Negócios do Esporte

O marketing pode dar certo mesmo sem desempenho esportivo

Erich Beting

''O melhor marketing que pode existir no esporte é a vitória''. Essa frase sempre serviu de amparo para os clubes justificarem o não-investimento em marketing. No Brasil, esse sentimento parece estar enraizado na cultura dos clubes e, também, dos torcedores e de boa parte da mídia que cobre o esporte.

Mas talvez um dos poucos segmentos em que o desempenho de um produto não precisa necessariamente ser bom para que ele seja consumido é o esporte. Como tem um enorme grau de fidelização entre o consumidor e a instituição esportiva (pode ser um clube, um atleta ou uma modalidade), o marketing serve apenas como meio para que a pessoa tenha cada vez mais interesse em consumir.

Uma prova concreta disso foi o resultado de uma ação que a Peugeot fez ao longo de todo o ano com o Flamengo. Em cada jogo do Rubro-Negro, um grupo de consumidores é presenteado com um ''Kit Torcida''. Além de ingressos para ver a partida de camarote, ele ganha uma camisa do clube e, ainda, acompanha o jogo ao lado de um grande ídolo do passado do clube.

É algo simples de se fazer, gera muito pouco custo e, obviamente, traz um enorme retorno. Por pior que esteja o desempenho do time dentro de campo, a simbologia que existe no fato de o torcedor poder estar ao lado de um ídolo, torcendo com ele, supera qualquer má fase da equipe. No máximo gera motivo de sobra para o atual perna-de-pau ser xingado com mais veemência, mas o convite para ir ao jogo se torna irrecusável.

Ao longo deste ano, 400 consumidores da fabricante de carros estiveram em partidas do Flamengo pelo Brasil. Num cálculo simples e rápido. Se cada um desses clientes mantiverem-se fiel à marca que proporcionou essa experiência, e na troca do próximo carro comprarem o modelo mais barato da Peugeot, eles teriam gerado R$ 12 milhões em vendas. Basicamente o mesmo que a empresa paga para patrocinar o clube.

Claro que esse é um exemplo absolutamente hipotético, já que a decisão do cliente para uma compra de um bem tão caro como um carro não é feita 100% na emoção. Mas a fidelização do cliente via esporte é uma ferramenta absolutamente eficiente.

Nos últimos anos, a miopia da indústria do esporte no Brasil confundiu muito o papel de um patrocínio esportivo. Quase sempre a exposição de marca é o único fator que leva uma empresa a considerar colocar dinheiro num projeto de esporte. A possibilidade de realizar diferentes ações a partir daquele patrocínio é geralmente colocada para escanteio.

No caso de Peugeot e Flamengo, aquela que parece ser a mais banal das ações pode gerar um retorno milionário em vendas, sem falar em outros benefícios intangíveis, como a própria promoção da marca pelo simples fato de o cliente ter tido uma experiência singular.

O maior entrave hoje para que haja um crescimento nesse tipo de ação é a falta de fôlego, dentro das empresas, para planejar o pós-patrocínio. A verba toda quase sempre é gasta para que ela consiga ter a propriedade. Depois, pouco, ou quase nada, sobra de dinheiro para que as ativações sejam feitas.

O flamenguista continuará a ser Flamengo, como diz o trecho inicial do hino do clube. O patrocinador que resolve se associar a um esporte tem de entender que esse é o maior ativo que existe para um projeto. A exposição da marca é absolutamente vital no processo, até para justificar parte do valor investido no patrocínio. Mas o trabalho que é preciso fazer após colocar essa verba é mais importante para fazer com que o investimento se pague.

É exatamente esse tipo de evolução que ainda falta para o mercado brasileiro. Mas que, aos poucos, começa a se revelar, numa ou outra ação aparentemente pequena.