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O dilema da Heineken: A boa história x a história 100% verdadeira
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Erich Beting

“A Heineken sendo Heineken também no Brasil. E dando uma paulada na cornetada que levou em 2014”. Assim resumi, nos 140 caracteres que tinha à disposição no Twitter, minha primeira impressão sobre o filme “The Cliché”, lançado na tarde de domingo pela Heineken.

Num fenômeno viral impressionante, a peça se espalhou pela internet na velocidade de Cristiano Ronaldo partindo para um contragolpe avassalador do Real Madrid campeão da Liga dos Campeões da Uefa retratada por aquela filmagem.

O vídeo é muito bom. É mais um golaço da Heineken na relação homem x mulher x Liga dos Campeões. E uma resposta a uma provocação feita em 2014, pouco antes da abertura da Copa do Mundo, quando a marca fez uma ação espetacular de promoção de sapatos com a extinta loja Shoe Stock. As mulheres tinham desconto para comprar sapato, enquanto os homens assistiam ao jogo. No dia seguinte, a Ambev, patrocinadora da Copa, cutucou a concorrente. Perguntou se as mulheres iriam “descer do salto e ir para o bar” acompanhar o Mundial.

Com o “The Cliché”, a Heineken deu seu troco. Mostrou que a mulher pode, sim, gostar de futebol. E fez isso de forma bem-humorada, inteligente, sofisticada. Como costumam ser as campanhas da marca ligadas à Liga dos Campeões pelo mundo. Teve o “The Dilemma”, no ano passado, envolvendo a Liga na Itália. Em 2013, o “The Negotiation” já havia sido espetacular para mostrar essa relação entre homem, mulher, cerveja e “The Champioooons” na Inglaterra.

Pouco depois de ver o vídeo, minha mulher lançou a pergunta: “será que é verdade?”. Dezessete anos de relacionamento já me ensinaram a saber que, se ela desconfia de algo, é porque está com a razão. Coincidentemente, minutos depois, mais um desses compartilhamentos de amigos no Facebook indicavam dois dos seis participantes do filme. Cliquei no nome de um deles e… bingo! O cara era ator!

O que se passou, a partir de então, foi uma caça aos bastidores da ação da Heineken. Muitas ligações, vasculhada pelos perfis em redes sociais, ligações recebidas de gente que quase entrou na ação, mas ficou de fora, até que, enfim, desconstruímos a história. De fato os participantes da ação foram pagos para participar. E, dos três casais participantes, dois são de atores/modelos, que confessaram estarem fazendo um “trabalho” para a marca.

A publicação da notícia também se espalhou pela internet. E gerou, nos perfis em redes sociais, um monte de opinião sobre o caso. Muitos criticaram a marca, outro tanto me criticou por achar exagerada a reação contrária à participação de atores na ação.

Quem acompanha o blog há mais de sete anos sabe o quanto a Heineken é, para mim, o exemplo mais bem acabado de empresa que sabe usar o esporte como plataforma para construção de marca. A prova disso veio em 2013, quando estive in loco acompanhando as ações da empresa na final da Liga dos Campeões em Londres.

Uma marca como ela não ser 100% verdadeira numa ação corresponde a uma frustração similar à que posso ter caso Usain Bolt seja pego no exame antidoping. Justo ele?

Mas, tentando analisar ao máximo todos os lados da história para montar uma opinião, a única conclusão possível que se chega é de que o dilema da marca nessa ação era ficar entre a história espetacular e a história 100% verdadeira. E, na dúvida, a empresa preferiu não correr riscos e ter uma segurança com atores dando mais qualidade de vídeo à ação.

O esporte traz, consigo, uma alta carga de espontaneidade. As pessoas são movidas pela paixão, o que dá muito mais autenticidade a ações que marcas eventualmente queiram fazer. É isso o que a Heineken sabe captar como poucos nos vídeos produzidos no exterior.

Por que não usar o mesmo expediente por aqui? No vídeo do “The Cliché”, fica evidente qual é o casal que não estava “atuando”, mesmo que todos não soubessem ainda qual seria o final da história. Em vez de ficar só com a espontaneidade da ação de pessoas realmente fanáticas por futebol, a marca optou por ir na segurança de ter a história bacana sendo contada.

Numa era em que a autenticidade das coisas e das pessoas é cada vez mais colocada em evidência e desmascarada em redes sociais, não tem como querer dar “uma fingidinha” só para ter a história perfeita e achar que está tudo bem. No mercado publicitário que é louco por um “storytelling”, muitas vezes incorre-se no erro de cair num “conto-de-fadas”.

A história da Heineken é espetacular. Mas, quando precisa recorrer a atores para participar de um roteiro publicitário, a marca se afasta daquilo que ela própria soube construir em uma década de patrocínio à Liga dos Campeões da Europa, que é usar a autenticidade do esporte para conferir autenticidade à marca.


A luz vermelha para o futebol brasileiro acaba de ser acesa
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Erich Beting

Antes era uma luz amarela. Uma camisa de time estrangeiro vestida por um garoto na rua. Uma loja que tinha o uniforme infantil do Milan, mas não o do Palmeiras (apesar de serem feitos pela mesma fabricante). Uma chamada na mídia que dá mais espaço para o Instagram de Cristiano Ronaldo do que para o time grande brasileiro que iria jogar naquele mesmo dia.

Mas agora a luz está vermelha, pulsando firme.

No final de semana, a audiência da final da Liga dos Campeões da Europa na TV aberta foi maior do que a da transmissão do futebol brasileiro. E, pior, maior do que a exibição de dois clássicos estaduais válidos pela principal competição do país (detalhes aqui).

De quem é a culpa? Realmente temos de acabar com essa história de achar que resolvemos nossos problemas a partir do momento em que achamos um culpado.

O futebol brasileiro precisa trabalhar, e muito, para retomar seu espaço com o torcedor. Como parte da indústria do esporte, não podemos aceitar que um jogo de Brasileirão, ainda mais um clássico, seja menos popular que uma partida de futebol europeu.

Foi exatamente essa disparidade de qualidade de produto que fez com que o basquete mundial perdesse espaço para a NBA. E, após literalmente engolir todos os outros países, a própria liga americana percebeu que, agora, precisar ajudar no desenvolvimento do esporte mundo afora, começando inclusive pelo Brasil, ao se associar ao NBB.

Será que vamos continuar a abandonar nosso produto a tal ponto que uma Uefa, Premier League ou Bundesliga decidam vir até aqui para nos recolonizar?

Há pouco começou um movimento dentro da CBF para mexer um pouco no Brasileirão. Apesar de duramente criticadas, as medidas de criar hino da competição, dar padrão na entrada dos times, dos campos, etc. são formas de tentar começar a mexer no produto. É pouco, mas é um início de algo.

O problema é saber se o plano estratégico para o Brasileirão foi desenhado ou se estamos tomando medidas no escuro, percebendo que é preciso melhorar algo, mas sem nem conseguir saber por onde.

Se, antes, havia apenas uma preocupação, agora a luz vermelha foi acesa para todos neste final de semana. É preciso, urgentemente, que o futebol comece a unir esforços para recuperar o torcedor. Do contrário, quando formos olhar de novo, os europeus voltarão com duas bolas debaixo do braço para refundar o futebol no Brasil…


Por que a unidade do futebol brasileiro é urgente
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Erich Beting

A discussão sobre os direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro para a TV paga de 2019 a 2024 tem feito o futebol, de certa forma, evoluir. Como já abordado por aqui, aos poucos os clubes vão percebendo o erro cometido em 2011, quando decidiu-se implodir o Clube dos 13, acabando com uma entidade que representasse as equipes de forma única.

O fim da negociação coletiva fez, também, com que o futebol deixasse de se unir em torno de causas iguais. Na correria por uma fatia maior do bolo da TV, os clubes não entenderam que é fundamental negociarem em bloco para obterem melhores receitas e, principalmente, para se fortalecerem como esporte.

 

Nesta terça-feira, temos na mídia mais um exemplo de como isso atrapalha o desenvolvimento do futebol e, aos poucos, vai afastando o torcedor dos clubes, levando-os para a Europa. Na estreia do Blog do Mauro Beting aqui no UOL (qualquer nepotismo é mera coincidência, mas aproveita e veja o blog dele aqui), foi publicada uma entrevista com Neymar Jr.

E a resposta que ele dá sobre jogar a Liga dos Campeões da Europa ou a Copa Libertadores é assustadora:

“É videogame, é a realização de um sonho de criança… Então escolho a Champions League.”

Neymar nasceu em 1992, mesmo ano em que a Libertadores voltou a ser objeto de desejo do torcedor brasileiro com a conquista inédita do São Paulo. Antes, nossos clubes eram quase sempre figurantes na principal competição do continente, muitas vezes por total desinteresse, já que tínhamos um Campeonato Brasileiro forte e desejado por torcida, mídia e atletas.

Mas Neymar cresceu vendo a melhor fase dos times brasileiros no torneio continental. Pegou a fase áurea da competição para o país, com times brasileiros campeões a pelo menos cada três anos. Mas o Brasil não tinha uma liga, a Libertadores era (e ainda é) uma zona e, assim, não nos preocupávamos com a bobagem de estar com nossos jogadores, times e competições presentes nos videogames.

E aí Neymar cresceu entortando zagueiros nos campos e sonhando em ser o que conseguia no videogame. Jogador do Barcelona, campeão da Liga dos Campeões, ouvindo o hino da competição ressoar dentro de um estádio lotado para aplaudir os melhores do mundo…

Quando Neymar nasceu, a criança no Brasil sonhava em ser Zico, Edmundo, Romário, Neto, Raí, Evair. Jogar no quintal de casa ou no Camp Nou era praticamente a mesma coisa. Não era preciso cruzar a fronteira para consumir um futebol dos sonhos.

Hoje, logicamente, a história é outra. Assim como estavam Romário e Ronaldo lá fora quando Neymar dava os primeiros passos com a bola, nossos craques estão fazendo o pé-de-meia vendendo seu pé-de-obra para o exterior. Mas existe um trabalho de marca gigantesco dos clubes e competições da Europa para que não sejam só os atletas os objetos de desejo do torcedor, mas os times e os torneios, vistos como estrelas de primeira grandeza.

O futebol no Brasil precisa se unir e discutir como fazer para evitar que nossas gerações cresçam querendo ser Neymar. Ou melhor. Querendo estar em Barcelona, em jogar a Champions, em fazer gol no Camp Nou lotado, e não no Maracanã semiocupado por torcedores raivosos de ver um futebol de quinta em plena quarta de madrugada.

No instante em que perdemos fãs para o universo virtual, é chegada a hora de criar um plano emergencial para resgatar a imagem do futebol brasileiro com o torcedor. Não o já formado, que assim como Neymar trocou o time daqui pelo Barcelona.

O resgate precisa vir de lá da base, criando elementos para o jovem se apaixonar pelo futebol no Brasil sem precisar do empurrão dentro de casa. E isso só vira quando o futebol se unir para deixar de perder fãs até pelo videogame…


Marcas ainda deturpam o conceito de ativação de patrocínio
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Erich Beting

A final da Copa do Brasil entre Santos e Palmeiras motivou algumas ações de ativação de patrocínio feitas pelas empresas envolvidas com a competição. No ano passado, o jogo entre Atlético-MG e Cruzeiro motivou, da mesma forma, algumas ativações. Na sexta-feira passada, dia seguinte ao título brasileiro conquistado pelo Corinthians, também vimos alguns patrocinadores do Timão criando ações.

O movimento do mercado é legal, mostra que há uma evolução das marcas no que diz respeito ao entendimento da importância que tem não ficar estático na camisa do time ou na placa ao redor do campo quando investe um bom dinheiro para patrocinar.

Mas, quando deixam apenas para o “grand finale” suas ações, as marcas mostram um completo deturpamento do que é o conceito de ativação de patrocínio.

Na esteira de desenvolvimento do marketing esportivo, tivemos, nos anos 80, a exposição da marca como grande chamariz para uma empresa. Ao colocar seu nome estampado no uniforme dos atletas, dos árbitros ou na placa de publicidade que aparecia na TV, essas marcas ganharam grande exposição e passaram a ser mais familiares às pessoas. Era um jeito mais eficiente de dar publicidade à empresa.

O problema é que o mundo mudou consideravelmente desde então. Não só tivemos uma enxurrada de novas marcas como passamos a ter uma overdose de informação com a propagação da internet e, hoje em dia, com tudo ao alcance da palma da mão na tela de um telefone celular.

A exposição de marca que antes era um diferencial passou a ser banal. Não é mais a exposição que faz a diferença num patrocínio, mas sim o que a marca faz com ele. É assim que o esporte se promove e, ao mesmo tempo, a marca se envolve com o público de uma forma completamente diferente do usual.

E é esse o conceito que pouco se pratica no Brasil.

As marcas ainda prendem-se muito ao que era o patrocínio no passado. Elas não entenderam que não adianta muita coisa fazer uma ou outra ação pontual, geralmente no jogo mais relevante da competição. É exatamente nessa hora que temos uma explosão de informações sobre a partida, com muita novidade chegando para as pessoas. No final das contas, a ação passa a ser apenas mais uma, sem realmente marcar a cabeça do torcedor.

Logicamente que trabalhar um patrocínio durante todo o ano exige uma dedicação e um gasto de dinheiro bem maiores do que o que são feitos hoje em dia. Mas, no final das contas, tudo isso torna o patrocínio muito mais valioso para a marca.

Para ver esse conceito colocado em prática, basta olhar para a Liga dos Campeões da Heineken. Quer dizer… Liga dos Campeões da Uefa, mas que, graças ao trabalho constante da marca de cerveja, parece ser sinônimo uma da outra. Claro que tudo isso tem um preço. A Heineken investe cerca de US$ 60 milhões ao ano no patrocínio à Uefa. E coloca mais ou menos três vezes essa verba nas ações de ativação relacionadas ao evento.

Foi graças a esse investimento que a Liga dos Campeões da Uefa cresceu mundialmente, da mesma forma que a cerveja conquistou outros mercados. Patrocinado e patrocinador levaram e foram levados para outros mercados a partir dessa relação de ativação das propriedades.

Por aqui, as marcas preferem esperar a final do campeonato para tentarem fazer o torcedor se lembrar de que elas existem…


Redução do futebol na TV pode ajudar os clubes
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Erich Beting

A análise parte de duas notícias do dia de hoje. A primeira, no UOL, de que a Globo estuda transmitir apenas uma partida por semana na TV aberta a partir de 2020 (aqui). A outra, na Máquina do Esporte, com a audiência cada vez mais crescente da Band na Liga dos Campeões da Europa (aqui).

Uma se relaciona à outra de formas distintas. E elas mostram que, ao contrário dos outros esportes, o futebol pode se beneficiar de uma menor exposição na TV para aumentar o consumo em seus diferentes níveis.

As maiores críticas dirigidas à Globo estão ligadas ao fato de ela “esconder” os outros esportes na TV, dando ênfase para o futebol na sua grade de programação. Hoje, na prática, a emissora dedica a manhã de domingo para todos os esportes, enquanto o futebol tem toda quarta e domingo espaço nobre na TV.

E, acredite ou não, isso faz mal para a promoção do esporte. Hoje há uma “overbola”. É muito futebol, às vezes de baixa atratividade, disponível para o telespectador. E, para piorar, desde que os contratos com a TV passaram a ser individuais, o privilégio de aparecer na TV aberta é concedido a poucos times, o que faz aumentar ainda mais a exposição constante das mesmas equipes, reduzindo também o interesse do consumidor.

Daí chegamos à questão do aumento de audiência na Band.

Até o ano passado, a Liga dos Campeões era transmitida no Brasil da seguinte forma: na terça-feira, os jogos estavam na ESPN e Sports+ pela TV paga e no Esporte Interativo pela parabólica. Na quarta, era dia de ESPN e Sports+ na TV paga e Band/Globo na TV aberta.

O alcance da competição era muito grande, considerando que a ESPN faz parte de todos os pacotes de programadoras e havia dois dias de transmissões em canais abertos.

Neste ano, com a migração para o Esporte Interativo, que ainda está em menos de 30% dos lares com TV paga do Brasil, a Liga dos Campeões perdeu muita exposição na TV. Se, antes, a grande variedade de canais permitia que o torneio fosse bastante consumido pelo torcedor, nos mais diferentes meios, ele agora concentra o consumo.

É isso o que tem impulsionado a audiência da Band a cada rodada. Ontem, mais alguns pontinhos foram ganhos pela emissora. Num jogo que envolvia um time midiático (o Real Madrid), mas que ao mesmo tempo ficou no 0 a 0, a Band conseguiu a melhor audiência para uma primeira fase de Liga dos Campeões, que ela transmite há quase dez anos.

Transpondo a situação para o futebol brasileiro, os clubes só têm a ganhar quando a Globo reduz a exposição da bola na TV aberta. Para dar ainda mais valor ao Campeonato Brasileiro, melhor seria se, em vez de exibir partidas por região (Flamengo para o Rio, Corinthians para São Paulo, Cruzeiro para Minas Gerais, Inter para Rio Grande do Sul, etc.), a emissora transmitisse apenas o jogo de maior interesse da rodada.

Isso ajudaria a aumentar o interesse do torcedor geral pelo campeonato e até ajudaria a promover mais outros produtos, como o pay-per-view, que naturalmente abraça o mais fanático, que busca acompanhar toda a competição.

Ao contrário dos outros esportes, que precisam da exposição na TV para crescer, no Brasil o futebol precisa da redução de exposição na TV aberta para aumentar o consumo. No fim das contas, poderá ser bom para os clubes essa mudança de estratégia da Globo para a transmissão de jogos. Resta saber como estará o cenário de televisão ficará até 2020.


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