O problema é bem maior que uma “cervejinha”
Erich Beting
Antes de começar a leitura do post, é preciso prestar um esclarecimento. Não gosto de cerveja, não tomo e nunca tomei cerveja. Mas sou radicalmente contra à ideia de que é preciso proibir o consumo de bebida alcoólica (principalmente a mais barata delas, que é a cerveja) dentro de um estádio de futebol.
A Lei Geral da Copa poderia acabar com a ridícula proibição do consumo de álcool nos estádios de futebol. O veto às bebidas veio sendo imposto ao longo dos últimos anos, numa estapafúrdia desculpa dos gestores do futebol para a sua incompetência em gerenciar o público que vai às partidas.
O problema da violência dos torcedores não é o consumo de álcool, como ficou tragicamente provado no último Corinthians x Palmeiras. Uma briga pela manhã, muitas horas antes do jogo, e a alguns quilômetros do estádio. Não é o álcool que causa a briga entre as torcidas. Muitas vezes ela já está premeditada, marcada, prevista, jurada.
A proibição ao consumo de álcool só reforça a nossa incompetência em tratar o torcedor como um cliente. Se realmente fosse ele o causador da discórdia, seria melhor interditar também a transmissão de partidas em bares e restaurantes, ou em qualquer lugar em que houvesse a combinação cerveja-torcedores de times adversários.
O fato é que, para variar, desvirtuamos o foco da discussão. Jogamos o problema na cerveja, quando o buraco é mais embaixo. Por que as torcidas organizadas têm acesso facilitado aos jogos? Por que é o batalhão de choque da PM quem faz a segurança nos estádios? Por que simplesmente não se tira a liberdade de quem briga, em vez de esperarmos uns tirarem a vida dos outros?
Há tempos que a violência já não está nos estádios. Dentro dele, ocorrem as mesmas discussões e tumultos de uma mesa de bar, um churrasco entre amigos ou de uma família dividida em duas torcidas.
O problema é que continuamos a colocar o torcedor não no papel de cliente, mas sim de escravo. Na lógica deturpada do futebol, a pessoa que vai ao jogo não está fazendo nada além de sua obrigação. Ela tem de estar ali, faz parte da vida dela ir às partidas de seu time do coração. Sendo assim, não há motivo para ela querer ser bem tratada, querer sentar no lugar que comprou o ingresso, ficar longe do alcance da chuva ou do sol, ter seu dinheiro valorizado com um belo serviço. Tomar a bebida que lhe convier, então, é querer demais!
E, desse jeito tacanho, vamos culpando a cerveja pela total falta de gerenciamento do futebol como negócio. Outros esportes, até por necessidade, sabem da importância do consumidor.
Não é de se espantar que, no domingo de Páscoa, às 10h da manhã, 11.400 pessoas pagaram para ir ao Maracanãzinho ver RJX x Vôlei Futuro pela segunda partida da semifinal da Superliga Masculina de vôlei. Na noite anterior, no Engenhão, 10.461 torcedores foram assistir a Vasco x Flamengo pelo Estadual de futebol do Rio.
O problema é bem maior do que a ''cervejinha''. O pior é que a Lei Geral da Copa poderia ser o ponto de partida para mudarmos isso, mas pelo visto até mesmo a segurança privada que será treinada para trabalhar em estádios de futebol durante o Mundial será colocada de escanteio depois que o evento acabar…