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NBA mostrou como o esporte precisa fazer no Rio
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Erich Beting

Após 20 dias no Rio de Janeiro para a cobertura das Olimpíadas, a volta à rotina do cotidiano esportivo brasileiro desinflado dos megaeventos é um tanto quanto dura. A retomada do futebol insosso de meio de semana (São Paulo e Flamengo que o digam), as ações de marca praticamente inexistentes nos estádios, a falta de engajamento da mídia na cobertura de esportes em geral, tudo vai aos poucos nos recolocando de volta às dificuldades do dia-a-dia.

Mas, na batalha de tentar tirar algo de bom do que foram os Jogos Olímpicos, muito provavelmente a NBA terá alguns pontos de vantagem em relação aos demais esportes e ligas. A liga americana de basquete apostou no conceito da NBA House no Rio. Montou um espaço no Boulevard Olímpico, atraiu parceiros comerciais e, acima de tudo, criou um “parque de diversões” do basquete para o torcedor que não estava dentro dos Jogos.

A casa recebeu 80 mil pessoas, ante uma expectativa de 50 mil (leia os detalhes aqui). Mas, mais do que receber gente e vender produto, a NBA usou o relacionamento com o torcedor para conhecer um pouco mais sobre ele.

O maior legado que existe na casa montada pela liga foi pegar dados de contato desses torcedores. Saber como e quando eles assistem ao basquete, de que forma tem interesse em ver os jogos da NBA, se curte também o basquete local, etc.

Ter acesso a informação de qualidade é vital para que as marcas possam entender melhor como explorar o esporte. A NBA soube criar um espaço de relacionamento não apenas para o torcedor se divertir no Rio, mas para gerar vendas e, mais além, conhecer melhor seus hábitos de consumo.

O maior problema que existe hoje quando uma entidade esportiva tenta vender algum projeto no Brasil é que quase nunca ela sabe apresentar uma solução de negócios para o patrocinador. Sem conhecer o seu cliente, a modalidade aponta a exposição de marca que gera e o histórico de conquistas, sem perceber que o real valor não é o que ela foi, mas o que ela pode gerar para o parceiro comercial.

A NBA, com sua casa, deu uma aula ao esporte brasileiro de como é possível divertir o público. E usar isso como ferramenta para conhecê-lo melhor.


A corrida sob ponto de vista da diversão
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Erich Beting

Corrida de rua, no Brasil, é tratada quase sempre como assunto sério. Raras são as provas pelo país que conseguem atrair o corredor não pela performance, mas pela diversão. E talvez esse seja o motivo para, apesar de registrar crescimento exponencial, o mercado de corrida de rua ainda não atingir patamares tão grandes quanto nos EUA.

Na última sexta-feira corri  pela primeira vez a Maratona de Jerusalém. Ou melhor. O evento chama-se Maratona de Jerusalém, mas eu corri os 21km, algo que já estava além das minhas pretensões. Foi a segunda vez que fiz uma meia maratona. Na primeira, no Rio de Janeiro, estava preparado e focado e com um objetivo claro dentro da corrida, com cada quilômetro planejado e previamente estudado por horas na véspera da prova.

Nessa daqui, fui do jeito que dava. Sem o preparo adequado, pensando mais em terminar nem que fosse caminhando, sem conhecer o trajeto, sem me preocupar com tempo, querendo fazer uma imersão na prova a partir da observação do redor do que focado no meu objetivo.

Espécie de muleta para compensar a forma física longe do ideal, a estratégia no fim ajudou a me revelar um outro meio de encarar a corrida de rua que, no Brasil, está muito longe de ser aplicado.

As nossas provas são, quase todas, pensadas para o atleta. Elas têm um planejamento voltado para tomada de tempo, trajeto, posto de hidratação, etc. E, aí, esquecemos de colocar na prova alguns itens que parecem gracejos, mas que ajudam sensivelmente a envolver o atleta e fazê-lo ter uma outra relação com a corrida.

Durante o percurso da meia maratona em Jerusalém havia gente fantasiada na “torcida” por você, artistas fazendo performance com pernas de pau e música, muita música. Lembro de ter contado pelo menos seis bandas ao longo do percurso, tocando músicas das mais distintas, mas que ajudavam a aliviar um pouco a dureza do percurso cheio de subidas e descidas, da distância que em algumas horas parece não ter fim.

Ao colocar a diversão dentro da corrida, a prova te envolve de outra forma. Fica mais legal correr, você não se sente na obrigação de correr o melhor tempo da sua vida, o lado esporte como lazer ganha o espaço do esporte como competição. Isso, na ponta final do negócio, faz com que o público local se envolva muito mais com a corrida.

Maratona_Jerusalem

 

Foram incontáveis os pedestres que nos deram algum incentivo em palavras ao longo da prova, assim como as mãos estendidas ao longo da calçada pelas crianças que estavam felizes de poder incentivar os “atletas” que passavam perto de suas casas.

No Brasil, uma das poucas provas que, sem querer, consegue ter esse lado mais de diversão é a São Silvestre. Não por planejamento da organização, mas por ser uma corrida aguardada por todos.

Em seu sexto ano, a Maratona de Jerusalém colocou 15.330 pessoas para correr as distâncias de 42km, 21km, 10km, e 5km. No Brasil, apenas três provas conseguem reunir mais atletas do que essa (São Silvestre, Maratona de São Paulo e Maratona de Revezamento do Pão de Açúcar), todas elas com pelo menos 15 anos de história, numa cidade com população 14 vezes maior que a de Jerusalém.

Se começarmos a pensar na corrida muito mais como diversão do que como performance, teremos um novo salto no mercado brasileiro de corrida.

* O blogueiro viajou a Israel a convite do Ministério do Turismo


Que ano foi esse?
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Erich Beting

É bem provável que, no fim de 2014, estávamos pensando no “ano mágico” que havíamos acabado de atravessar. Afinal, não só teve a Copa, mas que Copa memorável que tivemos no país! Um futebol bem jogado, uma festa bacana e muito aprendizado trazido para cá pelo maior evento do esporte mais popular do mundo.

Era natural, e essa era a minha ideia original, que viveríamos em 2015 um ano de ressaca. Poucas mudanças bruscas no futebol, a expectativa olímpica começando a aumentar a partir de agosto, as marcas começando a aquecer os tambores para 2016, sem grandes investimentos no esporte, os mesmos cartolas de sempre mandando e desmandando…

Até 27 de maio era mais ou menos esse o roteiro. O Brasileirão começava, as dúvidas sobre a performance técnica da seleção brasileira continuavam (que ano não foi assim desde que você se conhece por gente que acompanha futebol?), as marcas timidamente começavam a traçar seus projetos olímpicos…

Aí veio a prisão de José Maria Marin, a delação premiada de J. Hawilla nos Estados Unidos e o futebol virou de cabeça para baixo.

Sempre achamos, trabalhando ou não com futebol, que os dirigentes que estavam no comando do futebol no país tinham atitudes no mínimo suspeitas. Hoje, os três últimos presidentes da CBF são acusados formalmente pela Justiça dos Estados Unidos de práticas de crimes de corrupção. Um está preso, um sumiu faz três anos (Ricardo Teixeira sempre foi um homem de visão), o outro acaba de pedir licença do comando da entidade…

Joseph Blatter, o presidente da Fifa há quase 20 anos, foi tirado da cadeira máxima do futebol. Diversos outros dirigentes estão caindo, entre eles o até então ilibado Michel Platini, ex-craque de bola da França que trocou a fama conquistada pelos dólares desviados em acordos obscuros, ao que tudo indica.

O ano de 2015 pode vir a ser o começo do fim de um sistema mafioso que corroeu o futebol nos últimos 40 anos. As vísceras de um modelo de negócios que mais era um modelo de negociatas estão expostas, e a necessidade de mudança é enorme.

No final das contas, aquele que tinha tudo para ser um ano morno no esporte talvez tenha sido um dos mais importantes das últimas décadas. A ressaca pós-Copa foi acompanhada de um vendaval que rachou o status quo e colocou, sob nova perspectiva, o mercado do futebol.

Isso sem falar no que ainda vão se desenrolar as investigações sobre doping iniciadas na Rússia. Tal qual o castelo começou a ruir na América do Sul para o futebol, é muito provável que o esporte atinja novo patamar a partir do instante que combater, de forma sistemática, a burla de regras do doping, que envolve, como se vê no atletismo, pagamento de propinas a dirigentes para acobertarem as histórias.

No marasmo que geralmente caracteriza o ano em que não há Copa do Mundo e Jogos Olímpicos, será impossível, na cronologia do esporte, deixar 2015 para lá. Dentro das quadras, piscinas e campos, tudo correu mais ou menos como sempre, sem grandes feitos.

Mas, fora das competições, nunca houve tanta evolução num mesmo ano como esse que passou!

Agora é virar a página e começar 2016 com o espírito olímpico em dia. Para, daqui a um ano, podermos dizer “e que Olimpíada tivemos”! O blog, naturalmente, volta a falar de esporte e negócios na próxima semana, após uma pausa para recarregar as energias!

Bom Ano Novo a todos!


Efeito cascata provocado pela Fifa vai mudar o futebol
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Erich Beting

O efeito é cascata. Começou lá no 27 de maio com a prisão dos dirigentes e vai se ramificando mundo adentro. O fato é que, depois que ficou provada uma parte do esquema de corrupção que assola o futebol desde que TV e empresas passaram a pagar alto para ter os principais eventos, começou uma grande investigação sobre os negócios da bola em todo o mundo.

O escândalo da vez é na Itália. Por lá, a procuradoria descobriu que as empresas de mídia vinham fazendo vários adiantamentos aos clubes para que eles pudessem terminar o ano com o balanço financeiro no azul e, assim, continuar a disputar a Série A no ano seguinte. Em troca, os clubes favoreciam as empresas que faziam os pagamentos na discussão sobre a renovação dos direitos de TV (detalhes aqui).

Isso, aliás, poderá abortar de vez o já amalucado projeto da Liga dos Campeões das Américas trazido por aqui pela agência MP&Silva, envolvida no escândalo de futebol na Itália.

modus operandi não é muito segredo, mas agora os italianos conseguiram descobrir quem paga, quem recebe e tudo mais. É, a grosso modo, o mesmo que aconteceu com J. Hawilla e Traffic no começo do ano. Sabia-se como era o negócio, mas ninguém conseguia comprovar. A partir do momento em que o fio do novelo de lã começou a ser desenrolado…

O interessante é observar que a crise de imagem que atravessa o futebol será, no fim das contas, benéfica para o negócio. Antes, a Fifa dava o exemplo, para o mau, de como gerenciar as coisas. Pouca transparência, bastante arrogância e nenhuma preocupação de fato com o desenvolvimento do futebol eram alguns dos princípios básicos que regiam a entidade máxima do futebol.

Se o topo da pirâmide era assim, porque seria diferente nos outros lugares?

Isso gerou um modelo de negócios amplamente favorável à corrupção. Dirigentes remunerados por debaixo dos panos, empresas pagando mais por direitos que teriam menor valor, adiantamentos de verba para cobrir rombos em troca de favores. O modelo do futebol é ditado pela força econômica. Quem paga mais, leva.

Agora, porém, o sistema sofre uma mudança. O escândalo deflagrado nos EUA mostrou para outros países que há muito dinheiro desviado e sonegado por debaixo de alguns negócios da bola. Isso tem feito com que o futebol, como nunca antes aconteceu, comece a ser alvo de investigações mais severas por parte dos países.

A Itália é só mais um exemplo de como isso tem acontecido com maior frequência. E, caso os italianos consigam mostrar que, além dos contratos de patrocínio, os direitos de TV ainda representam uma caixa preta no universo da bola, fatalmente a faxina começará a ficar mais severa.

Imagine então o dia que as transações de jogadores no futebol passarem a ser o alvo das investigações?

A Fifa abriu a porta para que o futebol inicie uma faxina sem precedentes na história do esporte. Invariavelmente, toda crise traz melhorias para o ambiente de negócios. Com o futebol, não será diferente.


O futebol não tem espaço para um CEO
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Erich Beting

Durou pouco mais de três meses o trabalho de Alexandre Bourgeois como uma espécie de CEO do São Paulo. A saída do executivo sem ter tido tempo para apresentar minimamente qualquer resultado é só mais uma queda de um CEO no mercado do futebol. E deverá ser a realidade para qualquer novo executivo que queira se aventurar no cargo.

O problema não é do futebol em si, mas da cultura de empresa familiar que impera na maioria dos negócios no país.

O futebol, assim como a maioria das empresas, tem uma estrutura de gestão completamente centralizadora e cujas tomadas de decisão são feitas por um núcleo muito pequeno de gente, geralmente de confiança de quem está “no comando”.

Esse cenário é tão enraizado na cultura brasileira que é só acompanhar um pouco o noticiário de economia e negócios para perceber como o tema de “governança corporativa” é recorrente. As empresas procuram profissionalizar a gestão, trazem isso no discurso mas, na prática, a teoria é outra.

São poucas as corporações com faturamento similar ao dos clubes de futebol que possuem, em sua gestão, um corpo técnico altamente profissionalizado e não tenha ainda as principais decisões sendo tomadas com base no “feeling” do dono ou da família controladora da empresa.

Se já é difícil ver algo assim no mundo dos negócios, o que dizer de um ambiente ditado pela paixão e pela política?

A gestão no esporte tem quase todas as nuances da gestão pública. A sustentação do modelo não está no negócio, mas na política. Um presidente não é eleito e reeleito apenas pelos bons resultados apresentados. Sendo assim, colocar a figura de um CEO no esporte e esperar que, como mágica, tudo se torne profissional é tão difícil quanto imaginar que a solução para os problemas em qualquer governo seria colocar um executivo de mercado abaixo do presidente, governador ou prefeito e, com um excelente trabalho de gestão, tudo estaria resolvido.

No esporte, o maior erro que os dirigentes cometem, ajudados pela falta de conhecimento da mídia, é acreditar que, ao se colocar um CEO, os problemas de gestão serão rapidamente solucionados e, de uma hora para outra, o clube passará a obter desempenho esportivo e resultado financeiro.

Para que se profissionalize a gestão no esporte, não basta apenas ter um CEO. Se nenhum dos departamentos que são responsáveis pela existência do clube estiverem com profissionais que possam se dedicar integralmente ao negócio, o CEO será apenas um para-raio para a crise que vai acontecer invariavelmente numa entidade sem estar bem estruturada.

Essa é a mesma realidade encontrada pelos executivos em empresas de médio porte que decidem profissionalizar a gestão, mas ainda têm uma estrutura completamente centralizada no fundador da companhia, ou na família dele. Muitas vezes, o CEO não resiste à cultura familiar da empresa, que não abre mão da tomada de decisão centralizada e, mais ainda, não respeita toda a tecnicidade que o executivo possui.

No cenário do esporte, essa realidade é ainda mais crítica. O CEO precisaria, antes de tudo, ser político. Uma pessoa que teria de entender que a manutenção dela no cargo necessita de costura com quem é o dirigente “estatutário”, aquele que não recebe salário mas está todo santo dia no clube, influenciando as tomadas de decisão, mesmo sem ter qualquer comprometimento com a gestão.

É preciso, urgentemente, acabar com o mito de que um CEO é, obrigatoriamente, sinônimo de gestão profissional dentro de uma instituição esportiva. O cargo está longe de representar isso no ambiente corporativo, o que dirá então dentro do esporte, onde toda a estrutura de poder está atrelada à política, e não ao negócio.

O futebol não tem espaço para um CEO. Não da maneira como é hoje concebida a imagem dele.


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