Negócios do Esporte

Romário, Ronaldo e as Copas do Mundo

Erich Beting

Os dois foram, desde Pelé, os mais importantes jogadores brasileiros em Copas do Mundo. Romário, em 1994, e Ronaldo, em 2002, foram os heróis do tetra e do penta, respectivamente. No último sábado, os dois craques da bola mostraram um pouco do que pensam (ou são levados a pensar) a respeito de o Brasil abrigar a Copa do Mundo.

A pergunta feita pela ''Folha de São Paulo'' era direta: ''O Brasil aproveitará o potencial da Copa?''.

Membro do Comitê Organizador Local, garoto-propaganda da Brahma na campanha ''Imagine a festa'', entre outras funções ligadas ao evento, obviamente Ronaldo foi quem falou sobre o ''sim'' (é possível ler o texto aqui). Romário, deputado federal e que adotou o discurso de não ter rabo preso com ninguém, deu sua versão sobre o ''não'' (texto disponível aqui).

 

Os dois têm sua parte de razão. A de Ronaldo limita-se ao fato de que, realmente, não tem como voltar atrás. A Copa será no Brasil. Romário, por sua vez, argumenta de forma consistente sobre o que poderia ter sido e não será, mas também incorre no erro de achar que a Copa tira investimento que seria usado em saúde ou educação, discurso tão batido quanto o de que o Mundial só trará benefícios para o país.

Como sempre foi dito aqui no blog, o maior problema da Copa no Brasil é a falta de planejamento e, sobretudo, execução. O evento pode ser um imenso catalisador de vários processos, mas desde que saibamos antes o que queremos ao sediar o Mundial. Esse foi o primeiro problema da Copa no país. Nunca soubemos, e arrisco dizer que ainda não sabemos, o que abrigar o evento pode trazer de benefício para o país.

Esse é o primeiro erro para que a Fifa deite e role em cima da organização do torneio em terra brasileira. A entidade impõe a vontade dela, exige estrutura suficiente para o evento, mas não para a realidade do país. O resultado é aquilo em que os discursos mais exaltados se apoiam: a Copa é ''para inglês ver'', com mais danos do que benefícios ao Brasil.

Depois do problema do planejamento, entramos na execução. Melhorias em aeroportos, vias públicas de acesso, infraestrutura hoteleira, atendimento na área de serviços, etc. Tudo isso foi vendido como ''legado'' da Copa. Mas o problema é que esse é um gargalo no Brasil dos anos 2010 que independe de qualquer megaevento acontecer no país.

Vivemos hoje num país que tinha projetado suas demandas para no máximo até os anos 1980. Não é por causa da Copa que temos de ter melhores aeroportos, mais facilidade no deslocamento urbano, melhores hospitais, oferta de hotéis e tudo o mais. É pelo fato de sermos hoje uma nação com quase o dobro de habitantes daquela em que quase tudo o que existe hoje foi construído.

Há uma clara incompatibilidade entre o Brasil de hoje com o tamanho e a ambição dos brasileiros de hoje. E isso fica evidente no debate que ainda cerca a Copa do Mundo. Tínhamos de discutir o aproveitamento do ''potencial'' da Copa há oito anos, quando a candidatura única do país para abrigar o Mundial de 2014 já se apresentava cristalina para quem era do meio esportivo.

Agora vamos fazer a Copa do jeito que é possível, e não da forma em que poderíamos usar o torneio para projetar para o mundo o Brasil que Ronaldo e seus parceiros comerciais tanto teimam em vender para nós.

Uma coisa é certa. Romário e Ronaldo combinam muito bem com Copa do Mundo. Mas só se for naquela Copa que o Brasil tem propriedade para dizer que ''entende'', que é a que acontece dentro de campo.

Fora de campo, é obrigatório ter humildade e reconhecer que apanhamos de goleada…