Negócios do Esporte

Arquivo : dezembro 2012

O tour de Federer e a lógica reversa do esporte no Brasil
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Erich Beting

Roger Federer e Thomaz Bellucci fizeram na noite de quinta-feira a “grande abertura” dos quatro dias de evento em São Paulo para celebrar a estreia do tenista suíço, um dos melhores da história, em solo brasileiro. Na arquibancada do ginásio do Ibirapuera, a televisão mostrava alguns espaços vazios.

Claramente os assentos livres não eram pela falta de atratividade do evento, muito menos pelo horário de início do jogo (por volta das 21h locais). Ao preço de R$ 990 o anel inferior e R$ 500 o superior, a surpresa foi o Ibirapuera encher. Afinal, é mais barato assistir a diversos jogos de um ATP 1000 de Miami, por exemplo, do que pagar por um ingresso de um jogo de exibição no Brasil!

Mais uma vez o tênis peca pela fama “elitista” que construiu ao longo dos anos e que, desde as raquetadas certeiras de Guga, deixa de ser tão verdade assim. A cobertura mais ampla da mídia e o trabalho feito pela ATP nos últimos anos contribuiu para que o tênis deixasse de ser algo totalmente distante da realidade brasileira. Algumas quadras públicas acessíveis, o fenômeno de Guga no início do século e pronto, nós não temos apenas endinheirados milionários interessados em assistir ao esporte.

Quando conseguimos a proeza de reunir alguns dos melhores atletas da atualidade na cidade mais populosa do país, a lógica faria com que tivéssemos filas para conseguir ingresso, casa lotada e um sucesso de público. O absurdo, porém, é cobrar R$ 500 como preço mínimo para um jogo desses.

Sim, é verdade que a farra da meia-entrada interfere, e muito, nessa precificação de um evento. Como já falei disso no blog há algum tempo, vale lembrar. Para o organizador, não ter a certeza de quantas meia-entradas serão vendidas faz com que ele opte pelo mais simples: dobrar o preço do ingresso para faturar o dobro do previsto. Os organizadores também hão de lembrar que o valor de R$ 500 dá direito a assistir a duas partidas. E, também, vão justificar que nunca tivemos o Federer e os irmãos Bryan aqui, da mesma forma que a Sharapova e a Serena Williams são igualmente ícones mundias do tênis e estão esta semana por aqui.

Só que ao jogar o preço lá no alto a própria organizadora do Gillette Federer Tour joga contra o seu patrimônio. O valor mínimo de R$ 500 faz com que, facilmente, o público presente ao ginásio seja aquele que está acostumado a ver tênis. Sendo assim, não se renova o público e não se consegue fazer com que novas pessoas tenham acesso ao esporte. Se o preço da entrada fosse o único meio de se remunerar os atletas, ainda vá lá, mas a Gillette banca absolutamente toda a parte cara da conta.

No Brasil, a lógica dos organizadores de evento é tentar faturar ao máximo sem pensar na continuidade do produto. Pior ainda, sendo a Koch Tavares a organizadora do tour de Federer, do ATP 250 e do Challenger Finals, a própria empresa não trabalha para a criação de uma cultura no público brasileiro para acompanhar o esporte. Se os jogos com o suíço servissem de estímulo para novas pessoas irem ao tênis, seria muito mais fácil lotar os ginásios nos dois outros eventos da modalidade organizados pela empresa.

Mas a indústria no Brasil, como um todo, teima em seguir uma lógica reversa de que o luxo é o que dá retorno, e não a popularização de um produto para ganhar no atacado. É isso que move o segredo da Apple e, atualmente, o crescimento chinês pelo mundo todo. O produto de nicho é muito mais difícil de ser vendido.

Talvez essa seja a teima de um país deitado em berço esplêndido…


O que a Stock ensina aos outros esportes
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Erich Beting

No próximo final de semana a Stock Car realiza a sua “Corrida do Milhão”, um dos mais bem sucedidos projetos de marketing no esporte brasileiro. Criada em 2008, a prova que dá R$ 1 milhão em prêmio para o vencedor mostra alguns aspectos importantes na estratégia que o esporte precisa cada vez mais adotar para construir grandes histórias.

O primeiro deles é a definição de objetivos. A Stock se propôs, há seis anos, tornar-se a principal categoria do automobilismo no país. E, para não oscilar conforme o interesse das empresas, a categoria montou um projeto que prioriza o básico, que é o atleta. O foco da Stock é dar condições aos competidores para que eles consigam fazer carreira na modalidade e, mais do que isso, crie um público fiel à categoria.

Depois de patinar no Ibope e perder a exposição ao vivo da Globo em todas as suas provas, a Stock agora começa a reencontrar um caminho bom de manutenção da categoria. Álbum de figurinhas e produtos licenciados são apenas algumas das ações feitas para levar ao público o dia-a-dia das pistas e, mais do que isso, formar ídolos com os pilotos.

No início da semana, por exemplo, Cacá Bueno, líder do campeonato, participou de uma ação com a equipe num centro comercial em São Paulo. Frase do piloto após o evento: “Tirei tantas fotos aqui com o pessoal, então deu para perceber que eles acompanham a Stock e também senti que são torcedores” (leia a reportagem completa aqui).

Cada vez mais procurada pela mídia, a Stock Car mostra aos outros esportes que o caminho para ter sucesso como evento é “simples”: Continuidade, prioridade ao atleta e foco no torcedor são as principais ações a serem tomadas. Com elas, mídia e patrocinador tornam-se uma espécie de consequência natural.

Não dá para achar que um produto sem torcida e atletas competitivos poderá ser um sucesso de mídia e patrocínio. Quem quiser ver um pouco mais como fazer, que tente ir a Interlagos no próximo domingo.


Só o marketing não resolve
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Erich Beting

Palmeiras e Flamengo vivem situações muito parecidas nos bastidores dos clubes. No Fla, com a eleição para a presidência já realizada, Patrícia Amorim perdeu o rumo e o posto. No Palmeiras, até o fim do mês de janeiro Arnaldo Tirone deve tomar a mesma nau sem rumo de sua ex-colega de Rubro Negro.

Curiosamente, porém, os dois clubes sofrem com uma visão tosca da função do departamento de marketing do clube. Tanto no Rio quanto em São Paulo, os dois presidentes foram duramente criticados por não conseguir fazer o que o Corinthians fez nos últimos cinco anos, transformando o departamento numa das grandes molas propulsoras do clube.

Só que apenas o marketing não resolve a situação tanto de Palmeiras quanto de Flamengo.

Hoje o UOL destaca uma entrevista com Rodrigo Geammal, novo executivo de marketing do clube paulista (leia aqui). Nela, Geammal, que vem do mercado corporativo, bate na tecla de que o departamento precisa ser profissionalizado, precisa ser integrado às demais áreas do clube. Ontem, na entrevista pós-eleição, Eduardo Bandeira de Mello, novo presidente do Flamengo, dizia que já em janeiro o Rubro-Negro terá patrocinadores na camisa, algo que penou, e muito, para tentar conseguir nos últimos dois anos.

Nas duas situações, porém, o sucesso da empreitada não depende apenas do departamento de marketing.

Valendo-se do exemplo corintiano, o marketing do clube só conseguiu se sobressair quando o financeiro renegociou todas as dívidas, deu fôlego ao fluxo de caixa ao clube e permitiu que houvesse um cenário positivo para o Corinthians buscar novos parceiros comerciais. Endividados e, pior, sem as dívidas equacionadas, Palmeiras e Fla sofrem ainda com o vazamento de toda e qualquer negociação e uma enorme pressão de conselheiros, que não têm qualquer compromisso com a gestão do clube, por fazer contratos mais valiosos.

O departamento de marketing dentro de qualquer instituição é um importante meio de busca por dinheiro e relacionamento com o torcedor. Nos clubes de futebol, a pressão exercida por pessoas que não estão no dia-a-dia do gerenciamento do clube só atrapalha nessas negociações. Em clubes que não são de futebol, o pouco caso que é feito com a importância do marketing para se relacionar com o torcedor é uma das maiores causas para as equipes serem extintas tão logo o patrocinador principal desista do projeto.

Só o marketing não é suficiente para levantar gigantes adormecidos como Palmeiras e Flamengo.

Antes dele vem a necessidade de repensar a forma como os clubes são gerenciados, especialmente a interferência de pessoas que não têm noção de mercado e, mais ainda, comprometimento com a gestão do dia-a-dia. Resolvido esse primeiro e enorme problema, o maior gargalo hoje é a situação financeira da instituição. Estar endividado não é problema, desde que essa dívida esteja equacionada e com um plano de pagamento que comporte o fluxo de caixa. Só a partir daí que o marketing tem tranquilidade para trabalhar e, mais importante, mostrar resultado.


A manifestação popular e o preço que o futebol paga
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Erich Beting

Foi bonita a festa feita pela torcida do Corinthians para se despedir dos jogadores que embarcaram na noite de segunda-feira ao Japão. Foi a típica celebração do amor ao clube, à história, ao esporte. Daquelas festas que eu só sei pelas histórias que meu pai contava de dar um jeito de largar o trabalho para ir até a cidade receber o Santos de Pelé, ou o time brasileiro campeão no basquete, lá nos anos 50 e 60.

Só que a festa tem sido demonizada por muitos que se apegaram ao inevitável estrago que é causado ao se colocar 15 mil pessoas eufóricas num espaço que está preparado para receber passageiros no entra-e-sai característico de um aeroporto, com espaço para, sei lá, 5 mil pessoas simultaneamente, e olhe lá.

O fato é que qualquer manifestação popular causa aglomeração e, consequentemente, estragos. É só ver o saldo final de encontros reunindo entidades de classes, mesmo quando o objetivo final não é só protestar.

Mais uma vez, infelizmente, o esporte paga a conta de algo que historicamente foi se transformando na relação entre torcida e polícia. Sempre que há qualquer problema ele é por conta do comportamento marginalizado do torcedor. Nunca se discute a ação dos policiais em ordenar e coordenar a manifestação das pessoas.

Um dos grandes pontos de virada da relação do futebol com a torcida na Inglaterra, tão ou até mais violenta que a brasileira, foi a criação de uma unidade especializada em tratar com os hooligans. Além disso, criou-se uma legislação específica, e dura, contra o torcedor. O resultado, ao longo do tempo, foi uma mudança de comportamento dos dois lados. Torcedores menos violentos quando agem em bando, polícia mais preparada para não tomar uma atitude que cause uma rebelião.

Mais uma vez o que aconteceu em Guarulhos foi fruto do despreparo da polícia brasileira em gerenciar multidões. Seja ela do futebol, da política, da música ou das maria-chuteiras desempregadas. A polícia, como sempre, tratou de atirar e bater nas pessoas para “dispersar” a confusão, como se realmente precisasse de tudo isso para pedir às pessoas que fossem embora do aeroporto.

O futebol, porém, continua a pagar a conta, já que historicamente, como falamos aqui no blog sobre a demolição do Olímpico, o torcedor nunca foi colocado como prioridade na relação com o clube. Torcer é muito mais um programa de aventura do que de entretenimento no país. Só que isso causa um problema gigantesco toda a vez que há manifestação de torcida.

A polícia, despreparada, tenta reprimir à força qualquer forma de aglomeração. O torcedor, desesperado e também com más intenções, acaba deixando um rastro de destruição por onde passa, seja fugindo do policial que bate sem perguntar ou entender o que se passa, seja por pura e simplesmente achar que, por estar em grupo, pode fazer o que bem entender.

A quebradeira no aeroporto de Guarulhos foi absolutamente dentro da normalidade, se comparada a diversas outras que já aconteceram quando temos uma quantidade grande de pessoas aglomeradas. Recentemente, uma manifestação política em Porto Alegre terminou no depredamento do Fuleco, mascote da Copa. Da mesma forma que o ocorrido em São Paulo, a polícia foi muito criticada pelo comportamento ostensivo e abusivo que mostrou na situação.

O que o futebol não pode mais aceitar é pagar a conta de algo que não é exclusivo dele e, muito mais ainda, que precisa urgentemente ser modificado no país. Aceitar que policiais abusem da força (como mostrado recentemente no episódio com a torcedora do Coritiba) e tratem o torcedor, em qualquer circunstância, como um marginal, é remontar ao início da década de 70.

Já são mais de 20 anos livres da ditadura no país. Mas, infelizmente, alguns comportamentos seguem exatamente iguais aos da época.


A simbologia do fim do estádio Olímpico
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Erich Beting

O futebol brasileiro começa, gradativamente, a colocar um fim na era paleozoica de relacionamento com o torcedor.

Um dos símbolos disso aconteceu neste domingo, com a partida derradeira do estádio Olímpico do Grêmio. Para preservar a história, coube a um Gre-Nal dar fim a um estádio que marcou a vida centenário do gremista. E, para celebrar o futuro, caberá ao torcedor tricolor dar a mesma vida pulsante a sua nova arena.

Sem qualquer melancolia, o Olímpico virá abaixo para dar lugar a um estádio muito mais eficiente, sob todos os aspectos, ao Grêmio e, principalmente, ao torcedor gremista. É importante celebrarmos a história, mas muito mais necessário para a sobrevivência é planejar o futuro.

O velho Olímpico deixa para trás uma era em que o centro de tudo num clube de futebol era a instituição, e não a massa de torcedores que a movimenta.

Um novo estádio simboliza um novo modo de encarar o torcedor, colocado como a prioridade de um clube tal qual uma empresa faz com o seu consumidor. Para existir a Coca-Cola, é preciso existir um comprador do produto. Para um time de futebol existir, é preciso que haja um torcedor. E é pensando nele que os estádios começam a ser reformados e melhorados em todo o Brasil.

Cadeiras numeradas, facilidades no acesso, restaurantes e lojas. Tudo isso é visto como “frescura” pelo torcedor apaixonado. Para ele, a prova do amor incondicional é sentar no cimento, tomar sol e chuva, viver uma aventura para chegar e sair do estádio, sofrer com falta de segurança e de conforto.

O problema é que, num país com a economia em crescimento (mesmo que seja abaixo do esperado), com mais opções de entretenimento e lazer para toda a família e com um aumento na demanda por conforto por partedo consumidor, um estádio de futebol ultrapassado começa a deixar cada vez mais o torcedor longe das praças esportivas. É muito mais interessante passar uma tarde no shopping com a família do que tentar levar todos a um jogo de futebol, por mais apaixonante que seja esse programa.

Sim, os ingressos também ficarão um pouco mais caros, mas convenhamos que é preferível pagar R$ 50 para ter confortos que hoje não são proporcionados num estádio com ingresso mínimo de R$ 30. A mesma gritaria que hoje ocupa o futebol também se fez presente na indústria do cinema quando as salas enormes foram dando lugar a espaços para até mil pessoas, som estéreo, tela de alta definição, filmagem digital, etc. Isso não era uma “sala de verdade”, não era algo compatível com o cinéfilo tradicional. Hoje, as bilheterias rendem bilhões aos estúdios, e o interesse do público em geral pelo cinema aumentou. O cinéfilo, tal qual o torcedor apaixonado, continuam a frequentar as salas. Dessa vez, maravilhado com os recursos e os confortos oferecidos.

O fim do estádio Olímpico simboliza o início de uma nova era para o torcedor de futebol no Brasil.

Torcer não será mais uma religião, mas sim uma ótima opção.


O olé do Banco do Brasil em Felipão
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Erich Beting

Só agora é possível comentar a baboseira cometida por Felipão em relação ao Banco do Brasil. O melhor de tudo em todo o caso foi o gerenciamento da crise feito pela instituição financeira, que deu um olé no treinador. O BB não quis entrar em polêmica e, pelo contrário, usou a própria competência da escolha de seu patrocínio esportivo para responder a Scolar.

“O Banco do Brasil, junto com todo o povo brasileiro, deseja boa sorte ao técnico Luiz Felipe Scolari em seu novo desafio à frente da seleção, e torce para que as grandes conquistas do vôlei brasileiro, patrocinado pelo BB há mais de 20 anos, inspirem o trabalho da seleção”, dizia trecho do comunicado distribuído à imprensa.

Nada mais perfeito para acabar com qualquer discussão. Até porque, indiretamente, o BB cutucou o Itaú, que entrou apenas em 2008 no futebol com o patrocínio à seleção brasileira.

O episódio também mostra a falta de reciclagem dos profissionais que trabalham com o futebol no Brasil. Em 2002, Felipão ganhou simpatia ao brincar com os adversários frágeis que enfrentava, os “Bambalas” e “Arimatéias” de sua época de jogador na várzea. Dez anos depois, a mesma fórmula de usar metáforas para explicar algumas situações requer um cuidado muito maior.

O BB deu o primeiro olé em Felipão. Resta saber se, tecnicamente, o treinador estará preparado para não ser driblado também pelo novo jeito de pensar e jogar futebol. Apelar só para a capacidade de gestão emocional do grupo é, hoje em dia, algo do “tempo que se amarrava cachorro com lingüiça (naquela época, aliás, linguiça ainda tinha a trema)”…