45 do segundo tempo pela Primeira Liga e pelo Twitter, na noite de terça-feira, revelava uma parceria entre as duas empresas para a promoção do campeonato organizado pelos clubes. No dia anterior às semifinais, o Twitter se transformou no primeiro parceiro de mídia oficial de uma competição esportiva no Brasil (detalhes aqui).

O negócio mostra que, aos poucos, o futebol começa a acordar para as redes sociais.

Ter um perfil dos clubes nos principais canais sociais é perceber parte da necessidade de usar esses canais para promoção. Mas levar para um novo patamar, que é a promoção do evento que as redes sociais pode gerar, é parte importante da evolução do esporte e, mais do que isso, sua conexão com o torcedor jovem, necessidade de toda empresa que quer garantir a vida futura.

Nos Estados Unidos, mercado muito mais maduro, a NFL fez acordo com a Amazon para promover filmes de bastidores de equipes no aplicativo concorrente da Netflix (veja aqui). É uma evolução desse negócio. Não é mais só o jogo ao vivo que pode ser um produto que renda valor para o esporte.

Com o desenvolvimento da tecnologia para captação de imagens, o esporte precisa se colocar como produtor de conteúdo. A tendência, já quase uma realidade, é que os departamentos de comunicação se transformem em grandes redações de jornalismo, produzindo tudo sobre o cotidiano daquele clube, atleta ou competição.

Mais do que apenas questão de aproximação do público jovem, as redes sociais abrem uma nova oportunidade para a geração de receita no esporte. Com conteúdo exclusivo e de qualidade, será praticamente impossível para a mídia tradicional concorrer com isso. E, na parte final da ponta, o jogo ao vivo terá cada vez mais valor para os veículos.

O jogo de forças entre mídia e esporte tende a ter um claro vencedor mais para a frente.


O discurso da Copa sobreviverá à Lava Jato?
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Erich Beting

Começou a ruir hoje o discurso de legado gerado pela Copa do Mundo para o futebol. A inclusão da Arena Corinthians nas investigações da Lava Jato é o começo da abertura da caixa preta das construções de estádios no Brasil, a toque de caixa, nos últimos cinco anos.

Ainda haverá muito a ser investigado e, a partir daí, poderemos tirar qualquer conclusão mais detalhada do que ficará após a terra arrasada, se é que de fato ela ficará arrasada, ou só será revirada.

Com a falência das empreiteiras (se não financeira, sem dúvida moral), os estádios que estão hoje nas mãos dessas empresas vão passar para seus antigos donos.

Se eles não quiserem assumir a bronca (e a conta), o que vai acontecer?

Em Cuiabá, onde nenhuma empresa privada quis assumir o risco de gerenciar o estádio, o legado veio menos de dois anos após a Copa. Entregue à gestão pública, a Arena Pantanal definhou em tempo recorde.

As arenas da OAS estão começando a sair das mãos da empresa. Os estádios da Odebrecht, idem. E quem vai cuidar desses aparatos? Comprovadamente, colocar o estádio nas mãos da esfera pública não é certeza de sucesso, pelo contrário.

O tal legado prometido com a Copa do Mundo poderia ter vindo, se não das obras de mobilidade urbana, da melhora do aparato para a prática esportiva. Ao que tudo indica, com a Lava Jato chegando aos estádios construídos para o Mundial, há uma grande chance de mudar de vez os donos dos estádios.

E, ao que tudo indica, isso não significará necessariamente a melhora na gestão dos aparatos.


A corrida sob ponto de vista da diversão
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Erich Beting

Corrida de rua, no Brasil, é tratada quase sempre como assunto sério. Raras são as provas pelo país que conseguem atrair o corredor não pela performance, mas pela diversão. E talvez esse seja o motivo para, apesar de registrar crescimento exponencial, o mercado de corrida de rua ainda não atingir patamares tão grandes quanto nos EUA.

Na última sexta-feira corri  pela primeira vez a Maratona de Jerusalém. Ou melhor. O evento chama-se Maratona de Jerusalém, mas eu corri os 21km, algo que já estava além das minhas pretensões. Foi a segunda vez que fiz uma meia maratona. Na primeira, no Rio de Janeiro, estava preparado e focado e com um objetivo claro dentro da corrida, com cada quilômetro planejado e previamente estudado por horas na véspera da prova.

Nessa daqui, fui do jeito que dava. Sem o preparo adequado, pensando mais em terminar nem que fosse caminhando, sem conhecer o trajeto, sem me preocupar com tempo, querendo fazer uma imersão na prova a partir da observação do redor do que focado no meu objetivo.

Espécie de muleta para compensar a forma física longe do ideal, a estratégia no fim ajudou a me revelar um outro meio de encarar a corrida de rua que, no Brasil, está muito longe de ser aplicado.

As nossas provas são, quase todas, pensadas para o atleta. Elas têm um planejamento voltado para tomada de tempo, trajeto, posto de hidratação, etc. E, aí, esquecemos de colocar na prova alguns itens que parecem gracejos, mas que ajudam sensivelmente a envolver o atleta e fazê-lo ter uma outra relação com a corrida.

Durante o percurso da meia maratona em Jerusalém havia gente fantasiada na “torcida” por você, artistas fazendo performance com pernas de pau e música, muita música. Lembro de ter contado pelo menos seis bandas ao longo do percurso, tocando músicas das mais distintas, mas que ajudavam a aliviar um pouco a dureza do percurso cheio de subidas e descidas, da distância que em algumas horas parece não ter fim.

Ao colocar a diversão dentro da corrida, a prova te envolve de outra forma. Fica mais legal correr, você não se sente na obrigação de correr o melhor tempo da sua vida, o lado esporte como lazer ganha o espaço do esporte como competição. Isso, na ponta final do negócio, faz com que o público local se envolva muito mais com a corrida.

Maratona_Jerusalem

 

Foram incontáveis os pedestres que nos deram algum incentivo em palavras ao longo da prova, assim como as mãos estendidas ao longo da calçada pelas crianças que estavam felizes de poder incentivar os “atletas” que passavam perto de suas casas.

No Brasil, uma das poucas provas que, sem querer, consegue ter esse lado mais de diversão é a São Silvestre. Não por planejamento da organização, mas por ser uma corrida aguardada por todos.

Em seu sexto ano, a Maratona de Jerusalém colocou 15.330 pessoas para correr as distâncias de 42km, 21km, 10km, e 5km. No Brasil, apenas três provas conseguem reunir mais atletas do que essa (São Silvestre, Maratona de São Paulo e Maratona de Revezamento do Pão de Açúcar), todas elas com pelo menos 15 anos de história, numa cidade com população 14 vezes maior que a de Jerusalém.

Se começarmos a pensar na corrida muito mais como diversão do que como performance, teremos um novo salto no mercado brasileiro de corrida.

* O blogueiro viajou a Israel a convite do Ministério do Turismo


Tática do Esporte Interativo transforma futebol em incógnita
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Erich Beting

A estratégia do Esporte Interativo de, comendo pelas beiradas, ter um grande número de clubes sob contrato a partir de 2019 para a transmissão do Campeonato Brasileiro na TV paga pode gerar um tremendo enrosco na transmissão do futebol a partir daquele ano.

Sem conseguir fechar com clubes de maior expressão, o canal do Grupo Turner partiu para um interessante contragolpe. Foi atrás de equipes que estão na Série B, mas que nos últimos tempos tem flertado com a Série A, seja em umas duas a três temporadas, seja próximo da tabela de classificação.

O raciocínio do canal é bom. Paga-se uma luva a esses times, que assim têm condições de se reforçarem mais e, dessa forma, há um aumento de probabilidade de eles chegarem à Série A daqui a no máximo três anos, quando começa a valer o acordo que já conta com Santos, Atlético-PR, Coritiba, Bahia e Inter.

Esse é o cenário melhor possível para o canal, mas que pode ser péssimo para o futebol como produto.

Explica-se.

É ótimo ter a entrada de um novo e importante player no mercado. É só ver como foi benéfico para o mercado de TV paga a entrada da Fox há quatro anos. Os eventos foram sendo cada vez mais valorizados dentro das emissoras e, na ponta final, o esporte ganhou mais dinheiro.

Mas, num primeiro momento, a divisão de clubes entre Globosat e Esporte Interativo pode levar a um impasse que inviabilizaria a exibição dos clubes na televisão, o que por sua vez traria um efeito cascata de diminuição da presença do Campeonato Brasileiro na mídia, num momento em que a TV paga deverá ter desempenho de audiência cada vez maior, dada a fragmentação do consumo da mídia cada vez maior.

Uma eventual divisão de metade dos times para um lado e metade para o outro pode provocar uma situação em que a transmissão dos eventos seja colocada num segundo plano. E, aí, é o torcedor quem mais se prejudica. Não, o argumento de que há a TV aberta e o pay-per-view para compensarem isso não vale. Na aberta, é só um jogo por rodada que é transmitido. No PPV, reduz-se ainda mais o alcance dos clubes por conta do alto valor desembolsado pelo pacote.

Se não conseguirmos caminhar para o cenário ideal, que é de união entre os clubes para comercializar pacotes de transmissão, teremos de esperar por um ajuste entre as emissoras que transmitiriam o futebol lá na frente. Em vez do conceito de campeonato exclusivo para transmitir, teríamos jogos exclusivos, como acontece com as ligas americanas e em alguns campeonatos de futebol na Europa.

De qualquer forma, pelo movimento feito agora pelo Esporte Interativo, prever o que acontecerá com os direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro na TV paga a partir de 2019 é uma incógnita. E isso é péssimo para o futebol.


Crefisa está para o Palmeiras o que foi o BB para o vôlei
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Erich Beting

A notícia de hoje no Blog do Ohata é assustadora (leia aqui). Em troca do valor histórico pago pelo patrocínio ao clube, a Crefisa passou a ter superpoderes sobre o Palmeiras, a ponto até de determinar o uniforme a ser utilizado pelo clube.

É exatamente esse o status que teve o Banco do Brasil, tempos atrás, sobre o vôlei brasileiro. O banco era quem escolhia as cores da camisa do time, o que fez um projeto de o Brasil jogar com uma camisa toda preta ser engavetado por ordem do patrocinador, mesmo que isso representasse melhores vendas e, consequentemente, mais dinheiro para o esporte.

O Palmeiras conseguiu ampliar significativamente o que ganha com patrocínio. Mas qual o preço disso?

Essa é a resposta que o clube poderá ter de responder, amargamente, mais para a frente. No vôlei, o reflexo de uma tomada gigantesca de poder do BB resultou no afastamento de diversos outros patrocinadores do esporte e, no fim, o estrangulamento do negócio, que se tornou muito caro pelo retorno dado. Aos poucos, a CBV tem retomado o processo de crescimento como plataforma de negócios para parceiros comerciais, mas a sustentabilidade econômica do esporte ainda balança por conta da decisão tomada lá atrás de pegar muito dinheiro de apenas uma fonte.

No Palmeiras, o torcedor mais exaltado com certeza já me amaldiçoa e prega isso, a Crefisa pode porque paga. Ok, torcedor, então apliquemos essa mesma lógica para a emissora de TV que você tanto gosta de amaldiçoar por fazer com que seu time jogue às 22h no meio de semana. Se ela é quem paga a conta, o direito é dela, o clube que obedeça.

Hoje o Palmeiras se apoia na tábua de salvação da Crefisa, mas o que vai acontecer em 2017, quando o patrocínio acabar? Será que o clube conseguirá nova renegociação? Será que o patrocinador estará preparado para entender o limite que existe para a ingerência dele sobre o patrocinado ou vai querer exigir mais e mais simplesmente porque é quem paga a maior nota fiscal ao final do mês?

O futebol brasileiro tem tido dificuldade para entender que muito mais interessante do que ter um único grande patrocinador é importantíssimo diversificar ao máximo as fontes de receita. Ao ceder tudo para uma empresa que só se alia ao clube pelo fanatismo do dono por ele, o Palmeiras cai num erro primário. Olha o curto prazo, sem se preocupar com a sustentabilidade do negócio.

O exemplo do Banco do Brasil no vôlei deveria servir de alerta para o Palmeiras com a Crefisa, já que o da Unimed com o Fluminense não foi suficiente para o clube ter se preparado melhor para encontrar diferentes parceiros e não depender de um único mecenas.


As marcas no doping de Sharapova
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Erich Beting

O texto era para ter sido escrito na segunda, não deu. Na terça já tinha novidade. E hoje, talvez com a poeira um pouco mais baixa, seja mais interessante tentar fazer uma avaliação do turbilhão de informações que tem sido o anúncio do doping de Maria Sharapova.

Vamos por partes.

A primeira, e mais importante, é tentar entender o impacto dessa informação. Sharapova é o grande nome do tênis feminino há quase 15 anos.

Os mais velhos devem se lembrar de Anna Kournikova. Foi a primeira grande musa global do tênis e talvez a atleta que até aquela ocasião mais faturou com publicidade. No final dos anos 90 e começo dos 2000, ela era o rosto do tênis feminino. Bonita, atraía a atenção dos fãs, da mídia e, por consequência, das marcas. Só faltava uma coisa para ela. Performance. Todos os dólares que caíam na conta de Anna pelo patrocínio teimavam em não cair por premiação de títulos. Ela simplesmente não ganhava nada.

Aí vem 2004. Tão bela quanto Anna. Tão midiática quanto Anna. Mas vitoriosa. Sharapova é campeã em Wimbledon e se torna, naturalmente, a versão aperfeiçoada de Kournikova. E, na última década, só deu ela. Não sempre pela performance, mas como uma das melhores dentro de quadra e, sem qualquer concorrência, a melhor fora delas.

Por isso, o doping de Sharapova é uma notícia que traz um grande impacto no mundo do tênis. Ela era o grande rosto do esporte na última década. Ajudou a promover a globalização do esporte, foi figura fundamental para popularizar as competições femininas, que sempre ficaram à margem das masculinas. Ela é capaz até de lançar uma linha de doces com seu nome, levando a imagem do tênis a todo tipo de público.

Aí vem a segunda parte.

O tratamento dado pela ITF na comunicação do doping foi muito mais cauteloso do que em outras situações. Afinal, Sharapova foi quem anunciou primeiro o caso, algo que é raríssimo de acontecer. Só depois a federação entrou na jogada, e mesmo assim ainda sem condenar de forma mais dura uma das maiores do esporte. A suspensão ainda será analisada pela entidade, que parece querer entender o que está acontecendo também.

E aí entramos no terceiro capítulo dessa história. Qual a reação dos patrocinadores?

Por contrato, a maioria deles tem o direito de romper o acordo. Foi o que Tag Heuer e Porsche fizeram. Num mundo em que os exemplos de pureza e jogo limpo são cada vez mais importantes, é natural que as marcas tirem o time de campo quando um patrocinado não representa mais esses valores. Já a Nike suspendeu o contrato. Não quer perder o poderoso ativo que tem em mãos, mas também não pode compactuar com uma trapaça.

E aí é onde se vê um batalhão de comentários divergentes sobre o tema.

Por que as marcas abandonam os patrocinados no seu momento de dificuldade? Isso é jogar limpo com eles? Ou é ser meramente oportunista? É bom para o marketing da empresa fazer isso?

Os casos de doping no esporte serão sempre controversos. Na letra fria de um contrato, a marca tem direito a romper qualquer vínculo com quem é flagrado num exame. Mas não pode existir uma regra única que dite o comportamento a ser tomado pela empresa nessas horas.

Sharapova pode apenas ter errado, como foi a sua argumentação no minucioso pronunciamento que deu ao anunciar o doping. Ela não negou o fato, mas deu uma versão completamente aceitável do que aconteceu. Logicamente que devemos questionar se a principal atleta do tênis na atualidade, carregando US$ 23 milhões em publicidade ao ano, seria amadora o suficiente para não ler a lista de substâncias proibidas divulgada em janeiro.

Para manter-se no mesmo esporte, quem leu a biografia de Guga deve ter se divertido no episódio em que ele conta que, de tão distraído, perdeu a carteira com dinheiro e documentos antes de uma temporada na Austrália e quase não tinha como jogar o torneio.

O atleta é, antes de tudo, um ser humano. E está sujeito a erros que nos parecem primários, mas que fazem parte. Ainda mais dentro de uma rotina de extrema concentração na bolinha como é o tênis.

Partindo desse princípio, um patrocinador pode ter se precipitado ao já condenar Sharapova assim que o doping foi revelado. Romper o contrato com ela por um erro cometido que resultou no doping tem a mesma lógica perversa de só patrocinar quem é campeão. É não aceitar o erro. É praticamente ser um amigo só para os bons momentos.

Mas (e sempre tem um) e se Sharapova for realmente culpada? Se essa história de que foi um erro não se provar verdadeira? Aí ela terá duplamente errado. E a saída inicial das marcas mostra que elas souberam tomar o rumo. Mas esse mas ainda é suposição, o caso ainda precisa se desenrolar.

Pela importância que Sharapova tem para o esporte, não é possível condená-la imediatamente. É preciso tomar muito cuidado para entender o que aconteceu e, então, julgar o que for necessário.

Um caso de doping deixa várias marcas. E as marcas precisam saber lidar com isso. Assim como fez a ITF, que suspendeu temporariamente Sharapova para ir mais a fundo na investigação do caso e, então, publicar um veredicto, as marcas poderiam tomar uma atitude semelhante. Seria mais prudente, mais humano e, principalmente, mostraria que a relação de patrocínio não é algo meramente comercial.


O maior passo que o Flamengo pode começar a dar
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Erich Beting

O Flamengo anunciou ontem, em meio aos festejos pelos 63 anos do ídolo Zico, uma grande campanha para que o torcedor rubro-negro faça um cadastramento de suas informações no clube. Com o nome de Censo Rubro Negro, o projeto pretende mapear os hábitos de consumo de seu torcedor, como explicou o gerente de marketing Bruno Spindel (leia detalhes aqui).

De todas as boas reformas que têm sido promovidas pelo clube na gestão, essa talvez seja a mais significativa para o departamento de marketing do clube.

Saber quem é o seu cliente é o princípio básico de qualquer negócio. Vem desde o Egito Antigo, quando os donos dos bens sabiam quais eram os interesses daquelas dezenas de pessoas que iniciavam um embrião do mercantilismo.

Hoje, o grande segredo das corporações bilionárias é saber os hábitos dos consumidores. Por que Google e Facebook estão acabando com o modelo de publicidade que existia? Porque eles sabem o que as pessoas consomem, e vendem isso para os anunciantes.

No futebol brasileiro, sempre demos mais bola para as pesquisas que indicavam tamanho de torcida, nunca nos preocupando com o que realmente interessa. Como esses torcedores se relacionam com meu time?

O passo que o Flamengo começa a dar agora é fundamental para isso. Nos últimos cinco anos, conversando com torcedores e clubes, foram raríssimos os casos de clubes que relataram usar a base de dados das pessoas cadastradas nos programas de sócio-torcedor para fazer alguma ação mais próxima do torcedor. E foram muitos os torcedores que sempre afirmaram ter recebido, no máximo, e-mail marketing anunciando apenas a abertura da venda de ingresso para as partidas.

O futebol tem um benefício gigantesco em relação a qualquer outro produto para obter informações dos torcedores. Eles querem passar para o clube esses dados. Se souber mapear e manter ativo esse cadastro, o Flamengo dá um gigantesco passo para tornar muito mais fácil a venda de patrocínio, o aumento da venda de produtos licenciados e, obviamente, a presença de público nos estádios.

Não adianta nada ser a maior torcida do país se você não souber quem é ela. O Flamengo dá um passo gigantesco para começar a acabar com essa defasagem centenária dos clubes de futebol no Brasil.