Contra tudo e contra todos
Erich Beting
O bordão virou regra para a torcida de qualquer time. Na ótica do torcedor, todos estão contra seu time. É a proliferação dos ''anti'', da cultura do ódio, da mania de perseguição. Aqui no blog, já passei por representante das mais diferentes torcidas, conforme o tema e o ponto de vista a favor ou contra um clube.
Até aí, tudo bem, faz parte da paixão do torcedor. Para ele, até elogio, quando não deixado de forma claro, soa como ofensa.
Só que o problema é quando esse tipo de pensamento atinge quem está na gestão do clube. O papelão que se torna, cada vez mais, a disputa entre Conmebol e Corinthians é daquelas que podem manchar todos os avanços que o clube fez nos últimos cinco anos.
A postura inicial da diretoria do Timão foi perfeita. Repudiou o ato de seus torcedores, não fez pressão para proteger quem a polícia prendeu e, ainda, ''enlutou'' seu site oficial. É o mínimo que se espera.
Tudo começou a desandar quando o clube foi punido com a proibição de ter torcedores em seus jogos. Como disse aqui na ocasião, o Corinthians tinha a chance de fazer desse limão uma deliciosa limonada. Acatar a sanção e passar a exigir, do futebol na América do Sul, a melhoria no relacionamento com o torcedor e na qualidade dos campeonatos que são disputados por aqui.
Tudo bem, valendo-se do direito prévio do torcedor que comprou o bilhete antecipado, o Corinthians tentou recorrer. Perdeu. E começou uma estúpida perseguição pública com a Conmebol. A troca de farpas, via imprensa, ocorrida na terça-feira foi de uma infelicidade tremenda e, mais ainda, um desrespeito ao torcedor morto.
Sim, é absurdo o San José não ter sido punido por permitir a entrada dos foguetes sinalizadores mortais. Sim, a Conmebol tem de começar a ser mais eficiente no combate às atrocidades que sempre marcaram as competições por ela organizada. Sim, ainda há muito a evoluir na gestão do futebol na América do Sul.
Tudo isso, porém, não precisa ser exposto publicamente. Mario Gobbi tem o poder de representar o atual campeão da América e do mundo para pegar um avião, desembarcar em Assunção e colocar na mesa a participação alvinegra na Libertadores diretamente ao presidente da Conmebol.
Se está tão insatisfeito com a entidade, peça o boné e saia da competição. Com certeza o prejuízo financeiro será pequeno. A força da marca Corinthians permitirá ao clube excursionar pelo exterior e buscar outras formas de compensar o dinheiro que deixará de arrecadar com a disputa da Libertadores.
Duvido, até, que a Conmebol irá resistir à pressão de patrocinadores e televisão para que não seja imposta uma pena de cinco anos de banimento da participação do Corinthians da Libertadores. O clube, hoje, é maior do que o torneio. E tem de usar essa força para fazer com que a competição seja maior.
Ir à imprensa para pedir ''critério'' da Conmebol na punição aos clubes é birra de criança mimada. Ainda mais quando falamos de uma entidade que aprendeu, após 50 anos, de que é preciso coibir os maus tratos ao consumidor em seus eventos. Precisou, aliás, cair um alambrado e depois morrer um torcedor dentro de um estádio para que a entidade acordasse.
Contra tudo e contra todos pode até ser um motivo a mais para o torcedor acreditar em seu time. Só que não pode, nunca, tornar-se a bandeira de uma diretoria. O Corinthians começa a colocar por terra toda uma estratégia que alçou o clube ao mais alto patamar de sua história. Curiosamente no instante em que tinha tudo para mostrar que deixou para trás todos os vícios que corroem e apequenam o futebol na América do Sul.