Fifa e COL reúnem imprensa para “esclarecer” Copa
Erich Beting
A Fifa e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo de 2014 partiram para uma ''ofensiva'' com jornalistas, formadores de opinião e veículos de mídia. Desde a semana passada, a nova diretora de mídia da Fifa, Delia Fischer, o diretor de comunicação corporativa da entidade, Alexander Koch, e o diretor de comunicação do COL, Saint-Clair Milesi, têm se reunido com diversos jornalistas pelo Brasil.
A ideia dos encontros é aproximar mais as duas entidades dos formadores de opinião da imprensa brasileira e tentar diminuir a distância entre os dois lados na comunicação relativa à Copa do Mundo. A ''força-tarefa'' foi criada a partir de uma análise do que foi a cobertura de mídia da Copa das Confederações e, também, para diminuir o risco de a Fifa assumir o papel de vilã do Mundial.
A preocupação dos executivos se justifica. Um dos maiores indícios disso foi o uso do bordão ''Padrão Fifa'' para mostrar a indignação das pessoas com o alocamento de grande montante de dinheiro para obras relativas à Copa do Mundo quando deveriam haver outras prioridades para o povo brasileiro.
Como desde sempre pontuamos aqui no blog, o grande problema da Copa no Brasil não é a Fifa, mas o próprio país. Nunca soubemos, e continuamos sem saber (os protestos pré-Copa das Confederações deixaram isso mais claro ainda), o que queremos com a Copa do Mundo.
Tudo o que é relativo ao Mundial patinou aqui no Brasil desde antes mesmo da escolha do país como sede.
Desde pelo menos 2003, quando Joseph Blatter confirmou o rodízio de continentes para abrigar a Copa, que o Brasil aparecia como candidato único a sede de 2014. Teríamos, portanto, dez anos para nos prepararmos para o evento. Ok, vamos considerar que havia uma possibilidade de Ricardo Teixeira não conseguir a unanimidade entre os países da América do Sul e, com isso, apenas em 2007 sairia a decisão pró-Brasil. Teríamos, mesmo assim, seis anos para pensar, planejar e executar o Mundial.
Nunca existiu, porém, um projeto do país para a Copa do Mundo. O discurso de que o Mundial pode mudar a vida de uma nação é verdadeiro, desde que o país esteja preparado para ele. A Alemanha, em 2000, iniciou uma revolução no seu futebol para se preparar para receber a Copa do Mundo de 2006 e, a partir dela, colher os frutos desse novo patamar que o futebol alemão iria atingir. Hoje, sete anos após o torneio, é que o país atingiu o topo técnico e gerencial que almejou pelo menos dez anos antes.
O papo de legado dos megaeventos é uma falácia marqueteira adotada inicialmente pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) e que teve em Barcelona-1992 o seu melhor (e talvez único) exemplo. Desde então, o uso do termo ''legado'' passou a ser a vedete dos donos dessas competições esportivas.
Mas para ter legado é preciso ter, antes disso, planejamento e, principalmente, execução. É exatamente aí que reside a falha do Brasil com relação à Copa. Não planejamos o Mundial. Demoramos, por exemplo, um ano e meio para definir quais seriam as 12 sedes do evento, desperdiçando 25% do tempo que teríamos para o Mundial só com negociação política. Depois, levamos mais quase dois anos entre licitações e discussões sobre os projetos que devessem se adequar ao ''Padrão Fifa''.
E aí, de uma hora para outra, o problema passou a ser as exigências da Fifa, que já estavam definidas antes mesmo de o Brasil se candidatar a sede do evento. Não que a entidade do futebol não tenha sua parcela de ''culpa'' nessa história, mas desde sempre já tínhamos concordado com as regras do jogo sem ao menos saber para que elas serviriam.
Hoje, Fifa e COL tentam trabalhar para melhorar sua imagem no país. O grande erro das duas entidades foi não ter controle rígido sobre os destinos da candidatura brasileira desde 2007. Para fazer com que o legado de um evento seja realmente positivo, é preciso fazer com que as promessas feitas para que ele viesse ao país sejam transformadas em metas a serem cumpridas.
No Brasil, a cultura do ''no fim dá certo'' transformou-nos num país acostumado ao improviso. Somos os melhores do mundo em matéria de dar um jeito para que as coisas aconteçam, mas isso faz com que simplesmente não desenvolvamos a capacidade de planejar e executar.
O grande problema que a Fifa enfrenta hoje é não ter se preparado para essa característica cultural brasileira. Para quem conviveu nos últimos 12 anos com a obediência oriental, a rigidez alemã e o desejo de superação sul-africano, o ''desleixo'' brasileiro é preocupante. Esse talvez tenha sido o grande erro de avaliação da Fifa após o Brasil ter sido eleito sede da Copa do Mundo. Confiar que seríamos capazes de entregar o evento trabalhando ao nosso modo.
A gritaria que o Comitê Olímpico Internacional faz hoje em dia sobre o Rio-2016 era o que a Fifa deveria ter feito lá atrás, ainda em 2008, quando as sedes da Copa continuavam sem qualquer definição e o planejamento do país para o Mundial era sufocado por debates sobre eleições, mensalões e outros ões.
Hoje, o trabalho de bombeiro que a entidade tenta fazer talvez já não seja tão eficiente. O maior problema é que, para o bem e para o mal, a Copa do Mundo é da Fifa. Ela apenas acontece no Brasil. Esse discurso, que antes servia para que a entidade fizesse suas exigências e lavasse as mãos para a falta de preparo do país-sede, agora mostra que pode se tornar um grande vilão para 2014.