Brasil, o levantador de medalhas
Erich Beting
O esporte mais praticado no Brasil é o levantamento de medalhas.
Tomo aqui a liberdade de surrupiar a frase perfeita de Sergio Xavier, diretor do Núcleo Motor, Esporte e Turismo da Editora Abril, para explicitar o pensamento que toma conta do país a menos de três anos do início dos Jogos Olímpicos de 2016.
Temos, por cultura, o hábito de valorizar apenas as conquistas, e de preferência as douradas. Normal. É assim não apenas aqui no Brasil, mas na maioria dos países que têm o ego valorizado. O problema é que, pelas bandas tupiniquins, queremos atropelar um pouco as coisas e virar uma ''potência olímpica'' sem apresentar o requisito básico, que é ter planejamento para a prática de esporte.
Nos Estados Unidos, o lema ''sem ouro, sem medalha'', inspira empresas e atletas a buscarem o ouro. É a essência da meritocracia em sua mais cruel face: só o que reluz é ouro. Mas, por lá, a estrutura existente para o atleta chegar a uma Olimpíada em condições de conquistar uma medalha permite que esse nível de cobrança exista e, no quadro de medalhas, acompanhamos o reflexo claro disso.
Por aqui, é impossível pensar num Brasil mais vitorioso do que já é no esporte. Não pela falta de capacidade do país, mas pela falta de condições em um atleta chegar ao nível máximo de performance. Daí o projeto absurdo do governo federal, turbinado pelo ego do comando do Comitê Olímpico Brasileiro, de valorizar apenas a conquista de medalhas.
O grande caminho para o sucesso do Brasil no esporte passa pela realização dos Jogos Olímpicos. Não pelo que isso representa no quadro final de medalhas, mas pela mudança de entendimento do povo brasileiro do que é esporte. Somos monotemáticos na prática e consumo de informação do esporte. O futebol domina o noticiário e, naturalmente, a prática esportiva das crianças. Com as Olimpíadas, podemos construir espaços para outros esportes surgirem, já que não será apenas na estrutura do Rio que os países vão se alojar, sendo necessária a melhoria de infraestrutura esportiva como um todo em todo o país.
Só que o governo só quer olhar a medalha. Pressionado pelo COB e pela mídia (que insiste em só exaltar as histórias vitoriosas), criou um plano para que as empresas estatais invistam no esporte. Não na base, nem na melhoria de estrutura, ou na formação de novos atletas, mas sim nas ''modalidades com potenciais de medalha''.
Da mesma forma, o Ministério do Esporte e o COB, quando consultados por empresas que querem investir no esporte, indicam aqueles mesmos atletas e aquelas mesmas modalidades que já dispõem de recurso e estrutura para conquistar uma medalha.
Ou seja, continuamos a praticar nosso esporte predileto, que é levantar medalhas. Nada contra a empresa obter o retorno de visibilidade pela conquista de um medalhista olímpico. Mas, como projeto de nação, deveríamos estar mais preocupados não em ter uma boa posição no quadro de medalhas sem melhorar a estrutura esportiva, acreditando que um levaria ao outro.
A proporção é radicalmente inversa. Sem ampliação da prática de atividade física pela população, com mais acesso a áreas públicas e não-públicas para fazer algum esporte, fica muito difícil conseguir bom desempenho nas grandes competições.
Se quisermos ser, realmente, um país levantador de medalhas, temos de deixar de priorizar quem já tem condições de levantá-las.