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O Sansão da paz. Só fora de campo…
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Erich Beting

A ideia foi simples e genial. A ação encabeçada por Ambev, Santos e São Paulo de promover a paz entre os times antes de a bola rolar no Pacaembu foi de fácil execução e emblemática na transmissão de uma mensagem. Por que não colocar os jogadores dos dois times juntos no mesmo ônibus para ir a um jogo?

É a típica ideia simples de executar e importante de se fazer. Num momento em que a bobagem de se exigir torcida única no estádio aflora, os clubes e o patrocinador fazem um gesto que propõe uma outra reflexão.

E aí o que se vê dentro de campo, com a bola rolando?

Os jogadores, com a gana de vencer, jogam por terra toda a ideia dos clubes e do patrocinador. Se irritam com as jogadas dos outros, partem para agressão, física e verbal, e levam para o torcedor uma outra mensagem.

“Pedimos paz a vocês antes do jogo, mas colocamos tudo no lixo com nossas atitudes dentro de campo”.

Lugano é um craque-bandeira do São Paulo. E, como tal, deveria se comportar dando o exemplo. Não de ser durão, disciplinador e exigente de respeito. Deveria aceitar a derrota e a má atuação. Ameaçar Gabriel, responder de forma ríspida a repórter e fazer cara de mau é passar ao torcedor a mensagem errada.

Viesse isso de um garoto ainda começando era de se esperar. Mas do jogador que representa a dignidade do Tricolor é uma tristeza. Sim, por diversas vezes deve ser irritante ter de lidar contra Gabigol e Lucas Lima. São craques, jovens, habilidosos, velozes. Marcá-los deve ser insuportável. Desarmar uma bola não deve ser nada fácil. Assim como sair perdendo com menos de um minuto de jogo e tomar 3 a 0 justamente numa falta cometida após tomar um drible por baixo das pernas. Irrita, machuca, faz o sangue ferver.

Mas, no fundo, qual o exemplo que temos de passar? Lugano representa milhões de são-paulinos. E, como tal, teria de saber que, desde os 40s de bola rolando, aquele jogo tinha um justo vencedor. Um time que jogou melhor que o dele. Como o próprio Lugano reconheceu na entrevista após o jogo. Mas como não soube fazer dentro de campo.

O jogador de futebol precisa se entender como representante de uma imagem forte e poderosa. Ele é elemento importante dentro da sociedade. Ele forma opinião, ele inspira as pessoas, ele é exemplo. Numa sociedade que questiona cada vez mais os valores (i)morais, os atletas deveriam saber o peso que suas atitudes têm.

De nada adianta marcas e clubes se preocuparem em transmitir uma mensagem às pessoas se, dentro de campo, seus jogadores se comportam de forma completamente oposta. O pré-jogo do Sansão foi um dos mais inteligentes dos últimos tempos. E tudo foi jogado fora pela atitude dentro de campo dos jogadores. Não só de Lugano, mas o líder tricolor simbolizou tudo ao ser expulso por reclamação, ao tentar intimidar na força o jogador adversário, ao vociferar pela crítica feita pela mídia no pós-jogo.

Não é fácil digerir uma derrota doída como a do clássico, nem é fácil se comportar de forma cordial o tempo todo num jogo em que você é muito superior. Mas o atleta precisa entender que ele é muito mais do que só um jogador numa tarde ruim ou boa. Ele é um símbolo que tem de mostrar valores aos outros.

Como é possível pedir paz à torcida se o jogador dentro de campo é violento?

Saber ganhar e saber perder é um exercício que cada vez mais tem de ser desenvolvido dentro do futebol. Não só no Brasil. Do contrário, por mais que se peça paz aos torcedores, não dar o exemplo dentro de campo é, no mínimo, mostrar que tudo não passou de uma péssima ação de marketing.

Para aqueles que ainda acham que não houve nada demais nas atitudes dos personagens do Sansão, fica o convite a olhar o minuto final da decisão da NBA. LeBron James sofre uma falta dura, cai no chão, levanta, arremessa, cobra o lance livre, converte um ponto e, nem cinco minutos depois, recebe do adversário que cometeu a falta um pedido de desculpas e os parabéns pela conquista do título. Sem empurrões, acusações, reclamações.

Santos e São Paulo deveriam hoje cobrar de seus representantes dentro de campo uma atitude que justificasse o apelo feito à torcida algumas horas antes de a bola rolar no Pacaembu.


O amor no esporte não é incondicional
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Erich Beting

O São Paulo fez ontem o primeiro jogo no ano que encheu de orgulho seu torcedor. Podemos colocar todos os “poréns” nos 6 a 0 sobre o Trujillanos, mas uma goleada dessas, quando o time precisava de um bom resultado para afastar o mau olhado que o cerca, é fundamental para ajudar a embalar.

Aí, cerca de uma hora após o jogo, o que faz o São Paulo em seu perfil no Facebook?

Cobra o torcedor por não ter ido ao estádio para assistir ao jogo!!!

Chamada publicada pelo São Paulo em seu perfil no Facebook

Chamada publicada pelo São Paulo em seu perfil no Facebook, por volta da 1h da manhã de hoje. Cobrança pública pelos 18 mil torcedores presentes ao estádio

 

Esse tipo de conduta parece cada vez mais recorrente no futebol. Em vez de valorizar quem é fiel ao clube, o marketing cobra quem não está próximo pela ausência.

O erro, primário, é o de não entender que não são todos que vivem um caso de amor incondicional com o clube. Sim, quem trabalha na gestão de redes sociais do São Paulo naturalmente deve ser fanático pelo clube. Da mesma forma, dirigentes não-remunerados estão ali, em tese, pelo amor que não tem preço pelo clube.

Mas até quando as pessoas que trabalham no esporte vão achar que o comportamento das pessoas é igual ao delas?

O maior erro cometido pelo São Paulo em seu post no Facebook foi o de imaginar que o torcedor é obrigado a ir ao estádio apenas pelo fato de ser são-paulino. Sim, há uma parcela de torcedores que pensa e age dessa forma, mas ela representa uma minoria no espectro de interessados por um clube de futebol.

O São Paulo tem 6,5 milhões de seguidores no Facebook. Muito provavelmente não passa de 300 mil os fanáticos dentro desse montante. Desses, nem todos moram em São Paulo. Além disso, nem todos estão de folga numa terça-feira à noite. Ou na quarta pela manhã. Uma outra boa parte não dispõe de, no mínimo, R$ 30 para ir ao jogo.

Isso para não falar o quanto o time, dentro de campo, não corresponde às expectativas.

Uma das principais causas para fins de relacionamentos é a decepção que um parceiro causa no outro. Pelo que não vinha mostrando dentro de campo, o são-paulino não poderia mesmo ainda encontrar disposição para gastar quase R$ 100 e ir até o Morumbi gritar pelo time.

O fanatismo ocupa sempre a menor parcela de uma torcida. E um clube de futebol reclamar de seu torcedor que ele não vai ao jogo é simplesmente ignorar que a relação de amor que o torcedor nutre por ele não é incondicional.

O grande barato do marketing no esporte é alimentar o fogo da paixão de um fã das mais diferentes formas. Cobrar a presença sem dar qualquer presente é atitude, no mínimo, de desrespeito com os mais de 18 mil são-paulinos que se dispuseram a ir incentivar um time que, até ontem, não arrancava qualquer suspiro do seu torcedor.


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