O que é ser um profissional?
Erich Beting
Nas últimas semanas tive dois encontros com dois executivos que deixaram, recentemente, cargos graúdos envolvendo o esporte. No meio da conversa, ambos disseram ter sido muito boa a experiência em trabalhar com esporte, mas que a falta de profissionalismo na gestão de clubes, federações e atletas é algo que incomoda e atrapalha muito. Sem dúvida que para quem tem uma experiência anterior no mercado corporativo, o esporte é realmente um universo que mais assusta do que fascina.
Afinal, como já falado anteriormente aqui no blog, não é preciso profissionalizar o esporte para que o dinheiro entre no caixa. Um ótimo exemplo disso é o quanto cresceram as receitas dos patrocínios esportivos nos últimos cinco anos só porque o Brasil foi ''premiado'' com dois papéis que diziam que Copa do Mundo e Jogos Olímpicos seriam realizados por aqui.
O grande problema é que, com uma indústria esportiva minimamente existente, como era a nossa, a expectativa de quem estava nesse barco era de que os megaeventos impulsionariam o grau de profissionalização de quem trabalha no esporte. O maior problema, porém, é que ainda temos uma visão deturpada do que é ser um profissional.
No último domingo, a ESPN exibiu o documentário ''Fab Five'', sobre o fantástico time universitário de Michigan do início dos anos 90. Em determinado momento do filme, um dos atletas afirma que, ao ver a Nike se ''apropriando'' da equipe, ele teve um estalo. ''Eu era profissional sendo um universitário. Ou seja, eu vendia como um cara da NBA, mas não ganhava um centavo por isso''. Foram essas, mais ou menos, as palavras do ex-jogador.
Ser profissional, no mercado americano, é efetivamente ganhar dinheiro para viver do esporte. Para um atleta, isso representa não apenas ter um contrato de trabalho com alguma instituição, mas ter um contrato de patrocínio com uma marca de material esportivo, vender produtos licenciados com a marca dele, faturar com campanha publicitárias, etc. Isso é tão claro no modelo americano de gerenciar o esporte que o atleta universitário não pode receber qualquer tipo de incentivo monetário, apenas a bolsa de estudos. Só quando ele atinge as ligas esportivas, sejam elas as principais ou as secundárias, pode ganhar dinheiro.
É o bordão ''Show me the Money'' eternizado por Tom Cruise no personagem Jerry Maguire.
Já no Brasil…
Ontem mesmo o UOL publicou entrevista com Thiago Pereira, nosso nadador com o melhor desempenho na última edição dos Jogos Olímpicos. Nela, o atleta reclamava de ter de negociar para fechar contrato com um clube e, também, por estarmos a três anos das Olimpíadas do Rio e continuar baixo o investimento em esporte por aqui.
Como também já falei no blog, o grande dilema para os esportes olímpicos hoje é depender da estrutura de clubes, principalmente de clubes que têm no futebol sua principal atividade. Mais uma vez usando o exemplo americano, mesmo nas universidades, são raras as que têm equipes fortes em mais de uma ou duas modalidades. Isso faz com que exista espaço para investimentos em outros esportes.
Mas o grande problema passa pelo entendimento do que é ser um profissional do esporte no Brasil. Há 13 anos nesse mercado, uma das grandes coisas que se percebe é que as pessoas, geralmente, encaram ainda o trabalhar nessa área como uma ''diversão''. Ainda vemos que um atleta tem de seguir os mesmos preceitos lúdicos de relação com a atividade esportiva que temos quando somos criança. Da mesma forma, em outras áreas, o sentimento é muito parecido. O interesse não é construir uma carreira para fazer a vida trabalhando com isso. Pelo contrário, muitas vezes há um sentimento de que é errado ganhar dinheiro trabalhando com esporte.
A atração de novos profissionais para dentro do universo do esporte depende, muito, da resposta correta à pergunta ''o que é ser um profissional''. Enquanto o esporte for visto como um meio de diversão até para quem trabalha com ele, o processo de evolução será muito mais lento.