Negócios do Esporte

O Brasil merece a Copa do Nordeste
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Erich Beting

''O Nordeste merece'' é o slogan que permeou a criação do primeiro canal por assinatura voltado para uma região específica do país. O lançamento do Esporte Interativo Nordeste neste começo de ano foi uma das gratas surpresas de um dos mais consistentes projetos de canal esportivo no país.

Na noite de quarta-feira, mais de 60 mil torcedores lotaram o estádio do Castelão para acompanhar a grande decisão entre Ceará e Sport, pela Copa do Nordeste. O título do Sport coroou o mais interessante torneio que o futebol brasileiro conseguiu produzir nos três primeiros meses do ano.

Mas quais os segredos do sucesso da Copa do Nordeste?

Para começar, essa é uma das poucas competições no país com um ''dono''. Os clubes nordestinos assumiram, para si, a gestão do torneio. A CBF fica responsável pela gestão técnica. E, a grande sacada, cabe ao Esporte Interativo os direitos de comercialização do evento. Com isso, o Nordestão é um dos poucos campeonatos em que há uma negociação coletiva de propriedades comerciais.

Sem ter uma liga gestora da competição, coube ao parceiro de mídia tomar conta da gestão dos patrocínios do evento. Até aí, nenhuma grande novidade. Isso acontece, sem sucesso, com a Globo na Stock Car, no NBB e na Superliga de vôlei.

O lado bom, no caso da Copa do Nordeste, é que o DNA do Esporte Interativo é de uma agência de marketing esportivo. Os sócios foram quem, no começo dos anos 2000, gerenciaram comercialmente a Liga do Nordeste e, também, a Copa Coca-Cola, entre outros eventos, com a bandeira da Top Sports.

A mudança da Top para a Esporte Interativo, a partir de 2005, marcou também a mudança no conceito de um canal de TV com programação 100% de esporte. Com a volta do Nordestão, em 2010, surgiu para o EI a chance de voltar a fazer o que foi a origem da empresa e, mais do que isso, a começar a trilhar um caminho de domínio do mercado esportivo dentro do Nordeste.

A ressurreição da competição tem muito a ver com o grau de importância que o campeonato passou a ter. Com os Estaduais enfraquecidos e deficitários, os clubes de maior torcida passaram a ter no Nordestão a tábua de salvação esportiva e financeira.

A Copa do Nordeste é, para os times grandes da região, o grande torneio para se disputar no início da temporada. Inteligentemente, a CBF fez com que o campeão passasse a ter vaga na Copa Sul-Americana, criando mais um atrativo esportivo para o torneio.

Pelo Nordeste, é bem capaz que o Brasil comece a fazer, de vez, com que o futebol tenha competições mais atrativas e rentáveis. A Copa do Nordeste, hoje, é um campeonato que não apenas a região merece, mas o Brasil inteiro.

O show desta quarta-feira no Castelão foi só mais uma prova disso.


Os dilemas que envolvem o novo patrocínio do Corinthians
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Erich Beting

O Corinthians fechou um novo patrocínio para a camisa, com a CityLar, que estará no ombro do uniforme do Timão (leia aqui os detalhes). O negócio representa o primeiro da nova equipe de marketing do clube. E, por isso mesmo, envolve uma série de fatores que podem, lá na frente, desencadear uma nova realidade para o clube paulista.

Foi o mesmo Corinthians, com o projeto de contratar Ronaldo, que abriu espaço na camisa para o patrocínio de diversas marcas. O loteamento do uniforme pagou seu preço. Enquanto o Fenômeno esteve no clube, os espaços foram preenchidos e bem remunerados. Mas, mesmo assim, a cada ano mudavam os patrocinadores. Quando o atacante se aposentou, as renovações já não foram tão boas, e depois da conquista da América, em 2012, foi quase meio ano na busca por um patrocinador principal, até praticamente a disputa do Mundial de Clubes, quando a Caixa entrou.

Nesse intervalo de tempo, o mercado de patrocínio no futebol assistiu de tudo um pouco. Marcas importantes, com projetos de médio/longo prazo, foram deixando as camisas. Samsung, LG, Petrobras, etc. Outras, de atuação nacional e sem uma estratégia de marketing bem definida com os patrocínios, aceitaram entrar nos clubes e dividir espaço com várias outras marcas.

Isso elevou o valor pago aos times e reduziu a eficiência do patrocínio. Resultado: em quatro anos, o mercado subiu e desceu, tanto que hoje os clubes penam para encontrar patrocinadores.

Depois de causar todo essa reviravolta no mercado, o Corinthians havia começado a reparar o erro. Em vez de muitos parceiros, começou a reduzir o número de marcas no uniforme e a valorizar o que é sua principal propriedade, que é a própria camisa. Com isso, o clube havia limitado os parceiros a Caixa, Fisk e Tim. Conseguiu mais dinheiro dos três (R$ 45 milhões) do que no auge de Ronaldo (cerca de R$ 40 milhões com seis espaços comerciais).

A entrada do CityLar marca um novo desafio para o novo departamento de marketing do clube. Internamente, é uma excelente forma de o novo grupo mostrar eficiência. Em menos de um mês, já tem um novo parceiro comercial no Corinthians. Mas, paralelamente, isso cria um desafio. Como reagirão os patrocinadores atuais? Comprovadamente, existe uma desvalorização da exposição pelo excesso de marcas diferentes no uniforme. Isso pode desagradar os parceiros e gerar um decréscimo na renovação do contrato.

A necessidade de dinheiro em caixa e de mostrar serviço logo de cara existe, mas é preciso pensar no longo prazo. Ao que tudo indica, a nova diretoria de marketing do Timão, no afã de preencher as obrigações de curto prazo, deu um passo para trás. Que só será sentido em cerca de dois anos.


O esporte tem de buscar o fã, não o fanático
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Erich Beting

''Mire o fã, não o fanático''. Essa é a frase de impacto de um anúncio de uma agência de marketing esportivo num semanário sobre o tema nos Estados Unidos. A mensagem não poderia ser mais clara e direta. No esporte, o importante não é buscar o fanático, mas o fã. E esse talvez seja, hoje, a grande miopia do esporte no Brasil. Não percebemos, ainda, que o importante não é falar com quem já é cliente, mas com quem tem vontade de ser!

O fanático, por excelência, é aquela pessoa que consome o esporte independentemente da situação em que ele esteja. É, no melhor exemplo dos dias atuais, o consumidor de um estádio de futebol. Ele vai lá por amor incondicional ao time pelo qual torce. Se não tivesse esse sentimento, ele estaria afastado dos estádios, que pararam nos anos 70 e não se reciclaram desde então (a maior procura pelos estádios novos e/ou remodelados para a Copa é mais um reforço disso).

Mas o que fazer com quem não é fanático? A parcela de fãs que existe no esporte é muito maior do que a de fanáticos. Como em qualquer segmento, aliás. Sendo assim, é o fã que precisa ser mais bem tratado para estar próximo e consumir. E é o fã que foi, nas últimas décadas, deixado de lado por quem comanda o esporte.

O fanático é o jornalista esportivo, o torcedor organizado, o dirigente amador, o próprio atleta, o leitor de todas as possíveis notícias sobre seu time, ídolo e ou esporte favorito, muitos patrocinadores. Como são esses hoje os principais responsáveis pela indústria do esporte no país, não se percebe que é preciso mudar o foco.

Seja no futebol, no basquete, no vôlei ou até mesmo na Fórmula 1, não há nada de novo, no Brasil, para engajar o consumidor que tem uma apreço pelo esporte, mas também tem apreço por diversas outras opções de entretenimento. Nos últimos anos, esse cara foi sendo seduzido pelas outras atividades de lazer, e o esporte foi deixando de ter tanto espaço no cotidiano.

Sem competições de alto nível para acompanhar, sem plano de exposição permanente na mídia, sem projetos para que novos talentos surjam, sem planos de criação de uma liga nacional forte (como prova o vôlei), sem opções atraentes de consumo do evento ao vivo, é impossível reter o fã.

O grande barato de uma Copa do Mundo, por exemplo, é que ela é um evento para o fã, e não apenas para o fanático.

O cara que é tarado por futebol tem como regra colecionar álbum de figurinhas, saber de cor a escalação da Coreia do Sul, a campanha da Bélgica nas Eliminatórias, as dificuldades enfrentadas pela Argélia para se classificar, o potencial craque da Copa do time de Honduras.

Mas os bilhões que a Fifa acumula em patrocínio, direitos de TV e venda de produtos licenciados são oriundos daquele cara que sabe quem é o Messi, o Cristiano Ronaldo e, claro, comprará a camisa do Brasil para torcer pelo Neymar. Mas, para ele, quem diz que a Bélgica é candidata a beliscar, quem sabe, uma semifinal, é apenas um metido a entendido de futebol (e, quase sempre, o desempenho em campo prova que ele está certo!)…

Enquanto o foco das ações no esporte não for para esse tipo de consumidor, vamos continuar a ter uma indústria esportiva limitada no país. Não precisamos de uma Copa do Mundo ou de Jogos Olímpicos para tornar o esporte maior. Precisamos ajustar o foco das ações. É preciso mirar o fã. O fanático, mesmo vendado, vai querer consumir. Só que ele representa, estatisticamente, uma fatia muito menor da população.


O público prova o valor do Estadual
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Erich Beting

Só na Bahia e no Rio Grande do Sul as finais dos Estaduais tiveram mais de 30 mil torcedores no estádio. O levantamento do público presente ao primeiro jogo decisivo dos campeonatos locais pelo país evidencia o óbvio. Para o torcedor, o Estadual em si é entediante.

Os motivos são os mais variados, mas refletem uma nova realidade no país, que se evidencia desde que o Brasileirão passou a ocupar 8 meses do ano e os Estaduais foram espremidos em apenas 3 meses. O modelo que sustentou por seis décadas o futebol no Brasil, antes mesmo de a modalidade ter alcance nacional, não tem mais razão de ser.

Quando o calendário do futebol era dividido em dois semestres, os Estaduais ganhavam importância. Durante meio ano, eles eram, ao lado da Libertadores e da Copa do Brasil, principal motivo de interesse do torcedor e dava relativo dinheiro para os clubes. Quando o Brasileirão passou a ser disputado por pontos corridos, a importância do Estadual foi reduzida. Não só pelo maior apelo da competição nacional, mas também pela questão financeira. Com o dobro de datas, o Brasileirão passou a representar, só em receita de TV, um aumento de mais de 100% de receita, lá em 2003. Com mais jogos entre times de maior torcida, também, aumentou a receita em bilheteria no longo prazo, além de promoções com empresas (entre 2005 e 2008 a Nestlé patrocinou a competição, por exemplo).

Hoje, os Estaduais viraram um estorvo.

Para os clubes pequenos, eles representam 3 meses em que a vida é colocada em jogo. Para o atleta e para o clube, chegar um pouco mais longe é questão de sobrevivência.

Para os clubes de maior torcida, eles viraram um problema. Chegar até as finais não os assegura os louros da vitória. Perder antes da decisão é um caos. Além disso, decidir um título com menos de 3 meses de temporada é algo que desgasta completamente os atletas.

Como não há volta para o Estadual mais longo, é preciso repensar a função dele para os clubes. É, mais ou menos, o que fizeram os clubes da Europa com as taças nacionais. Terceiro torneio na escala de importância, eles são relegados muitas vezes ao time reserva. Por aqui, torneios internacionais, Brasileirão e Copa do Brasil precisam ter prioridade na montagem do planejamento de temporada.

Os Estaduais, repensados, também assegurariam aos clubes menores uma maior capacidade de planejamento e mesmo de projeção no futebol. Hoje, a vida é decidida em dois meses. Num calendário mais espaçado, é possível ao clube menor não disputar apenas o Estadual, mas fases preliminares de Copa do Brasil, torneios interestaduais e outras competições, dando mais chance de o clube aparecer.

Uma coisa é certa. Nem mesmo nas finais os Estaduais empolgam o público. E esse é o motivo que faltava para que se repense toda a estrutura das competições do futebol no Brasil.


Felipão busca redes sociais para convocar o torcedor
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Erich Beting

Luiz Felipe Scolari decidiu fazer, na marra, o papel de chefe da torcida brasileira para a Copa do Mundo. Nas próximas horas, uma onda de ''convocações'' dos torcedores brasileiros para vestirem a camisa para torcer pelo Brasil devem invadir os perfis de jogadores nas redes sociais.

O vídeo, produzido pelo próprio staff de Felipão, é uma forma de ele falar diretamente com o torcedor. Agora, os jogadores e os canais oficiais da CBF e de patrocinadores da seleção também devem ser usados como meio para que a mensagem seja propagada. A ideia é que esse vídeo inspire os torcedores a, cada vez mais, vestirem a camisa do Brasil e, ao mesmo tempo, dar ainda mais confiança para os jogadores.

Felipão, no fim das contas, repete mais ou menos a estratégia que foi extremamente bem-sucedida na campanha de Portugal à inédita disputa da final da Euro, em 2004. Naquela ocasião, ele usou a imprensa para conseguir transmitir o recado de união, especialmente pela dificuldade que ele tinha encontrado por ser brasileiro e comandar o time europeu.

Agora, Felipão teve a percepção de usar as redes sociais para chegar diretamente ao torcedor, sem precisar passar pelo crivo do noticiário da mídia. Apesar de não ser adepto do uso da nova mídia para comunicar-se, o treinador entendeu que esse seria um caminho mais curto para tentar fazer o espírito do torcedor pelo Brasil ser aflorado e também para que, numa via de mão dupla, o jogador seja incentivado diretamente pela torcida.

Na prática, com muito mais carisma e credibilidade para tratar do tema, Felipão faz algo que deveria ter sido mais bem aproveitado pela CBF e seus parceiros comerciais. Acada passo que dá, Scolari revela que teria uma habilidade ímpar para trabalhar campanhas de marketing como poucos…

Veja abaixo o vídeo.


Adidas e Nike levam ao consumidor “desespero” da Copa
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Erich Beting

A Copa do Mundo é, para Adidas e Nike, o principal acontecimento dos últimos anos. Esporte mais popular do mundo, as vendas de um Mundial podem levar a marca para a liderança de mercado. Por isso, desde 2012 que ambas têm trabalhado para chegar ao Brasil no topo. Em 2008, a Nike já falava em ser líder no futebol até 2014. Em 2010, a Adidas celebrava o sucesso de vendas da Jabulani e já começava a projetar o que faria com a bola do torneio no Brasil, responsável por boa parte dos lucros.

O curioso é que esse ''desespero'' das duas empresas em ser a maior do mercado de futebol foi transferido para o consumidor. O mote da campanha tanto de Adidas quanto de Nike levam, para as pessoas, o conceito de que a Copa no Brasil é a hora do ''tudo ou nada''.

''Vamos com tudo'' foi a tradução de toda a comunicação da Adidas. Em vários países, o ''tudo ou nada'' é abordado nas campanhas publicitárias. Na última terça-feira, a Nike apresentou o ''Arrisque tudo'', seu slogan para o Mundial.

Como são marcas que vivem do esporte, naturalmente os fabricantes de material esportivo tendem a incentivar o consumidor a praticar o esporte. Ser um novo Messi ou um novo Cristiano Ronaldo é a mensagem que elas tentam passar.

Mas no caso da Copa no Brasil, além dos craques, as marcas tentam passar o conceito de que o Mundial é o momento mais importante para a vida das pessoas. E que, se elas querem ser bem-sucedidas, esse é o momento do ''tudo ou nada''.

Para as marcas, sem dúvida, é isso o que representa uma Copa do Mundo. Ser bem-sucedido num ano como esse pode levar a empresa a faturamento recorde em vendas. Para o atleta, ir à Copa também é chegar ao topo. Quase sempre as campanhas de Mundiais feitas pelas marcas retratavam essa necessidade. O foco, geralmente, era o atleta.

Agora, o consumidor foi levado a incorporar esse ''tudo ou nada'' relacionado ao torneio. Num momento delicado pré-Copa como esse que vivemos no Brasil, a estratégia das duas principais marcas de artigos esportivos do mundo parece seguir esse mesmo conceito: ela pode significar a glória. Ou um retumbante fracasso…


A cocriação entra na seara do esporte
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Erich Beting

Na última década, o conceito da cocriação começou a fazer parte do cotidiano de algumas empresas com mais frequência. Com a proliferação da internet e das redes sociais, levar o consumidor a ser um ''cocriador'' de um projeto dentro de uma empresa se tornou mais fácil e uma boa estratégia de marketing para as marcas.

No esporte, aos poucos, a cocriação começa a dar as caras. Dois exemplos nesta semana mostram isso. A Gol, patrocinadora da seleção, decidiu levar para o torcedor a criação de uma pintura alusiva ao time brasileiro (veja os detalhes aqui). As companhias aéreas brasileiras têm feito ações similares nos últimos anos, especialmente desde que a Azul entrou no mercado. É a primeira vez, porém, que o esporte é a base para algo do gênero.

Outra ação, essa sem a chancela ''oficial'' de um clube, foi feita pela Netshoes. Um fã de 10 anos de idade mandou uma correspondência à empresa com o desenho de uma nova camisa para o Borussia Dortmund. A vendedora de artigos esportivos chegou a entrar em contato com a Puma, fornecedora de material do clube alemão. Não teve retorno. Decidiu, então, transformar em pôster o projeto do menino e dar a ele uma camisa oficial do time (leia aqui).

Aos poucos, o esporte começa a explorar a paixão do torcedor para a cocriação. Alternativa simples e eficiente do ponto de vista de marketing, ela muitas vezes traz uma solução para a empresa inovar e, também, agradar ao consumidor, acabando com a lógica de ''imposição'' que ainda permeia o lançamento de um produto.

Com o componente do vínculo emocional muito maior do que numa relação comercial simples, o esporte pode ter na cocriação um caminho para inovar. Numa era em que as redes sociais encurtam distâncias entre a empresa e o consumidor, entre o clube e o torcedor, o atleta e o fã, é natural que o caminho passe a ser esse.

É mais barato, causa mais barulho para a marca e, por fim, cria um vínculo ainda mais forte do consumidor com a empresa.


O jogo de empurra (e de cena) da reta final da Copa
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Erich Beting

Virou um enorme jogo de empurra, e de cena, a reta final da turbulenta preparação brasileira para a Copa do Mundo. O debate da vez é sobre o pagamento das estruturas provisórias dos estádios, ou seja, daquilo que será usado unica e exclusivamente para o Mundial. Por contrato, esse dinheiro deve sair de quem se dispôs a receber as partidas. A Fifa, como boa dona da festa que é, chega apenas com o bolo, deixando para os anfitriões todo o custo estrutural do evento.

Sem qualquer juízo de valor, essa é a regra do jogo. Que o Brasil não concordasse com ela previamente, ou então que batesse o pé contra alguns dos tais ''Padrão Fifa'' que sempre existiram e que vão continuar a existir, seja a Copa aqui ou acolá. Dinheiro em caixa para isso não falta, como mostra a reportagem da Máquina do Esporte em mais um especial sobre as finanças da Fifa (leia aqui)

Só que a briga para saber quem paga a última das contas pré-Mundial é, curiosamente, um tremendo jogo de cena de governantes e donos de estádios. Como agora o bordão ''não vai ter Copa'' não cola mais, espertamente o Brasil passou a se apropriar da ameaça de não fazer o evento se não chegar um bombeiro para apagar esse incêndio.

Hoje não passa de um jogo de cena esse jogo de empurra. Os donos dos estádios querem jogar nas costas da Fifa o debate, provocando um pouco mais a ira da opinião pública sobre a entidade, que precisa ser dura na resposta e lembrar que o compromisso assumido pelo país foi de que ele faria a Copa custe o que custasse, literalmente.

Em meio a um cenário problemático de críticas aos excessivos gastos públicos, a esfera pública tirou o pé do acelerador e deixou de lado o discurso de cinco anos atrás, quando o Brasil era lindo e maravilhoso e a conta da Copa nem precisava fechar de tão magnânimo que seria receber o evento. Do outro lado, os três donos privados de estádios do Mundial fazem o jogo do ''a fonte esgotou'' para conseguir mais benefícios para ter sua arena novinha em folha.

A Fifa, nessa história, ficou com a bomba na mão. É o preço que se paga por ser um dono de festa tão exigente. Sim, é a regra do jogo. Mas será que não está na hora de a entidade rever um pouco se é realmente essa a melhor forma de mostrar o ''jogo bonito'' que ela tanto tenta apregoar? Esse jogo de cena não poderia servir para que, em 2018, ela não precise de novo apagar incêndios que ela própria poderia ter evitado?

Festa boa, afinal, é aquela em que todos, convidados, anfitriões e donos da festa, saem satisfeitos. Não dá para o dono querer fazer a lista de presentes, exigir de seus anfitriões e convidados que eles comprem tudo o que está lá e, no fim, não dizer nem obrigado. Depois de umas três festas nesse esquema, é preciso rever os conceitos…


O recado de Real e Barça ao futebol mundial
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Erich Beting

Confesso que ainda tenho um hábito ''das antigas'' de consumo de informação. Às segundas-feiras, gasto parte do tempo matinal procurando as capas dos jornais para saber o que passou no fim de semana. Sim, era mais rápido fazer esse tipo de busca pelo Twitter, mas alguma coisa ainda tenho de conservar do tempo em que ''ler jornal'' era uma boa forma de estar atualizado.

E esse hábito, além de servir para comprovar que jornais ainda são feitos com o pensamento antigo, em que a função dele é dar ''notícia'', e não fornecer análises para que eu filtre as zilhões de informações que me são passadas, traz algumas tendências de consumo de informação.

Nesta segunda-feira, por exemplo, o noticiário de esportes dos principais jornais do país tinham como grande destaque o clássico do fim de semana… Na Espanha!!!! Real Madrid e Barcelona ocuparam fotos de destaque nas capas de ''O Estado de São Paulo'', ''Folha de São Paulo'' e ''O Globo''. Não na capa de esporte, mas na capa do jornal, concorrendo com todas as outras notícias do fim de semana. Em outros países, a situação se repetiu. Na Itália, o ''Corriere dello Sport'' foi ainda mais enfático: ''Lição de futebol'', estampava a manchete da principal matéria de futebol num veículo exclusivo sobre esporte.

O sucesso absoluto do eletrizante Real 3×4 Barcelona é um recado ao futebol mundial.

Aos poucos, vamos sofrendo um processo de transformação do futebol num produto tal qual as grandes ligas esportivas dos Estados Unidos. Um esporte dominado por uma elite mundial, com pouquíssimas variações e distinções locais. É mais ou menos esse o resumo que se pode fazer desse clássico espanhol. Um duelo que o mundo inteiro sabia que aconteceria e que, no dia seguinte, continuava a repercutir, ainda mais pelas polêmicas que cercaram o jogo.

Por ser tão enraizado na cultura brasileira, o futebol local ainda tem muito espaço por aqui. Mas, aos poucos, vai dando bola para que as principais potências europeias dominem também o noticiário. Mas não são apenas a presença dos grandes jogadores na Europa que levam a isso.

O clássico espanhol teve muito mais espaço na mídia pelo fato de, por aqui, a concorrência dele no noticiário ser os campeonatos estaduais. A atenção da mídia para o jogo em Madri é uma prova a mais da saturação dos torneios locais. Se estivéssemos numa reta final de Campeonato Brasileiro, possivelmente o duelo dos dois clubes mais ricos do mundo ficaria um pouco mais escanteado.

O ponto, porém, é que o futebol no Brasil precisa, urgentemente, se preparar para não dar mais espaço para o futebol na Europa crescer. Não por ''protecionismo'' ou qualquer bobagem do tipo, mas por uma questão de sobrevivência.

Num mundo cada vez mais interligado, o consumidor sempre vai em busca do melhor produto. Essa foi a grande percepção do futebol europeu há mais ou menos 15 anos, quando a Uefa começou o plano de expansão de seus campeonatos para o mundo. A exportação da Liga dos Campeões dentro de um padrão mínimo de qualidade fez com que, de uma hora para outra, os clubes europeus se tornassem mais ''próximos'' do mundo todo. Ao mesmo tempo, a necessidade de aumentar receitas a partir da expansão de fronteiras gerou um movimento natural de ''invasão'' das grandes potências europeias nos países com um mínimo de uma cultura futebolística.

O dia-a-dia de Real Madrid e Barcelona, por exemplo, é parte do nosso cotidiano tal qual é o dia de um clube de grande torcida por aqui. E isso é preocupante para quem precisa conquistar torcedores, angariar a atenção da mídia e, de quebra, aumentar a receita. Tal qual uma NBA, a Uefa passou a ser o centro que reúne os melhores jogadores, os melhores times e os melhores espetáculos de futebol do mundo.

Há 15 anos, era impensável retratarmos o futebol europeu tendo como enfoque os clubes de lá. Os times eram identificados pelos brasileiros que lá atuavam, nada além disso. Hoje, os jornais destacam frases de Messi e Cristiano Ronaldo, repercute o que falou Sergio Ramos sobre a expulsão. E também, claro, falamos de Neymar. Mas o atleta brasileiro saiu do centro da notícia. Ele deu lugar ao clube, que passou a ser tão ou mais familiar que o pé-de-obra brasileiro em atividade por lá.

O interesse pelo consumo do futebol na Europa é cada vez maior. Isso gera um grande desafio para o Brasil. Não perderemos fãs, mas é bem provável que percamos consumo.

A TV vai ter mais interesse em mostrar a partida de melhor qualidade. O torcedor vai deixar de ir ao estádio para ficar em casa e acompanhar o duelo de seu time de lá. O jogador vai olhar e, em vez de sonhar disputar um jogo num Maracanã lotado (até porque isso é cada vez mais raro), vai sonhar em pisar no Santiago Bernabéu, no Old Trafford, na Allianz Arena, no Camp Nou…

A forma como a mídia deu bola para esse Real e Barça é um recado ao futebol. Não apenas no Brasil, mas em todo o mundo. É urgente que o nível do espetáculo melhore. Do contrário, vai sobrar apenas uma elite de 12 clubes na Europa dominando todo o consumo de futebol no mundo. A mudança é lenta, mas é só ver como mudou o interesse pelos clubes europeus nos últimos 20 anos. Ou o Brasil muda a forma como se vende o produto do futebol, ou a concorrência europeia ficará cada vez maior.

O futebol europeu hoje representa o que as ligas americanas são para os demais esportes. Excelência de qualidade e objeto de desejo de consumo.


Avanti, Palmeiras! Mas não dá para melhorar, não?
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Erich Beting

O Palmeiras sofreu nesta quinta-feira um ataque. A sala que vendia ingressos para o jogo contra o Santos foi destruída por torcedores que tentaram roubar bilhetes. Antes, outros também tentaram usar uma mesma carteira de sócio-torcedor para comprar mais ingressos que o permitido. O estrago foi feio. Mas pior ainda foi a impressão deixada pelos maus torcedores.

Pela primeira vez, um jogo importante do clube, como o clássico contra o Santos, na Vila Belmiro, não terá o privilégio das torcidas organizadas na aquisição de bilhetes. O Palmeiras decidiu fazer o óbvio. Venda restrita para os sócios-torcedores. Se sobrar bilhete, aí o público ''comum'' pode tentar comprar.

O movimento do clube foi perfeito. Antes, atitudes como essa tinham sido timidamente tentadas. Em 2008, o Inter na final da Copa Sul-Americana teve o Beira-Rio fechado para o sócio-torcedor. O Corinthians, na vitoriosa campanha da Libertadores em 2012, deu muito mais vantagens para os associados comprarem os bilhetes. Nos dois casos, porém, as organizadas ainda tiveram facilidades para comparecer aos jogos.

Agora, não. O Palmeiras usou a bandeira do sócio-torcedor para tentar reduzir a força do torcedor organizado. O movimento, claramente, atingiu quem precisava. E o clube sofreu a represália típica daqueles que não se conformam em perder o poder.

O único erro do clube foi não ter proporcionado a venda dos bilhetes pela internet. Para fazer parte do programa de sócio-torcedor (o Avanti), é preciso usar a web. Então por que não fazer a venda toda on-line? Ok, o jogo era fora de casa. Mas o Santos, rival do domingo, usa a mesma empresa para a venda de ingressos pela internet.

Reduzir ao sócio-torcedor o bilhete de um jogo é, na atual conjuntura do futebol, uma medida eficiente para reduzir a força das organizadas. Ao passar para o clube o controle de quem está no jogo, é possível diminuir a influência do torcedor que vai em bando. Na Europa, os carnês anuais de ingresso têm essa função. Antecipação de receita e perda de força do torcedor organizado. No Brasil, o sócio-torcedor é a válvula de escape para isso.

O que os clubes precisam entender é que estamos entrando numa nova era. A ida do torcedor a um local físico para a compra de um ingresso tem de ser o último recurso disponível. Hoje, cerca de 50% do país tem acesso à internet. É gente mais do que suficiente para que um estádio fique constantemente lotado. De qualquer time.

Avanti, Palmeiras! O caminho é esse mesmo. Se é possível dizer que existe um ''dono'' para o consumo de um torcedor, ele é o clube. A torcida não pode, nunca, ter o poder sobre isso. Só que, para isso, é preciso colocar-se na pele desse consumidor. Como é que pode, hoje, a compra de um bilhete não estar ao alcance de um clique?

É possível melhorar muito o sistema. Até para continuar a fazer com que o bom torcedor seja, cada vez mais, a regra, e não a exceção.