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Ajuda estatal à Paralimpíada evidencia falha na gestão brasileira
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Erich Beting

Um socorro de última hora do governo vai garantir que os Jogos Paralímpicos comecem, como programado, em 7 de setembro. Enquanto corriam as Olimpíadas, havia uma grande possibilidade de que as Paralimpíadas fossem adiadas para outubro. O problema era dinheiro. Faltava verba para que o comitê organizador entregasse o evento.

Nesta semana, porém, verbas da prefeitura do Rio e de apoio de estatais foram injetadas por meio de convênios e patrocínios. Ao mesmo tempo, os ingressos começaram a ser realmente vendidos, e o cenário ficou menos turbulento.

Os Jogos Paralímpicos sairão na data prevista. Mas o que significa esse vigoroso aporte estatal de emergência?

A Paralimpíada sofreu, no fim das contas, da falha na gestão do evento por parte da organização. Preocupado com a entrega das Olimpíadas, o Rio 2016 negligenciou o evento seguinte. Menor, usando quase toda a estrutura olímpica e mais curta, a Paralimpíada é teoricamente mais fácil de ser gerenciada. Mas nem por isso pode ser colocada tão em segundo plano como aconteceu agora.

A preocupação é tão grande com o evento maior que o menor ficou “esquecido”, como se fosse algo distante. Quando a chama olímpica se apagou, o desespero passou a tomar conta da organização, que então partiu em busca de soluções para conseguir fechar a conta e entregar o evento. E, aí, quem se comprometeu a pagar a conta, não importasse o que acontecesse, foi o governo brasileiro. Daí a enxurrada de dinheiro público nas Paralimpíadas.

Se o discurso olímpico era o de que o evento aconteceria sem injeção de dinheiro público no que se referia às questões esportivas, o mesmo não pode ser aplicado à Paralimpíadas.

A lição que fica dessa história é a de que os comitês internacionais, Olímpico e Paralímpico, precisam urgentemente sentar para um bate-papo. As Paralimpíadas começam a ser cada vez maior e mais complexa. Se continuar a viver à sombra do evento principal, será sempre uma emoção conseguir entregá-la. Ainda mais quando os dois eventos acontecem num país que ainda não tem uma indústria esportiva vigorosa como é o Brasil.


A fabulosa história da briga do Guarani com a Schin
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Erich Beting

O Guarani é hoje líder de seu grupo na Série C do Campeonato Brasileiro. Após anos de glória, o time de Campinas tenta resgatar um pouco de sua dignidade depauperada por anos e anos de gestões pavorosas que levaram o clube de primeiro campeão nacional do interior a um time praticamente desconhecido para além da região do interior paulista em que está inserido.

Na segunda-feira, o clube divulgou uma nota de repúdio contra o Instituto Própesquisas e a Brasil Kirim, fabricante de bebidas que tem, entre outras marcas, os refrigerantes Schin, patrocinador da Ponte Preta, rival histórico dos bugrinos em Campinas e que hoje disputa a Série A nacional.

O motivo da nota é uma pesquisa, encomendada pela Brasil Kirim e divulgada sem anuência da empresa, sobre o tamanho das torcidas dos clubes de futebol em Campinas. Terceira maior população no estado de São Paulo, Campinas é uma cidade que desperta o interesse das marcas. Com 1,1 milhão de habitantes, é daquelas cidades do interior paulista que concentra riqueza e ainda possui uma população jovem graças à presença de universidades.

Por isso mesmo, para um patrocinador de um time de futebol local, saber tamanho e concentração de torcedores por times é importante. Nesse mapeamento de mercado, a Brasil Kirim viu que o Corinthians é a maior torcida local, seguido de Ponte Preta, São Paulo, Palmeiras e Santos. O Guarani aparece em sexto lugar, dentro da margem de erro, empatado com os santistas.

Segundo o levantamento, 3% da população de Campinas é torcedora do Guarani, enquanto 20% se diz torcedora da Ponte Preta. O resultado causou indignação no Guarani, que propôs então um boicote de seus torcedores à Schin.

A atitude é patética. E ajuda a explicar um pouco o porquê de o Bugre hoje ser um time de terceira divisão nacional.

Mais uma vez, o clube mostra total desconhecimento sobre o que é e para o que serve uma pesquisa de opinião. Quando o Guarani tenta desmerecer a pesquisa por questionar 800 pessoas num universo de 1,1 milhão, afirmando que isso “não retrata um panorama absoluto de uma cidade”, está simplesmente ignorando a base em que é feita uma pesquisa e a função de se dizer que há uma “margem de erro” em todo levantamento, já que ele nunca é capaz de abranger toda a população.

Outro tosco argumento usado pelo clube é o de que é impossível o Guarani ter apenas 3% do universo de torcedores de Campinas se, no domingo, contra a Portuguesa, 7 mil pessoas foram ao estádio. Sem considerar a margem de erro do levantamento, 3% de torcedores num universo de 1,1 milhão de pessoas representa 33 mil pessoas. Ou seja, com 7 mil pessoas no estádio, cerca de 21% do total da torcida do Bugre estaria presente. O argumento é totalmente inútil.

Se quiser fazer uma comparação mais tosca e menos estatística ainda, o perfil do Guarani no Facebook conta com 21 mil pessoas. O da Ponte Preta, com 235 mil. Será que também haveria uma nota de repúdio ao Facebook por isso?

Ao se direcionar dessa forma, colocando a torcida contra a Brasil Kirim, o Guarani afasta um potencial patrocinador do clube. Ao pedir explicitamente o boicote a produtos da marca, o clube pensa com a cabeça do torcedor fanático. Não seria mais fácil propor à Schin um trabalho específico com os torcedores do clube? Ajudar a resgatar o amor pelo Guarani, a comparecer ao estádio, a impulsionar as vendas? A marca poderia ganhar novos consumidores e o clube, certamente, teria algo a mais a ser oferecido para se aproximar da torcida.

Mas a pergunta que fica nessa fabulosa história é até mais simples. Será que o Guarani já fez alguma pesquisa recente para saber qual o tamanho de sua torcida? O clube sabe por que não se vê mais tanta camisa alviverde nas ruas de Campinas? Aliás, será que o Guarani tem ideia de quem é o torcedor do clube, o que ele consome, como ele se relaciona com o time, quando foi a última vez que ele foi ao Brinco de Ouro da Princesa?

A considerar como anda o desempenho dentro de campo do Guarani, o torcedor já deveria ter soltado sua nota de repúdio faz tempo…

 


Por que a Arena da Baixada é de fato um estádio multiuso
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Erich Beting

A Arena da Baixada receberá, no próximo final de semana, uma partida de vôlei da seleção brasileira masculina. Duelo marcado antes mesmo de o Brasil ganhar o terceiro ouro olímpico na modalidade, o confronto consolida também o estádio do Atlético Paranaense como uma arena que é, de fato, multiuso dentre todos os estádios que foram erguidos e/ou remodelados para a Copa do Mundo de 2014.

Depois de abrigar um evento do UFC, agora é a vez de o estádio do Furacão ter um jogo de vôlei. Por que esses eventos têm acontecido na Arena da Baixada e não em outros lugares?

Quando comemorou a instalação de uma grama sintética no estádio, no final do ano, o Atlético celebrava não apenas a implementação de uma novidade no mercado brasileiro, algo que sempre foi a marca do clube desde o fim dos anos 90.

O que o Atlético sabia que ganhava ao trocar o tipo de gramado de seu estádio era uma tremenda vantagem competitiva em relação à concorrência. Esqueça o aspecto técnico, a bola, o campo de jogo. O negócio que mais ajuda o Furacão ao ter a grama sintética é poder realizar, num final de semana, um jogo de vôlei, com um piso colocado sobre o gramado e, no dia seguinte, se quiser, fazer uma partida de futebol profissional em perfeitas condições.

Numa cidade que sofre com o frio como Curitiba, ter a grama sintética já é uma economia na manutenção do gramado. Tecnicamente, o time de futebol também se beneficia, por não precisar jogar num gramado danificado pela natureza e/ou por outros eventos (é só ver como estava o gramado do Mané Garrincha no domingo, ou como costuma ser o Allianz Parque após evento).

Nesse momento, mais do que fazer dinheiro com outros usos do estádio, o Atlético Paranaense precisa mostrar que a Arena da Baixada é uma excelente alternativa ao eixo Rio-SP. A grama sintética permite ao Atlético não colocar muitas restrições para que seu estádio seja usado para outros fins durante a temporada do futebol.

No final das contas, dos 12 estádios da Copa do Mundo, o único que pode hoje dizer que é multiuso é a Arena da Baixada. E a chave para isso foi, entre outras coisas, mudar a grama do estádio no fim do ano passado, começo deste.

Nos próximos anos a tendência é que aumente a concorrência entre os estádios para ter outros eventos. Com uma grama diferente das outras, a Arena da Baixada já está na frente nesse quesito.


NBA mostrou como o esporte precisa fazer no Rio
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Erich Beting

Após 20 dias no Rio de Janeiro para a cobertura das Olimpíadas, a volta à rotina do cotidiano esportivo brasileiro desinflado dos megaeventos é um tanto quanto dura. A retomada do futebol insosso de meio de semana (São Paulo e Flamengo que o digam), as ações de marca praticamente inexistentes nos estádios, a falta de engajamento da mídia na cobertura de esportes em geral, tudo vai aos poucos nos recolocando de volta às dificuldades do dia-a-dia.

Mas, na batalha de tentar tirar algo de bom do que foram os Jogos Olímpicos, muito provavelmente a NBA terá alguns pontos de vantagem em relação aos demais esportes e ligas. A liga americana de basquete apostou no conceito da NBA House no Rio. Montou um espaço no Boulevard Olímpico, atraiu parceiros comerciais e, acima de tudo, criou um “parque de diversões” do basquete para o torcedor que não estava dentro dos Jogos.

A casa recebeu 80 mil pessoas, ante uma expectativa de 50 mil (leia os detalhes aqui). Mas, mais do que receber gente e vender produto, a NBA usou o relacionamento com o torcedor para conhecer um pouco mais sobre ele.

O maior legado que existe na casa montada pela liga foi pegar dados de contato desses torcedores. Saber como e quando eles assistem ao basquete, de que forma tem interesse em ver os jogos da NBA, se curte também o basquete local, etc.

Ter acesso a informação de qualidade é vital para que as marcas possam entender melhor como explorar o esporte. A NBA soube criar um espaço de relacionamento não apenas para o torcedor se divertir no Rio, mas para gerar vendas e, mais além, conhecer melhor seus hábitos de consumo.

O maior problema que existe hoje quando uma entidade esportiva tenta vender algum projeto no Brasil é que quase nunca ela sabe apresentar uma solução de negócios para o patrocinador. Sem conhecer o seu cliente, a modalidade aponta a exposição de marca que gera e o histórico de conquistas, sem perceber que o real valor não é o que ela foi, mas o que ela pode gerar para o parceiro comercial.

A NBA, com sua casa, deu uma aula ao esporte brasileiro de como é possível divertir o público. E usar isso como ferramenta para conhecê-lo melhor.


Dinheiro não falta ao Brasil para ser top 10
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Erich Beting

A busca alucinada por medalhas do Comitê Olímpico do Brasil (COB) nos últimos quatro anos resultou naquilo que era esperado. Na hora de explicar o motivo de a meta de estar entre os dez maiores do mundo nos Jogos do Rio de Janeiro, o comitê saiu pela tangente: minimizou a posição final e exaltou o “melhor desempenho da história”, com aumento de presença em finais, maior número de medalhas da história de uma edição olímpica e pulverização de conquistas por diferentes modalidades.

Sim, tudo isso é verdade. Mas a realidade não dá tantos motivos para celebrar. O Brasil foi uma das nações que mais dinheiro despejou para a preparação de atletas no mundo. A falta de dinheiro e de empenho em investir não podem, hoje, serem usadas como muleta para justificar um desempenho abaixo do esperado no país.

O fato é que dinheiro não falta para o Brasil ser um país entre os dez mais potentes do esporte no mundo. Onde, então, estamos errando?

A conta é simples. O investimento que as confederações fizeram, no último ciclo olímpico, tinha como objetivo o alto rendimento de alguns atletas. Foram pagas viagens para melhorar desempenho, salários mais altos para se ter maior dedicação aos treinos, treinadores internacionais para trazerem maior conhecimento, etc. Pouco, para não dizer praticamente nada, foi feito para ampliar a base de praticantes daquela modalidade.

O que esse pensamento focado em medalha causa é uma distorção do processo de criação de uma nação que de fato seja uma potência esportiva.

Ao despejarmos muito dinheiro em poucos potenciais campeões, desestimulamos toda a cadeia. Não há condições para a formação de novos atletas e, pior, por estar com mais dinheiro, o atleta de alto rendimento que é beneficiado com Bolsa-Pódio, Bolsa-Medalha, Bolsa-Atleta, carreira militar, etc. não quer parar de competir, porque sabe que isso significará para ele a perda de receita. E, assim, criamos um modelo engessado, em que quem tem dinheiro continua a ter mais dinheiro, impedindo que novos talentos apareçam.

Um dos esportes que mais investe na base, no Brasil, é o futebol. E isso explica, em parte, o segredo do sucesso brasileiro em formar jogadores de futebol. Como é um grande negócio vender jogador, os clubes colocam um dinheiro a fundo perdido na formação de talentos. CTs modernos, equipes técnicas qualificadas, estrutura para o atleta se desenvolver pessoal e profissionalmente.

Assim como o COB, o clube de futebol foca seu investimento no alto rendimento. A preocupação é com o atleta vencedor. Mas o clube sabe que, para gerar mais dinheiro e manter um time competitivo, de nada adianta contratar o Messi e ter outros 10 coadjuvantes em campo.

Essa, porém, é a realidade de muitos esportes no Brasil. Investimos tudo em um único atleta, o que coloca sobre ele a pressão para obter resultado. A melhoria do país no quadro de medalhas e até mesmo em participação em finais não revela muita coisa sobre o rumo que temos tomado para crescermos como nação esportiva.

Muito mais importante do que colecionar medalhas é empregar os esforços para a disseminação da prática de atividade física no país. Isso só acontece se houver dinheiro, claro. Mas não um dinheiro para ser empregado em 50 potenciais atletas, excluindo-se dessa lista praticamente cem vezes mais de pessoas, por todo o país, que podem vir a ser um representante do país numa edição de Jogos Olímpicos.

A função das entidades esportivas como o COB – e do próprio governo – é ajudar na formação de atletas no país, e não investir a maior parte dos recursos em quem tem melhor desempenho. Essa mentalidade é para ser usada pelas empresas privadas que usam o esporte para ganho de imagem e/ou vendas. Para elas, só o craque daquela modalidade interessa.

Pelo dinheiro que o COB e as confederações tiveram à disposição de 2012 para cá, o Brasil não estar entre as dez nações mais vitoriosas do Rio 2016 é um motivo a mais para nos preocuparmos. Enquanto os recursos não forem enviados para a disseminação da prática esportiva, seguiremos adotando um critério que foi inventado pelos americanos e seu conceito de que “sem ouro, sem medalha”. Basta comparar as realidades de um país e de outro para termos a certeza de que estamos no caminho errado.

Não falta dinheiro ao esporte no Brasil. O que falta, mais uma vez, é empregar de forma correta a verba.


Descaso com Havelange mostra novo caminho do esporte
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Erich Beting

João Havelange talvez seja o maior responsável pelo momento atual do esporte. O ex-dirigente, que morreu ontem aos 100 anos de idade, soube como ninguém explorar o crescimento da televisão e do investimento em marketing das grandes empresas nos anos 70 e 80. Fez isso com extrema habilidade, a mesma que demonstrou para, em 1970, ganhar a eleição para a presidência da Fifa, desbancando o status quo europeu.

Havelange foi o hábil negociador que o futebol precisava para se fortalecer. Seu modelo de negócios inspirou também o COI a construir o fenômeno das Olimpíadas. A força do ex-dirigente era tanta que, em 2009, mais de 10 anos após deixar a presidência da Fifa, Havelange costurou a candidatura do Rio de Janeiro para os Jogos Olímpicos do até então longínquo 2016. Seu apoio nos bastidores foi importante para a Cidade Maravilhosa receber os Jogos.

Na celebração da vitória, Havelange prometeu tomar um champagne na sua festa de 100 anos, durante os Jogos.

No ano seguinte, porém, o status do todo poderoso dirigente ruiu. Condenado pela Justiça suíça de receber propina da antiga agência de marketing ISL junto com o genro Ricardo Teixeira, Havelange assumiu a culpa, devolveu parte da grana e, então, foi tirado dos cargos de presidente honorário da Fifa e do COI. Ao mesmo tempo, a presidente Dilma Rousseff tirou dele o passaporte diplomático concedido décadas antes no Brasil.

A perda de prestígio e poder marcaram o início do fim de Havelange, até então um senhor de 94 anos ainda plenamente ativo, diariamente nadando na piscina e viajando pelo mundo em eventos da Fifa e do COI. Mais do que a idade avançada, o que lhe fez mal foi perder o status que havia adquirido ao se impor como grande dirigente mundial, influente a ponto de negociar contratos milionários e se reunir com chefes de estado estando sempre do lado mais forte da relação.

A forma como COI, Fifa e até CBF (o Brasil não enlutou para jogar ontem e hoje as semifinais do futebol) trataram a morte do grande dirigente, porém, mostra como as coisas estão mudando.

Havelange poderia ser referendado como o grande dirigente que levou os Jogos a serem esse colosso. No entanto, foi completamente ignorado durante o evento em que, sete anos atrás, projetava que seria a celebração de seus 100 anos de idade entre aqueles que sempre tiveram a seu lado.

Ao Havelange ser colocado no ostracismo, percebemos que o esporte começa a mudar sua configuração. Não cabe mais um dirigente corrupto entre os grandes do esporte.

Por mais que tenha sido grande responsável por toda a transformação do esporte como negócio, pode ser que Havelange tenha sido apenas o cara na hora certa. Com o apetite de investimento da mídia e das marcas nos anos 80 pelo esporte, era natural que ele se tornasse um grande negócio… O ocaso com que sua morte foi tratada pelos seus pares, porém, mostra que as coisas estão mudando.


É preciso aprender a treinar para a derrota
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Erich Beting

Jogar em casa ajuda ou atrapalha? A pergunta deverá ser feita para praticamente todos os 465 atletas do Time Brasil nesses Jogos Olímpicos. Já vinha, aliás, sendo feita por nós da mídia, vocês da torcida, pela turma de dirigentes, talvez quem sabe até pelo psicólogo do atleta…

Essa inquietação em dar tanta bola assim para a torcida mostra que não estávamos preparados para saber o que fazer com o fator casa nos Jogos Olímpicos. Será que jogar em casa requer mais preparo? Ou menos afobação? É preciso ser coração ou razão? Ansiedade demais ajuda ou atrapalha?

O fato é que o Brasil não sabe perder. Não conseguimos ainda entender a lidar com a frustração da derrota. Com a necessidade de nos explicarmos diante das câmeras, para nossos pais, cônjuges, filhos, muito menos para o nosso travesseiro.

Perder é sofrido. O choro de explosão de Diego Hypólito quando finalmente completou um exercício de solo sem falhas numa Olimpíada é exatamente o reflexo dessa nossa difícil relação com a derrota.

A expressão “o que é que eu vou dizer lá em casa?” parece incomodar demais e atrapalhar demais o atleta.

Deve ser cultural. Somos um povo que acredita que os problemas se resolvem quando encontramos o culpado. É só apontar o dedo que, milagre, resolvemos as coisas. E isso passa a ter um reflexo direto na condução da atitude de nossos atletas, especialmente quando joga em casa.

Foi a crucificação de Rafaela Silva em 2012, para o cala-boca de 2016. E se Rafa não tivesse vencido agora? Ela estaria preparada para nova frustração olímpica? E nossa torcida, saberia perder junto com ela?

Novak Djokovic chorou copiosamente ao cair para Del Potro na primeira rodada do tênis. Minutos depois, refez-se publicamente da desilusão, disse que as derrotas faziam parte, mesmo as mais doloridas, declarou-se feliz pela conquista de seu amigo argentino que volta e meia sofre com lesões. Ele sabia que um novo dia começaria. Já está pelo Rio aproveitando um pouco a indigesta folga para torcer por atletas do seu país.

Por aqui, nossos atletas mostram que ainda não sabem lidar com a frustração da derrota. Cesar Cielo, que era a grande aposta do mercado publicitário, sumiu após não se classificar para o Rio. Rodrigo Pessoa abandonou o time de hipismo ao saber que seria suplente. Alguns atletas têm evitado dar entrevistas quando as coisas não saem como o planejado (o time de futebol antes dos 4 a 0 é um dos exemplos disso).

O atleta precisa estar preparado para a derrota. Não é ensaiar o discurso e ser vazio ao responder sobre ela quando questionado. Um grande atleta precisa saber se comunicar. Sumir diante do problema é só mais uma prova de que ele não sabe perder. Os Jogos no Brasil podem ser uma ótima oportunidade para mudar essa falha histórica.

Temos de treinar não apenas para vencer. Mas para saber o que fazer quando perder. Passar a mão na cabeça do atleta e evitar sua exposição para falar sobre uma derrota é só um desserviço que nossos gestores fazem para o desenvolvimento do esporte no Brasil.


Filas no Rio mostram imaturidade na gestão esportiva no Brasil
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Erich Beting

As irritantes filas nas arenas olímpicas persistiram no segundo dia de Jogos. Na tentativa de encontrar os motivos para faltar comida, levar 1h para comprar um refrigerante ou comprar um item e ele ter acabado no tempo em que se esperava, o Comitê Rio 2016 argumentou que há uma “falha operacional”.

A tradução para a frase é: “imaturidade”.

O Rio 2016 mostra que não aprendeu absolutamente nada com a Copa do Mundo. Ou mesmo com a realização do Rio Open, desde 2014, na mesma Cidade Maravilhosa. Isso para não considerarmos Carnaval e Copa do Mundo na lista…

O espetáculo esportivo continua sendo encarado, por aqui, como algo que só tem um local para acontecer, que é dentro da arena. O espaço para a competição precisa estar em ordem. E só.

É exatamente essa visão antiquada de como se trabalhar o evento esportivo que o futebol começou a quebrar pós-Copa. Entendemos que não seria possível mais esquecer de olhar para o torcedor, a mídia, o patrocinador. Hoje eles também são importantes para o espetáculo. Não mais do que o atleta, sem dúvida, mas precisam ser bem tratados.

Foi assustador chegar ao Parque Olímpico ontem e me deparar com a logística de compra de alimentos e bebidas, tanto nas arenas quanto nas áreas de conveniência do local que mais recebe gente nos Jogos.

Todos os alimentos e bebidas são comprados num caixa único. Ou seja. Se eu quero uma pipoca, tenho de ir lá na mesma fila de quem quer uma água ou uma cerveja. E, depois, eu tenho de me espalhar pelos diferentes quiosques de entrega de produtos.

O responsável por pensar essa logística, muito provavelmente, nunca foi a uma festa junina de escola primária.

Em vez de pulverizar os canais de compra, concentra-se tanto a compra quanto a distribuição. Não precisa ter nem experiência em megaevento para saber que isso torna até mesmo a compra de cinco pessoas num mesmo lugar inviável.

O Rio 2016, preocupado em erguer ótimas arenas e dar o máximo de qualidade para os atletas, esqueceu-se de que o show também tem um importante ator. O torcedor foi simplesmente ignorado. Esquecem-se, os organizadores, que são eles que espalham a fama do evento.

Quem está em casa vendo pela televisão uma partida de basquete pode achar que o ginásio estava com muitos lugares vazios. Pois saiba que tem muita gente que está na parte interior da arena, há meia hora, esperando para pegar uma ficha, para então ir para outra fila, para pegar apenas um saquinho de pipoca…

E a organização está tão perdida na resolução do problema que continua a importar food trucks, não entendendo que o problema não é apenas a falta de produto, mas os canais de venda.

Muito provavelmente não falharemos como Atenas e o padre irlandês, ou como a  China no sumiço da vara de uma competidora no salto com vara que era favorita à medalha.

Mas erramos num princípio básico dos grandes eventos, que é causar uma ótima impressão para o torcedor levar adiante uma boa imagem dos Jogos e da cidade que o abriga.

As falhas na organização da alimentação dos torcedores são a prova de que seguimos imaturos na gestão esportiva aqui no Brasil…

 


COI tenta manter Olimpíada jovem com novos esportes
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Erich Beting

Surfe, skate, escalada, caratê e beisebol serão as novidades do programa olímpico a partir de 2020. À exceção das duas últimas modalidades, incluídas muito também por conta do peso que possuem no Japão, país-sede do evento daqui a quatro anos, a escolha do Comitê Olímpico Internacional (COI) mostra muito a preocupação que existe para manter acesa – e jovem – a chama dos Jogos Olímpicos.

Desde Londres-2012 que o COI se preocupa em tentar entender como os Jogos podem se relacionar com o jovem. A invasão das redes sociais tumultuou todo o esquema de venda de direitos de transmissão do evento. As regras rígidas de controle sobre quem pode publicar o que não ajudam a trazer o jovem para perto dos Jogos. E, para piorar, a tradição de um evento centenário faz com que os mais novos estejam longe de achar que a Olimpíada é um evento para eles.

A escolha de surfe, escalada e skate fere o princípio olímpico. Como pode um maratonista ter o mesmo status de um skatista? Ou de alguém numa escalada? Pode. E terá, cada vez mais, uma função importante para a estratégia de comunicação com o público do COI.

Se não abrir os olhos para os esportes que surgiram e cresceram nos últimos 50 anos, o COI rapidamente cairá no mesmo erro de uma Fórmula 1, que cada vez mais se aproxima do nicho, sem renovar o seu consumidor.

A tarefa principal do COI é preservar o espírito olímpico que fez a fama dos Jogos e do próprio comitê. Para isso, não só a tradição tem de ser preservada. É preciso renovar, sempre, o interesse das pessoas pelas Olimpíadas. Ou, como afirmou Thomas Bach, presidente do comitê, ao justificar as escolhas:

“Queremos levar o esporte ao jovem. Com as diversas opções que os jovens têm, não podemos mais esperar que eles venham até nós. Temos de ir até eles”, afirmou.

A tendência, para o futuro, não é apenas a inclusão de outros esportes não-tradicionais nas Olimpíadas, mas também a exclusão de algumas modalidades que foram importantes, mas que hoje representam dispêndio de tempo e grana para os organizadores, sem gerar tanto envolvimento do público.

O COI precisa do jovem. E mostrou que pode romper um pouco a tradição para ir em busca dele. Falta, agora, o comitê ter o mesmo tipo de atitude em relação ao trabalho que faz com a mídia. Especialmente nas redes sociais.


“Segunda Campeã” exige profissionalismo do atleta
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Erich Beting

Até que demorou mais do que esperava a primeira discussão acerca da proposta do SporTV na “Segunda Campeã”, como está sendo apelidado o jogo de segunda-feira à noite transmitido pela emissora com exclusividade. Veio do ex-jogador Tinga a crítica sobre o fato de os jogadores terem de conceder, dentro de um estúdio, ainda com a roupa de jogo, a entrevista para o programa “Bem, Amigos”, que começa colado na sequência da partida.

Na primeira “Segunda Campeã”, o vazamento da conversa de Cuca com Diego Souza sobre o time do Santos gerou insatisfação dos palmeirenses. Desta vez, Tinga desceu a lenha no fato de os jogadores serem obrigados a irem direto do campo para a entrevista “ainda cansados”, segundo argumentou o ex-jogador de Inter e Cruzeiro.

Particularmente, achei a proposta da entrevista pós-jogo num estúdio, só com dois jogadores e um treinador, um formato bem interessante. O atleta ali, ainda com o uniforme de jogo, é um elemento novo para os programas de debate. O “confronto” entre jogadores que acabaram de sair da partida, bem como de um treinador, também é outra situação que agrada do ponto de vista jornalístico. Ainda acho que o “Bem, Amigos” deve explorar ainda mais o conteúdo jornalístico trazido por essa situação, focar a entrevista nos detalhes do jogo, instigar ainda mais o atleta e o treinador, mas isso também fugiria demais da característica do próprio programa.

Para o torcedor, acredito também que seja legal sair daquele formato batido e modorrento das entrevistas coletivas pós-jogo. Lentas, massacrantes, repetitivas, etc. Ali existe mais dinamismo, o atleta está ainda com o jogo quente na cabeça, existe o confronto direto do debate com outros atores da partida.

Mas e para atletas e treinadores, será que Tinga está certo em reclamar?

Já havia tido essa percepção logo depois de Sport x Palmeiras e reforcei-a acompanhando o pós-jogo de Cruzeiro x Atlético-PR. O jogador precisará ser muito mais profissional para encarar esse bate-papo após a partida.

Respostas menos pasteurizadas, inteligência para se posicionar, preocupação com a imagem que será transmitida por ele após o jogo. Tudo isso é exigido no formato apresentado até agora. O atleta não poderá ficar naquela mesma expressão de sempre, mantendo o mesmo padrão de resposta, fugindo de respostas mais agudas.

No esporte profissional, o atleta precisa entender sua posição como protagonista não apenas dentro de campo. Ele tem de saber se posicionar e fugir do padrão. Nesse formato da “Segunda Campeã”, o jogador de futebol, pela primeira vez, precisa ser um pouco mais do que alguém que “faz parte do grupo”, que “chegou para somar” e que o “importante são os três pontos”.

E, como qualquer mudança de padrão, ela gera descontentamento. O fato é que o jogador de futebol no Brasil está tendo de sair da zona de conforto para ser mais atleta, mais profissional. “Só” jogar futebol é tarefa fácil demais nesse cenário…