Negócios do Esporte

Qualquer Copa latina será a melhor da história

Erich Beting

''A Copa das Copas''.

O slogan que o governo federal tentou embutir para a Copa do Mundo parecia, até o apito inicial para Brasil x Croácia, uma conversa de lunático. Hoje, após o término das duas primeiras rodadas do Mundial, estamos vivendo, realmente, uma Copa do Mundo como há muito tempo não se via. Para a minha geração, muito possivelmente é a Copa das Copas de fato.

Os dois principais elementos que compõem a Copa das Copas, porém, tem muito mais a ver com situações conjunturais do que propriamente com o esforço e o preparo brasileiros para receber o evento.

Dentro de campo, o futebol prova a sua capacidade de retroalimentação. No pior momento da história fora de campo, com a Fifa envolta até o pescoço em suspeita de compra de votos, com diversos desmandos na congestão do futebol brasileiro e afins, temos um espetáculo dentro dele. Raros são os jogos com os times jogando para não perder. Raras são as vezes em que é previsível o que acontece nas quatro linhas.

Fora dele, porém, a sensação é de que temos muito mais capacidade do que havíamos imaginado. Sim, estamos muito mais bem preparados do que supúnhamos. Os aeroportos passaram com louvor nos testes até agora. A hotelaria está aguentando o tranco (quando o preço fica proibitivo, o torcedor dá um jeito e dorme por aí).

E o turista está fazendo uma baita de uma farra num país com inverno quente como o nosso e receptividade raramente vista em outros lugares. O turista, aliás, que é o principal elemento para fazer com que essa seja a Copa das Copas.

É tudo isso que compõe os ingredientes que tornam o evento, até agora, tão especial. Não é só o espetáculo dentro de campo, mas a relação do torcedor com a Copa. E isso, sinceramente, é algo que tem muito mais mérito na relação do povo latino com o futebol do que realmente com o Brasil.

O fato é que tínhamos nos esquecido de como a realização de uma Copa num país da América Latina é especial. A região é, disparada, a que mais gosta e transpira futebol no mundo. E isso encontra a sua mais perfeita tradução no Mundial de 2014, com todas as virtudes e defeitos do sangue latino no planeta bola.

A última vez que um país latino-americano abrigou a Copa do Mundo foi o México, em 1986. Longínquos 28 anos se passaram desde que o mundo conheceu, pela primeira vez, a ''ola''. O leitor mais novo não se recorda, mas foi nos estádios mexicanos que começou a mania de fazer a onda que percorre a arquibancada inteira, numa nítida celebração das pessoas pela alegria de ver a um jogo de futebol.

Mas, em 1986, o futebol não estava tão conectado quanto agora. As distâncias entre os países eram as mesmas, mas os abismos econômicos tornavam muito mais difícil para que os torcedores se deslocassem com tanta facilidade de um continente a outro. A partir de 1994 é que a Copa do Mundo passou a ser um evento também para o mundo dentro dos estádios, e não apenas restrito aos torcedores locais.

E, desde 1994, estamos longe de ter uma Copa num país da América Latina. Agora que a Copa veio para cá, é que percebemos o quanto argentinos, mexicanos, colombianos, uruguaios, equatorianos, costarriquenhos e, claro, brasileiros são tarados por futebol. A ponto de invadir o estádio por não ter ingresso, ou então de dormir na praia para não perder a chance de ir ao jogo pelos proibitivos preços da hotelaria selvagem do Rio de Janeiro.

A Copa de 2014 está sendo a Copa das Copas não por mérito do trabalho brasileiro em receber o evento, mas pela paixão latina pelo futebol e pela Copa do Mundo. O que a torna mais mágica é que, dentro de campo, parece que essa paixão contagiou os jogadores. E, assim, temos um Mundial como há muito não se via.

A Fifa aboliu a ideia de rodízio de continentes para fazer a Copa do Mundo. Pelo bem do seu produto, deveria, pois, começar a pensar em fazer pesquisas de opinião para saber em quais regiões do mundo seria mais interessante para o público receber o evento. O único risco é que, a partir de então, todas as Copas sejam na América Latina.

Sem dúvida não há lugar mais apaixonante para se fazer um Mundial…