A busca por um emprego melhor
Erich Beting
Primeiro de tudo, que fique claro que não existe mocinho e bandido nessa história. Existem lados e interesses distintos em todos os envolvidos. Mas os casos recentes envolvendo Henrique e Casemiro, ambos campeões mundiais sub-20 e jogadores do São Paulo, revelam o quanto o futebol evoluiu nos últimos anos.
No final das contas, paixões exacerbadas de lado, a queda de braço entre clube e atletas nada mais é do que a disputa por um emprego melhor, ou pelo menos por melhores condições de trabalho.
É importante frisar, aqui, a necessidade de usarmos o termo ''paixões exacerbadas de lado''. Porque, para o torcedor, a paixão cega uma análise mais criteriosa daquilo que envolve hoje o relacionamento entre clube e atleta.
Para um jogador de futebol, o clube representa um emprego. Ele pode até escolher defender primeiramente um determinado time por torcer por ele, mas o fato é que, a partir do instante em que ele coloca na cabeça que será um profissional da bola, o clube deixa de ser sinônimo de paixão e se torna um local de trabalho.
Para o clube, o jogador é um funcionário, que no final das contas tem de trabalhar para trazer lucro para ele. Seja do ponto de vista financeiro, advindo da negociação desse atleta com outra equipe, seja do esportivo, com o jogador trazendo vitórias com as bolas nos pés.
Sendo assim, o relacionamento entre ambos é parecido com aquele de um funcionário que trabalha para uma empresa. A paixão é apenas do torcedor. O atleta quer ganhar espaço dentro do time, entrar em campo, fazer gols, ser importante para a equipe.
No caso de Henrique e Casemiro, é exatamente esse o ponto que pegou na queda-de-braço por melhores salários e condições de trabalho.
Imagine que você seja um estagiário de uma grande empresa e que tenha passado pelo processo de trainee dessa firma. Com 19 anos de idade, cheio de vitalidade e com bom desempenho profissional. O que você espera de seu empregador? Ser contratado em definitivo, ter um aumento de salário, ganhar bonificação maior pelo bom desempenho e ser colocado para fazer grandes negócios… Mesmo que para isso você tenha de superar a concorrência de outros funcionários que estão há mais tempo na casa, ou então no mercado, que sejam mais experientes, mas também mais lentos que você…
Do outro lado, a empresa investiu em você, deu qualificação, ajudou com o pagamento de cursos extra-curriculares, deu aulas de inglês, vale-refeição, etc. É justo que ela espere que esse profissional cresça aos poucos, se desenvolva e traga de volta o dinheiro investido em forma de trabalho, de melhores ganhos, de grandes projetos. Mas há vários outros funcionários em sua empresa que estão há mais tempo na casa, são mais experientes, podem ajudar no treinamento desses novos talentos. Você espera que seu estagiário entenda isso e aguarde pelo momento certo para ter a promoção, para ganhar aquele aumento, para ser o diretor da área…
Quando um lado não consegue corresponder às expectativas do outro, o que acontece? Ou o estagiário fica insatisfeito e não rende o esperado, ou então sai em busca de outro ambiente para trabalhar, um local onde ele consiga nem sempre ganhar mais, mas sim poder mostrar melhor todo o potencial que tem.
Proporcionalmente, foi esse duelo de ideias que aconteceu agora com Henrique, Casemiro e o São Paulo. Não existe certo e errado. Cada um está no seu direito de exigir. É hipocrisia demais exigir que os jogadores tenham uma dívida de gratidão com o clube que o formou. A relação é trabalhista. Se o atleta não render o esperado, o clube não vai pensar que tem uma dívida moral com ele para não demiti-lo.
No final das contas, a busca é por um emprego melhor. Ou pelo menos para estar sentindo-se mais recompensado no lugar onde se trabalha.
Há dez anos, esse debate simplesmente não existiria. O atleta estaria vinculado ao clube mesmo que com ele não tivesse contrato de trabalho. Praticamente à revelia. Todos estão no direito de querer melhores condições de emprego. Antes, a legislação simplesmente ignorava esse direito do clube. O futebol, sem dúvida, evoluiu.
-
Gustavo
25/08/2011 09:14:57
Eu contei uma história só para dizer o seguinte:Clube de futebol forma atleta da mesma maneira que uma empresa recebe um estagiário e o forma para ser efetivado. O que ambos gastaram a mais por isso? A empresa pede resssarcimento dos estagiários que foram parar no concorrente ou que simplesmente não são bons?O clube de futebol é a mesma coisa. Investe-se numa base para tirar alguns bons profissionais. Esses profissionais estão no mercado e podem, sim, ir para outros clubes. O clube formador é que deveria ter se precavido (diga-se investido melhor) em suas possíveis promessas.E a Lei Pelé ajuda a estragar isso. Agora me pergunto: existe lei que inibe estagiário de mudar para o concorrente? Não, claro qeu não. Pq no futebol seria diferente?
-
jmanoel
25/08/2011 05:41:57
Concordo com vc Erich, ja faz tempo que o futebol no brasil é encarado como negocio e nada + justo, que um funcionário valorizado, pleitear aumento de salario, por que na verdade a realidade é essa, profissional valorizado = aumento de salario e nada + agora o amigão Venceslau Ponte Preta ta querendo aparecer ou tentar algum tipo de proximidade que não cabe aqui ( reunir pessoalmente ou no Skype kkkkkkkkkkkkk), toma cuidado jonh lenon morreu assim com esses loucos da vida kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
-
Thiago Gonçalves Fernandes
24/08/2011 19:43:47
Erich,Sou São Paulino fanático, mas sou consciente!Eu concordo em genero, número e grau com tudo o que você escreveu!As vezes sou chamado de anti-são paulino, por esta minha opinião, talvez seja MAIS UM problema, da falta de profissionalismo dos dirigentes, pois esse tipo de problema já foi superado na Europa a muito tempo... Desde os tempos "Bosmann"
-
Vicente
24/08/2011 15:43:41
Concordo plenamente com seu argumento no que diz respeito à relação entre jogador e clube, que é trabalhista.Paixão clubística deve mesmo ser deixada de lado, mas na minha opinião muito mais por força da realidade atual que por ideal. Não acredito que ter paixão por um clube - ou gratidão, ou mesmo identificação - seja algo que precise ser esquecido, ou desconsiderado. Demostrar essa paixão muitas vezes pode, inclusive, ser um diferencial do jogador, dentro desse mercado bem concorrido que é o futebol.Mas, para se considerar isso, deveríamos ter um fomento nesse sentido, não imagino uma fórmula, mas se quer jogador comprometido num nível X, é preciso se criar uma metodologia pra atingir esse nível.Dito isto, e considerando esse caso como você sugere, uma relação trabalhista, acho que mesmo assim está muito errado o modelo dessa gestão.Os clubes investem pesado na formação dos atletas e, usando o mesmo paralelo que você, os clubes fazem mais que o papel de empresa que investe no funcionário, faz também o papel da família. Afinal, meu plano de saúde, alimentação e, principalmente, estudo, foi custeado por mim com o auxilio da minha família, não pelo meus atuais empregadores ou quaisquer outros.Adoraria conhecer uma empresa que investisse tanto num funcionário como um clube formador, e fizesse isso mesmo correndo tanto risco com esse investimento. Afinal, além dele poder sair a qualquer momento, ainda há o risco do profissional simplesmente não vingar, coisa bem difícil de acontecer no mundo corporativo, menos dependente de talentos.Fora isso, ainda há a se considerar o momento deste imbróglio. Afinal, é interessante tanto pro jogador quanto pro clube uma valorização advinda de boa atuação pela seleção brasileira, mas talvez seja preciso que haja alguma regra, afinal se o jogador for muito mal ele vai ter uma diminuição salarial? Por fim, o torcedor são-paulino sabe muito bem que o Henrique tomou essa atitude porque sabe que no São Paulo ele já desperdiçou bastante chances, sem corresponder.Pra mim, o erro do São Paulo foi investir num jogador mediano por tanto tempo. Pra mim, o clube que forma um jogador deve, de alguma maneira, ter mais segurança no seu investimento.abraço
-
Diogo
24/08/2011 15:24:44
Erich acho que a comparação 'não esta correta ja que ele não é um estagiario e sim um funcionario. possue um contrato em vigor. Ele querer sair é um direito dele desde que ele arque com a multa por quebrar tal contrato , alias como em qualquer empresa. Abracos
-
Gustavo
24/08/2011 14:23:20
Nossa quanta gente revoltada.Agora coloco a pergunta: vocês entraram como estagiário na empresa. Estão lá apenas para levar café e tirar cópias de documentos (como a grande maioria das empresas trata seus estagiários). A chance de você ser efetivado é pequeno, mas existe. Por um motivo qualquer você conseguiu se destacar e a empresa lhe oferece um emprego. Você aceita. A empresa paga cursos internos, faz sua qualificação com os funcionários mais experientes. Porém, você faz um processo seletivo e recebe uma oferta muito melhor. Você comenta com o seu superior o fato procurando uma equiparação salarial, que não ocorre. Você resolve sair. O que você faz?a. Pede as contas, paga aviso prévio?b. Pede as contas, paga pelo investimento que a empresa fez em sua qualificação?c. No final acaba não aceitando a oferta. Afinal de contas a empresa atual investiu tanto em você e seria pouco moral largá-la na mãoVejam que a relação é a mesma. Clube de futebol investe mas não paga Pós Graduação. Investe com as ferramentas e "cursos" internos. Não há custo extra em formar um atleta. Eles formam vários e somente poucos são efetivados no time principal. A relação é a mesma.Está na hora de todos nós olharmos para um jogador de futebol como funcionário como outro qualquer. Tem que trazer retorno, senão, rua. Assim é a vida aqui fora. Assim deveria ser a vida num clube de futebol Assim a lei deveria tratar os jogadores.Chega de protecionismo para uma minoria que ganha milhões. Os outros 90% dos jogadores que ganham menos de 1mil reais são tratados como funcionários comuns. Não rendeu, rua. Pq os mais abastados não podem?
-
neto
24/08/2011 11:51:14
Na hipótese trazida pelo Erich o trainee não tinha contrato em vigor com a empresa. No caso Henrique havia um contrato em vigor para ser cumprido, o que gera, além de obrigação jurídica, obrigação ética e moral. Já diziam os romanos: "pacta sunt servanda" ou os contratos existem para ser cumpridos.
-
João Carlos
24/08/2011 10:54:15
Existe outra grande diferença: os atletas tem contrato de 5 anos com o clube, ou seja, chova ou faça sol durante 5 anos no fim do mês o rapaz recebe um belo salário, privilégio que nenhum trabalhador comum tem. Se ele passar uma fase ruim, decrescer de produção, ou perder o gosto pela profissão ainda assim terá o seu garantido, ou então uma recisão que lhe dará uma bolada significativa.
-
Shiro
24/08/2011 10:33:03
Hj em dia todos quer ganhar dinheiro fácil. Cade a ética no esporte na educação na vida eles tem uma divida de gratidão com o time formado
-
Jão
24/08/2011 10:26:46
Ótimo Texto!
-
Sergio Padilha
24/08/2011 08:53:50
Você se esquece do ponto mais importante. O dinheiro e as condições de trabalho pleiteadas pelo estagiário são para ele. No caso dos jogadores existe uma corja de intitulados empresários que vão atuar como intermediadores e, com certeza, se beneficiar muito mais que atleta e clube, já que nada investiram e nada tem a perder.
-
givago
24/08/2011 04:35:07
Concordo em algumas partes.A grande diferença entre a situação de jogadores e empregos normais é que os jogadores assinam um contrato MUITO diferente.Em uma empresa se pode sair quando quer, só cumprir o aviso prévio. A empresa também pode demitir o funcionário, só pagar o que deve.Jogadores assinam contrato, e nele ta escrito tudo que deve ser cumprido. Se ele tem contrato de 3 anos com um salário X, que o cumpra. Se o clube quer mandar embora o jogador, que pague a multa de recisão. Simples assim.Se o Henrique tivesse ido ao mundial e não tivesse jogando nada, ou se machucasse, o clube para os seus salários do mesmo modo.Então para os jogadores, quando forem assinar com um clube, que analisem muito bem o que estão fazendo.
-
Aloisio
23/08/2011 20:19:06
Erich, concordo com a sua comparação. Já comentei aqui no seu blog e em outros blogs que a valorização é necessária e justa, contudo, tenho um senão, a impressão que esses atletas tentam utilizar de subterfúgios para forçar tal valorização. Recorrer (ou ameaçar recorrer) à Justiça do Trabalho como primeiro artifício não me parece o mais correto, principalmente quando os argumentos são tão estranhos, como no caso Oscar.
Leia os termos de uso