Negócios do Esporte

Por que D’Alessandro vende mais do que Neymar?

Erich Beting

No mês passado, a Nike divulgou alguns resultados de venda de camisas oficias de futebol no Brasil. Segredo guardado a sete chaves pelas fabricantes de material esportivo, a empresa disse apenas quem são os líderes em vendas no país. Para evitar aqui o diz-que-diz clubístico de torcedores, segue uma informação importante. A venda computada pelas fabricantes não é para o consumidor final, mas sim para as lojas. Ou seja, não é o número de compradores diretos, mas o de lojistas que buscam o produto para então revenderem ao consumidor, com o risco de não conseguir negociar a camisa ou ter de fazer promoções para venda.

Com isso bem claro, reproduzo parte do texto distribuído à imprensa pela Nike:

''E entre os times e os atletas brasileiros o Corinthians é o número 1 em vendas, com as camisas de Paulinho (número 8). Depois vem o Inter de Porto Alegre, com a camisa 10 de D’Alessandro, e o Santos, com a 11 do Neymar''.

Ok, vamos considerar que o tamanho das torcidas dos times seja o primeiro parâmetro para tentarmos explicar esses números. Sendo assim, logicamente o Corinthians será o líder em vendas, e naturalmente um jogador que tem ótima identificação com a torcida, como Paulinho, tende a ser o de maior procura pelos lojistas. Afinal, a camisa do ídolo do time é a que potencialmente vende mais.

Só que o mesmo critério não serve, por exemplo, para explicar o porquê de D'Alessandro vender mais do que Neymar.

Sim, os dois são os maiores craques e ídolos de Inter e Santos. Mas, obviamente, o interesse em torno de Neymar extrapola o tamanho de Santos e Inter. Hoje, pensando racional e mercadologicamente, a camisa 11 de Neymar teria tudo para ser o item de maior venda para as lojas.

É para tentar explicar isso que entra um fator importante do contrato dos clubes brasileiros com a Nike. Hoje, além de seleção brasileira e Corinthians, a fabricante fornece uniforme para Santos, Inter, Bahia e Coritiba. A expansão no número de clubes atendidos foi um dos grandes saltos da Nike no mercado brasileiro. O problema, porém, é que a empresa não tem uma estrutura suficiente para atender a cinco clubes e mais a seleção. No passado, nem mesmo para atender seleção, Corinthians e Flamengo a Nike tinha força.

Para tentar resolver isso, a empresa fez um acordo com a Netshoes, que tem como um dos segredos de seu negócio como loja virtual de artigos esportivos a logística de entrega do produto. Por contrato, a Nike cuida das operações de seleção, Corinthians e Internacional. Santos, Coritiba e Bahia são coordenadas pela Netshoes, que recebe o produto da Nike e então coordena as vendas para os lojistas.

O maior enrosco nessa história é exatamente o fato de a Netshoes ser não apenas uma empresa de logística de distribuição, mas sim um importante vendedor de produtos para o consumidor final. A própria campanha publicitária da empresa na TV enfatiza isso, mostrando ao consumidor que ele tem, na empresa, uma loja virtual disponível 24h por dia e sem filas.

Quando a Netshoes tem de vender para o lojista que ela mesmo ''derruba'' na sua propaganda, o enrosco está feito. Naturalmente ele compra ''menos'' do seu próprio concorrente do que compra da Nike (até pela gama de outros produtos que a marca americana oferece). Com isso, a camisa do clube tem menor procura nas lojas e, consequentemente, gera menor receita para os clubes.

Uma das grandes chaves de mudança do mercado de fabricante de material esportivo no Brasil nos últimos oito anos foi a capacidade de entrega das empresas. Com o aumento da renda do brasileiro, o consumo de produtos dos clubes aumentou. Sendo assim, ter uma boa presença no ponto de venda passou a ser um fator chave para os fabricantes e, também, para os clubes, que ganharam mais com a porcentagem sobre a venda do seu produto.

Num mercado tão delicado quanto o brasileiro, em que há demandas específicas, os clubes precisam olhar com carinho para a capacidade de entrega de seu parceiro de material esportivo. Ter só uma marca de renome na camisa, nesse caso, pode ser até pior, já que isso significa maior exigência por parte do torcedor.

Afinal, por mais fanático que seja o torcedor do Inter, é impossível que D'Alessandro represente maior poder de convencimento de compra do que Neymar…