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Jogo de segunda é O programa da TV
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Erich Beting

O público na Ilha do Retiro foi alto. Mais de 26 mil torcedores estiveram presentes para o Sport 1×3 Palmeiras. Mas o que mais chamou a atenção, para quem esteve em casa, é que ficou claro que a rodada da segunda-feira à noite foi inteira programada para a televisão.

A escolha do confronto, o horário do jogo e o tratamento dado pelo Sportv à cobertura da partida fizeram com que, finalmente, entendêssemos o significado e a importância de tratar o futebol como um produto para a televisão.

O jogo das 20h de segunda é um pedido do Sportv, que agora tem todos os elementos para vencer com folga a disputa pela audiência da segunda à noite na TV paga. Com o jogo ao vivo no Brasileirão seguido do “Bem, Amigos”, será muito complicado para qualquer outro canal chegar próximo da concorrência.

E aí é que está o grande ponto da estreia do jogo da segunda. O esporte é um entretenimento e, como tal, tem de ser moldado para atender aos interesses de quem ajuda a pagar a conta dele. Sendo a TV uma das principais financiadoras do futebol na atualidade, por que não criar um produto que atenda os seus interesses?

Com o título de “Segunda Campeã”, o Sportv refaz, no Brasil, o modelo que consagrou a popularização do esporte no país nos anos 80 pela TV Bandeirantes. Se, naquela época, a “Faixa Nobre do Esporte” era sinônimo de entretenimento ao vivo para o consumidor na TV (que o diga o Italiano às 11h de domingo, ou a sinuca com Rui Chapéu), nas duas últimas décadas esquecemos desse saudável hábito de pensar o esporte também para quem é um dos importantes propagadores dele.

Finalmente enxergamos que o futebol precisa ser pensado para a TV. E isso vai muito além do que apenas adequar o horário da partida para os anseios da grade de programação. O esporte pode oferecer conteúdo diferenciado para os seus parceiros de mídia. Essa foi a chave que transformou os campeonatos europeus em grandes produtos.


TV virou refém do sistema que ela própria criou
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Erich Beting

Quando o Clube dos 13 foi implodido, há questão de cinco anos, um dos principais articuladores da mudança do sistema de pagamento aos clubes pelos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro foi Marcelo Campos Pinto, então diretor de esportes da Globo.

Hábil negociador, Campos Pinto sabia que, naquele momento, a implosão do sistema de negociação individual dos clubes era bom para ele e para a emissora que trabalhava.

A situação, naquela época, era a seguinte. O Clube dos 13, pela primeira vez na história, havia criado um modelo de venda de direitos muito similar ao que acontece na NFL, a liga que mais fatura em direitos de transmissão no mundo. Em vez de buscar as emissoras para transmitir com exclusividade a competição, a NFL entrega jogos exclusivos para todas elas.

A lógica de mercado é simples. Em vez de ganhar muito de uma fonte só, a liga espalha entre diversas empresas seus diferentes produtos, criando valores distintos para cada um deles. O modelo, que começou lá nos anos 70 a ser implementado pelos americanos, beneficiou-se de um mercado aquecido de direitos de mídia. Hoje, por ano, a NFL ganha quase US$ 8 bilhões. As emissoras disputam, com valores estratosféricos, direitos sobre uma conferência, sobre o jogo do domingo à tarde, da segunda-feira à noite, da quinta-feira, do sábado, etc.

O Clube dos 13 estava, há cinco anos, tentando ainda de forma embrionária buscar esse modelo. Como havia uma disputa mais acirrada na TV aberta (Record e Rede TV! sinalizavam interesse em participar da concorrência), a ideia era os clubes faturarem mais da TV, mesmo que no final das contas terminasse com uma única empresa ganhando a disputa.

O que aconteceu, porém, foi um embate gigantesco por poder político entre um grupo liderado por Kleber Leite e Andrés Sanchez, tendo como mentor e incentivador Ricardo Teixeira, e o outro pelos líderes do Clube dos 13, então personificados em Fábio Koff e Ataíde Gil Guerreiro.

Guerreiro era o maior articulador do novo modelo de negociação da TV. A ideia era de realizar concorrência a cada três anos, abrindo cada vez mais espaço para jogos exclusivos para quem se interessasse pelos direitos. Além disso, ele traria para os clubes a geração de imagem das partidas, conceito que é premissa básica em qualquer evento, mas que ainda está muito, mas muito distante, de ser implementado no Brasil, que ainda tem na Globo não só a detentora dos direitos de transmissão, mas também a responsável por gerar as imagens.

Em meio a essa ideia, veio a briga pelo poder. Sem vencer as eleições, o grupo Teixeira-Leite-Sanchez decidiu, então, implodir o contrato de televisão. Puxados pelo Corinthians, os clubes sondaram Campos Pinto para a negociação individual.

Para a Globo, o negócio, naquele momento, era vantajoso.

O contrato individual acabaria com o projeto de trazer mais para a mão do C13 o controle sobre a distribuição das imagens do Brasileirão e, logicamente, a divisão por diferentes emissoras da transmissão do campeonato.

Agora, cinco anos depois, o feitiço começa a virar contra o feiticeiro. O que teoricamente Campos Pinto deixou como legado para a emissora hoje é um Frankstein. Exatamente pelo fato de cada clube negociar individualmente seus contratos que houve brecha para que o Esporte Interativo iniciasse as conversas para comprar os direitos do Brasileirão na TV paga com alguns clubes.

Hoje, com a negociação na base do “cada um por si”, quem quer comprar tem um trabalho 20 vezes maior, pelo menos, para adquirir os direitos de transmissão. Em vez de sentar com um único interlocutor e conseguir um acordo pela principal competição do país, é preciso ir a cada clube e conversar individualmente com eles. Isso deixa o processo muito mais demorado e, mais do que isso, incerto.

É só ver a bagunça em que se transformou a negociação dos direitos do Brasileirão na TV paga para o período 2019-2024. Se o formato de disputa não se alterar, o torneio terá 20 clubes, mas Globosat e Esporte Interativo já fecharam acordo com pelo menos 30 agremiações.

No final das contas, a TV virou refém do próprio sistema que ela ajudou a criar. E, ao que tudo indica, pelo menos até 2024 não há previsão de que os clubes se organizem para voltar à negociação coletiva dos direitos.


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