Negócios do Esporte

Arquivo : junho 2016

Djokovic ‘rouba’ mais que o coração de Guga em Paris
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Erich Beting

Ao “roubar”, com a devida permissão, o gesto que imortalizou Guga em Paris, Novak Djokovic coroou a primeira conquista dele no saibro francês com o que tinha de melhor o colega brasileiro e com algo que ele tem naturalmente de sobra: muito carisma.

Guga conquistou Paris ao usar a naturalidade de suas ações para se mostrar “um cara qualquer” dentro daquele monte de lendas que desfilavam por Roland Garros. Tanto que, ao fazer o coração no chão na épica campanha de 2001, ele conquistou de vez um lugar entre os grandes mitos do tênis.

Ao repetir o feito de Guga, que se mostrou emocionado com a homenagem, Djoko entrou também para o lugar que pertencia ao brasileiro, mas com um adicional. Em termos de performance, Guga não chega perto do sérvio.

Djoko está se transformando, aos poucos, no maior mito da história do tênis, indo para um lugar mais distante que já tinham conseguido chegar Pete Sampras, Andre Agassi, Rafael Nadal e Roger Federer. Todos esses caras são multicampeões, mas, em termos de carisma, não conseguem ter a leveza e simpatia de Djokovic.

O coração na quadra principal de Roland Garros é só mais uma prova do carisma absurdo que Novak Djokovic tem no mundo do tênis. Se Gustavo Kuerten acaba de ser nomeado embaixador mundial do tênis, pode apostar que Djoko, depois do gesto de domingo, tem tudo para também ganhar esse posto muito em breve.

 


O que será da 9ine na volta de Ronaldo?
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Erich Beting

Ronaldo voltará para o comando da 9ine. Mas qual 9ine volta a encontrar Ronaldo, dois anos depois de ele ter deixado o dia a dia das operações da agência de marketing esportivo e entretenimento?

Quando, em 2013, a 9ine passou para o comando de Marcus Buaiz, o Brasil do Esporte ainda vivia na euforia do pré-Copa, da esperança do pré-sal e num cenário ainda de pré-crise. A gente já tinha uma sensação estranha guardada, mas estava longe de ser o pessimismo que começou a crescer nas manifestações de junho, durante a Copa das Confederações.

Nesse cenário, tudo era motivo para pensar grande. A 9ine era uma agência que vinha tendo muito sucesso ao reinventar o conceito de gerenciamento de carreira de atletas. Anderson Silva tinha sido praticamente elevado à condição de ídolo nacional graças ao trabalho da empresa. Junto com ele (e com a bagagem de Ronaldo) vieram outras celebridades para o casting da agência.

Buaiz, então, temperou ainda mais o negócio. Com histórico no ramo artístico, ele começou a trazer para a 9ine o braço “entretenimento” que fazia parte do nome da agência desde o seu lançamento. Os dois anos anteriores à era Buaiz foram marcados por uma série de ações ligadas ao mercado de esporte, tendo Anderson Silva como carro-chefe, mas também com trabalhos bacanas em contas de empresa, ações com atletas, etc.

O problema, a partir dali, foi que Buaiz guinou demais a 9ine para o entretenimento. E, sem a presença de Ronaldo, a agência começou a perder espaço no esporte. Tanto que, de um ano para cá, na pré-Olimpíada, as notícias que vinham da agência eram de acordos com Paolla Oliveira, Claudia Leitte e outras celebridades do meio artístico.

Agora, esse povo migra para a ACT10N com Marcus Buaiz. E Ronaldo, que 9ine encontra?

A agência ainda deve ter os contratos com Ronaldo (claro), Neymar (quem não tem?) e Rafael Nadal (que não rendeu nenhum negócio ainda). Mas perdeu, ao longo de dois anos, o mercado corporativo, que ajuda a pagar boa parte da conta.

No fundo, no fundo, a tendência é que a 9ine se transforme na nova versão da R9, a marca que lá atrás foi criada pela Nike para explorar – e bem – a imagem de Ronaldo. O Fenômeno, por si só, já é uma empresa que precisa de uma agência para cuidar de sua imagem.

Mas, no Brasil pós-Jogos, pós-Impeachment, pós-pré-sal e em crise, é difícil imaginar que a agência consiga voltar a ter o tamanho e o fôlego de 2011, quando Ronaldo deixou os campos para enveredar num novo negócio que poderia ser fenomenal, mas que enfrentou uma realidade muito diferente da expectativa que existia sobre o mercado esportivo do país.

É difícil imaginar que haverá mercado para a 9ine retomar o espaço que lhe começava a ser aberto em 2013, quando Ronaldo se afastou da agência. Só não dá para dizer que é impossível porque a própria história de superação de Ronaldo dentro de campo prova que ele é capaz de grandes retornos. Mas, para isso, o Fenômeno precisará ter o mesmo “sangue nos olhos” que estava pré-Copa. Tanto na de 2002 quanto na de 2014…


São Paulo prova que mercado de patrocínio não está maduro
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Erich Beting

O acerto de um contrato de patrocínio pelo São Paulo após dois anos é a prova de que o mercado de patrocínio esportivo no Brasil ainda não está maduro o suficiente para enxergar além da exposição de marca numa relação com um clube de futebol.

Há um ano, o mesmo São Paulo tentava levar ao mercado o conceito de, em vez de buscar exposição de marca com aportes pontuais, as empresas procurassem se relacionar com os torcedores vinculados às mídias do clube, além, claro, dos sócios-torcedores. Era, como disse à época, fazer do limão uma limonada, já que o clube buscava uma alternativa para a falta de empresa interessada em patrocinar a camisa do time.

A estratégia, da antiga diretoria de marketing, procurava gerar mais valor à camisa e ampliar a fonte de receita por meio de acordos mais longevos sem envolver a exposição de marca. A ideia era boa, mas apenas duas empresas toparam a empreitada. A Gatorade, que já era parceira e apenas ampliou o relacionamento com o clube, e a Copa Airlines, que fez uma estratégia interessante de fortalecimento de marca no mercado brasileiro a partir do São Paulo.

No começo deste ano, sob nova direção, a estratégia são-paulina mudou radicalmente. Em vez de pensar em valorizar as propriedades de camisa, deixando-as mais limpas, o clube partiu para vender a exposição para ganhar o cliente, baixando a pedida em relação aos valores surreais praticados nos outros clubes (Corinthians e Palmeiras estão com acordos acima do “normal” de mercado).

Em cinco meses, cinco marcas já aceitaram essas novas condições, a Copa ampliou a parceria tendo maior exposição da marca. Além de acabar com o incômodo “jejum” de dois anos sem um patrocínio máster, a diretoria quer seguir vendendo “iscas” com aportes pontuais para pegar parceiros de mais longo prazo. O conceito, sempre, é vender a exposição de marca.

Nenhuma das duas diretorias estão erradas nos conceitos apresentados ao mercado. Mas a reação das próprias empresas é uma prova de que as empresas ainda não estão preparadas para comprar relacionamento com o consumidor quando pensam em investir em esporte. E, se o mercado todo se coloca contra a ideia conceitual, o melhor a fazer é repensar o modelo e entregar aquilo que ha interesse em se comprar.

Muitas vezes achamos que a falha é sempre do lado do esporte. Sem perceber que a miopia sobre patrocínio envolve não apenas a ponta mais fraca da relação…


A luz vermelha para o futebol brasileiro acaba de ser acesa
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Erich Beting

Antes era uma luz amarela. Uma camisa de time estrangeiro vestida por um garoto na rua. Uma loja que tinha o uniforme infantil do Milan, mas não o do Palmeiras (apesar de serem feitos pela mesma fabricante). Uma chamada na mídia que dá mais espaço para o Instagram de Cristiano Ronaldo do que para o time grande brasileiro que iria jogar naquele mesmo dia.

Mas agora a luz está vermelha, pulsando firme.

No final de semana, a audiência da final da Liga dos Campeões da Europa na TV aberta foi maior do que a da transmissão do futebol brasileiro. E, pior, maior do que a exibição de dois clássicos estaduais válidos pela principal competição do país (detalhes aqui).

De quem é a culpa? Realmente temos de acabar com essa história de achar que resolvemos nossos problemas a partir do momento em que achamos um culpado.

O futebol brasileiro precisa trabalhar, e muito, para retomar seu espaço com o torcedor. Como parte da indústria do esporte, não podemos aceitar que um jogo de Brasileirão, ainda mais um clássico, seja menos popular que uma partida de futebol europeu.

Foi exatamente essa disparidade de qualidade de produto que fez com que o basquete mundial perdesse espaço para a NBA. E, após literalmente engolir todos os outros países, a própria liga americana percebeu que, agora, precisar ajudar no desenvolvimento do esporte mundo afora, começando inclusive pelo Brasil, ao se associar ao NBB.

Será que vamos continuar a abandonar nosso produto a tal ponto que uma Uefa, Premier League ou Bundesliga decidam vir até aqui para nos recolonizar?

Há pouco começou um movimento dentro da CBF para mexer um pouco no Brasileirão. Apesar de duramente criticadas, as medidas de criar hino da competição, dar padrão na entrada dos times, dos campos, etc. são formas de tentar começar a mexer no produto. É pouco, mas é um início de algo.

O problema é saber se o plano estratégico para o Brasileirão foi desenhado ou se estamos tomando medidas no escuro, percebendo que é preciso melhorar algo, mas sem nem conseguir saber por onde.

Se, antes, havia apenas uma preocupação, agora a luz vermelha foi acesa para todos neste final de semana. É preciso, urgentemente, que o futebol comece a unir esforços para recuperar o torcedor. Do contrário, quando formos olhar de novo, os europeus voltarão com duas bolas debaixo do braço para refundar o futebol no Brasil…


Ranking explica o porquê de Nike pagar muito pelo Chelsea
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Erich Beting

Depois de uma fase em que os contratos de patrocínio de camisa foram para as alturas, o futebol europeu convive agora com a era em que os acordos de fornecimento de material esportivo serão inflacionados. A divulgação do ranking de fabricantes que mais vendem camisas feita pela consultoria Euromericas, somada com a história de que a Nike está próxima de anunciar acordo com o Chelsea, explicam por que a fabricante americana decidiu pagar um valor até pouco tempo atrás inimaginável pelo clube londrino.

Desde que se transformaram em marcas globais, os clubes de futebol da Europa viraram alvo da cobiça das grandes fabricantes de material esportivo. Uma camisa do Barcelona, hoje, tem mercado em qualquer lugar do planeta.

Por isso mesmo, o Chelsea estava insatisfeito por receber “apenas” £30 milhões por ano da Adidas (algo em torno de R$ 150 milhões). E foi por isso que passou a jogar duro com o mercado. Como, nos últimos anos, a Nike perdeu alguns dos principais clubes do planeta (Manchester United, Juventus e Arsenal), a investida sobre o time de Roman Abramovich faz todo sentido.

O contrato histórico de £60 milhões ainda é pouco perto do que ganha o United e do que irá ganhar o Barcelona. Mas, na lógica comercial da empresa, é um patrocínio que se paga. Com 3 milhões de camisas vendidas mundialmente, o Chelsea consegue fazer esse dinheiro retornar a seu patrocinador.

No Brasil, há cerca de cinco anos, quando Flamengo e Corinthians fizeram contrato na base de R$ 30 milhões por ano, seus dirigentes celebraram uma arrecadação histórica com o fornecimento de material esportivo. A diferença do que esse tipo de contrato representa aqui e na Europa é a prova de que os clubes brasileiros não possuem qualquer penetração para além das fronteiras nacionais.

O papo de “conhecido internacionalmente” que os brasileiros teimam em querer se vangloriar não é absolutamente nada comparável ao “vendido internacionalmente” que os principais clubes da Europa podem dizer que são.


Marketing esportivo tem de servir para vender
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Erich Beting

O Corinthians promoveu ontem, em sua Arena, a primeira edição do Sponsor’s Day, evento criado para apresentar ao mercado oportunidades comerciais no estádio alvinegro e, também, mostrar como o clube pode ser um bom parceiro de negócios. Dentro do evento, foram realizadas algumas palestras com parceiros comerciais do Corinthians, que mostraram resultados obtidos ao se associarem ao clube.

O interessante de observar nas falas de Natura, Special Dog e Napster foi de que, em três diferentes tipos de propriedade, as marcas conseguiram obter um resultado interessante em vendas (veja mais detalhes aqui).

Seja por meio da exposição da marca na camisa, de uma ação com os torcedores presentes no estádio ou por meio do uso de estratégia de divulgação no meio digital, as três empresas relataram que, ao se associarem à paixão do torcedor corintiano, conseguiram impulsionar as suas vendas.

Muitas vezes o público confunde o marketing esportivo com uma ação que traz benefícios como construção de marca ou exposição da empresa. Ainda temos, no Brasil, a cultura de justificar o investimento no esporte tendo como base essa premissa de valorização da marca.

Mas, no fundo, o marketing esportivo, como qualquer ferramenta de marketing, tem de gerar vendas para quem fizer o investimento. Não é possível mais acharmos que apenas a exposição ou a construção de marca seguram uma estratégia no esporte. Afinal, o esporte é muito mais do que uma mídia tradicional. Ele precisa ser visto e trabalhado como plataforma para gerar vendas.

Enquanto não tivermos essa cultura de olhar o marketing esportivo como elemento de vendas, seguiremos a achar que só haverá investimento se houver aparição do esporte na mídia. E, assim, o esporte continuará a usar como argumento de venda para uma empresa a sua história, e não a sua capacidade de relacionamento com o consumidor, que é o grande diferencial dele.


Por que o atleta não vira garoto-propaganda?
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Erich Beting

Neymar não renovou, após quatro anos, o contrato de publicidade que tinha com a Lupo. O astro do Barcelona, maior nome do futebol brasileiro na atualidade, foi substituído pelo ator global Cauã Reymond (veja aqui).

A troca de garoto-propaganda da marca é emblemática. Nos últimos cinco anos, a empresa investiu bastante na promoção de sua linha Lupo Sport, voltada para a prática de atividade física. Foi um movimento que chegou até mesmo a fazer da marca uma fabricante de material esportivo, tendo contrato, por exemplo, com o Atlético Mineiro campeão da Libertadores de 2013.

A mudança de rumo na comunicação da campanha é cercada de muitos fatores.

Neymar, hoje, vale muito mais do que em 2012, quando o acordo foi fechado. O próprio momento político-econômico do Brasil era completamente diferente do atual. E, ainda, havia uma perspectiva de crescimento da Lupo como marca esportiva.

Mas por que não optar por uma outra opção dentro do esporte, um pouco mais barata, ainda mais tendo o cenário de Jogos Olímpicos a caminho?

O fato é que, no Brasil, atleta não é a primeira opção quando se pensa num garoto-propaganda. Além da maior dificuldade em atuar diante das câmeras em relação a atores, os esportistas ainda são pouco familiares para a população em geral.

Outro agravante, especificamente este ano, é que o atleta está caro. Por conta das Olimpíadas, os cachês tiveram um aumento natural com a maior procura por atletas. Assim, a empresa acaba pensando ainda mais se vale a pena investir num rosto não tão conhecido para ter um hipotético bom resultado conforme a performance dele no Rio.

É perfeitamente compreensível uma marca substituir Neymar por Cauã Reymond. O que o esporte precisa fazer, urgentemente, é trabalhar melhor a imagem dos atletas para conseguir ocupar esse espaço. Ou, então, veremos papelões como o protagonizado por Rosângela Santos no atletismo. O atleta precisa de preparo. Do contrário, seguirá sempre à margem do filão do mercado publicitário.


Primeira rodada mostra que só Band perde sem futebol
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Erich Beting

O resultado da primeira rodada de transmissão do Campeonato Brasileiro com exclusividade pela Globo mostrou o quanto, para a emissora carioca, o fim do acordo com a Band é benéfico, ao passo que, para a emissora paulista, a perda do futebol terá impacto negativo na audiência (detalhes aqui).

A justificativa da Band de que a conta do futebol não fecha tem, naturalmente, todo sentido. O problema é imaginar o quanto, para a emissora, deixar aos poucos de ser o “canal do esporte” (algo que ela já deixou faz tempo, mas ainda se beneficia do histórico) pode representar em relação a faturamento e audiência de outros programas da casa, esportivos ou não.

Curioso notar que a saída da Band, agora, acontece mais ou menos pelo mesmo motivo que fez a emissora deixar de ser “O canal do Esporte”, no começo dos anos 2000. Naquela época ocorreu o primeiro grande salto nos valores dos direitos de transmissão no país, e a Band optou por não arcar com os altos custos.

A decisão, então, foi sair do “Canal do Esporte” para o “Canal da Mulher”, algo que estava começando a representar bons índices de audiência e relativo sucesso comercial. O projeto, porém, não foi para  frente. Após cinco anos, mais ou menos, a emissora voltou a buscar no esporte o conteúdo que a diferenciava.

Sem o mesmo fôlego da época áurea do “Show do Esporte”, e com Luciano do Valle mais em Recife do que em São Paulo, a Band foi aos poucos retomando o esporte em sua grade. Já com a saúde debilitada e sem a mesma autonomia de antes, Luciano também não conseguiu retomar o projeto que consagrou a emissora nos anos 80/90, com a segmentação do conteúdo antes do advento da TV a cabo.

O sucesso do MasterChef ajuda a Band a ver que há vida fora do futebol. O problema é que, à exceção do programa da terça-feira à noite (um dia em que o futebol é tradicionalmente fraco em conteúdo), geralmente a audiência da emissora fica oscilando entre 1 e 4 pontos.

A reprise dos Simpsons, com certeza muito mais barata que o futebol, foi trágica na audiência.

A justificativa da crise para não apostar num produto que dá prejuízo financeiro, mas garante constância e status ao canal poderá, no médio prazo, mostrar-se à Band uma aposta tão desastrosa quanto foi a escolha por ser o “Canal da Mulher” no início dos anos 2000.

Ao renegar o futebol, a Band vai contra aquilo que a consagrou na audiência. Enquanto isso, a Globo sorri sozinha com a conquista de mais pontos na audiência. Isso, sem dúvida, fará com que a renegociação do pacote futebol, em 2017, seja benéfica para a emissora. No fim das contas, o futebol será o único produto que teve um acréscimo na audiência média de um ano para o outro.

E isso tem um impacto no próprio faturamento publicitário da Globo que, por sua vez, deverá compensar tranquilamente a saída da Band das transmissões do futebol…


Flu mostra que dinheiro não garante o melhor negócio
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Erich Beting

O texto é de 14 de dezembro. O título era “Clubes fazem conta errada na hora de escolher material esportivo“. Naquela semana, o Fluminense tinha encaminhado o fim de quase 20 anos de parceria com a Adidas para acertar com a novata Dry World. O jargão de “maior contrato da história” do Fluminense era adotado para justificar a aposta na nova parceira, em detrimento de uma relação, muitas vezes turbulenta, com a segunda maior empresa do mundo no ramo de material esportivo.

O texto, agora, é de 12 de maio. O título é “Sem entrega, Dry World impõe problemas ao Fluminense“. A manchete já diz tudo. Praticamente meio ano após dizer que o Fluminense trocava o certo pelo duvidoso (e de ser cornetado pelo clube por isso, já que havia a “certeza” de que nada poderia ser pior do que já era em relação à entrega de material esportivo), o próprio clube admite que encontra grandes dificuldades com o novo parceiro, que, surpreendentemente, conseguiu ser ainda pior que o antigo…

O fato é que o Fluminense caiu na manjada tentação de achar que um contrato que oferece mais dinheiro é, necessariamente, o melhor negócio a ser feito. O mercado esportivo brasileiro ainda não conseguiu amadurecer suficientemente para entender que a relação da cadeia de valor não depende de um único fator.

No caso das empresas de material esportivo, a lógica de mercado não é simples. O clube tem de, necessariamente, conhecer a etapa toda de produção de uma camisa. Isso significa saber também quem é o parceiro de seu fornecedor. No Brasil, hoje, apenas Penalty e Olympikus contam com fábricas próprias. As duas empresas, porém, vivem sérias dificuldades financeiras.

Assim, quando assinam com marcas estrangeiras, os clubes precisam ver quem elas estão contratando para se tornarem produtoras de seus uniformes. Adidas, Nike, Umbro, Under Armour, Dry World… Todas essas marcas possuem capital, mas não necessariamente têm capacidade de entregar o que está prometido em contrato.

Da mesma forma, patrocinadores que não têm histórico como empresa muitas vezes caem no universo esportivo prometendo rios de dinheiro. Não entregam e, no fim, quem tem de pagar o prejuízo é o clube, que ficou sem o dinheiro para bancar aquela operação.

Há quase 30 anos, o Comitê Olímpico Internacional (COI) tomou uma decisão que ajudou a revolucionar a marca dos Jogos Olímpicos. Em vez de buscar sempre o parceiro que ofertava mais dinheiro para as Olimpíadas, passou a buscar empresas que lhe dessem a entrega mais completa. Seja na mídia, no patrocínio ou no fornecimento de produtos.

Com um produto mais forte, é possível buscar mais dinheiro no mercado. Sem equipamento até mesmo para as categorias de base vestirem no dia a dia, o Fluminense prova que o tal do “melhor contrato da história” não é assim tão vantajoso para a imagem do clube. Pelo menos por enquanto.


Ligas de todo o Brasil, uni-vos!
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Erich Beting

A notícia não poderia ser melhor para o mercado esportivo nacional. As principais ligas esportivas, à exceção do futebol, decidiram sentar numa mesma mesa e começaram a planejar como fazer para que elas deixem de se canibalizar e passem a, racionalmente, dividir calendário, despesas e gerar receitas em conjunto (detalhes aqui).

Enxergar a existência das ligas como negócio é fundamental para que elas possam crescer. Diferentemente do mercado americano, em que há uma concorrência maior entre os diferentes esportes, por aqui o esquema é outro. Como o futebol é tão forte e concentra tanta verba, um plano tático conjunto de basquete, futsal, handebol e vôlei pode ser extremamente eficiente para que essas modalidades cresçam.

O mercado brasileiro é extremamente peculiar no que diz respeito à indústria do esporte. Ainda temos pouca capacidade geração de riqueza. Não há ligas nacionais fortes e constituídas. Da mesma forma, temos baixa exposição na mídia e menor aderência de público para os esportes além do futebol.

Tudo isso leva a um cenário que, durante décadas, foi deteriorado por vaidade de dirigentes que queriam se autoproclamar o primeiro esporte do país, já que o futebol é religião. E aí o que vimos foi, aos poucos, o vôlei matando o basquete, que matou o handebol, que matou o futsal, que matou o vôlei, que matou…

Os esportes passaram a, de forma agressiva, tentar ganhar uma fatia de mercado em detrimento da outra modalidade. Se havia uma marca no vôlei, o basquete ia atrás para ter uma proposta dela. O calendário, muitas vezes, encavalava as decisões de um esporte com a do outro. E o resultado, claro, era a deterioração de ambos como produto. Não só para a TV, mas para torcida, atletas, dirigentes e, claro, patrocinadores.

É um alento saber que as quatro modalidades coletivas com maior potencial de geração de receita no país decidiram se unir para conversar. Não precisa nem sair negócio. Mas o fato de já debaterem alguns temas de interesse mútuo sinaliza claramente que há caminho para todos.

O futebol andou para trás no Brasil quando perdeu a capacidade de enxergar nos clubes um ponto de união, e não de concorrência. As ligas, ao entenderem isso, começam a dar um primeiro passo para conseguirem se tornar modalidades sustentáveis (e atrativas) para todos os atores da indústria do esporte.

A união das ligas talvez seja uma das melhores notícias do esporte brasileiro dos últimos tempos.