Negócios do Esporte

O que fizemos nos últimos três meses?

Erich Beting

Dentro de um período de três meses cabem 1.440 jogos de futebol. Isso também é o equivalente ao tempo de carreira de um jogador como Zé Roberto, que parece ter fôlego infinito para jogar bola.

Durante três meses, o futebol brasileiro viu uma imensa oportunidade para surgir uma nova liderança.

Marco Polo del Nero precisou se afastar da presidência da CBF, tendo de responder a investigação na Fifa e na Justiça dos EUA, impossibilitado de viajar e preocupado mais com a própria defesa do que com o futuro do futebol brasileiro.

Nesse período, o máximo que os clubes (tidos como a tábua de salvação para o futebol brasileiro) conseguiram foi fazer um acordão com as federações estaduais para organizar a Copa da Primeira Liga, torneio que ficou sem pé nem cabeça no meio de um calendário já inchado.

Durante três meses, os clubes não conseguiram minimamente se preparar para mudar. Em vez de se organizarem e mobilizarem para falar mais grosso na relação com as federações e confederações, se perderam numa negociação sobre direitos futuros de transmissão do Brasileirão. Não por estarem planejando o cenário após 2018, mas por estarem desesperados atrás de dinheiro novo para pagar a conta de 2016, que já tem o acumulado de 2015, 2014, 2013…

Durante três meses, os atletas não se organizaram minimamente para fortalecerem seu movimento que pede melhorias e mais bom senso no futebol. Voltaram-se para seus compromissos com a bola, ignorando os cinco meses de salário atrasados na Portuguesa, ou diversos desmandos de dirigentes, clubes e coronéis espalhados pelos rincões do país.

Durante três meses, os gestores esportivos não se uniram para exigir mudanças. Para propor menos mudanças de comando que geram muito desmando, para cobrar mais comprometimento dos dirigentes, para exigir melhores condições nos gramados dos estádios, para propor melhores condições aos torcedores, para transformar o futebol no produto de entretenimento que um dia ele ainda será.

Durante três meses, os patrocinadores não fizeram uso da força econômica para exigir melhorias no produto onde eles investem milhões e precisam de retorno. Não cobraram explicações para a desordem na CBF, não cobraram os dirigentes por aceitarem horários estapafúrdios para o início dos jogos, que afasta público dos estádios e da TV, não exigiram um melhor tratamento ao consumidor do futebol.

Durante três meses, nós da imprensa não nos organizamos minimamente para elevar o debate, para questionar os coronéis (Nunes e quetais), propor novos ares na gestão esportiva, investigar trocas de favores para manter o status quo, impulsionar a criação de um debate que de fato tirasse da zona de conforto a cartolagem furada do comando da bola.

Quem se mexeu nos últimos três meses?

A CBF criou comitês para discutir reformas e melhorias, deu mais autonomia a gente do mercado no comando de áreas estratégicas, como os departamentos de marketing e de competições, buscou algumas alternativas para tentar, enfim, dar uma nova cara para uma desgastada instituição.

Sim, temos o péssimo futebol do time brasileiro pelo caminho. Sim, saíram alguns patrocinadores de renome como Gillette, Michelin e Sadia (todos por mudança de política de investimento da empresa). Sim, algumas decisões do comitê de gestão da CBF são histórias que nem o Gustavo, meu filho de dez meses, acredita ser para valer. Sim, o Coronel Nunes foi uma piada de péssimo gosto durante os últimos três meses.

Mas, por mais incrível que possa parecer, quem de fato se mobilizou nos últimos três meses para mudar um pouco aquilo que é feito no futebol foi a CBF. Tivemos um vácuo de liderança da bola como há 30 anos não se via no país. E o que fizemos para preenchê-lo?

Não adianta espernear pela volta de Del Nero. Ele, naturalmente, sempre foi o presidente da CBF nos últimos três meses…