O Corinthians e a Caixa
Erich Beting
Ontem não houve tempo hábil para falar do tema, então vamos hoje a uma análise que muita gente já pediu para que fosse feita. Neste instante em que escrevo o post está programado o início da entrevista coletiva de imprensa em que será anunciado o patrocínio da Caixa ao Corinthians até 2014.
O ponto chave do negócio não é a grana envolvida, nem se há ou não interferência do ex-presidente Lula na concretização do acordo. Essas são duas relações ralas para tentar compreender o negócio. Na verdade, é preciso analisar toda a conjuntura do mercado de patrocínio esportivo, no Brasil e no mundo, para chegar-se a uma conclusão um tanto quanto óbvia.
É extremamente pertinente e coerente a realização do patrocínio da Caixa para o Corinthians.
O primeiro motivo é mercadológico. A Caixa está, hoje, entre os cinco maiores bancos do Brasil. Seus concorrentes diretos estão, todos, posicionados de forma estratégica no mercado de patrocínio esportivo. O Itaú lidera as ações com seleção brasileira e Copa do Mundo de 2014; o Bradesco vem a seguir com o patrocínio às Olimpíadas-2016 e outras seis confederações; o Santander fincou o pé no futebol com a Libertadores e Neymar; e o Banco do Brasil tem a força do vôlei e outros esportes de bom posicionamento estratégico como tênis e automobilismo.
Até o anúncio do acordo com o Corinthians, a Caixa estava com o atletismo e o Comitê Paraolímpico Brasileiro. Propriedades interessantes, mas que estão longe de serem estratégicas como a dos concorrentes. Além disso, desde meados deste ano o banco já começava a entrar na propriedade que ainda está disponível no futebol, que é o patrocínio a clubes. Avaí, Figueirense e Atlético-PR possuem a marca da instituição financeira em suas camisas. Sendo assim, o patrocínio ao clube que hoje é o mais midiático do país tem um apelo gigantesco para a Caixa e é uma forma direta de ela se posicionar contra seus principais concorrentes.
Afinal, a partir do momento em que a Caixa ou qualquer outra empresa pública não tem regalia de marcado por ser do governo, ela tem de fazer uso das ferramentas de comunicação da mesma forma que seus concorrentes da iniciativa privada. Nesse caso, reclamar da injeção de dinheiro público em instituição privada é de uma tremenda burrice. Ou, então, é fazer com que o esporte pague uma conta que não lhe pertence.
As empresas públicas fazem uso recorrente da publicidade para comunicar suas ações e conquistar clientes. Por que então não é errado elas pagarem para fazer propaganda em veículos de mídia? Da mesma forma que a Caixa anuncia nos canais de TV que lhe interessa, ela pode colocar dinheiro apenas nos clubes que são mais vantajosos na estratégia de comunicação dela.
Aí entra a questão de conjuntura do patrocínio esportivo pelo mundo. Nós temos aqui no Brasil um comportamento absolutamente radical em relação à participação da iniciativa pública no esporte. Algo que, mundialmente, não acontece. Como já disse em outra oportunidade aqui no blog, geralmente os gestores esportivos no exterior fazem chantagem com a esfera pública para conseguir regalias e/ou incentivos. Nos EUA, diversos estádios e arenas privadas são construídos com dinheiro do governo. A diferença, lá, é que o esporte prova, com números, que haverá geração de empregos e impostos para retornar o investimento feito.
Por aqui, sem a capacitação do gestor esportivo, confundimos investimento público no esporte com troca de favores. A Caixa patrocinar o Corinthians é vista como uma ação que compete exclusivamente a Lula, como se todos os demais envolvidos nessa história fossem pessoas sem qualquer capacidade de negociação e análise de mercado. Se não houvesse qualquer motivo para que a Caixa investisse no futebol e, especificamente, no Corinthians, aí sim poderíamos creditar a Lula qualquer ingerência. Mas, na atual conjuntura do mercado de patrocínio no país, o patrocínio não só se justifica como se transforma num grande trunfo para a empresa na disputa com a concorrência.
Aí sim entramos em outra questão, que é o valor do acordo. A Caixa pagará R$ 1 milhão para ter a marca exposta nos dois jogos do Mundial de Clubes, outros R$ 30 milhões para 2013 e renovação automática para 2014 com o valor pago corrigido pelo índice IPCA. Com isso chegamos a duas conclusões: a primeira, de que realmente o negócio foi técnico, já que o montante pago está dentro de uma realidade de mercado. A segunda, de que as próprias empresas colocaram um freio na gastança sem sentido dentro do futebol. Dificilmente o valor do Corinthians, que será o topo entre os clubes do Brasil, ultrapassará os 30 milhões.
Com esse valor, a Caixa consegue, também, pagar menos para ter a maior exposição entre seus concorrentes. Como estará na camisa do clube durante todo o ano, a empresa terá exposição permanente sua marca na mídia. Todos os seus rivais gastam mais do que isso no ano para terem menor presença na mídia. O que, também, explica a lógica do negócio. Afinal, qual outra propriedade estava livre para investimento com um retorno tão alto?