Negócios do Esporte

O ídolo nunca pode ser maior que o esporte

Erich Beting

Qual a importância de um ídolo para o desenvolvimento do esporte?

Essa pergunta volta-e-meia aparece nas palestras que tenho feito para falar sobre o esporte como negócio. O ídolo sem dúvida alguma é fundamental para que o esporte ganhe popularidade. Mas esse herói pode se transformar em vilão com o passar do tempo.

Explica-se. O risco que existe é o de o ídolo se tornar tão grande e tão forte que, no fim das contas, ele se torna maior que o esporte. Foi assim, por exemplo, com a Fórmula 1 no Brasil após Ayrton Senna. O ídolo atraía mais gente para a modalidade do que a própria competição entre os carros. Ou, então, com Gustavo Kuerten no tênis.

Quando o ídolo se transforma em algo além do esporte, ele acaba virando uma espécie de ''parasita''. Sem querer, é verdade, mas vira.

Ao atrair toda a atenção da mídia, dos fãs e, consequentemente, dos patrocinadores, o atleta vai blindando de certa forma o crescimento da modalidade. Com os recursos nele centralizado, fica mais difícil para que outros atletas consigam ter mais verba e, assim, uma melhor performance. E, no médio prazo, quando o ídolo começa a entrar em declínio técnico, a modalidade como um todo perde o interesse da mídia, do público e dos patrocinadores.

Muito dos apuros que hoje passam alguns esportes no Brasil tiveram origem na presença de um ídolo que era mais forte que a modalidade. No fim do mês, o judô brasileiro conseguiu seu melhor resultado na história dentro de um Mundial. O desempenho mostra claramente o benefício do esporte em não depender só do ídolo.

Nos anos 90, o judô ficou calcado na imagem de Aurélio Miguel, e nada mais foi feito para desenvolver outros ídolos, apesar de ótima performance brasileira nos tatames (Rogério Sampaio e Carlos Honorato são dois bons exemplos disso). Um dos segredos da atual gestão da CBJ é não apostar as fichas em cima da imagem de um único atleta, procurando desenvolver o judô como um todo. Além de dividir de forma mais igualitária a receita, essa estratégia permite que o desempenho esportivo não dependa de um ou outro nome.

O maior risco que corre hoje o UFC no Brasil é não achar substitutos para Anderson Silva. O fanático pelo esporte vai consumi-lo de qualquer jeito. Mas o torcedor comum, hoje, vê no lutador alguém maior que a modalidade, mais ou menos como foi Mike Tyson para o boxe nos anos 80/90.

O ídolo é importante para promover uma modalidade. Mas ele não pode ser o único a alavancar o esporte. Do contrário, quando ele parar, o ciclo de crescimento da cadeia produtiva daquela modalidade vai ruir.