Negócios do Esporte

Arquivo : novembro 2015

O que representa o fim da Era Campos Pinto para o futebol
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Erich Beting

Marcelo Campos Pinto já estava sendo colocado para escanteio na Globo há algum tempo. Desde que foi determinado o fim do adiantamento de cotas de TV para os clubes, meio que sem alarde, durante a Copa do Mundo, que o chefão do futebol da Globo nos últimos 20 anos começou a perder seu grande poder dentro da Globo.

Com os escândalos recentes no futebol, e a sempre próxima relação do executivo com as figuras centrais dos episódios que têm furado diversas cartolas mundo adentro, a situação de Campos Pinto ficou ainda mais complicada. Para “piorar”, o grande interesse de Roberto Marinho Neto pelo tema esporte e direitos de transmissão ajudaram a aumentar a ingerência da Família Marinho sobre aquele campo que praticamente tinha dono único na emissora.

Campos Pinto talvez tenha sido, na última década, uma das figuras mais poderosas do futebol brasileiro. Seu crescimento na Globo veio na vitória pelos direitos da Copa do Mundo de 2002, após a conturbada negociação com a ISL, quando a emissora adiantou parte da verba pelos direitos, viu a agência falir envolvida num megaesquema de corrupção e livrou a empresa de um enrosco ainda maior.

A partir dali, ele passou a ditar as negociações. E, usando-se do artifício do adiantamento de cotas, passou a reger todo o destino sobre os direitos de TV no país. Em 2003, quando os clubes tentaram um levante para migrar para o SBT com o Brasileirão por pontos corridos, Campos Pinto usou o adiantamento de mais de R$ 50 milhões para manter os clubes sob contrato. Depois, em 2011, quando o Clube dos 13 começou a ruir, foi ele quem renegociou os contratos com os clubes, passando os direitos, antes negociados coletivamente, para os acordos individuais.

Ao que tudo indica, a Globo adotará uma nova postura na negociação de direitos. Campos Pinto sempre foi muito próximo dos dirigentes de clubes, vivia dando expediente na CBF e costumava ter liberdade para falar em nome da emissora. Centralizador, não deixava de liderar qualquer negociação que envolvesse o futebol.

Nas últimas semanas, o executivo vinha abrindo negociações com os clubes para tentar ampliar, de 2018 para 2020, os direitos de transmissão do Brasileirão com os clubes. Agora, com uma negociação menos centralizada, o projeto pode acabar sendo colocado em segundo plano pela própria Globo.

A saída de Campos Pinto do lado do principal financiador do futebol pode representar uma grande ruptura do modelo que foi criado em 1997, quando a emissora passou a querer exclusividade sobre o esporte, e gerar uma nova relação entre os dirigentes e a emissora.

No momento em que os clubes começam a ter cada vez mais interesse em assumir a gestão de campeonatos, a saída de quem negociava os direitos de transmissão da Globo é o primeiro passo para que um novo modelo comece a querer sair da inércia.

A Globo não deverá deixar de ter os direitos sobre os principais campeonatos do país. Mas ela perderá a influência que o principal executivo destacado para o futebol exercia sobre os dirigentes. E isso poderá, no médio prazo, significar um novo tipo de relação entre o futebol e a Globo.

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Esporte amador x esporte de alto rendimento. Onde investir?
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Erich Beting

Matéria desta semana na Máquina do Esporte traz uma curiosa comparação. A Maratona de Nova York, realizada no último domingo, dia 1º, gera quase cinco vezes mais receita para a cidade americana do que o Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1, que será no próximo dia 15, acrescenta na economia paulistana (detalhes aqui).

A comparação é interessante. Durante décadas a Fórmula 1 sempre se vendeu como o supra-sumo do esporte. Vista como a mais glamourosa competição esportiva do mundo, a F1 sempre foi sinônimo de geração de riqueza para as cidades por onde ela passa. Mas, de uns tempos para cá, receber uma etapa de F1 não é lá um negócio tão fantástico para os municípios.

O automobilismo passa por uma crise de identidade que faz com que cada vez menos torcedores tenham o interesse de se deslocar para acompanhar a competição. E isso não tem relação alguma com o fato de que o campeonato deste ano já está decidido. A Fórmula 1, deliberadamente, envelheceu. Muito por conta de seu grande dirigente comercial, Bernie Ecclestone, que diversas vezes já declarou não ver sentido em a categoria olhar para o público jovem, que seu negócio é falar com senhores de 70 anos cheio de dinheiro, etc.

Há 30 anos que a transmissão da Fórmula 1 é exatamente a mesma. O máximo que evoluiu foi a inserção de uma ou outra câmera no carro do piloto, mas via de regra o telespectador não tem nenhuma novidade para auxiliar num melhor monitoramento da prova. Por que, então, ir a um autódromo?

Por outro lado, a Maratona de Nova York, em menos de 50 anos, é uma competição que não para de crescer. Apostando no aumento da prática de atividade física, a principal maratona do mundo fez, no ano passado, um acordo de naming right do evento que mostra bem para onde o evento quer caminhar. Fechou patrocínio com a empresa de consultoria em tecnologia Tata Consultancy Services.

No anúncio do acordo, um dos motivos celebrados pelos organizadores do novo contrato era o de que ele poderia possibilitar um incremento em soluções de tecnologia e uso de aplicativos para telefones para os mais de 50 mil participantes da prova. Até a data da corrida deste ano, o aplicativo oficial da prova contabilizava mais de 268 mil downloads…

É, como se vê, um caminho radicalmente oposto ao adotado pela F1, que ainda enxerga o esporte e o relacionamento entre as pessoas como nos anos 80.

E, aí é onde entra toda a questão. Quando se compara o resultado financeiro que gera para uma cidade a realização de um grande evento esportivo amador, incentivando a prática de atividade física das pessoas, o esporte de alto rendimento começa a perder de goleada.

A comparação Maratona de NY x GP Brasil de F1 é apenas um exemplo evidente de como, hoje, o esporte de alto rendimento se tornou algo caro e de retorno financeiro duvidoso. Ou, se não é duvidoso, com um retorno financeiro menor do que aquele que envolve um evento pensado para colocar o atleta amador em atividade.

O esporte de alto rendimento ainda é um melhor negócio para as marcas pelo alcance que ele gera a partir da exposição na mídia de massa. Mas, para uma cidade, não há dúvida que é mais rentável investir num grande evento para as pessoas praticarem esporte do que promover uma competição que envolva atletas de alto rendimento.


Corinthians pode ter mais um recorde: o “campeão do sofá”
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Erich Beting

A situação promete dar um novo capítulo à modorrenta discussão “pontos corridos x mata-mata”. No próximo domingo, o virtual campeão nacional Corinthians poderá bater outro recorde. Ser o primeiro campeão a ter celebrado o título “do sofá”.

A proeza do dia é mais uma obra de irresponsabilidade de quem pretensamente deveria comandar o futebol do país. A CBF dormiu no ponto, não percebeu onde poderia acabar essa história e deixou acontecer. Sem ter tempo hábil, pelo seu próprio regulamento, para mudar o horário do jogo do Corinthians, a entidade teve de manter a partida contra o Coritiba para o sábado às 19h30.

O clube paulista sairá dessa partida da mesma forma que terminou o jogo contra o Atlético Mineiro. Sabendo que será o campeão, só não se sabe quando. Poderá ser no dia seguinte, num churrasco entre os jogadores e seus familiares, o que seria legal exclusivamente do ponto de vista pessoal para os atletas.

E aí entra o ponto central dessa história. A CBF deveria ter pelo menos UM funcionário pensando exclusivamente na promoção de seu maior produto com periodicidade definida, que é o Campeonato Brasileiro. Já se sabia, há pelo menos 15 dias, que uma combinação de resultados poderia fazer do duelo contra o Coxa a decisão do título.

Não havia ninguém na CBF olhando a tabela, ou pelo menos acompanhando o noticiário (roda de debates na TV e simulador de classificação nos sites é o que não faltam hoje em dia no cotidiano do futebol) para já prever que seria de bom tom fazer o time estar em campo, ao lado da torcida, na hora do apito final em Belo Horizonte?

Geralmente a CBF guarda certa antecedência para promover todos os jogos nos mesmos dias e horários. Deixa para as três rodadas finais, impulsionada pela outra novela chatíssima do futebol nacional, a tal da “mala branca”. Foi assim que tudo funcionou bem até agora. Mas…

O episódio do Brasileirão que pode ter seu campeão pelo sofá é só mais um que deveria provocar indignação e mexer um pouco mais com o modelo de descaso com o qual é tratado o principal campeonato do país.

Não se trata de exigir muita coisa, apenas que a CBF esteja atenta para cuidar com um pouco mais de carinho do Brasileirão. Mas como parece que a entidade tem dificuldades até para renovar o passaporte de seu presidente poder viajar para o exterior, fica difícil acreditar que alguma mobilização virá dali…


Temos o nº 1 do mundo do tênis. E agora?
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Erich Beting

O Brasil voltou, após quase 15 anos, a ter um tenista no topo do ranking mundial. Agora nas duplas, Marcelo Melo conseguiu repetir o feito de Guga em dezembro de 2000 ao chegar no lugar mais alto da lista dos melhores do tênis.

Como bem escreveu Alexandre Cossenza em seu Saque e Voleio (leia aqui), o feito de Melo deveria significar algumas coisas. O duro é o uso do futuro do pretérito para explicar o tamanho da façanha conquistada pelo mineiro.

Talvez o mais claro a se pensar seja que Melo conseguiu igualar Guga, mas nas duplas, porque o Brasil não conseguiu acompanhar Guga. Não soubemos, há 15 anos, preparar o terreno para semear o topo do ranking.

Melo tinha 17 anos quando Guga alcançou o maior feito da história do tênis brasileiro. Desde então, os tenistas brasileiros se beneficiaram de um aumento de interesse pelo tênis em geral. A mídia deu muito mais espaço à bola amarela, os patrocinadores começaram a entender que poderiam tirar bom proveito do esporte em suas estratégias de exposição e construção de marca, os torcedores entenderam, de certo modo, o que é um ace, um forehand, um slice.

Mas, da mesma forma que a conquista de Guga foi possível graças principalmente à dedicação e talento de uma família e um treinador, a conquista de Melo agora é também muito mais fruto da perseverança de um núcleo duro formado em torno do jogador do que um processo natural de quantidade x qualidade.

Nos últimos 15 anos, a Confederação Brasileira de Tênis (CBT) não soube olhar nada além do que o alto rendimento. Não é apontar o dedo da culpa, mas é um fato. Tivemos muito mais torneios de base, buscamos encontrar novos talentos, mas efetivamente não soubemos propagar o tênis para além do profissional.

E isso é péssimo quando temos de desenvolver o esporte no país. Guga deu ao país uma oportunidade única. Nunca houve tanto interesse pelo tênis como quando ele chegou ao topo. Isso fez com que, naturalmente, surgisse uma geração de bons tenistas no país.

Melo, André Sá, Bruno Soares e Thomaz Bellucci são alguns exemplos. Foram caras que surgiram ou mantiveram a caminhada no esporte graças ao aumento de cobertura da mídia e de disponibilização de verba de patrocinadores. O caminho deles foi bem mais fácil do que os de Guga, Jaime Oncins e Fernando Meligeni, por exemplo. Não na competitividade de um esporte que passou a ser praticado em todo o mundo, mas sim no aumento do interesse do Brasil como um todo pela modalidade.

Só que esse movimento não foi acompanhado por quem deveria ter a preocupação de criar um estilo brasileiro de jogo. Não capacitamos treinadores, não criamos mais torneios de base, não procuramos ampliar a prática do esporte. Ficamos, passivamente, acompanhando tudo pela TV, esperando que o raio caísse duas vezes no mesmo lugar.

O Brasil nunca teve uma geração tão talentosa no tênis quanto a dos últimos 25 anos. Caras que deveriam ser chamados a todo instante para opinar, ajudar a propagar e desenvolver o esporte. Não apenas na mídia, mas no projeto social que ainda carece de ídolos para dar exemplos, no evento para empresas que precisam entender mais de que forma o tênis pode gerar benefícios para as marcas, no dia-a-dia para além do número 1 alcançado.

Guga foi fruto do acaso. Melo, em menor escala, também. Daqui a 15 anos, será que teremos um novo número 1? Isso provavelmente só será possível se usarmos os bons exemplos que surgiram em nossa vida para impulsionar novos fãs e, naturalmente, novos praticantes do tênis.

E, para isso, é preciso olhar mais do que o esporte no topo. Construir quadras e capacitar treinadores é uma missão bem menos dispendiosa de se realizar do que organizar torneios com os principais nomes do esporte.

O Brasil tem, novamente, um break point a seu favor…