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Under Armour leva a outro patamar ideia de marca esportiva
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Erich Beting

Em setembro de 2010, quando a Nike lançou a plataforma Nike+, o mercado de material esportivo assistiu a uma nova transformação. Ao criar um sistema integrado de monitoramento das atividades físicas, a fabricante americana mostrou para os concorrentes que a revolução tecnológica iniciada em 2001, com o desenvolvimento do iPod, começava a invadir a indústria do esporte.

Breve linha cronológica para entender o que aconteceu.

Em 2001, a Apple lançou o iPod, o tocador de música que armazenava zilhões de arquivos num único lugar. Foi o início da transformação da indústria fonográfica, sempre baseada na venda de CDs e cobrança cara para a reprodução de uma música. Em 2007, a mesma Apple deu um passo além nessa revolução. Criou o iPhone, colocando as funções de computador num espaço que antes era usado apenas para fazer ligações telefônicas. Passamos, então, a ter tudo reunido ao alcance das mãos.

Três anos depois, em 2010, a Nike levou essa mudança de hábito de consumo da tecnologia entre as pessoas para a prática de atividade física. Paralelamente à revolução provocada pela Apple, YouTube, Twitter e Facebook davam mostras de que o não havia mais volta para o caminho de integração das pessoas por redes virtuais de compartilhamento de informações.

A empresa americana foi visionária nesse sentido. Quando criou o Nike+, a fabricante unia três pontas. A primeira, vinda dela mesma, de incentivar a prática de atividade física para o atleta amador: “Se você tem um corpo, você é um atleta”, é um dos mantras da Nike. A segunda parte foi juntar isso ao fato de que as pessoas queriam tornar a vida privada em pública, a partir da divulgação, para uma rede de amigos, de seus hábitos cotidianos. E a terceira, a grande constatação, foi perceber que a tecnologia começava a ficar ao alcance das mãos.

Já que tudo estava ao alcance das mãos, por que então não unir também os resultados da performance esportiva e permitir que você mostre isso a seus amigos? O Nike+, em resumo, é isso. Uma ferramenta que monitora a sua atividade física, torna-a disponível num site e permite o compartilhamento dos dados em suas redes virtuais de relacionamento.

Essa largada dada pela Nike foi acompanhada, apenas, pela Adidas. Pouco depois, a fabricante alemã colocou em pé o projeto “MiCoach”. O princípio era o mesmo. E, mais interessante, já havia sido testado pela própria marca nos anos 80, quando foi colocado um microprocessador num tênis para medir as passadas dos atletas.

Atualmente em terceiro lugar entre as marcas esportivas, a Under Armour tem se consagrado no mercado americano por apostar alto em inovação. Criada em 1996, a empresa agora começa a querer incomodar as duas gigantes do setor. Em fevereiro, num movimento ousado, a empresa anunciou a criação da plataforma Under Armour Connected Fitness. A ideia é criar um grande centro virtual de “atletas”. Em vez de desenvolver aplicativos próprios, como fizeram as concorrentes, a estratégia foi outra. E muito, mas muito mais interessante.

A Under Armour comprou, em fevereiro, dois aplicativos. O Endomondo, que faz o monitoramento de prática de atividades físicas, e o MyFitnessPal, que é um contador de calorias. A compra do primeiro foi, a grosso modo, para dar sequência ao que Nike e Adidas fazem com suas plataformas próprias. Já que as pessoas praticam atividade física, que possam então monitorar aquilo que fazem. A diferença é que, para o aplicativo funcionar, a pessoa não precisa vestir nenhum produto da Under Armour.

A tacada de mestre, porém, foi a compra do aplicativo que serve para as pessoas medirem a ingestão de alimentos. Com 80 milhões de usuários, o MyFitnessPal não é voltado para quem pratica esporte, mas para quem se preocupa com a saúde e alimentação. E isso atende, exatamente, o movimento que deverá acontecer nos próximos cinco anos dentro do mercado.

A terceira onda de evolução da tecnologia ao alcance das pessoas é a saúde. Os aparelhos eletrônicos começam, agora, a mensurar nossa saúde. Não é mais só um relógio que vestiremos, mas uma espécie de central de informações detalhadas sobre níveis de colesterol, ingestão de proteínas, carboidratos, etc. Num mundo cada vez mais obeso e mal alimentado, é preciso saber como estamos. É esse o salto que a indústria de tecnologia calcula que haverá na próxima década. Apple, Samsung, IBM, Microsoft, Sony.

As gigantes do setor têm desenvolvido plataformas que possam aliar tecnologia a saúde. É a preocupação com o bem-estar, mais do que com a prática de atividade física.

Ao comprar o MyFitnessPal, a Under Armour passou a saber o hábito de alimentação de 80 milhões de pessoas ao redor do mundo. E crescendo! Pessoas que compartilham suas informações voluntariamente, preocupadas com o que será da saúde delas no futuro. Elas não sabotam o aplicativo. Pelo contrário, tornam-se aliadas dele.

E o que isso impacta para uma marca esportiva? A Under Armour deixou de ser uma marca esportiva. Ela procura ser uma marca de bem-estar.

“Se você tem um corpo, você tem de cuidar dele”. É o mantra da Nike elevado ao patamar de preservação da espécie. E, convenhamos, há muito mais consumidores preocupados em bem-estar do que em praticar uma atividade física…


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