O golaço da Centauro e o mercado peculiar do Brasil
Erich Beting
A rede de lojas Centauro marcou um golaço. Fechou a última cota disponível de patrocínio à Copa do Mundo. O negócio representa o maior investimento já feito pela empresa no mercado esportivo. Ao todo, os investimentos devem bater a casa dos R$ 100 milhões, segundo Sebastião Bomfim Filho, fundador e CEO do Grupo SBF, detentor da rede de lojas.
Na conversa que tive com Bomfim (leia aqui), o executivo expõe duas situações muito interessantes.
A primeira é a de que ele acredita numa mudança de comportamento do torcedor brasileiro a partir da Copa do Mundo. A Copa, na visão dele, mostrará um universo diferente ao torcedor, em que ele deixa de ser um ''animal'' para ser um consumidor que recebe um bom atendimento. É, mais ou menos, o que o próprio Bomfim fez lá em 1981, quando mudou o conceito de loja de artigos esportivos. Ao abrir a primeira Centauro, em Savassi, bairro nobre de Belo Horizonte, ele levou para as pessoas ''comuns'' o que antes era um espaço restrito ao fanático. Talvez o grande segredo do crescimento da Centauro tenha sido transformar em moda a loja de material esportivo.
E o segundo ponto que ele levanta no bate-papo é que teve extrema dificuldade em fechar o negócio com a Fifa porque precisou quebrar uma tradição na entidade. Pela primeira vez na história, uma empresa de varejo patrocinou o Mundial. Esse ponto é absolutamente revelador de uma situação peculiar do Brasil em relação ao restante do mundo. E que, logicamente, revela muito do embate que existe sobre patrocínio esportivo no país.
O desenvolvimento da indústria no Brasil faz com que as empresas de varejo tenham importante peso na nossa economia. Invariavelmente nas listas de maiores faturamentos do ano aparecem algumas desse segmento. O varejo é, também, dominante na publicidade brasileira. E, por isso mesmo, o varejo aqui é também um investidor no esporte. Em outros mercados, é raríssimo ver grandes lojas inserirem sua marca em patrocínios esportivos. O que geralmente acontece é a busca de grandes marcas pelas principais propriedades de patrocínio.
Mas, aqui, o patrocínio esportivo ainda é muito confundido com publicidade. A marca investe seguindo a lógica que permeou nossa história. Exposição na TV é o grande barato do patrocínio. Esse raciocínio guiou as duas grandes rivais do mercado de varejo esportivo, Netshoes e Centauro, no patrocínio feito até agora em esporte. As duas duelaram por espaço na TV, sem ter um plano mais concreto de ativação desses patrocínios.
A Centauro fechar com a Fifa obrigará a empresa a pensar em como não obter retorno apenas da exposição na mídia que o patrocínio trará. O aporte à Copa do Mundo não consegue obedecer a essa equação que o patrocínio a clubes têm atualmente. Em vez de ser uma oportunidade ''barata'' de mídia, ele se torna caro demais pelo tempo de exposição que possui. A ativação da marca a partir do evento é, portanto, a grande chave para o negócio fazer sentido.
O mercado esportivo brasileiro ainda tem suas peculiaridades. Talvez um benefício concreto que Copa do Mundo e Olimpíadas tragam para o país é entender que só exibir a marca não basta. O golaço da Centauro em se associar à Fifa pode ser o caminho para essa mudança, pelo menos nas empresas de varejo.