A Ilha de Lost, o Congresso, o Senado e Juvenal Juvêncio
Erich Beting
A entrevista coletiva/monólogo de Juvenal Juvêncio na apresentação de Paulo Autuori como novo técnico do São Paulo foi um acontecimento. Talvez até a fumaça preta que perseguia as pessoas dentro da Ilha de Lost, ou as atitudes de congressistas e parlamentares em relação a alguns tópicos recentes da política brasileira sejam mais compreensíveis do que o bizarro espetáculo protagonizado pelo presidente do São Paulo.
As declarações de Juvenal servem, e muito, para o folclore. Representam, na essência, o que foi o futebol de tempos atrás, com seus dirigentes polêmicos e fanfarrões. Hoje, muito do que se tenta explicar sobre o que acontece ou deixa de acontecer no Morumbi tem uma relação direta com atitudes como a protagonizada pelo mandatário do clube.
Poder centralizado, decisões tomadas sem qualquer base racional, distribuição de cargos estratégicos por interesses meramente políticos e/ou pessoais muitas vezes estão por trás de alguns dos problemas que se refletem em derrotas inesperadas dentro de campo, perda de rumo durante uma competição e incapacidade de decidir um jogo.
Ocupasse Juvenal Juvêncio um cargo de presidência dentro de uma empresa, ou mesmo num governo, e essa entrevista teria sido motivo para a queda das ações da companhia, uma reunião de emergência do conselho de administração ou, no caso de um cargo público, uma revolta popular nas ruas.
Mas o universo do futebol ainda permite aberrações desse tipo. E, naturalmente, muitos irão dizer que tudo não passou de um truque de Juvenal para afastar a pressão sobre o novo treinador e jogar toda a repercussão da mídia para si. Assim, o time ganha respiro para treinar, não se questiona mais um ou outro atleta e tudo se vira para o ''teatro'' de Juvenal.
De fato um pouco disso aconteceu. O novo ambiente do São Paulo com Paulo Autuori poderá até fazer com que o time vença o Corinthians e seja o campeão da Recopa, algo que com certeza não aconteceria se nada tivesse sido alterado no Morumbi. Mas as lições que vêm do mercado corporativo não podem ser ignoradas. Uma empresa que tem um presidente que tenta desviar o foco de atenção para problemas do seu cotidiano em vez de trabalhar para mudar o comportamento invariavelmente mostra no médio prazo suas deficiências.
O exemplo mais recente de que no futebol atual é cada vez mais difícil prosperar sem ter um mínimo de organização gerencial é o Palmeiras campeão da Copa do Brasil em julho de 2012 e rebaixado em novembro do mesmo ano no Campeonato Brasileiro.
Por mais divertido que seja o discurso de Juvenal Juvêncio, a leitura mais fria mostra que, no médio prazo, nova entrevista terá de ser convocada para tentar afastar uma nova crise da área. E aí, quem sabe, Juvenal será contratado para inventar um novo roteiro para salvar aquele final decepcionante que teve Lost. Por que, no futebol, está claro que não há mais espaço para essas coisas…
Para quem não entendeu patavinas do que está escrito aqui, segue o link com os ''melhores'' momentos do monólogo de Juvenal Juvêncio na apresentação de Paulo Autuori (clique aqui). É mais fácil, realmente, compreender o que motiva as decisões de senadores e deputados do que qualquer outra coisa…