A Copa, 16 anos depois…
Erich Beting
A última lembrança que tenho de uma Copa do Mundo no Brasil é em 1998. Sim, não endoideci nem mesmo você, caro leitor. O fato é que o Mundial da França foi o último que, para mim, teve aquele sabor de ''Copa do Mundo no Brasil''. Algo que é tão característico e cultural no nosso país e que, para mim, sempre foi o que mais me magnetizou e me levou a trabalhar com isso.
E é justamente por conta do trabalho que, só agora, consigo reacender a chama de ver uma Copa no Brasil.
Em 2002, com a bola rolando lá do outro lado do mundo, o país não parava para assistir aos jogos. Apenas acordávamos mais cedo, ou nem dormíamos. Mas interromper o trabalho, mudar o planejamento do dia por conta daquele Senegal x Dinamarca imperdível, achar um jeito de esticar o pescoço na mesa de reunião para ver a TV colocada na recepção… Tudo isso ficou anestesiado na conquista do penta. Não aconteceu. Chegávamos às 12h para trabalhar, com aquelas olheiras de quem dormiu menos que o Luis Roberto, se é que isso era possível.
Aí veio o grande sonho de infância realizado. Em 2006, consegui carimbar, aos 45 do segundo tempo, o passaporte para realizar a primeira cobertura in loco de uma Copa! Embarquei cinco dias antes de a bola rolar na Alemanha, com a alegria de uma criança indo para uma viagem em férias. Quatro anos depois, cheguei a Johanesburgo seis dias antes de o Tchabalala fazer aquele golaço na abertura do Mundial sul-africano.
Essas duas experiências me ensinaram um pouco a dificuldade que deve ser viver como um expatriado. Ficar longe da cultura que marcou sua vida, dos amigos, da família, das celebrações. Ainda mais numa Copa do Mundo, evento que sempre moldou e guiou grandes acontecimentos do ponto de vista pessoal, desde o rojão estourando no ouvido no maldito Brasil x França de 86, ou na bronca da Tia Márcia por não falar de outra coisa a não ser de Copa em maio de 1990, passando pela festa adolescente em 94 e a de início de fase adulta em 98…
Uma Copa do Mundo longe do Brasil é muito legal, mas completamente diferente de tudo o que nos acostumamos a viver desde pequeno. Esqueça a rua pintada de verde e amarelo. Nem pense que tudo vai parar para ver o Brasil jogar. Nem mesmo nas ruas os comentários são só sobre o que realmente importa naquele momento…
Reencontrar-me com a Copa do Mundo no Brasil, 16 anos depois, é poder relembrar um pouco da infância. Colocar a bandeira no carro, na janela, no vidro do banheiro. Fechar a rua e pintá-la. Tudo isso faz parte da nossa cultura. É algo com o qual nos deparamos desde que nos conhecemos por gente.
Celebrar a Copa não é ser alienado. É ser genuinamente brasileiro. Reencontrar com o clima de Copa, mesmo que tardio, 16 anos depois, é poder voltar a celebrar a brasilidade muitas vezes sufocada pelos dilemas e definições que temos pela frente.
A Copa chegou. Nunca vivemos a situação de ter de construir o evento no país. Aprendemos bastante com isso e precisaremos usar esses ensinamentos para evoluir como nação. Não podemos descarregar só no técnico da seleção brasileira ou na Fifa a nossa indignação com as coisas que são erradas. Um país evoluído é crítico. Uma pessoa evoluída é crítica.
Mas para podermos cobrar, temos também de conhecer nossa cultura. E, pelos próximos 32 dias, viveremos uma manifestação que é parte de nossa raiz. A Copa chegou e a festa vai se espalhar por todo canto. Foram 16 anos para voltar a viver essa sensação. Com todos os defeitos típicos de nosso país, vai ter uma baita diversão. Ou melhor. Ela já começou. E o clima vai ficar ainda mais quente nos próximos dias. Em