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Por que o esporte é imune à crise?
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Erich Beting

Os clubes de futebol no Brasil nunca arrecadaram tanto em bilheteria, atingem números recordes com o sócio-torcedor, seguem vendendo bem os seus produtos licenciados, faturam bastante com o pay-per-view e só não ganham mais dinheiro porque não conseguiram desenvolver uma boa cadeia de produtos e serviços para o seu torcedor.

Se estivéssemos pautando esse cenário no quadriênio 2007-2011, muito provavelmente o futebol estaria, tão somente, seguindo o fluxo de boas notícias da economia. O país vivia a euforia pré-sal, pré-Copa e pré-Olimpíada. A marolinha da crise no exterior não afetava um aquecido mercado interno pré-endividamento da Classe C, maior beneficiada com diversas mudanças que aumentavam o poder de consumo.

Mas o cenário é completamente outro. A economia entrou em retração. A endividada Classe C parou de consumir, o que faz a indústria reduzir as vendas. O pré-sal ainda está no pré. A Copa já é pós sem ter mudado muito a vida das pessoas como euforicamente se prometia. E o pré-Olimpíada não encanta mais assim.

E, mesmo assim, o futebol segue batendo recorde de faturamento a partir da paixão do torcedor. O que explica isso?

Sinceramente busco há mais ou menos uns dois anos a resposta para isso. Sempre disse, por aqui, que o salto de receita do futebol viria com os novos estádios e com o desenvolvimento de produtos e serviços para os torcedores. Foi assim que a Europa fez há 20 anos, é assim que os Estados Unidos trabalham há 100. Mas onde está a razão para que o torcedor, mesmo com as receitas mais apertadas, não deixar de lado o consumo do futebol?

Hoje o Mundo do Marketing publicou uma entrevista exclusiva com Philip Kotler, o maior especialista em marketing do mundo e que acaba de publicar um livro mostrando que o modelo de capitalismo que moldou o mundo nos últimos 300 anos está em colapso (a leitura obrigatória da entrevista está aqui).

A análise que Kotler faz sobre a mudança de comportamento das pessoas em relação ao capitalismo é direta e simples. As empresas precisam rever o modelo de acumulação de riqueza em troca da exploração do outro. É isso que gera um desequilíbrio na sociedade, e é isso que faz com que as empresas precisem assumir um outro papel diante da sociedade.

“Cada empresa deve redefinir o seu propósito, dizendo como pensa que seu trabalho está beneficiando a sociedade”, afirma Kotler ao Mundo do Marketing.

E é aí que entra a análise do começo desse post. O esporte é capitalista a seu modo, que é basicamente o modo que faz com que as pessoas queiram consumi-lo, independentemente do momento econômico que atravessa.

Como Kotler diz, o modelo capitalista que sustentou o mundo está precisando ser revisto. E as empresas precisam mostrar algum benefício à sociedade para que as pessoas consumam o produto delas. E é exatamente isso que faz o esporte. O torcedor consome o produto por acreditar nele. Seja o time, o atleta ou a competição. Ele sabe que o objetivo da empresa, no esporte, não é lucrar em cima da paixão, mas devolver para ele um bom produto, que no caso traz o benefício pessoal da performance esportiva.

Quando colocar essa lógica em prática, o esporte no Brasil conseguirá atrair, cada vez mais, os consumidores. E, naturalmente, a receita aumentará, o que por sua vez fará o produto melhorar. O capitalismo, no esporte, é um dos poucos casos em que o dono do negócio não está preocupado em acumular riqueza em forma de dinheiro. E, assim, ele consegue sofrer menos durante um momento de crise na economia.


Comunicado oficial – Arbitragem
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Erich Beting

Este blog vem a público esclarecer que repudia, veementemente, qualquer nota oficial de repúdio, de qualquer clube, sobre a performance da arbitragem numa determinada competição. Avisa, também, que já protocolou “junto à” direção da CBF uma reclamação formal pedindo que o clube que reclama da arbitragem nunca mais possa atuar nas competições em que ele trabalhe. Informamos ainda que iremos até o fim na busca por justiça, indo à Corte Arbitral do Esporte, na Suíça, para recuperar aquilo que nos foi tirado.

Nas últimas semanas têm sido esse o teor dos “comunicados oficiais” dos clubes em relação aos erros de arbitragem que ocorreram de forma mais decisiva no Campeonato Brasileiro. Uma tremenda bobagem, que só serve para que os dirigentes alimentem, ainda mais, uma polêmica já levantada de forma completamente deturpada pela mídia, que tenta encontrar má fé onde só existe, de fato, má qualidade na execução do trabalho.

 

Uma das melhores decisões tomadas neste Brasileirão foi a de fazer do árbitro uma figura inquestionável dentro de campo. Por mais autoritária que tenha sido a regra, ela contribuiu, e muito, para que os jogadores parassem de fazer cena e se preocupassem em jogar de forma mais leal o jogo. É só ver que as reclamações acintosas, agora, são contra lances que realmente foram mal marcados pela arbitragem, como nas recentes mãos bobas que aconteceram.

Isso deu, de uma forma ou de outra, mais qualidade para o jogo. O atleta não reclamar é um enorme ganho para o torcedor. Mas isso gera, para a arbitragem, uma obrigação. Tendo menos pressão sob seus apitos, sobra mais lucidez para reduzir o erro.

Agora, a missão da CBF é caminhar para isso. Trabalhar para reduzir o erro. Fazer do trio de arbitragem um quinteto parece uma obrigação. Isso ajudaria demais a reduzir erros de interpretação ou até mesmo de má colocação do árbitro na área.

Os clubes, em vez de jogarem para a torcida com suas notas oficiais de repúdio, deveriam brigar por uma melhora na qualidade do espetáculo. Afinal, o que o futebol vende para o público é isso. Um bom jogo, com o menor grau de interferência externa possível, para assegurar ao torcedor o máximo de emoção que uma partida possa proporcionar.

Quando disparam seus “comunicados oficiais”, os dirigentes contribuem para a discussão vazia dentro da mídia se o árbitro age ou não de má fé. Muitos fazem isso para atrair a audiência e alimentar a discussão que permeia o ódio nas redes sociais.

Cabe ao esporte reduzir a pó esse tipo de atitude dos jornalistas. Mas, para isso, precisamos de menos “comunicados oficiais” e mais união em torno da resolução de problemas. De nada adianta transformar o árbitro na autoridade máxima de fato dentro de campo se, fora dele, a CBF continua a permitir que os clubes joguem contra o próprio produto.

Erros sempre vão acontecer. Para A, B ou C. Contra A, B ou C. Alguns são banais e não interferem no resultado do jogo. Outros são cruciais para definir uma partida.

No tênis, resolveu-se isso com a conferência eletrônica de bolas dentro ou fora. Ela é feita após um pedido do atleta, que tem um limite de pedidos por set. Se acerta a marcação, não perde esse direito. Se erra, perde.

O futebol poderia adotar isso. Termina o lance, o capitão do time pede o direito de os árbitros reverem a jogada na TV e, aí, tiram a teima. Com um limite de um pedido por tempo de partida, o sistema poderia funcionar da mesma forma que o tênis. Se ele acerta, volta a marcação. Se erra, não pode mais pedir. Isso evitaria o jogo de parar a toda hora, mas seria usado para os lances cruciais, aqueles em que todo o time não se conforma com a marcação.

Batalhar pela melhoria da qualidade do jogo, e não pela vitória do time, deveria ser o desejo de todo mundo que trabalha com esporte. A CBF, preocupada em fazer do árbitro a autoridade máxima dentro de campo, deveria agora se preocupar em transformar essa figura num profissional menos suscetível a erros que mudam a história do jogo.

Só assim o discurso de torcedor da mídia e dos dirigentes seria sufocado pelo bom senso. Mas parece que essa palavra causa calafrios na CBF…


NBA mostra a importância de conhecer seu cliente
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Erich Beting

Estive na última semana envolvido com a realização da primeira edição do “NBB Marketing Meeting”, encontro organizado pela Liga Nacional de Basquete (LNB) e pela NBA e que contou com a promoção da Máquina do Esporte. Por conta disso, inclusive, o blog esteve praticamente sem atualizações durante a semana.

O evento foi fechado para convidados das duas ligas e da Máquina. A ideia era explicar um pouco mais sobre a sociedade entre LNB e NBA no Brasil e, também, trazer para as empresas ali presentes algumas ideias de como a NBA faz para ser uma marca de alcance global.

O primeiro e mais básico conceito aplicado foi o de que é preciso ter um bom produto em mãos. E, por produto, no caso da NBA, está claro que ele é o jogo de basquete. Sem isso, não se tem o que vender. Mas só ter o bom produto não basta. E, aí, o que a NBA mostrou é a importância que se tem de conhecer bem o seu cliente.

Todo o trabalho da liga é baseado, primeiro, no conhecimento do cliente. Não só quem ele é, mas também o que ele deseja. É a partir daí que a liga passa a montar todo o restante do seu plano de marketing. Que passa pela conversa com os patrocinadores da liga, os clubes e o público estrangeiro. Só depois disso que as ações são elaboradas para gerar engajamento e correlação do que a liga precisa baseado naquilo que o fã quer.

Um exemplo que mostra bem isso é o número de seguidores da NBA hoje. Segundo pesquisa da Sponsrship Intelligence para a liga, ao redor do mundo há 550 milhões de fãs do basquete americano. A China é o país onde há o maior número de clientes: 331,8 milhões. Os Estados Unidos estão em segundo lugar, com 82,3 milhões. A Índia é o terceiro país, com 41,6 milhões. E o Brasil está em quarto lugar, com 32,5 milhões.

Isso explica o movimento feito pela NBA há alguns anos de vir para o país. Há, por aqui, grande potencial de crescimento dos negócios da liga. Somos o quinto país que mais consome o League Pass, pacote de transmissão pela internet das partidas da NBA. Pela lógica da pesquisa, o Brasil deveria ser o quarto maior mercado do mundo. E, não por acaso, a liga americana decidiu tornar-se sócia da Liga Nacional de Basquete. Quanto mais forte for o basquete por aqui, mais consumidores haverá para a LNB e para a NBA.

Por aqui, ainda se discute muito o conceito de “maior torcida” que é aplicada apenas ao futebol.

Ao ver ontem a palestra de Pam El, vice-presidente executiva da NBA, mais uma vez constata-se o óbvio. De que adiantam esses levantamentos feitos aqui no Brasil? Os números de tamanho de torcida só servem para gerar manchete na mídia e gerar debates acalorados pelas mídias sociais e mais apaziguadores na mesa do bar.

O quanto, de fato, o esporte no Brasil conhece o seu cliente? Quantos consumidores de futebol existem? E das outras modalidades? É com base nisso que o esporte precisa começar a trabalhar.

Não adianta considerar a monocultura do futebol e a mídia como os grandes entraves para a massificação do esporte no país se não conhecemos quem são os clientes de cada modalidade. A NBA sabe que há 32,5 milhões de pessoas que são, de uma forma ou de outra, impactada pela liga aqui no país. São consumidores ou potenciais consumidores.

Mas e o esporte no Brasil? Ele conhece o seu cliente? Saber quem é o consumidor do seu produto é o primeiro passo para que uma marca possa desenvolver-se. Com o esporte não é diferente. A próxima rota de crescimento do esporte após os Jogos Olímpicos passa, necessariamente, pelo trabalho do conceito de “conhecer o seu cliente”.

Do contrário, pensaremos que os Jogos passaram e nada de bom ficou para o país…


Futebol entendeu que o estádio é seu local mais importante
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Erich Beting

Pode colocar essa na conta da Copa do Mundo. O futebol brasileiro finalmente entendeu que o lugar mais importante que existe é o estádio. Nas últimas semanas, a CBF tem feito um baita esforço para ampliar a média de público do Campeonato Brasileiro. Da mesma forma, os clubes têm se desdobrado para reduzir preços e tentar achar um “valor-ótimo” para assegurar a presença do torcedor no estádio.

Pode parecer estúpido de tão banal que o raciocínio representa, mas o futebol finalmente entendeu que o estádio é o seu local mais importante. E por isso mesmo é possível colocar na conta da Copa do Mundo essa mudança de pensamento.

Com novos gestores nos modernos estádios que ficaram após o evento, constatou-se o óbvio. Cadeira vazia é dinheiro perdido. Hoje, com as novas estruturas, o torcedor naturalmente gasta mais dinheiro quando vai a um estádio novo. Seja pela empolgação que leva ao consumo, seja pela maior oferta de serviços, proveniente de um estádio com mais conforto e pré-disposto a ter áreas de lazer que vão além do assento na arquibancada.

A CBF comemorou, nesta segunda-feira, o fato de atingir 25 mil torcedores de média nos jogos das 11h de domingo. Medida implantada à força no Paulistão deste ano por conta de incompatibilidade de adequação do horário da TV com os protestos nas ruas paulistanas, o jogo das 11h virou hit. A CBF, ágil, percebeu isso e passou a jogar, para os novos estádios, essas partidas. E, assim, está vendo a média de público do Brasileirão aumentar.

Há uma demanda reprimida de torcedores que querem ir ao estádio, mas que estiveram afastado dele por conta do calendário esdrúxulo que tomou conta do futebol nas últimas duas décadas. Ditada pelo interesse da televisão, a tabela de jogos sempre tentou se adequar ao conforto de quem assiste à TV. Os horários pensados para atrair a torcida foram sempre suprimidos.

Agora, porém, há uma nova necessidade no futebol. Os estádios não podem mais ser deficitários. Assim, é preciso fazer com que mais pessoas possam frequentar esse ambiente. E isso significa fazer promoções, modificar horário de jogos para adequá-los às necessidades das pessoas e tentar encontrar caminhos para levar mais gente ao estádio.

O reflexo da mudança de hábito estimulada pela Copa já começa a ser visto um ano após o Mundial. Mesmo à força, o futebol brasileiro vai melhorando. O marketing está começando a querer entrar em campo. Ou, nesse caso, a trabalhar para levar mais gente para o campo…


O patrocínio pontual só vale para time pequeno
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Erich Beting

O Santos conseguiu a proeza de, neste domingo, ter entrado em campo com nove marcas diferentes no uniforme, além do escudo do clube. O feito talvez só não tenha sido maior do que o do empate arrancado em pleno Maracanã contra o Flamengo depois de virar o intervalo perdendo por 2 a 0.

A justificativa do torcedor e da diretoria santista para se defenderem da atrocidade cometida pelo clube é a de que qualquer dinheiro é válido e que, ao fechar os patrocínios pontuais, o Santos engordou o caixa.

Vender patrocínios pontuais só porque o jogo será exibido na TV aberta é uma prática completamente descabida para um clube que disputa a Série A do Campeonato Brasileiro. O valor arrecadado com os patrocínios não chega a representar o salário que se paga a alguns jogadores do time, o que significa que ele não aliviará em nada o caixa.

O patrocínio pontual é uma prática que só vale para time pequeno. Os quase R$ 200 mil que o Santos arrecadou com seis diferentes empresas não compensam o desgaste de imagem que isso gera.

Lance do empate entre Santos e Flamengo. Será que é possível gravar qualquer uma das marcas expostas aí? FOTO: Gilvan de Souza/Flamengo

Lance do empate entre Santos e Flamengo. Quais as marcas expostas? FOTO: Gilvan de Souza/Flamengo

Repare, na foto acima, a quantidade de marcas que estão expostas. Agora imagine isso durante a transmissão do jogo, pela televisão. Qual marca será lembrada? De que forma?

Além disso, alguns dos patrocínios fechados dão a marca do desespero santista. O clube, literalmente, fez valer o bordão “Topa tudo por Dinheiro”. Entregou para marcas que são muito inferiores a ele o direito de ocupar um espaço que deveria ser o mais valioso de um clube centenário e que, entre outras coisas, revelou Pelé, Robinho e Neymar.

Os clubes de maior torcida deveriam entender, de uma vez por todas, que só os pequenos se beneficiam de acordos pontuais. Nem mesmo a receita obtida com os patrocínios no domingo foi suficiente para amenizar a crise financeira do Santos.

Entender qual o seu produto, quem é seu público e qual o potencial do clube para a geração de negócios para um patrocinador são maneiras muito mais eficientes de o Santos vender melhor o seu peixe.

Literalmente…

 


O futebol baixou os preços ou a crise acabou?
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Erich Beting

No começo do ano, o Palmeiras fechou patrocínio com três empresas que nunca haviam investido em esporte (Crefisa, FAM e Prevent Senior). Pouco depois, a Jeep usou o Flamengo para anunciar o começo de produção no país. Depois, a 99 Taxis começou a aparecer nos uniformes de diversos clubes da Série A nacional. E, no próximo mês, a Voxx, marca de suplementos do Grupo Cimed, anunciará patrocínio a diversos times (leia aqui).

Um ano após a lenga-lenga dos dirigentes de que a Copa do Mundo e a crise haviam afastado os patrocinadores de seus uniformes, o futebol não encontra motivo que justifique um movimento grande de entrada de novas marcas em ações de patrocínio.

Quer dizer. O motivo é claro, apenas o orgulho impede que os dirigentes tenham coragem de explicar o que acontece.

O fato é que o futebol é um mercado imune a crise. O que estava faltando para os clubes era readequar o preço à realidade, algo que começa também a acontecer em boa parte da economia do país, afetada pelo surto de crescimento que transformou, em muitos casos, a moeda corrente do real para o surreal.

O futebol vivia, até o ano passado, numa bolha de ilusão. Os clubes achavam que valiam o preço do começo da década, quando Ronaldo e Corinthians, impulsionados pela mania de grandeza da Hypermarcas, haviam levado para valores fenomenais o patrocínio de camisa no país. Com a economia em crescimento, mais Copa e Olimpíadas a caminho, era natural que o mercado se inflacionasse.

Acontece que o milagre do esporte não aconteceu. O do país, começou a deixar de acontecer. E, no fim das contas, os clubes demoraram para entender que a moeda corrente deveria voltar para os reais, em vez dos surreais.

Ao mesmo tempo, as empresas começaram a perceber outra forma de se comunicar por meio do esporte. As mídias sociais se fortaleceram e se transformaram numa eficiente e barata plataforma de ativação de patrocínio.

Chegamos, então, ao cenário de hoje. Com valores mais factíveis e sem grandes concorrentes no mercado, o patrocínio no futebol voltou a ser uma alternativa mais barata e eficiente de atingir um grande contingente de pessoas com alta capacidade de atenção do consumidor. É só ver a movimentação do torcedor em cima de uma marca quando ela anuncia o patrocínio à equipe.

A economia do país mostra que estamos num momento pior do que o do ano passado. Mesmo assim, o futebol parece ter reencontrado o caminho do patrocínio. Não tem muito segredo. A desculpa da crise acaba assim que se entende que não pode cobrar três vezes mais do que o real valor de um patrocínio.


O maior trabalho da CBF será resgatar a marca Brasil
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Erich Beting

A crise não é de hoje. Ela se manifesta, de formas diferentes, há muitos anos. E vai, aos poucos, consumindo todo o futebol brasileiro. Os 7 a 1 ficarão impregnados na memória coletiva por muitas e muitas décadas. Se considerarmos que eles foram responsáveis por acabar com o fantasma do Maracanazzo após 64 anos, não é difícil supor que tenhamos um período longo a lamentar.

Como reduzir isso é que é o ponto.

O que se viu na noite de quarta-feira foi uma seleção brasileira insossa contra uma Colômbia vibrante. Dentro de campo, parecia que a seleção pentacampeã do mundo era a que vestia amarelo mesmo, e não a que estava de azul. O campo não deixa de ser o reflexo do que acontece fora dele.

A seleção desalmada é reflexo de um comando de futebol brasileiro largado há muitos anos. Preocupados com negociatas, sem entender que fundamental é desenvolver o negócio.

O resgate de imagem que a CBF precisa fazer é enorme. A Copa do Mundo, 7 a 1 incluído na conta, ajudou bastante. Os índices de audiência da seleção estão altos como nunca estiveram desde o pós-Mundial. A torcida, ao se aproximar do time brasileiro por força da Copa, passou a querer acompanhar mais a seleção do que era antes, nos amistosos empacotados no Emirates Arena, espécie de primeira casa brasileira, mas lá na fria – e distante – Londres.

Ganhar a Copa América está longe de ser obrigação. Na realidade, parece que é sonho tão distante quanto arrancar um empate naquele fatídico 8 de julho de 2014.

Mas que o pós-Copa América sirva para a CBF entender que é preciso, urgentemente, repensar a imagem da seleção brasileira na mente das pessoas. Uma primeira medida é acabar com o acordo que terceiriza a gestão dos amistosos da seleção. A conta burra de que se ganha mais dinheiro terceirizando o jogo é a desculpa do preguiçoso.

Temos 14 estádios novos, precisando de grandes eventos, e pelo menos 20 milhões de pessoas ávidas em consumir o time nacional de futebol. A crise que a CBF vive no fora de campo pode servir, e muito, para mudar bastante coisa dentro dele. A começar pela relação do torcedor com essa marca.

PS: O blogueiro entra em recesso pelos próximos 10 dias para curtir mais um filho que chega. Volto em julho, ou caso mais algum causo de muito relevante ocorra no esporte. Um abraço!


O que muda no futebol daqui para a frente
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Erich Beting

É praticamente impossível que o futebol permaneça na redoma que esteve pelos últimos 50 anos depois do estouro dos escândalos de corrupção que envolvem algumas das figuras mais importantes da política da bola. Num efeito tão ou mais avassalador que a falência da ISL, no começo dos anos 2000, a crise de agora deixa uma ferida aberta no coração da Fifa, que até então permitia-se o privilégio de ser uma empresa com faturamento bilionário e que não precisa dar grandes satisfações para além de seus acionistas, que são as confederações.

Essa crise de agora, porém, deve mudar exatamente essa condição. A Fifa não precisava se preocupar com a opinião pública. Seus dirigentes seguiam incólumes, uma vez que o principal campeonato que a entidade organiza, que é a Copa do Mundo, segue a ser o evento mais cobiçado do universo ao lado dos Jogos Olímpicos. Isso garantia uma espécie de “blindagem” para a Fifa. Por mais que a organização fosse massacrada por denúncias de corrupção, escândalos e quetais, a Copa do Mundo assegurava uma relativa paz à Fifa.

O que mudou é que os patrocinadores, que só estão na Fifa por causa da Copa, estão sendo pressionados a rever seus conceitos. Acionistas das empresas patrocinadoras, diante dos escândalos, perguntam cada vez mais sobre o que está acontecendo. Isso reflete numa pressão interna dentro dessas empresas que, no final das contas, começam a pressionar a Fifa para que os problemas se resolvam.

Para piorar o cenário, a Uefa, principal entidade de futebol do mundo ao lado da Fifa, começa a questionar a entidade-mãe sobre o que está sendo feito. A ruptura da turma de Michel Platini é uma pressão muito grande e, talvez, até maior do que aquela enfrentada pela Fifa com a opinião pública. Com seu afiliado mais poderoso ameaçando a deserção, é preciso ceder politicamente para poder continuar onde está.

No caso ISL, há quase 15 anos, a Europa e os principais dirigentes do futebol também estavam envolvidos. O caso serviu, também, para que as entidades na Europa se tornassem mais sérias e menos propensas aos erros que agora cometem Concacaf e Conmebol, de terceirizarem suas propriedades comerciais em troca de alguns favores, digamos assim, menos nobres.

Há quatro anos, Blatter conseguiu contornar a crise interna que envolvia a compra de votos para a eleição do Qatar. A sujeira tinha ficado embaixo do tapete suíço do QG da entidade. Agora, a situação é muito distinta. A crise é na opinião pública e interna. Ingleses e americanos, derrotados nas escolhas de 2018 e 2022, querem mudar o sistema. E isso representa muita coisa.

Daqui para a frente, ou a Fifa muda o modo de operação, ou cairá no erro de continuar achando que detém o poder absolutista no futebol. Uma coisa, porém, é certa. O ambiente de negócios no futebol tende a ser muito mais vigiado daqui para a frente, em qualquer canto do mundo. E isso vai gerar uma melhora, gradual, na qualidade de quem trabalha nisso.


Por que existe um intermediário nos contratos de patrocínio?
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Erich Beting

A pergunta surgiu diversas vezes para mim na última semana, desde que estourou o escândalo envolvendo contratos de patrocínio e mídia no futebol. “Por que é que precisam existir intermediadores nos contratos? Não é possível que uma empresa precise de um terceiro para fechar negócio!”. Em 140 caracteres ou um pouco mais, muita gente ficou revoltada com o modus operandi da corrupção no futebol.

Existem, basicamente, duas situações que permitem a existência de um intermediário na negociação de contratos.

A primeira é a incapacidade de o esporte negociar com as empresas e/ou agências de publicidade. Pelo amadorismo das instituições, elas acabam terceirizando o serviço a uma agência, que vai ao mercado em busca de compradores das cotas de patrocínio disponíveis. Esse modelo é muito usado por atletas e até mesmo por alguns clubes menores, seja do futebol ou de outras modalidades.

É isso, por exemplo, que explica parte do segredo de muitos contratos de patrocínio de atletas e instituições. Mas há o outro lado da moeda…

O segundo ponto é o modelo que foi implementado pela Fifa nos anos 70, sob a gestão de João Havelange, e que passou a ser “regra” em boa parte das grandes instituições do futebol pelo mundo. Em 74, quando assumiu a Fifa, Havelange precisava gerar receita para uma entidade que funcionava praticamente como uma espécie de fornecedora de licença para federações disputarem campeonatos. O brasileiro percebeu que havia um potencial enorme de geração de receita. Em parceria com Horst Dassler, herdeiro da Adidas, entregou os direitos de comercialização da Copa do Mundo a uma agência de marketing. E, então, o negócio cresceu.

O que a Fifa criou, a partir dos anos 70, foi um modelo de completa terceirização dos negócios das entidades esportivas. A Fifa passou a ser “vendida” por uma agência. No começo, a agência ficava com todo o risco do negócio. Ela pagava à entidade e ia ao mercado tentar negociar os direitos de placas de publicidade, patrocínio e TV e, assim, obter seu lucro. Para a Fifa, o negócio não representava risco. Ela recebia adiantado e não precisava se preocupar em “fechar a conta”.

Com o passar do tempo, esse modelo começou a ser visto em diversos outros eventos. E aí surgiu o problema. Sabendo que era um negócio da China para quem comprava, dirigentes começaram a combinar comissões “por fora” para ceder a uma ou outra agência esses direitos. Em 2001, quando a ISL faliu (a empresa criada lá nos anos 70 por Dassler), levou consigo um escândalo de pagamento de propina a dirigentes, entre eles Havelange e Ricardo Teixeira.

Agora, o escândalo revelado tem a mesma origem. Pagamento de comissões “por fora” a dirigentes sobre direitos cedidos a empresas de marketing. Os patrocinadores, muitas vezes, ficam vendidos nessa história. Tentam negociar diretamente com a confederação que organiza o campeonato, mas ela só aceita o negócio se ele for fechado com a agência de marketing que o representa. O dinheiro das empresas é pago de forma correta, conforme contrato. O que acontece depois que ele entra nessas empresas intermediárias é que é o problema.

Por isso mesmo patrocinadores e empresas de mídia cobram, com veemência, uma maior transparência das entidades esportivas. O fim desse modus operandi das agências intermediárias tende a baratear o custo dos eventos. Para quem compra, o melhor é ir direto ao vendedor, sem precisar passar por um terceiro.

O escândalo revelado há quase uma semana promete acabar com um sistema de quase 50 anos que impera no futebol. E vai passar a exigir, nas entidades, gestores cada vez mais qualificados para vender – e entregar – bem o produto.


O escândalo de hoje no futebol começou há quatro anos
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Erich Beting

O estouro do escândalo de corrupção envolvendo dirigentes do futebol, especialmente nas Américas do Sul, Central e do Norte, começou a ser desenhado há quatro anos, antes da eleição para presidente da Fifa. O grupo que “debandou” de Joseph Blatter e tentou apoiar Bin Hamman é o mesmo que tem muito, mas muito a ver com as investigações que resultaram em todas as prisões desta quarta-feira.

Chuck Balzer, Jack Warner, Nicolas Leoz, Ricardo Teixeira e Julio Grondona eram os principais nomes da política da bola na Concacaf e na Conmebol. Os cinco, numa tentativa orquestrada, se uniram a Bin Hamman para tentar mudar o comando da Fifa e, naturalmente, terem maior influência na entidade mundial.

Blatter percebeu antes a articulação e desmantelou o grupo, revelando escândalos envolvendo esses cinco nomes, que num espaço de dois anos foram perdendo espaço no mundo do futebol.

E aí é que entrou toda a história revelada hoje. No desmantelamento do grupo, a Fifa deu argumentos para o governo americano passar a ir atrás de dinheiro que deveria ter recebido em impostos. Apertou o cerco a Chuck Blazer desde aquele instante. E, assim, foi trilhando o caminho. No ano passado, com o engavetamento, feito pela Fifa, do relatório sobre a gestão temerária da entidade elaborado por Michael Garcia, ex-promotor federal americano, o cerco se apertou ainda mais.

As contribuições com a Justiça feitas por J. Hawilla, Blazer e os filhos de Jack Warner são fundamentais no processo. Mas tais revelações acontecem porque muita gente foi “tirada” do jogo da Fifa há quatro anos.

E aí é que entra o grande ponto de onde toda essa história pode chegar. Ao desmantelar o modus operandi do futebol nas Américas, a Justiça dos EUA mostra o caminho para poder derrubar o modus operandi do futebol na Fifa. Caso isso venha realmente acontecer, muita gente poderá ainda estar envolvida.

O que isso impacta no negócio? A pergunta foi repetida diversas vezes para mim ao longo do dia. Acho que o ponto crucial é que ele torna mais limpo todo o processo envolvendo o esporte. E isso traz enormes avanços.

Quando há uma melhoria na qualidade dos profissionais envolvidos em qualquer segmento de mercado, há um forte crescimento daquele setor. O futebol poderá, finalmente, desenvolver todo o potencial que existe nele como esporte que mais movimenta as pessoas no mundo. Quando a ganância for substituída pela produtividade, não há como todos não ganharem.

É essa lufada de esperança que existe no momento.