Escolha de chefe de delegação escancara o estilo Del Nero
Erich Beting
A escolha de um desafeto do governo de Dilma Rousseff para chefiar a delegação brasileira na Copa América é o primeiro gesto mais contundente de Marco Polo Del Nero à frente da CBF, em menos de um mês como presidente da entidade. Depois de prometer tentar barrar a aprovação da Medida Provisória 671, que joga duro contra os clubes em busca de uma renegociação da dívida com o governo, Del Nero mostra que não quer diálogo com o Planalto.
A escolha de João Dória Jr. para o cargo de chefe da delegação é um recado. A função que o empresário e jornalista exercerá em Santiago deve ser muito mais escolher bons vinhos para os jantares dos dirigentes brasileiros do que realmente representar a CBF em reuniões protocolares.
A CBF não precisa de mais patrocínio, ou pelo menos não precisa do bom relacionamento de Dória com o empresariado para conseguir um. Da mesma forma, o empresário não precisa da CBF para ganhar mais holofote, apesar de o futebol sempre ajudar na promoção das pessoas.
A pergunta, que sempre aparece quando se anuncia o chefe de delegação de uma seleção brasileira é exatamente a mesma. Mas, afinal, o que faz tal pessoa?
Nos primórdios do futebol, o chefe de delegação era o cara que deixava tudo mais ou menos ajustado para o time disputar a competição. Ele se reunia com os dirigentes de outras entidades, cuidava dos bastidores e outras necessidades. Com a profissionalização que há hoje, mesmo em se tratando de um torneio organizado pela Conmebol, o chefe de delegação é praticamente uma figura protocolar. Vai a encontros de dirigentes, mas praticamente não participa de nada além de eventos paralelos à competição em si e à rotina da seleção.
Por isso mesmo, tanto faz se irá Dória Jr. ou um cone ''chefiar'' a delegação brasileira.
Del Nero já havia colocado Walter Feldman, político que era do PSDB e crítico do PT, para ser uma espécie de principal executivo da CBF. Uma de suas funções é usar a influência que tem no Congresso para articular em favor dos interesses da entidade e do futebol com os políticos, especialmente os de oposição ao governo, com quem Feldman tem ótimo trânsito.
Agora, o recado é outro. Dória fez campanha por Aécio Neves nas eleições, promovendo encontro do candidato com representantes do empresariado nacional. A aproximação a alguém ''de mercado'' é uma forma de mostrar que não haverá brecha para diálogo com o governo também por parte da CBF.
Del Nero traz consigo uma característica que era marcante em João Havelange. Apesar de negar veementemente que futebol e política se misturavam, o antigo presidente da CBD (a predecessora da CBF) e da Fifa sabia como poucos usar a influência do esporte sobre os políticos para realizar diferentes manobras em favorecimento das entidades que comandava.
O atual mandatário da CBF não costuma se apressar em negar a relação entre política e futebol. Mas sabe, como poucos cartolas da atualidade, a importância que tem, nos bastidores, saber jogar também o jogo da política.