Clubes não aprenderam. O paitrocínio é que acabou
Erich Beting
O futebol brasileiro passará por um 2015 de vacas pretensamente magras, mas que poderá ter um reflexo muito grande, e importante, para um futuro mais sólido da indústria. O momento, agora, é de readequação após quatro anos de uma loucura desenfreada dos cartolas.
Para tentar resumir e relembrar o que aconteceu.
Tudo começou em dezembro de 2008, quando o Corinthians anunciou a contratação de Ronaldo. À época, o negócio estava completamente bem resolvido. Ronaldo recebia um valor fixo de salário (R$ 400 mil em carteira de trabalho) e tinha uma participação sobre os negócios que poderiam ser fechados pelo clube, à exceção do patrocinador máster da camisa.
Paralelamente a isso, o Brasil vivia na seguinte realidade. A economia estava bem, mesmo com a quebra dos EUA, e o país vivia a euforia de ter conquistado o direito a sede da Copa do Mundo de 2014. A incursão de mais gente na classe C fazia com que o consumo estivesse em alta e, assim, vivíamos um período de muito dinheiro na economia.
Com esse cenário, a operação Ronaldo-Corinthians foi um sucesso. O clube loteou a camisa, as empresas, com dinheiro em caixa e boa perspectiva de faturar, mergulharam de cabeça achando que faziam um excelente negócio e investiram no projeto.
Isso fez com que, ainda em 2009, os demais clubes saíssem à caça de projetos parecidos. Com mais dinheiro no mercado, não foi difícil encontrar quem quisesse estampar a marca num uniforme. O ano que terminou ainda coroando o Rio como sede das Olimpíadas de 2016 fez com que desse a ''louca'' no mercado. Todo mundo queria investir no esporte. E, com Ronaldo elevando o interesse da mídia pelo futebol, as camisas dos times se transformaram em abadás de carnaval.
Num primeiro momento, os clubes aumentaram o quanto ganhavam com patrocínio, mas criaram um grande problema para o mercado. Abrindo espaço para várias marcas, reduzia-se o retorno sobre o investimento dessas empresas. No fim das contas, elas percebiam que o negócio não era tão vantajoso assim. O dinheiro gasto era alto demais para um retorno não tão grande assim.
Para piorar ainda mais o jogo, no começo de 2011, o Clube dos 13 ruiu. Impulsionado por uma manobra encabeçada pelo Corinthians, os clubes acharam que era melhor negociar os contratos de TV individualmente do que de forma coletiva. Em vez de todos se unirem, cada um foi buscar o seu quinhão.
Num primeiro momento, parecia o negócio perfeito. De uma hora para a outra, os clubes começaram a ganhar, pelo menos, o triplo do que recebiam pela transmissão do Campeonato Brasileiro.
E foi aí a bolha começou a se formar…
Com mais dinheiro, ter o próprio ''Ronaldo'' passou a ser fácil. Os clubes, então, começaram a buscar no exterior um craque já perto do fim de carreira. O raciocínio era o mesmo que motivou o Corinthians lá atrás. Contratação de peso gera a atração da mídia e da torcida. Isso leva o patrocinador a nos procurar e, claro, mais dinheiro vai entrar nos cofres.
O problema é que só existe um Ronaldo, assim como, depois do contrato individual de TV, praticamente só existem Corinthians e Flamengo para a Globo exibir na TV aberta…
O cenário em 2011 estava longe de ser o mesmo de 2009. A economia já não ia tão bem. A classe C, endividada, já reduzia o furor das compras. As empresas tinham de rever, para baixo, seus orçamentos. Os valores dos clubes, ainda no alto, não seduziam mais os patrocinadores de ocasião.
Só que, turbinados pela Globo, os clubes gastaram o que tinham disponível e, também, o que viria pela frente. Contratações acertadas, mas caras, como a de Seedorf no Botafogo, ou completamente desastradas, como a de Carlos Eduardo, no Flamengo, refletem bem essa realidade. Os jogadores que vieram simplesmente não se pagavam. Nem por patrocínio, nem pela mídia.
Nos últimos dois anos, a Globo foi o ''bombeiro'' de boa parte dos clubes. Sem patrocínio, eles foram bater na porta da TV para pedir adiantamentos de contratos. No malabarismo, conseguiram manter seus ''craques'' e alimentar uma falsa solvência financeira.
Ano após ano, os balanços financeiros têm se encerrado no vermelho, mas os clubes continuam contratando e propondo salários astronômicos para seus atletas.
O que mudou agora?
A Globo fechou a torneira. Por uma determinação da alta cúpula da emissora, não se adianta mais nenhum centavo para os clubes. Como a maioria deles não tem patrocínio ou vive de aporte da Caixa, não dá mais para buscar os outros parceiros para manter o caixa funcionando.
O problema é que os dirigentes não conseguiram acompanhar a lógica do mercado nesses anos todos. Eles seguem achando que o patrocínio valerá R$ 20 milhões, quando as empresas estarão propensas a investir, no máximo, metade disso num patrocínio máster de camisa. A diferença, agora, é que acabou o ''paitrocínio''. Não há mais um bombeiro apagando o incêndio com adiantamento de dinheiro.
O ano de 2015 pode ser essencial para ensinar aos clubes a importância de diversificar as fontes de receita, de não depender só da TV e, mais importante, de baixar a bola e compreender qual o real valor de suas marcas. O maior risco que existe é o refinanciamento das dívidas ser aprovado em Brasília e, dessa forma, os clubes terem um alento de empurrar para debaixo das asas do governo a incompetência dos últimos anos na gestão de suas marcas.
O futebol chegou na beira do precipício. E, o que é pior, ele está vendado. Resta saber se ele saberá tirar a venda dos olhos e mirar o horizonte do longo prazo ou terá de esperar alguém chegar lá para recolocá-lo andando sem risco, mas para trás…