Estaduais não são o problema, mas todo o restante
Erich Beting
O problema maior não são os Estaduais, afinal. Os campeonatos locais foram a base de sustentação do futebol no Brasil. No início dos anos 1900, foram esses os torneios responsáveis pelo princípio de organização do futebol no país. Com as dimensões continentais do Brasil, nada mais natural que os clubes jogassem, primeiro, em suas redondezas. São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Minas Gerais. A partir daí começou a expansão dos campeonatos estaduais de futebol pelo país.
Brasileirão, mesmo, só foi começar a ter a partir dos anos 70, quando a expansão interna promovida pela ditadura acelerou a construção de estradas e aeroportos, fazendo com que fosse menos difícil jogar um dia no Oiapoque e outro no Chuí. Além do fato de o governo militar querer ampliar o sentimento nacionalista, o que tornava de certa forma natural se construir um campeonato que reunisse times do país todo, ou de quase todo o país.
Por conta disso, os Estaduais são parte importante da cultura de futebol do Brasil. Foi com base nele e nas rivalidades locais que construímos a base da paixão, algo tão fundamental para que o futebol arrebate milhões e leve multidões a estádios, TVs e tudo o mais. Acabar com os Estaduais é, enfim, negar a própria história e sustentação do futebol no país. E é uma decisão errada.
Os Estaduais são um sucesso, é só ver o que foram as últimas semanas, quando eles entraram em sua fase decisiva. Estádios lotados, audiência alta na televisão, mídia focada em comentar os jogos, as conquistas, os heróis e vilões. É algo tão atrativo que, em 13 partidas nas novas arenas, foram mais de 400 mil pessoas aos jogos e R$ 19 milhões em geração de receita de bilheteria (detalhes aqui).
O problema é que, para chegarmos a quatro jogos atrativos, são necessárias outras 15 partidas completamente entediantes. Isso na conta individual! Quando elevamos para a proporção de que cada Estadual tem, pelo menos, 16 times na disputa, chegamos a quase duas centenas de jogos inúteis para apenas 15 a 20 partidas realmente atrativas para o público, a mídia e os patrocinadores.
Os Estaduais não podem acabar, mas também não podem continuar do jeito que estão. Hoje, eles servem para massacrar o começo de temporada dos grandes clubes e tentar fazer com que apareçam algumas equipes menores. Com três meses para 19 datas, é humanamente impossível de as duas coisas acontecerem de maneira coerente.
Os Estaduais não são o problemas, mas os dirigentes que os comandam precisam, urgentemente, buscar uma nova fórmula para fazer com que a competição que deu origem ao futebol no Brasil não seja tão maltratada como tem sido. Poderíamos ter tido três meses de festa, e não três semanas…