A lenta agonia da São Silvestre
Erich Beting
Foram 22.502 concluintes da edição de 2013 da prova. Estiveram presentes 11 patrocinadores, sendo apenas duas empresas estatais nessa conta. Mas, aos poucos, a corrida de São Silvestre começa a agonizar. Porque, aos poucos, a corrida de rua mais popular do mundo vai se distanciando daquilo que era o grande barato dela, que era o não-corredor, o não-atleta, o ''mero'' espectador.
Concebida nos anos 30 para ajudar a Gazeta Esportiva a ter o que noticiar na edição de 1° de janeiro, a Corrida de São Silvestre ganhou o mundo por ser exatamente a única atividade esportiva profissional da virada do ano. O que fez a fama dela foi exatamente ser algum bom acontecimento para o público num dia em que raramente há algo para nos entreter além da arrumação da festa de fim de ano.
Há dois anos, a direção da prova tomou a tacanha decisão de retirar da Avenida Paulista a chegada da prova. Na ocasião, escrevi que aquilo iria significar a morte da São Silvestre (leia, ou releia, clicando aqui). No ano passado, a decisão foi revista, mas os organizadores tiveram então a ideia de mudar o horário da largada. Em vez de fazer a prova no período da tarde, ela passaria para a manhã. Com isso, não haveria mais tanto atropelo na chegada dos atletas da São Silvestre com o público da festa de Reveillón na Paulista.
Só que essa mudança de horário tirou da São Silvestre o contato com o público não-aficionado pela corrida. Em 2011, último ano da prova no período da tarde, a audiência da transmissão da Globo foi de 19 pontos, na medição do Ibope. Isso significa algo em torno de 3,3 milhões de pessoas sintonizadas, acompanhando a cerca de uma hora de transmissão da corrida.
Neste ano, a Globo somou 9 pontos no Ibope durante a transmissão da prova. No ano passado, a audiência havia sido de 8 pontos. No total, a edição de 2013 da São Silvestre foi vista por 1,8 milhão de pessoas, pouco mais da metade do que havia assistido em 2011.
A tradução dessa numeralha pode ser feita no diálogo durante o café da manhã do dia 31 de dezembro em família:
O cunhado pergunta: ''Quem ganhou a São Silvestre?''
Eu respondo: ''Dois quenianos. No masculino e no feminino''.
A sogra intervém. ''Nossa, já foi a prova?''
Sem o apelo da TV, a São Silvestre vai virar mais uma prova como todas as outras que acontecem no calendário brasileiro. E, assim, as pessoas que decidiam sair do sofá na letargia pré-Reveillón ao assistir a prova ainda não terão nem saído da cama quando algum queniano cruzar a linha de chegada na primeira posição…
O futuro da São Silvestre, infelizmente, parece ser o mesmo do seu criador, o jornal ''Gazeta Esportiva''.