Negócios do Esporte

Arquivo : junho 2014

Vivendo e aprendendo a torcer
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Erich Beting

São Paulo, 12 de junho de 2014, por volta de 12h. No Parque do Ibirapuera, Vitor, 4 anos, e José, 3 anos, brincam. Um é brasileiro. O outro, mexicano. Falam, a seu modo, de seus ídolos. Neymar e Chicharito. José veio com a família para acompanhar a Copa do Mundo. Vitor estava com os avós passeando no parque enquanto aguardava a hora de acompanhar a estreia do Brasil.

Em diversos outros pontos da cidade de São Paulo, torcedores com as mais diferentes camisas de seleções mundiais se encontravam e confraternizavam. É esse o espírito, e o grande barato, de uma Copa do Mundo. Encontrar pessoas de outras culturas, vestindo outras camisas, e tratá-las como grandes e antigos amigos, unidos por um mesmo propósito, que é a paixão pelo futebol.

São Paulo, 12 de junho de 2014, por volta de 17h. Vitor e José estão com suas famílias assistindo ao jogo. Assim como boa parte do país está ligado na tela da TV. Dentro do estádio, são 62 mil torcedores. Maioria brasileira, algumas centenas de croatas e diversos outros de diferentes nacionalidades. É exatamente a mesma situação das ruas paulistanas. Uma salada de nações, unidas pelo amor ao futebol.

A bola começa a rolar e, em menos de 10 minutos, a Croácia sai na frente do placar. Logicamente, para delírio da minoria croata no estádio. Imediatamente, torcedores localizados ao lado dos croatas começam a xingá-los e pedir para eles silêncio. Os argumentos, em sua maioria, são o de que eles precisavam respeitar o Brasil, que aqui era a nossa casa, etc.

Voltemos à experiência vivida pelas crianças no parque pela manhã.

Quando estamos fora dos estádios, somos civilizados, confraternizamos, celebramos. Por que, ao passarmos a catraca, mudamos tão radicalmente de estilo? Por que não respeitar o direito do outro de torcer?

Durante todo o período pré-Copa, as marcas procuraram enfatizar a qualidade brasileira em receber bem as pessoas. Pelos primeiros dias de contato das seleções com os torcedores, isso foi uma realidade. Fizemos festa, colocamos os jogadores estrangeiros para sambar, fizemos uma festa como poucas nações conseguem fazer.

Mas o clima beligerante que existe dentro de um estádio é uma das coisas mais esdrúxulas, e amedrontadoras, do futebol no Brasil. Não sabemos respeitar o direito do outro de torcer. Tratamos, desde o princípio, o adversário em campo como inimigo na arquibancada. Esse é um dos principais motivos para termos uma violência endêmica nos estádios.

Não conseguimos permitir que um croata celebre o gol do time dele só porque foi contra o nosso? Isso não é torcer, mas sofrer.

A Copa do Mundo pode ensinar, e muito, o torcedor brasileiro a ser um torcedor, não um guerreiro. Para isso, a própria mídia precisa entender seu papel como formadora de opinião. Sim, é mais do que “só um jogo”. Mas é preciso fazer com que o torcedor vá ao estádio como quem vai incentivar o seu time. Assim como dentro de campo vence aquele que for mais eficiente, na arquibancada todos devem ter direitos iguais a demonstrar seu amor, e não o ódio, com o torcedor “diferente”.

A Copa deixa claro que o problema dos estádios no Brasil não está só nas torcidas uniformizadas. Não sabemos a torcer. Precisamos nos lembrar mais da tolerância fora das arquibancadas e levá-las para os estádios. Do contrário, o que seria o evento de maior celebração de amor ao futebol se transformará numa reprodução da guerra. Com o que tem de pior no ser humano dentro de uma guerra.

É preciso aprender a torcer. E isso só será possível se vivenciarmos melhor o que é torcer.


A Copa, 16 anos depois…
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Erich Beting

A última lembrança que tenho de uma Copa do Mundo no Brasil é em 1998. Sim, não endoideci nem mesmo você, caro leitor. O fato é que o Mundial da França foi o último que, para mim, teve aquele sabor de “Copa do Mundo no Brasil”. Algo que é tão característico e cultural no nosso país e que, para mim, sempre foi o que mais me magnetizou e me levou a trabalhar com isso.

E é justamente por conta do trabalho que, só agora, consigo reacender a chama de ver uma Copa no Brasil.

Em 2002, com a bola rolando lá do outro lado do mundo, o país não parava para assistir aos jogos. Apenas acordávamos mais cedo, ou nem dormíamos. Mas interromper o trabalho, mudar o planejamento do dia por conta daquele Senegal x Dinamarca imperdível, achar um jeito de esticar o pescoço na mesa de reunião para ver a TV colocada na recepção… Tudo isso ficou anestesiado na conquista do penta. Não aconteceu. Chegávamos às 12h para trabalhar, com aquelas olheiras de quem dormiu menos que o Luis Roberto, se é que isso era possível.

Aí veio o grande sonho de infância realizado. Em 2006, consegui carimbar, aos 45 do segundo tempo, o passaporte para realizar a primeira cobertura in loco de uma Copa! Embarquei cinco dias antes de a bola rolar na Alemanha, com a alegria de uma criança indo para uma viagem em férias. Quatro anos depois, cheguei a Johanesburgo seis dias antes de o Tchabalala fazer aquele golaço na abertura do Mundial sul-africano.

Essas duas experiências me ensinaram um pouco a dificuldade que deve ser viver como um expatriado. Ficar longe da cultura que marcou sua vida, dos amigos, da família, das celebrações. Ainda mais numa Copa do Mundo, evento que sempre moldou e guiou grandes acontecimentos do ponto de vista pessoal, desde o rojão estourando no ouvido no maldito Brasil x França de 86, ou na bronca da Tia Márcia por não falar de outra coisa a não ser de Copa em maio de 1990, passando pela festa adolescente em 94 e a de início de fase adulta em 98…

Uma Copa do Mundo longe do Brasil é muito legal, mas completamente diferente de tudo o que nos acostumamos a viver desde pequeno. Esqueça a rua pintada de verde e amarelo. Nem pense que tudo vai parar para ver o Brasil jogar. Nem mesmo nas ruas os comentários são só sobre o que realmente importa naquele momento…

Reencontrar-me com a Copa do Mundo no Brasil, 16 anos depois, é poder relembrar um pouco da infância. Colocar a bandeira no carro, na janela, no vidro do banheiro. Fechar a rua e pintá-la. Tudo isso faz parte da nossa cultura. É algo com o qual nos deparamos desde que nos conhecemos por gente.

Celebrar a Copa não é ser alienado. É ser genuinamente brasileiro. Reencontrar com o clima de Copa, mesmo que tardio, 16 anos depois, é poder voltar a celebrar a brasilidade muitas vezes sufocada pelos dilemas e definições que temos pela frente.

A Copa chegou. Nunca vivemos a situação de ter de construir o evento no país. Aprendemos bastante com isso e precisaremos usar esses ensinamentos para evoluir como nação. Não podemos descarregar só no técnico da seleção brasileira ou na Fifa a nossa indignação com as coisas que são erradas. Um país evoluído é crítico. Uma pessoa evoluída é crítica.

Mas para podermos cobrar, temos também de conhecer nossa cultura. E, pelos próximos 32 dias, viveremos uma manifestação que é parte de nossa raiz. A Copa chegou e a festa vai se espalhar por todo canto. Foram 16 anos para voltar a viver essa sensação. Com todos os defeitos típicos de nosso país, vai ter uma baita diversão. Ou melhor. Ela já começou. E o clima vai ficar ainda mais quente nos próximos dias. Em


Flu x Itália triplica receita de Volta Redonda de 2013
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Erich Beting

O amistoso entre Fluminense e Itália, disputado no último domingo no estádio Raulino de Oliveira, em Volta Redonda, provou aquilo que já falamos há tempos por aqui. Não é só a falta de bons estádios que afasta o torcedor. O produto apresentado para o público é o que, essencialmente, precisa ser modificado.

O jogo amistoso levou pouco mais de 17 mil pessoas ao estádio em Volta Redonda. Na bilheteria, a arrecadação foi de R$ 1,3 milhão.

O desempenho significa a maior lotação do Raulino de Oliveira e a maior receita do estádio nos últimos tempos. Mais ainda. Na comparação com todos os jogos feitos por Copa do Brasil e Campeonato Brasileiro no local em 2013, o amistoso de domingo arrecadou o triplo em bilheteria e levou o triplo de pessoas para o estádio.

Foram 11 jogos no estádio pelas duas principais competições nacionais em 2013, com uma receita total de R$ 407 mil. Dessas partidas, cinco foram do Botafogo, duas do Vasco, duas do Flamengo, uma do Volta Redonda e uma do Resende. Pela Copa do Brasil foram sete jogos, enquanto quatro duelos foram pelo Brasileirão. Em nenhum desses 11 confrontos a bilheteria terminou com saldo positivo. Sim, todas as vezes que foi jogar lá, a equipe mandante teve de pagar.

Numa única partida, o faturamento foi o triplo de todo o ano de 2013. Nada mudou no Raulino de Oliveira desde o ano passado para este. A única “novidade” foi a presença de um time que nunca vimos jogar por lá. Para isso, nem mesmo o preço salgado dos ingressos (o tíquete-médio ficou perto dos R$ 90) foi um empecilho. Nos jogos de 2013, o valor médio mais caro cobrado foi de R$ 20, e apenas 22% do estádio estava preenchido.

A conclusão é óbvia. O torcedor até pode pagar mais por um jogo de futebol. Desde que o produto tenha apelo. O amistoso entre Flu e Itália mostrou isso. Gente disposta a consumir futebol existe. Só que é urgente que o futebol seja digno do dinheiro que se gasta.

Enquanto não mudarmos o produto, por melhor que seja o estádio, ninguém vai querer estar nele…


Os novos dilemas que a Fifa terá com os atletas
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Erich Beting

A Copa do Mundo se tornou um evento desproporcionalmente gigante para a Fifa. Em 40 anos, o evento saiu de uma competição entre países europeus e Brasil e Argentina para ser um acontecimento mundial. Muito graças à transmissão da TV cada vez mais massificada, a Copa chega, em 2014, representando uma espécie de encruzilhada para a Fifa.

O evento se tornou tão grandioso que é praticamente impossível controlar quem pode ou não pegar carona com ele. É só ver a quantidade de propagandas que surgem neste momento pré-Copa. Se, há 20 anos, a preocupação da Fifa era em assegurar que os direitos de transmissão não seriam violados, agora o problema é outro. A entidade precisa tentar proteger seus parceiros da “carona” que os concorrentes pegam por conta da grandiosidade do evento.

Nesse novo embate, os jogadores assumem um papel importante. Sem a verba – ou o espaço – para patrocinar o evento, as marcas vão atrás dos protagonistas do Mundial. Messi, Neymar, Cristiano Ronaldo e afins viram a alternativa para que as empresas falem com os consumidores de um modo a tirar uma casquinha da Copa do Mundo.

Ontem, a Beats lançou um interessante clipe, chamado “O jogo antes do jogo” (detalhes aqui). Nele, diversos atletas que estarão na Copa do Mundo usam o fone de ouvido da marca. Em 2010, na África do Sul, a Beats foi uma das empresas que mais se beneficiou da exposição gerada pela competição. Muitas vezes só promovendo a entrega de produtos, conseguia ter a marca exposta nos fones de ouvido dos jogadores. De olho nisso, a Fifa proibiu, agora em 2014, que os atletas usem aparelhos que não sejam da Sony, patrocinadora do torneio (detalhes aqui).

Vamos ver, a partir do dia 12, como será esse duelo entre as empresas. É bem provável que os jogadores que têm patrocínio abram mão de usar qualquer fone de ouvido. Até por uma questão contratual. As chuteiras continuam a ser a única barreira permitida pela Fifa para que os jogadores possam atuar na Copa do Mundo. A justificativa é de que ela ainda interfere na performance, e que a qualidade do jogo precisa ser preservada. Se os atletas resolverem fazer valer o fato de serem “donos” do espetáculo, a “dona” da Copa do Mundo terá de sentar à mesa e negociar. Em

2018 deveremos ver uma nova batalha envolvendo o Mundial e a Fifa. Depois da TV e dos patrocínios, os atletas passam a ser um novo dilema para a entidade. E nessa queda de braço é difícil prever quem conseguirá barganhar mais…


Até tu, São Paulo?
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Erich Beting

A maior repercussão da fabulosa parceria do São Paulo com a empresa Busca Serviços Digitais até agora foi a gafe cometida por Renan Lemos Villela, dono do novo parceiro do São Paulo Futebol Clube, e não Esporte Clube São Paulo, como ele teimou em chamar. 

Mas, muito mais curioso, é fazer uma busca pelo nome de Renan Lemos Villela pela internet e descobrir que o Grupo Villela, que ele representa, tem um passado, no mínimo, questionável. O Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul tem Ação Civil Pública contra o grupo, acusado de discriminação religiosa. Villela obrigava seus funcionários a irem a cultos religiosos para “tirar o diabo do corpo”.

Os detalhes dessa história estão na Máquina do Esporte (clique aqui).

O clube que sempre se vangloriou de fazer excelentes negócios e ser vanguarda e exemplo de gestão não poderia, nunca, cometer um erro tão primário quanto esse.

No afã de buscar receita, os clubes estão esquecendo o primordial, que é o retorno financeiro que uma marca forte pode trazer.


Vai ter Copa!
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Erich Beting

E o brilhante recado é dado por esse grupo de italianos, cantando o hino nacional com a convocação de Cesare Prandelli.

Só falta, agora, esse tipo de atitude chegar ao Brasil. Pelo menos as ruas aqui em São Paulo estão começando a ficar mais verde-amarelas. Em dez dias tem tudo para ferver o país. Com ou sem protestos.