Escândalo na Fifa pode mudar relação de patrocínio no esporte
Erich Beting
O ultimato que os patrocinadores da Fifa deram ao pedir a renúncia imediata de Joseph Blatter da presidência da entidade mostra o quanto o patrocinador pode interferir na gestão do patrocinado. Mas o ponto é. Por que só agora?
Quando assinaram seus contratos com a Fifa, as empresas sabiam muito bem o terreno onde estavam calçando suas chuteiras. Sempre houve um abismo entre o que era a Copa do Mundo e o que a Fifa representava como entidade. As marcas sabiam disso, mas aceitaram essa regra em nome do ''jogo bonito'' da Copa do Mundo. Ou seja. Apesar da Fifa, o negócio era vantajoso pelo que representa a paixão do torcedor pelo Mundial.
Mas até onde vai o ''direito'' do patrocinador de ficar alheio à situação da entidade? Como ele pode se permitir fechar os olhos para toda uma má gestão na entidade que patrocina em nome do benefício da relação com o consumidor e sua enorme paixão pelo evento esportivo?
A pressão que os patrocinadores fazem agora na Fifa soa, no mínimo, contraditória. Por que Blatter não é bom para a entidade só agora? E nos últimos 17 anos, quando negociaram seus contratos com o mesmo dirigente, não havia problema?
Dos cerca de US$ 5 bi que a Fifa arrecada a cada ciclo de Copa do Mundo, cerca de 40% vem dos patrocinadores. São essas empresas que ajudaram a criar uma imagem de soberania para o Mundial, emprestando sua credibilidade como marca para o evento que hoje é mais forte até mesmo do que elas.
A crise de agora, porém, pode ser uma espécie de ponto de virada na relação patrocinador-patrocinado.
Os patrocinadores sempre souberam da bomba-relógio em que estavam metidos ao entrar para a ''Família Fifa''. Mas só começaram a reclamar e pressionar quando, publicamente, as feridas da entidade começaram a ser expostas. Primeiro, na conturbada escolha do Qatar para abrigar a Copa de 2022. Depois, com a revelação de péssimas condições de trabalho para os operários daquele país. Agora, com o escândalo que acaba com a reputação da ''Família''.
As marcas só foram para o ataque ao serem atacadas por seus acionistas, preocupados com a reputação da empresa ao se associar com uma entidade tão sem escrúpulos quanto a Fifa e seus dirigentes. Agora, a faxina faz-se necessária não pelo bem do jogo, mas pelo bem da própria patrocinadora.
Os fãs continuarão a ser apaixonados pela Copa do Mundo. Apesar da Fifa e de seus dirigentes. Mas as marcas não podem compactuar com esse ''apesar''. Pelo menos se quiserem manter a boa imagem frente à sociedade.
Muitas dessas marcas patrocinadoras possuem severos manuais de conduta que exigem, de algum fornecedor ou funcionário, uma imagem e um passado limpos para permitir fazer algum negócio entre eles. Por que o mesmo não se aplica ao patrocínio? Só agora, quando a imagem de sujeira começa a respingar na conta da empresa, que aparece a reação contrária?
O escândalo da Fifa pode servir como lição para mudar o comportamento de quem aporta dinheiro no esporte. O poder econômico tem força suficiente para interferir na gestão da entidade patrocinada.
O primeiro caminho que as marcas deveriam adotar para escolher um patrocínio seria ver, no patrocinado, princípios éticos e imagem ilibada. Isso sim seria bom para o jogo. Dos negócios e da bola.