Negócios do Esporte

Arquivo : janeiro 2015

O milagre do X se desfez no esporte
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Erich Beting

A saída de Eike Batista da IMX (leia aqui) mostra o quanto ainda não há uma indústria de esporte no Brasil. É claro que o movimento está ligado à queda do “Império X”, muito mais do que qualquer eventual frustração que Batista possa ter tido ao trabalhar com o esporte. Mas a mudança do controle acionário da IMX mostra o quanto acabou a euforia dentro da indústria esportiva.

Voltemos no tempo. Em novembro de 2011, Eike anunciou a sociedade com a IMG para abrir, no Brasil, a IMX. A ideia, dita no comunicado distribuído à imprensa, era fazer com que a agência se tornasse uma das maiores do mundo, impulsionada pelo crescimento do esporte no país.

O cenário era lindo. Economia em alta, esporte idem. Brasil já detinha o status para ser a sede da próxima da Copa do Mundo e também havia sido eleito sede dos Jogos Olímpicos de 2016. As empresas patrocinavam o esporte como nunca antes. Eike ainda era visto como o excêntrico e audacioso empresário que seria a síntese do Brasil adulto, maduro, ex-emergente e novo dono do pedaço. A entrada dele no esporte só vinha mostrar que estávamos chegando a um novo patamar.

A IMX foi a última das grandes a se movimentar. Antes disso, já viviam a festa no Brasil do Esporte Octagon, Geo Eventos (união de Globo e RBS), o publicitário Nizan Guanaes e até mesmo o ex-jogador Ronaldo, com o grupo WPP. Todos estavam aqui, prontos para oferecer toda a estrutura dos melhores grupos do mundo para o novo Brasil do Esporte.

Por que hoje só perduram IMX (sem o X), Octagon (até quando, já que os sócios brasileiros foram morar em Orlando?) e a 9ine (ganhando dinheiro com shows, não com esporte)?

O problema que já existia naquela época e que hoje é muito mais evidente é que, na prática, são muitos prestadores de serviço para pouco serviço em si.

A IMX de 2015 tem quase metade do tamanho de 2014. O problema não foi a Copa, mas a lucratividade do negócio. A agência queria replicar o modelo da IMG nos Estados Unidos por aqui. Tinha o braço de gerenciamento de imagem de atletas, tinha área de consultoria, tinha área de eventos. Das três, só sobrou a de eventos.

Para uma agência prosperar no país, ela precisa ter um evento próprio. Do contrário, não há negócio para ela. Ou melhor. Até existe, mas é muito pouco. Hoje, o negócio da IMX está sustentado no Rio Open de tênis, torneio que gera R$ 25 milhões em receitas. Nenhum outro braço da empresa (talentos ou consultoria) é capaz de gerar tanto dinheiro assim.

No mercado americano, em que o esporte é profissionalizado, existe espaço para que haja gestores de imagem de atletas, consultoria para empresas interessadas em investir, etc. A IMG é um colosso mundial porque atua num mercado 100% profissional, em que há muito dinheiro envolvido na indústria esportiva e sem perspectiva de sair.

Por aqui, ainda estamos desenvolvendo uma indústria. O esporte quase nunca sabe construir um produto que possa ser vendido. As empresas quase nunca sabem investir no esporte e ajudar a transformá-lo em produto. As agências não crescem pela falta de maior maturidade da indústria. Em 2009, depois que o Rio foi eleito sede olímpica, todo mundo achou que era a hora do esporte.

O grande futuro da indústria estará depois dos eventos, quando será preciso fazer uso daquilo que foi construído para Copa e Olimpíada. Faremos muito mais coisas com o esporte, saberemos transformar muito mais ideias em produtos, teremos as empresas mais maduras para investir e, aí sim, será possível realmente crescer como se imaginava no esporte.

Mas, se alguém imaginava que a indústria esportiva se multiplicaria de uma hora para a outra só por causa dos megaeventos, vale lembrar a regra básica da matemática. Qualquer número multiplicado por zero é igual a zero.


It’s a Match! Ou. Como fazer dinheiro e atrair torcida
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Erich Beting

Líder da Conferência Leste na NBA, o Atlanta Hawks deu uma aula de como fazer dinheiro, atrair e entreter o torcedor num jogo de quarta-feira à noite. Num acordo com o aplicativo para celular Tinder, o Hawks fez da partida contra o Memphis Grizzlies um acontecimento. Criou o Jogo do “Deslize para a Direita”, em alusão à funcionalidade do aplicativo.

O Tinder é um aplicativo para promover “encontros”. Você cadastra o seu perfil, coloca as características que gostaria de ver num parceiro e, então, o aplicativo mostra quem está “disponível” dentro desses atributos nas redondezas. Se você gosta da pessoa, desliza para a direita a foto dela. Se a pessoa também deslizou para a direita sua foto, o aplicativo avisa: “It’s a Match!”.

A sacada do Hawks foi fechar a parceria com o Tinder para promover o jogo. Quem estaria na quadra era o de menos. O negócio era promover um encontro na Philips Arena para os seus torcedores a partir do uso do aplicativo.

O acordo com o Tinder gerou uma receita para o clube que, literalmente, já valeu o ingresso. Ou pelo menos subsidiou o torcedor que iria ao evento. O valor pago para ir ao ginásio era o de menos. Os US$ 15 davam um crédito de US$ 10 para bebidas. No fim, os US$ 5 que “sobravam” devem ter coberto o preço para imprimir o ingresso. E olhe lá.

Arte para promover o "Jogo do Encontro" do Atlanta Hawks

Arte para promover o “Jogo do Encontro” do Atlanta Hawks. Detalhe para o preço (US$ 15, com direito a US$ 10 de crédito para tomar bebidas)

Ao todo, 17.126 torcedores foram ao jogo (eram 18.238 lugares disponíveis no ginásio). A média que o Hawks tem obtido na atual temporada, quando faz uma campanha espetacular, é de 16.007 torcedores por partida.

Mas, mais importante do que isso, foi o furor causado pela ação. O time entregou aos homens, na entrada do ginásio, rosas para serem entregues às mulheres. Ao longo do tempo, os torcedores que conseguiram formar seus pares iam colocando fotos nas redes sociais e identificando com a expressão #SwipeRightATL.

O mais divertido foi ver a reação dos torcedores que ficaram em casa, lamentando o fato de não terem ido ao jogo para, também, poder se dar bem. Além disso, diversas personalidades brincaram com o fato.

Ontem abordei por aqui que o formato de disputa da competição para atrair o torcedor a um jogo de futebol é o de menos. O Atlanta Hawks mostrou que é só usar um pouco a criatividade, e oferecer uma solução a um parceiro comercial, que é possível atrair dinheiro, agradar a torcida e fazer um bom marketing.

O jogo? Ah, foi mais uma vitória do Hawks, por 96 a 86. E muitos veículos de mídia disseram que o Hawks deslizou para a esquerda o Memphis. Mas só daqui a 9 meses saberemos também se a ação do Tinder resultou em novos torcedores para o Atlanta…


Pontos corridos ou mata-mata? Melhor ter um BrasileirÃO
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Erich Beting

O novo presidente do Grêmio lançou publicamente a campanha pela volta do mata-mata ao Campeonato Brasileiro. Disse que está conversando sobre o tema com outros dirigentes, com a Globo, etc. e tal. Tão logo ele vazou a informação, saíram diversas análises sobre qual fórmula é melhor, que as competições mais legais do mundo são nesse modelo, que os EUA usam essa fórmula nas suas bilionárias competições e tudo o mais.

Debater qual formato de disputa é a “solução” para o futebol brasileiro é mais ou menos acreditar na tese do apagão para justificar os 7 a 1 da Alemanha de julho passado. A queda de interesse das pessoas para acompanhar o Campeonato Brasileiro deve-se muito menos ao formato de disputa da competição e muito mais à promoção e organização do campeonato em si.

O futebol brasileiro está estacionado dentro das quatro linhas, sem se preocupar para quem está fora dela. Para piorar, estamos ocupando a vaga do idoso nesse estacionamento. Mas com razão. Nosso futebol está envelhecido.

Esse é o primeiro ponto da história. Não temos um futebol vistoso. Lucas, do PSG, falou sobre isso recentemente. Disse que o futebol aqui é muito devagar. Seedorf, quando analisou o futebol de Paulo Henrique Ganso, meio que disse isso nas entrelinhas. “Ganso não tem velocidade e pegada para jogar na Europa”. Ou seja. O cara que aqui é um dos poucos iluminados ao tocar na bola não teria condições de jogar em alto nível no lugar onde se pratica o melhor futebol do mundo.

A falta de um futebol bonito relega ao fanático o interesse em acompanhar os jogos. Não é bonito ver um jogo. Ou melhor. São raros os jogos bonitos para se assistir. Assim, quem não é tão interessado em futebol não tem motivo para ligar a TV ou ir até o estádio. É preciso ter um futebol mais bonito, mais ofensivo, mais produtivo, menos bruto. Esse foi o primeiro ponto detectado pelos ingleses no começo dos anos 1990 e que começou a ser trabalhado para atrair mais gente para acompanhar o futebol por lá. Parece que deu certo, independentemente da fórmula de disputa da Premier League ou da FA Cup…

Aí entra o segundo ponto. Sem um futebol bonito, poderíamos pelo menos promovê-lo de alguma forma a ponto de atrair o interesse das pessoas. Mas não fazemos isso.

Não nos preocupamos em “contar histórias” sobre nosso futebol para ampliar o interesse das pessoas por ele. Somos massacrados pela mídia o tempo todo. Só que de informações completamente inúteis, como qual jogador está saindo com quem, o que ele publicou no Instagram, qual a nova briga de bastidores dos dirigentes, etc. O futebol não se preocupa na forma como a mídia promove o seu produto. Pior. Os dirigentes alimentam o fanatismo e a segregação, quando deveriam ter interesse em mostrar que o ambiente do futebol é agradável para qualquer um, que ir a um jogo é uma experiência legal, que há coisas divertidas acontecendo. Os EUA sempre se preocuparam com isso. Em 20 anos, desde que a MLS foi criada, trabalharam a ponto de fazer o americano gostar do esporte e, mais ainda, se interessar em acompanhá-lo!

Chega-se então ao terceiro ponto. Sem um futebol bonito e sem promoção do esporte, porque mesmo alguém vai se interessar por ele?

Ah, sim! Os fanáticos!

Hoje, a população “comum” não se interessa por futebol. Ou se interessa menos do que poderia. Por que eu trocaria um domingo de sol com a família ou os amigos para ver um jogo do Campeonato Brasileiro? Só o fanático é atraído por esse “programa” nos dias de hoje. E os índices de audiência estão aí para provar isso. Hoje, a queda que a Globo tem quando sai da novela e vai para o futebol é muito maior do que era antes. Não, o problema não é o horário do jogo. É a qualidade dele. Jogo bom todo mundo para e quer ver!

Pontos corridos ou mata-mata não mudarão praticamente nada se o futebol brasileiro continuar estacionado na vaga de idoso que ele encontrou dentro do campo. Antes de pensar em qual formato de disputa é melhor para o Campeonato Brasileiro, é preciso primeiro se preocupar em transformar o torneio em um BrasileirÃO, com ÃO maiúsculo mesmo. E aí será tão legal que você nem vai precisar discutir qual modelo é melhor. O melhor é ver a bola rolando mesmo!


A aula de gerenciamento de crise do UFC
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Erich Beting

No dia 3 de janeiro, Jon Jones manteve, pela oitava vez, o título de campeão do UFC. A vitória sobre Daniel Cormier, em decisão unânime dos juízes, manteve uma hegemonia de quatro anos do lutador como detentor do cinturão da categoria meio pesado.

Três dias depois, Jon Jones foi à lona. Flagrado num teste antidoping com resquícios de cocaína no corpo, o campeão viu sua imagem tomar um golpe que poderia colocá-lo a nocaute.

Hoje, um dia depois, Jones e o UFC dão uma aula de como se faz o gerenciamento de uma crise. Seja um astro da mídia ou uma empresa, o fato é que a forma como o caso está sendo tratado merece ser vista como exemplo de como se comportar quando as coisas dão errado.

O primeiro a dar o exemplo foi Jon Jones. O lutador admitiu o vício e prontamente disse que se internaria numa clínica de reabilitação contra drogas. Depois, o UFC emitiu um comunicado apoiando a decisão do atleta e informando que lhe dará todo o suporte necessário para que ele consiga se recuperar, citando a própria “força de campeão” de Jones, mas ressaltando que ela existe dentro do octógono e precisa ser vista também fora dele.

Fama, poder e dinheiro giram em torno daqueles que conseguem atingir o status que Jones conseguiu. Fama, poder e dinheiro, muitas vezes, corrompem. Ou desviam as pessoas da rota. Quem nada tem e passa, de uma hora para outra, a ter tudo, tem tremenda dificuldade de administrar o novo status. Seja ele um lutador de MMA que quase foi zelador de prédio, seja ele um executivo que alcançou o topo mais alto da carreira.

Jones não conseguiu aguentar  o tranco de virar estrela. Não deve ser nada fácil, como comprovam diversos casos desde que o “glamour” da mídia entrou em ação para aumentar o alcance do esporte e, consequentemente, o dinheiro envolvido dentro dele. O atleta é o grande centro do espetáculo do esporte. E precisa ter uma conduta que o transforme, literalmente, num semideus, a exemplo do que era o conceito da Grécia Antiga. Jones estava nesse patamar e voltou a ser um “mero mortal”, por assim dizer.

Por isso mesmo, o que Jones e o UFC fizeram foi louvável. Não tentaram esconder o fato, ou transferir a culpa, como quase sempre acontece nesses casos. Assumiram o erro e seguiram em frente, dando mais uma vez o exemplo. Se Mike Tyson tivesse convivido com Dana White, provavelmente teria sido um atleta ainda mais espetacular…


O Brasil subiu no salto para os Jogos de 2016?
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Erich Beting

O maior risco que havia do sucesso da Copa do Mundo no Brasil era de que o país simplesmente ignorasse o que foi o sufoco pré-evento e se deixasse levar pelo otimismo da nossa capacidade de improviso. Ao que tudo indica, incorremos nesse erro e, a menos de dois anos das Olimpíadas do Rio de Janeiro, deixamos ao acaso dois importantes cargos públicos ligados ao evento.

Sim, a banda toca de forma completamente diferente naquilo que se refere aos Jogos Olímpicos em relação à Copa. Periodicamente o COI faz reuniões sem a necessidade de chutes públicos no traseiro do país. Nelas, cobra prazos e coronogramas, acompanha o andamento das obras e toma um grande cuidado para não desandar a construção do Rio para as Olimpíadas. Dificilmente teremos, a uma semana do início do evento, obras inacabadas como foi com o Mundial de futebol.

Mas, quando olhamos as nomeações de um ministro do esporte que assume não entender do tema, mas sim “de gente” e de um secretário de esportes no Rio que tem apenas 23 anos e é filho do ex-governador padrinho político do atual governador, percebemos que o Brasil negligencia exatamente aquilo que mais precisa num projeto de abrigar um grande evento esportivo: a disciplina da execução.

Nada contra George Hilton e Marco Antonio Cabral. Mas, no momento em que a mídia estará de olhos arregalados sobre tudo o que se refere a esporte e gestão esportiva, não podemos ter, nos dois cargos mais visados, pessoas que não estejam aptas a falar do tema.

O relacionamento interno do Rio-2016 com as esferas públicas não muda. Segue com a Casa Civil no âmbito federal e segue com a mesma equipe de sempre no Rio de Janeiro.

Só que era preciso arriscar tanto assim ao colocar um cidadão que não gosta e nem acompanha esporte como ministro e um jovem ainda em formação como secretário estadual?

Com certeza faremos um grande evento em 2016. A festa será bonita, os atletas estarão felizes, as coisas vão acontecer. Mas ao ver as indicações para cargos-chave na reta final da organização dos Jogos Olímpicos, percebemos que as lições da Copa do Mundo foram jogadas para debaixo do tapete. Ou se perderam junto com o time de Felipão nos 7 a 1 do Mineirão.

O Brasil precisa, urgentemente, descer do salto. Ou corre o risco de seguir sem aprender como ser grande aos olhos de todos.