Negócios do Esporte

Arquivo : outubro 2015

Estádio novo já vira diferencial competitivo
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Erich Beting

Reportagem de hoje do diário “Lance!” mostra que o Corinthians deverá bater, em 50 jogos, a marca de R$ 100 milhões de arrecadação com venda de ingressos para o torcedor na Arena Corinthians. O número deve ser alcançado já no jogo contra o Flamengo, dia 25 de outubro, curiosamente também a partida de número 50 feita pelo clube no estádio.

Se for considerar que cerca de 40% da arrecadação se esvai em pagamento de taxas, custo de pessoal no dia de jogo e outras coisas mais, o Corinthians conseguiu, em um ano e meio, R$ 60 milhões, que é equivalente a dois anos do contrato de patrocínio máster que possui com a Caixa.

Os números revelam o quanto o estádio novo já se transformou num diferencial competitivo dentro do futebol. Os clubes que atuam nas novas arenas estão arrecadando como nunca em bilheteria.

Em 2013, quando publicou a lista anual de clubes que mais faturam no mundo, a consultoria inglesa Delloitte afirmou que era preciso olhar cada vez mais atentamente para os clubes do Brasil e da Rússia. Segundo os britânicos, os estádios erguidos para a Copa do Mundo fariam de brasileiros e russos clubes com faturamento próximo ao dos times médios da Europa, colocando-os entre os 20 maiores faturamentos do futebol mundial.

O único erro da Delloitte nessa conta foi ter imaginado que brasileiros e russos possuem mercados tão maduros quanto os alemães e os ingleses. Numa realidade em que ainda patinamos muito para entender o que um estádio pode gerar de potencial de receita, a bilheteria aparece timidamente como a única fonte de arrecadação para os clubes.

O Corinthians tem conseguido colocar 30 mil pessoas por jogo em seu estádio. Quanto isso gera a mais de arrecadação para o clube? Essa é a resposta que ainda falta ser respondida. Foram poucas, até agora, as ações de ativação de marcas feitas dentro da Arena Corinthians. Até agora, uma ou outra empresa usou o recurso do telão para criar alguma ação com o torcedor presente no estádio.

Mas ainda há um potencial inexplorado de faturamento com a venda de produtos dentro dos estádios e, mais ainda, de alimentação. No caso da Arena Corinthians, as lojas da praça de alimentação no Shopping Metrô Itaquera, vizinho ao estádio e parada obrigatória de quem usa o metrô, são as que estão sorrindo com um aumento substancial de faturamento nos dias de jogos.

Só na bilheteria, os clubes arrecadam como nunca antes com os novos estádios. Imagine quando o futebol começar a entender que o importante não é venda de ingressos, mas a receita que é possível conseguir num dia inteiro de jogo?


Modelo do futebol precisa ser revisto
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Erich Beting

A renúncia de Carlos Miguel Aidar, somada à crise da Fifa, reforça a necessidade de o modelo do futebol ser revisto.

A origem do futebol no Brasil remonta à formação social do país. Inicialmente, o futebol era jogado pelos clubes, que eram formado muitas vezes por grupos diferentes de pessoas. Os ingleses, os italianos, os alemães, os operários, os brasileiros, etc. Aos poucos, esses grupos começavam a querer rivalizar entre eles, literalmente para ver quem era o “melhor da cidade”.

Foi assim que surgiu, em 1902, o Campeonato Paulista. Até então, nada além da reunião de confrades, de clubes que tinham meramente como objetivo se divertir ao final de semana, mas numa brincadeira que foi ficando um pouco mais séria ao longo do tempo.

Os campeonatos pelo país evoluíram, desde os anos 1930 o jogador passou a ser considerado profissional, a televisão entrou na jogada, os patrocinadores também e, agora, o marketing dentro dos clubes começa a decolar. Mas e a estrutura de gestão dessas entidades?

Esse é o ponto que, literalmente, não mudou desde que Charles Miller trouxe as primeiras bolas para o Brasil.

Continuamos a ter o futebol regido por entidades que nada mais são do que meras associações de pessoas. E isso gera um ambiente completamente propício para a corrupção.

Tal qual acontece na política, o dinheiro no futebol não tem dono. A dor do prejuízo sempre cai sobre o clube, nunca sobre o dirigente responsável pela dívida. As acusações que recaem sobre Aidar, de recebimento de comissões sobre transação de jogadores e também em contratos de patrocínio, nada mais são do que o escancaramento da realidade dentro do futebol.

Enquanto os contratos não se tornarem públicos, será impossível vigiar a rota do dinheiro no futebol. Que o diga a tabelinha Neymar-Barcelona, ou o pagamento recém-descoberto de Blatter a Platini, que possivelmente mudará o rumo futuro da Fifa e, consequentemente, do futebol.

O modelo de associação clubística para o futebol funcionou até o momento em que se profissionalizou o esporte. Desde que os jogadores passaram a receber salários, criou-se a necessidade de fluxo de caixa para o futebol, e isso já exigia, desde aquela época, que o clube passasse a ser tratado como uma empresa, tendo como maior finalidade as conquistas, mas pensando o tempo todo em como atuar para gerar receita, montar times fortes e ganhar títulos.

Como não fez isso há 80 anos, o futebol passou a viver a mercê da honestidade de quem está no comando. O problema é que é muito dinheiro orbitando na esfera futebolística, com a maior parte dele indo para o atleta. Nos últimos 30 anos, o montante de grana envolvido se tornou ainda maior.

O ambiente do futebol, do jeito feudal como é organizado, é prato cheio para que a farra com o dinheiro alheio engorde os cofres errados. E isso se transforma em algo completamente incompatível quando comparado ao que se transformou o futebol na atualidade.

As decisões a serem tomadas pelo comitê de reforma da Fifa nos próximos meses podem ser fundamentais para começar, de cima para baixo, a mudar isso. O futebol vive hoje numa encruzilhada. As principais divisões de cada país são absolutamente profissionais dentro de campo, mas precisam urgentemente se tornar profissionais fora dele. Não dá para considerar, da mesma forma, uma equipe da Série A com uma de Série D.

O modelo não pode continuar a sendo o mesmo de 80 anos atrás.


Quanto pior, melhor?
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Erich Beting

O futebol da seleção brasileira parece ter entrado no mesmo espiral da política nacional. O grupo do “quanto pior, melhor” aparentemente está se tornando cada vez maior e mais influente.

Ontem, na derrota para o Chile, a seleção brasileira mais uma vez expôs os defeitos de um time ainda em formação, acossado cada vez mais pelo “fantasma do 7 a 1” e, ainda pior, sem contar com o principal jogador e referência da equipe. Pela frente, teve também o melhor time do continente na atualidade, embalado, jogando em casa.

A derrota para o Chile era previsível. O Brasil vive uma transição de gerações, atuando com um time bastante jovem, e recupera-se de um enorme trauma sofrido dentro de casa.

Mas o que aconteceu na derrota brasileira, para mim, foi novidade. Pela janela de casa, o primeiro gol chileno foi acompanhado de uma corneta tocada por um torcedor solitário. No segundo gol, porém, outras comemorações surgiram, acompanhadas até mesmo de um rojão estourando ao longe.

Comentei no placar em tempo real do UOL e no Twitter a situação. Apenas um comentário foi de que havia muito estrangeiro morando aqui. Os demais foram elogiosos à atitude e relembrando, sempre, os 7 a 1.

 

A situação é alarmante.

A má fase do time é um fenômeno absolutamente compreensível e passageiro. O Brasil ficou 24 anos entre o tri e o tetra mundial, penou antes de se classificar e ganhar o Mundial de 2002, escorregou nas últimas Copas. Mas, nunca, o torcedor se engajou tanto contra a seleção.

A crise é de imagem. A conexão de boa parte da torcida com a seleção, que havia se perdido dentro de campo, agora se transformou em histeria pelo fim de qualquer credibilidade do esporte fora das quatro linhas.

Quando o presidente da CBF precisa estar mais preocupado em não viajar com o time nacional do que em criar uma identificação da equipe com o torcedor, realmente a conclusão que se chega é a de que, quanto pior, melhor.

O futebol nunca esteve tão ruim fora das quatro linhas. O problema é que os dirigentes olham para os lados e não conseguem tomar uma atitude que mostre que é possível sair do buraco.

Qualquer semelhança com o momento político vivido pelo país não é mera coincidência. A troca do projeto de governo pelo projeto de poder acaba, no médio e longo prazo, com o modelo vigente. Ainda mais se ele está calcado numa estrutura corrupta.

Existe, hoje, além de uma crise técnica, uma enorme crise de imagem no futebol que faz o torcedor desertar não só para Miami, mas para qualquer rival brasileiro dentro de campo. Será que chegaremos ao ponto de até para a Argentina ver gente torcendo?

Assim como a crise econômica não é boa para o país, a derrocada da bola brasileira não é benéfica. Ela só causa a sensação de que não há realmente como acreditar que dias melhores virão e que qualquer crise tem seu ápice e, depois que se ajusta, volta a calmaria.

O problema é que, assim como no universo da política, não há no mundo da bola exemplos que nos indique que, no momento, exista algo mais eficiente para provocar a mudança do que a terra arrasada.


O futebol precisa de um Uber para quebrar a banca
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Erich Beting

A crise que sangra a Fifa há quatro meses começa a mostrar seus mais diferentes desdobramentos no universo do futebol, que por sua vez revelam a total falta de inovação que existe na cadeia de comando da modalidade.

A situação atual da principal entidade do futebol beira o ridículo. Um resumo da tragicomédia. Em 27 de maio, sete dirigentes ligados à Fifa são presos na Suíça por corrupção, em investigação feita pelos Estados Unidos. Dois dias depois, o presidente da entidade é reeleito para mais quatro anos à frente da entidade que comanda desde 1998. No discurso de posse, afirma que continuará sentado em seu trono para resgatar a imagem da entidade.

Quatro dias depois, o presidente afirma que não vai mais ficar na entidade. Mas que a renúncia não é imediata. Ela só vai acontecer dali a nove meses, literalmente para ter tempo de ser gerido o novo sucessor. Cerca de quatro meses depois, o secretário geral da Fifa se vê como principal ator de um esquema para revenda com ágio de ingressos da Copa do Mundo, em operação que lhe rendeu alguns milhões de dólares.

A Fifa, então, decide suspender o dirigente. Seu presidente, por sua vez, reitera que não há nada de errado nisso. Dias depois, é a vez de o presidente ser o alvo de investigação, acusado de má gestão e apropriação indevida de recursos. Nessa investigação, o principal candidato a sucessor do trono tem revelado um pagamento, com dez anos de atraso, de um serviço prestado para a Fifa. Pagamento feito sem qualquer ágio pelo atraso, numa data que coincidia com o período pré-eleitoral da entidade, em que o dirigente que recebeu o dinheiro era o principal candidato de oposição e, misteriosamente, desistiu da candidatura…

Passa-se mais uma semana e quem financia a Fifa decide falar. Os principais patrocinadores da entidade, alguns com mais de 60 anos de relacionamento com ela, pedem para o presidente renunciar, “pelo bem do jogo”, apropriando-se do slogan que a Fifa gosta de usar para justificar a imposição de seu “padrão” goela abaixo de quem recebe qualquer evento da entidade.

O que faz o presidente? Pede para sair? Não! Ele diz que continua no cargo… Agora, é o próprio comitê de ética da Fifa que decide propor o afastamento, por três meses, do presidente. Exatamente quatro meses antes da eleição, o que não lhe daria tempo para fazer muita coisa na preparação do sucessor. Aliás, sucessor esse que agora é uma grande incógnita, já que o favorito ao trono também tem o pedido de suspensão temporária após ter recebido esses tais de 2 milhões de francos suíços com dez anos de atraso.

E o que faz o restante do universo do futebol frente a tanto descalabro?

Até agora, o que se vê surgir são alguns projetos de criação de ligas de clubes. Baseados meramente na premissa de que “tem de se dar poder aos clubes”. Como acreditar que algo realmente diferente virá desses clubes, em sua maioria deficitários e sem apresentarem um modelo de gestão que seja diferente do status quo vigente?

Há 45 anos a Fifa criou o modelo de gestão de eventos baseado na venda dos direitos de transmissão e patrocínio, com o atleta se tornando uma espécie de figurante de um produto maior.

As propostas “inovadoras” que surgem até agora são meramente réplicas desse modelo com novos atores. Seja uma agência de mídia turbinada por dinheiro de parceiros (no caso da Liga dos Campeões das Américas), seja uma liga de clubes que de inovador só tem o discurso de que o clube é mais capaz do que a CBF para transformar o futebol num produto (no caso da Liga Sul-Minas-Fla-Flu).

O futebol precisa urgentemente de um Uber. Um modelo de negócios novo, que rompa com o paradigma vigente, que traga inovação e possibilite mudar o ecossistema. Só assim será possível acreditar que realmente poderá ter uma mudança para melhor na modalidade…


São Paulo vai demorar para resgatar imagem
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Erich Beting

O barraco político em que se meteu o São Paulo e que teve seu ápice nesta segunda-feira fará com que o clube demore a resgatar o prestígio no mercado, especialmente naquele interessado em patrocinar um time de futebol.

É impressionante como, em meia década, o São Paulo saiu de exemplo de gestão, clube três vezes campeão do mundo e único tricampeão nacional seguido para um clube com os mesmos vícios de política arcaica que predominam e destroem a reputação do futebol brasileiro.

A áurea de vanguarda que cercava o clube foi-se embora com a soberania que o São Paulo imaginou ter conquistado.

Não por acaso, dos 20 times que jogam a Série A do Nacional hoje, o Tricolor está ao lado de Santos e Goiás como os únicos sem um patrocinador principal na camisa. Não que ter o patrocínio máster seja sinônimo de eficiência na gestão do clube, mas a ausência dele muitas vezes indica que algo não corre bem.

Como já destacado aqui no blog, o São Paulo é um dos poucos clubes que estava trabalhando numa nova proposta a ser oferecida para o mercado. Ciente da dificuldade do momento econômico, o marketing são-paulino foi às empresas oferecendo alternativas que gerassem maior engajamento e retorno do que a simples exposição na camisa de jogo do clube.

Agora, porém, o marketing tricolor terá de recuar.

Se fosse um país, poderíamos dizer que as agências de análise de risco reduziram o “grau de investimento” no São Paulo. A forma como o clube tem ocupado o noticiário, antes mesmo do entrevero entre Carlos Miguel Aidar e Ataíde Gil Guerreiro, dificulta demais no convencimento das empresas de que vale a pena investir no clube.

O que amenizava, até então, era o desempenho esportivo do time, na disputa por vaga na Libertadores e na semifinal da Copa do Brasil. Mas, agora, a grave crise política se sobrepõe a esse cenário e interfere diretamente no negócio.

O trabalho que a nova diretoria são-paulina terá é de convencer o mercado de que o clube é seguro para se investir. E esse resgate de imagem é que é trabalhoso. O São Paulo tem, pela frente, o desafio de voltar a ser a referência, o modelo que deveria ser seguido pelos outros.

Os dois principais rivais do Tricolor, Corinthians e Palmeiras, passaram por semelhante problema na última década, tendo como desafio ainda maior o resgate de confiança também técnica, já que ambos foram rebaixados para a Série B nacional. O São Paulo precisará se espelhar nos rivais para entender como precisa tapar o buraco e estancar a crise política.

Mas o processo de resgate de imagem do clube para o mercado patrocinador deverá demorar, pelo menos, uns dois a três anos. Em tempos de concorrência cada vez mais acirrada pela verba das marcas, isso pode representar uma perda de desempenho esportivo muito grande.


Estádio, afinal, é ou não lugar para usar a internet?
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Erich Beting

“Mineirão, meu amigo, bem que você poderia liberar uma rede wifi para nós, faz falta demais”.

A postagem, feita no dia 3 de outubro no perfil do estádio do Mineirão no Twitter por um internauta, recebeu a seguinte resposta oficial:

“Você vai para o estádio para ficar na internet? Tem que ir para cantar, apoiar seu time e sair sem voz!”.

O diálogo foi prontamente retuitado e compartilhado nas redes sociais, expandido para além do Twitter, onde o post teve mais de mil interações. A maioria das pessoas defende a postura adotada de forma oficial pelo estádio. O próprio torcedor que fez a pergunta não se ofendeu com a resposta.

A lógica exposta pelo Mineirão em seu Twitter é simples. O torcedor que vai frequentar o estádio só pode ser aquele que não quer pensar em usar a internet durante o período em que estiver por lá. Ele não pode querer compartilhar as imagens e os vídeos registrados no jogo. Não pode querer mostrar a torcida, o campo, o estádio. Ele tem de se concentrar apenas em ver um jogo de futebol. E, logicamente, “cantar, apoiar o time e sair sem voz”.

O pensamento retrógrado que ainda insiste em ditar o comportamento do futebol pode ser sintetizado nesse diálogo. Se viesse de um torcedor fanático essa resposta, ela seria absolutamente compreensível. Para ele, aquilo é religião, não é entretenimento. Não se vai a uma missa para tirar foto do padre e gravar o sermão.

Mas quem não é fanático faz o que?

Esse é o maior desafio encontrado pelos novos gestores dos estádios no Brasil. Os aparatos são caríssimos, têm um custo de manutenção alto e precisam ser muito mais do que apenas locais onde acontece um jogo de futebol.

A experiência de assistir a um evento esportivo pela televisão sofisticou-se tanto nos últimos 30 anos que não foi possível para o evento ao vivo acompanhar essa evolução. Hoje, ver um jogo pela TV não é apenas mais cômodo, mas oferece muito mais recursos para o torcedor do que se ele estivesse no campo. A confusão envolvendo Chapecoense e Palmeiras no último domingo é um exemplo disso. Em casa, o torcedor entendeu o recuo do árbitro Jaílson de Freitas na expulsão de Egídio. No estádio, ele era chamado de “ladrão”.

Não cabe mais achar que estádio é o local restrito ao torcedor que trata o futebol como religião. Ele será majoritariamente ocupado por esse público, mas o segredo para tornar uma arena rentável está no fato de trazer para dentro de campo um torcedor que foi se afastando das arquibancadas ao longo dos anos.

Ter acesso à internet num estádio “Padrão Fifa” parece ser um princípio básico para qualquer bom gestor. Ele precisa entender que o estádio deixou de ser apenas um local para ver um jogo, mas é um espaço de entretenimento que precisa encantar o público a ponto de ele falar para todos o quão legal é a experiência de ver um jogo lá.

E, hoje, qual a melhor ferramenta para isso do que o boca-boca virtual?

A proliferação do uso do Periscope é a síntese dessa situação. Quer cartão de visitas melhor do que um torcedor, de forma espontânea, compartilhar a emoção de uma torcida entoando um grito de incentivo ao time? Ou mostrar um estádio lotado, despertando nos outros o sentimento do “queria estar ali” ou “no próximo eu vou”?

Ao dizer para o torcedor que ele não tem de ir ao estádio para usar a internet, o Mineirão ignora o fato de já estar no limite de capacidade de público fanático em seu estádio. É preciso reencontrar o torcedor que não considera futebol uma religião. E, para esse fã, a internet é uma excelente plataforma de comunicação.

Afinal, como mostra a foto abaixo, o mundo, hoje, produz conteúdo em cada esquina…

Quem seria o Mineirão nessa foto?

Pessoas em Nova York, à espera da passagem do Papa Francisco. Quem representaria o Mineirão?


Escândalo na Fifa pode mudar relação de patrocínio no esporte
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Erich Beting

O ultimato que os patrocinadores da Fifa deram ao pedir a renúncia imediata de Joseph Blatter da presidência da entidade mostra o quanto o patrocinador pode interferir na gestão do patrocinado. Mas o ponto é. Por que só agora?

Quando assinaram seus contratos com a Fifa, as empresas sabiam muito bem o terreno onde estavam calçando suas chuteiras. Sempre houve um abismo entre o que era a Copa do Mundo e o que a Fifa representava como entidade. As marcas sabiam disso, mas aceitaram essa regra em nome do “jogo bonito” da Copa do Mundo. Ou seja. Apesar da Fifa, o negócio era vantajoso pelo que representa a paixão do torcedor pelo Mundial.

Mas até onde vai o “direito” do patrocinador de ficar alheio à situação da entidade? Como ele pode se permitir fechar os olhos para toda uma má gestão na entidade que patrocina em nome do benefício da relação com o consumidor e sua enorme paixão pelo evento esportivo?

A pressão que os patrocinadores fazem agora na Fifa soa, no mínimo, contraditória. Por que Blatter não é bom para a entidade só agora? E nos últimos 17 anos, quando negociaram seus contratos com o mesmo dirigente, não havia problema?

Dos cerca de US$ 5 bi que a Fifa arrecada a cada ciclo de Copa do Mundo, cerca de 40% vem dos patrocinadores. São essas empresas que ajudaram a criar uma imagem de soberania para o Mundial, emprestando sua credibilidade como marca para o evento que hoje é mais forte até mesmo do que elas.

A crise de agora, porém, pode ser uma espécie de ponto de virada na relação patrocinador-patrocinado.

Os patrocinadores sempre souberam da bomba-relógio em que estavam metidos ao entrar para a “Família Fifa”. Mas só começaram a reclamar e pressionar quando, publicamente, as feridas da entidade começaram a ser expostas. Primeiro, na conturbada escolha do Qatar para abrigar a Copa de 2022. Depois, com a revelação de péssimas condições de trabalho para os operários daquele país. Agora, com o escândalo que acaba com a reputação da “Família”.

As marcas só foram para o ataque ao serem atacadas por seus acionistas, preocupados com a reputação da empresa ao se associar com uma entidade tão sem escrúpulos quanto a Fifa e seus dirigentes. Agora, a faxina faz-se necessária não pelo bem do jogo, mas pelo bem da própria patrocinadora.

Os fãs continuarão a ser apaixonados pela Copa do Mundo. Apesar da Fifa e de seus dirigentes. Mas as marcas não podem compactuar com esse “apesar”. Pelo menos se quiserem manter a boa imagem frente à sociedade.

Muitas dessas marcas patrocinadoras possuem severos manuais de conduta que exigem, de algum fornecedor ou funcionário, uma imagem e um passado limpos para permitir fazer algum negócio entre eles. Por que o mesmo não se aplica ao patrocínio? Só agora, quando a imagem de sujeira começa a respingar na conta da empresa, que aparece a reação contrária?

O escândalo da Fifa pode servir como lição para mudar o comportamento de quem aporta dinheiro no esporte. O poder econômico tem força suficiente para interferir na gestão da entidade patrocinada.

O primeiro caminho que as marcas deveriam adotar para escolher um patrocínio seria ver, no patrocinado, princípios éticos e imagem ilibada. Isso sim seria bom para o jogo. Dos negócios e da bola.


Entrave maior para uma liga nacional é comercial
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Erich Beting

Alexandre Kalil, designado principal executivo da Liga Sul-Minas, deu algumas entrevistas após a reunião que houve na sede da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e deixou claro que a ambição do grupo de dirigentes que foram à entidade é, em algum momento, formatar um projeto para finalmente tirar do papel uma Liga Nacional, que represente diversas divisões do futebol brasileiro.

Numa entrevista de Kalil ao Globoesporte.com (leia a íntegra aqui), porém, fica claro onde há hoje o maior entrave para a criação de uma liga. Diz o dirigente/executivo:

“O futebol brasileiro precisa de uma conta simples: quem vende, tem que cuidar. Quando houver a Liga, vamos cuidar da Série A, B, C, da quarta divisão. Vamos ter responsabilidade na hora de dividir. Não adianta pensar que eu tenho que ganhar mais que os outros”.

Kalil foi um dos poucos dirigentes que, em 2011, quando começou a implosão do Clube dos 13, se opôs ao modelo individual de negociação dos direitos de TV. Tanto que o Atlético-MG, clube que presidia, foi o último a assinar o contrato com a Globo, que acabou com a única negociação coletiva de direitos que existia no futebol brasileiro, provocando uma regressão de pelo menos 30 anos na organização da modalidade no país.

Agora, essa mesma situação criada no início da década se volta contra os clubes. Os contratos de cessão dos direitos do Brasileirão estão assinados com a Globo por pelo menos mais três anos.

Essa situação já cria o primeiro impasse para a formação de uma liga nacional. A maior receita que existe, em qualquer liga, em qualquer esporte, é a de televisão. E ela precisa seguir, como bem apontou Kalil, uma divisão democrática de receita, para fazer prevalecer a lógica da competitividade esportiva em vez da competitividade econômica.

Como conseguir convencer os clubes, principalmente os de maior torcida, de que eles terão de abrir mão do conforto da situação atual para diminuir a sua receita e tornar sua equipe menos competitiva?

Se os clubes olhassem para além do próprio umbigo, ou para além do fluxo de caixa defasado, seria absolutamente normal ter esse pensamento. O modelo de liga que comercialmente é mais eficiente, que é o dos Estados Unidos, parte do princípio de que todos os clubes são sócios de um negócio maior. O desempenho esportivo não pode ser unicamente dirigido pelo poderio econômico. Isso gera desinteresse do torcedor nesse negócio no médio/longo prazo.

Mas, por aqui, a lógica comercial é colocada em segundo plano. O dirigente, em vez de pensar no todo, olha o seu problema. É natural, é do ser humano. Mas, hoje, isso é um absoluto entrave para que haja condições de se criar uma liga nacional.

Na análise que faz, Kalil é preciso ao dizer que “esse tipo de coisa só nasce quando há vontade dos clubes”, respondendo sobre a possibilidade de a Liga Sul-Minas virar, com o tempo, a Liga Nacional.

A questão é que, além de haver uma miopia na direção de boa parte dos clubes sobre a necessidade de eles serem unidos fora de campo, o principal contrato que daria força econômica à liga hoje está dividido entre os clubes, com cada um recebendo, muito provavelmente, mais individualmente do que estaria se houvesse um contrato coletivo, em que seria obrigatório ser mais democrático na divisão das receitas e no financiamento das demais competições menores, subordinadas à liga.

A boa notícia, porém, é que os clubes finalmente entenderam que, se for para criar uma liga, ela não pode representar apenas alguns clubes, mas uma competição. Esse já foi um primeiro grande passo para que não aconteça, numa eventual criação da liga, o mesmo erro de princípio que, em pouco tempo, acabou com a Copa União e, posteriormente, o Clube dos 13.


Blindagem à crise mostra demanda reprimida no futebol
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Erich Beting

Será que existe uma espécie de “blindagem” que o futebol atravessa hoje em relação ao restante da economia do país? Na última segunda-feira, mostramos na Máquina do Esporte que, em 2015, só com os novos sócios-torcedores do Movimento por um Futebol Melhor, as receitas dos clubes aumentaram em 128%, em média, recorde histórico do programa que já vai para o terceiro ano (veja aqui).

Por que, em meio a um cenário de retração econômica, com todo mundo tirando o pé da gastança, cresce tanto assim um programa de adesão de sócios-torcedores?

A situação mostra que há uma demanda reprimida no futebol, que aos poucos começa a ser atendida, ainda de forma esporádica, pelos clubes. O Movimento por um Futebol Melhor talvez seja o melhor termômetro disso. Há três anos no ar, o programa tem mostrado para os clubes a importância de colocar o torcedor no papel de um consumidor ativo do esporte, gerador de receita importante para o clube e responsável por uma parte significativa da receita da entidade.

Antes de olhar para o sócio-torcedor, os clubes flertaram com a exploração do bom momento do varejo. Foi no começo da década, quando vivíamos a febre das lojas oficiais, na esteira do crescimento do mercado de franquias e no bom momento do varejo.

Agora a situação é um pouco diferente. Com dívidas e dúvidas, a população parou de consumir produtos. É só ver a crise que pega no varejo, com redução de metas e queda brusca de vendas. O sofrimento das franquias de lojas oficiais dos clubes nada mais é do que reflexo da crise que assombra o mercado varejista.

 

E aí é que entra o segredo do sucesso do programa de sócios dos clubes. O sócio-torcedor compra, ao pagar a mensalidade ao clube, um sonho. É a facilidade na compra de ingresso, é a oportunidade de ter uma experiência exclusiva com ídolos do passado e do presente, com o estádio do time, com o centro de treinamento, etc.

O único benefício real que existe é o desconto na troca de produtos das empresas parceiras, mas parece que essa lógica varejista não é fundamental para levar o torcedor a aderir aos programas, apesar de muitos se beneficiarem disso.

O fato é que o sócio-torcedor atinge o fã exatamente naquilo que faz dele um consumidor do esporte. De um ano para cá, os clubes aumentaram significativamente as ações de experiência única para a torcida. Sócios-torcedores podem ser gandulas, perfilar com o time no hino nacional, assistir ao jogo de uma poltrona na beira do campo, etc.

Essa é a demanda que estava reprimida no futebol. Os clubes tinham, até pouco tempo atrás, a visão de que o torcedor era obrigado a ser um consumidor do time de futebol. Ele tinha de comprar produto oficial, ir ao jogo, vibrar sem criticar durante a partida, etc. Não era uma via de mão dupla.

Como sempre digo por aqui, toda paixão precisa ser correspondida. O que essas experiências restritas a sócios mostram é que existe o interesse do torcedor de consumir esse tipo de produto. Mas, para isso, é preciso ofertar o serviço a ele.

Por meio dos sócios-torcedores, os clubes perceberam o óbvio. Existe um mercado consumidor grande para o futebol, que não sente tanto os efeitos da crise e se dispõe a gastar bastante para a paixão dele. Mas é impossível achar que esse consumidor estará lá se não houver o mínimo esforço por parte do clube.

A “bilndagem” do futebol à crise nada mais é do que a descoberta de que há um bando de gente que é apaixonada por aquilo, mas que precisa de um mínimo de motivação para fazer parte do negócio. Se o esporte brasileiro tivesse levantado os olhos para além da arena de disputa esportiva, conseguiria ter percebido a necessidade de atender esse público muito antes.

O topo da curva de consumo no esporte ainda está longe de ter sido atingido. Não é o futebol que está imune à crise, mas sim o fato de que ele não conseguiu entregar ainda todo o potencial de produtos que os consumidores querem.