Para que servem os Estaduais?
Erich Beting
O mundo caiu para Corinthians, Flamengo e Palmeiras no domingo, após as eliminações dos três times dos seus respectivos campeonatos estaduais. A queda no torneio local fez até o calmo ambiente corintiano transformar-se num mar de tormentas.
E a pergunta que fica é. Para que servem os Estaduais? Se o time ganha, mídia e torcida levantam a bandeira do ''não fez mais que a obrigação''. Agora, quando perde, o mundo desaba.
Existe hoje uma distorção muito grande na organização do futebol no Brasil. Por um lado, prega-se uma profissionalização extrema, mas por outro não se abandona o passado ''amador'' do esporte no país.
Pelas dimensões territoriais que temos, o futebol no Brasil se estruturou a partir dos Estaduais. Foi por causa das rivalidades locais que o esporte cresceu, se fortaleceu e se consolidou como o maior do Brasil.
Só que, hoje, a estruturação do futebol no país não permite que tenhamos a figura dos Estaduais. Pelo menos não para os clubes que estão no topo da pirâmide da bola.
Por questões políticas, hoje temos um Estadual com 23 datas espremido em três meses. No calendário atual do futebol, é uma aberração a temporada começar em ritmo tão arrasador. Já com Copa Santander Libertadores e Copa Kia do Brasil em disputa, a média é de um jogo a cada três dias logo na parte inicial da temporada. Prato feito para arrebentar os atletas. Seja agora, seja em dezembro, quando é a reta final de Brasileirão.
Para piorar, a partir do momento que mídia e público tratam como ''obrigação'' vencer o Estadual, ele se transforma num estorvo para o clube grande. O time precisa entrar com força total, especialmente na reta decisiva, e com isso deixa para um segundo plano a preparação para o Campeonato Brasileiro e até mesmo para a disputa da Libertadores ou da Copa do Brasil.
Hoje, as competições nacionais e internacionais são muito mais importantes para os clubes, em todos os sentidos. São essas vitórias que geram mais ''fama'' para a equipe, possibilita aumento no contrato de patrocínio, rende mais receita com bilheteria e até mesmo faz o jogador de maior qualidade desejar jogar por aquele time.
O Estadual faz parte de um passado importante do futebol no país, mas é preciso olhar para a frente. Se quisermos manter os principais atletas em atividade por aqui, é preciso tratá-los bem, dar condições de enfrentar grandes adversários em grandes jogos, criar um ambiente tão qualificado quanto lá de fora.
Mas, para isso, não basta mudar a mentalidade dos dirigentes. Pelo contrário. Muitos são favoráveis a dar mais descanso para os atletas e ter mais datas para realizar excursões, eventos para patrocinadores, etc.
O maior ranço para a manutenção de torneios deficitários e inchados vem da mídia, que promove os Estaduais pela necessidade de aumentar ou manter a audiência, os cliques, as vendas.
Em quase um mês ''de folga'', o Flamengo poderá mostrar quão interessante pode ser um mundo sem o Estadual.
Mais tempo de preparação da equipe para o Nacional, realização de partidas amistosas Brasil a dentro (excelente para divulgar e fortalecer a marca) e calma para trabalhar a cabeça dos atletas são alguns dos ingredientes que podem dar um doce resultado para o Fla no fim do ano.
Está claro que o futebol como negócio dos dias de hoje não pode comportar mais os Estaduais. Pelo menos não para os clubes que almejam muito mais do que serem o melhor de seu estado. Se quisermos ter o melhor futebol do mundo dentro de campo, temos de deixar o tradicionalismo de lado e trabalhar para melhorar a qualidade do espetáculo para o torcedor.