A dura tarefa de transmitir esporte na TV aberta
Erich Beting
A Globo quis mudar a transmissão de Fórmula 1 e fez, do pré-evento, uma espécie de ''show de auditório'' sem auditório, mas com todas as firulas que só estamos acostumados a ver nesse tipo de programa. No meio da madrugada, Galvão Bueno era o grande astro da transmissão travestida de show da primeira prova da temporada. A iniciativa gerou desconforto, principalmente entre os fanáticos. Nas redes sociais, as críticas foram praticamente instantâneas. Nos sites especializados, idem. Tanto que a enquete do Grande Prêmio, com cerca de 5 mil internautas, apontou rejeição de 90% ao formato utilizado pela emissora.
A crítica é justificável. Por conta do horário da madrugada, muito provavelmente quem ficou acordado até tarde para acompanhar o GP da Austrália foi o cara que é, realmente, um fã daquele esporte. Ele possivelmente foi a maioria dos cerca de 1 milhão de pessoas em São Paulo e 700 mil no Rio de Janeiro que acompanharam a corrida ao vivo, segundo os dados do Ibope. Mas o ponto é que, seja por conta dessa transmissão diferente ou não, a audiência da F1 cresceu em comparação a 2014 (leia aqui).
E é aí que entra o grande desafio que tem a TV aberta na transmissão do esporte. É muito provável que o fanático por esporte (que obviamente é a absoluta maioria dos que me acompanham por aqui) não consiga entender que a TV aberta não foi feita para ele. Quer dizer, até pode ter sido, mas hoje geralmente há uma massa muito maior de não-fanáticos acompanhando o evento na TV aberta do que a de profundos conhecedores do tema. E, por isso, a transmissão trata o esporte muito mais como uma diversão do que com a seriedade que exige um fanático.
A razão para isso é relativamente simples. Há 20 anos que existe a opção de o brasileiro acompanhar esporte em canais exclusivos, com programação dedicada 24h somente a esporte. O aparecimento da TV a cabo no país mudou radicalmente a vida do fanático por esporte. Hoje, temos quase dez canais exclusivos de esporte no país. É um assombro, se considerarmos que, no começo dos anos 90 a Bandeirantes fez fortuna ao se denominar ''o canal do esporte''.
A questão é que a TV aberta exige muito mais pluralidade de conteúdo. E, por conta disso, ela precisa falar para todo tipo de gente. O fanático, muitas vezes, não se conforma com a instrução ''básica'' que é passada a ele. A transmissão, que foi antes meramente informativa, precisa ser interessante para aquele que não dá tanta bola para a informação, mas muito mais para o show que é protagonizado pelo esporte.
Nesse sentido, por mais que o esporte preferido do fanático para as transmissões de TV aberta seja achincalhar Galvão Bueno, o estilo ''showman'' que ele adota nos eventos é fundamental para captar a atenção do telespectador que não é vidrado naquilo. Galvão aumenta a dramaticidade de um evento a níveis mais apelativos que o da Cantareira, mas com esse jeito de ser consegue hipnotizar o não-fanático.
O desafio para as transmissões na TV aberta é entreter as pessoas, além de informar. Conseguir fazer as duas coisas ao mesmo tempo é um talento que pouquíssimos rostos que figuram na nossa televisão conseguem ter. Afinal, o show tem de continuar…