Negócios do Esporte

Revezamento da Tocha dá temperatura sobre os Jogos

Erich Beting

Há oito meses que, semanalmente, vou ao Rio de Janeiro. O trajeto entre o aeroporto e a Barra da Tijuca serve para, a cada semana, ficar com aquela pulga atrás da orelha se vamos conseguir realizar os Jogos Olímpicos. De dois meses para cá aumenta um pouco mais a certeza de que faremos, bem ao nosso estilo, o evento acontecer. Haverá falhas, não seremos quase impecáveis como foi Londres em 2012, mas conseguiremos.

A dúvida que ficava, porém, era em relação a nossa reação com o evento. Mais do que entregar a estrutura, nós seremos capazes de entrar ''no clima'' dos Jogos?

A festa em Londres foi espetacular, mas de certa forma demorou a acontecer. Cheguei por lá no dia da cerimônia de abertura. A sempre ácida mídia britânica batia bastante na falha da organização pela ausência de torcedores em vários eventos. A torcida, de fato, parecia não se empolgar. Depois, a crítica passou a ser a falta de desempenho do time britânico. Após o primeiro ouro, com quatro dias de Jogos, a festa começou para valer, as arenas lotaram e o evento foi um sucesso, transbordando em cada esquina da cidade.

Ontem, essa dúvida em relação ao Rio começou a ser sanada. Fui condutor da chama olímpica na cidade de Ribeirão Preto, interior de São Paulo. E o evento que acontece para o revezamento da tocha é, em tese, o resumo de como serão os Jogos Olímpicos daqui a 17 dias.

O comboio da tocha vai abrindo espaço pelas ruas da cidade. Você, nessa hora, é colocado num ponto de encontro no meio da rua. O comércio está aberto, nada é modificado pela passagem da tocha, a não ser o trânsito. Há algumas pessoas ao seu redor, que estão ali esperando para ver o que vai acontecer. De repente, chegam os caminhões dos patrocinadores, tocando música, distribuindo brindes, chamando o povo a participar. E, quando chega a sua hora de conduzir a tocha, você entende o que a chama olímpica representa no imaginário das pessoas.

Ao acender o fogo, o público começa a vibrar. As pessoas vão correndo ao seu lado, passam a aplaudir, sacar os telefones celulares e tirar foto. A chama, com o perdão do trocadilho, ilumina a cabeça do público, que sente uma indescritível alegria de poder compartilhar aquele momento e fazer parte dele. Assim, transformam o que antes era uma rua parada numa grande celebração.

Depois que a caravana passa, as pessoas vão se recolhendo nas ruas, vão voltando para a sua rotina, provavelmente usando as redes sociais para repassarem a seus conhecidos as imagens que conseguiram registrar daquele momento.

O Rio de Janeiro, hoje, vive mais ou menos a mesma sensação que tive quando estava naqueles cinco minutos esperando outro condutor chegar com a chama olímpica para repassá-la a mim. O evento está chegando. Quando ele começar, as pessoas vão irradiar alegria de fazer parte daquilo.

O que, sem dúvida, está longe do ideal, é o que aconteceu antes dos Jogos e o que ficará depois deles. Mas o problema, nesse caso, não são as Olimpíadas. É o jeito brasileiro de levar a vida que precisa mudar. Os Jogos podem nos ajudar a cobrar isso no nosso cotidiano. Seria um inesperado (e indigesto para muitos) legado olímpico…