Negócios do Esporte

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Ligas de todo o Brasil, uni-vos!
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Erich Beting

A notícia não poderia ser melhor para o mercado esportivo nacional. As principais ligas esportivas, à exceção do futebol, decidiram sentar numa mesma mesa e começaram a planejar como fazer para que elas deixem de se canibalizar e passem a, racionalmente, dividir calendário, despesas e gerar receitas em conjunto (detalhes aqui).

Enxergar a existência das ligas como negócio é fundamental para que elas possam crescer. Diferentemente do mercado americano, em que há uma concorrência maior entre os diferentes esportes, por aqui o esquema é outro. Como o futebol é tão forte e concentra tanta verba, um plano tático conjunto de basquete, futsal, handebol e vôlei pode ser extremamente eficiente para que essas modalidades cresçam.

O mercado brasileiro é extremamente peculiar no que diz respeito à indústria do esporte. Ainda temos pouca capacidade geração de riqueza. Não há ligas nacionais fortes e constituídas. Da mesma forma, temos baixa exposição na mídia e menor aderência de público para os esportes além do futebol.

Tudo isso leva a um cenário que, durante décadas, foi deteriorado por vaidade de dirigentes que queriam se autoproclamar o primeiro esporte do país, já que o futebol é religião. E aí o que vimos foi, aos poucos, o vôlei matando o basquete, que matou o handebol, que matou o futsal, que matou o vôlei, que matou…

Os esportes passaram a, de forma agressiva, tentar ganhar uma fatia de mercado em detrimento da outra modalidade. Se havia uma marca no vôlei, o basquete ia atrás para ter uma proposta dela. O calendário, muitas vezes, encavalava as decisões de um esporte com a do outro. E o resultado, claro, era a deterioração de ambos como produto. Não só para a TV, mas para torcida, atletas, dirigentes e, claro, patrocinadores.

É um alento saber que as quatro modalidades coletivas com maior potencial de geração de receita no país decidiram se unir para conversar. Não precisa nem sair negócio. Mas o fato de já debaterem alguns temas de interesse mútuo sinaliza claramente que há caminho para todos.

O futebol andou para trás no Brasil quando perdeu a capacidade de enxergar nos clubes um ponto de união, e não de concorrência. As ligas, ao entenderem isso, começam a dar um primeiro passo para conseguirem se tornar modalidades sustentáveis (e atrativas) para todos os atores da indústria do esporte.

A união das ligas talvez seja uma das melhores notícias do esporte brasileiro dos últimos tempos.


Saída da Band mostra como futebol recua como negócio
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Erich Beting

A saída da Band da transmissão do futebol é um baque. Não só para a emissora, mas também para os clubes, que ficam ainda mais enfraquecidos na relação de poder com a Globo, detentora mais do que exclusiva dos direitos de transmissão do futebol.

A presença de apenas uma emissora transmitindo o Brasileirão é a prova de que o futebol reflete a crise econômica pela qual o país passa. Como a Máquina do Esporte mostrou outro dia, o futebol depende hoje da verba de instituições financeiras, respondendo por 70% dos patrocínios na Série A nacional.

Hoje, há apenas seis patrocinadores máster nas camisas de 16 clubes (Banrisul, Caixa, Crefisa, Intermedium, MRV e Schin), enquanto outros quatro não possuem um patrocínio principal. Há dez anos, o cenário era completamente diferente, com várias marcas investindo no esporte mais popular do país.

O futebol, como negócio, enxugou. E a saída da Band é um reflexo disso. Não há mais tanta empresa interessada em pagar a conta, seja ela de patrocínio na camisa, seja ela de transmissão de jogos. Com menos empresa envolvida, há menos dinheiro disponível no mercado para que o futebol seja sustentável.

Ao perder um parceiro de transmissão do futebol, os clubes perdem mais ainda um poder de barganha com a TV. Hoje, há dois financiadores do futebol no Brasil, a Globo e a Caixa. Por mais que tenham evoluído na busca pela diversificação de receitas, especialmente com o sócio-torcedor, os clubes estão cada vez mais dependentes das duas fontes para conseguirem manter suas estruturas.

De nada adianta os valores de TV e de patrocínio terem aumentado substancialmente nos últimos anos se isso significa que os clubes estão cada vez mais dependentes das fontes pagadoras desses altos valores.

A pior notícia da saída da Band do futebol é a certeza de que não há alternativa para os clubes de desenvolverem seu produto sem depender excessivamente da verba da Globo. O maior problema está no fato de que os clubes entregam à Globo toda a necessidade técnica de produção das imagens dos jogos. Assim, a transmissão de um jogo fica muito encarecida, já que a emissora precisa não só pagar pelos direitos como custear toda a transmissão de um jogo.

Na Europa, Alemanha e Inglaterra evoluíram seus campeonatos a partir do instante em que passaram a ditar a regra sobre os direitos de transmissão, sendo as ligas as responsáveis por gerar as imagens das competições. Isso aumentou o valor pago pelas TVs e permitiu uma pulverização maior da transmissão em diferentes empresas, cada uma pagando aquilo que pode por um pacote de jogos.

Por aqui, seguimos caminhando no sentido inverso. Além de teimar em manter a negociação individual, os clubes não percebem que estão deixando o produto cada vez mais na mão de poucas empresas. Vai levar muito tempo ainda para o futebol se recuperar disso. E a saída da Band é só mais um capítulo dessa difícil caminhada…


Inglaterra mostra que futebol pode ser similar às ligas americanas
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Erich Beting

A conquista inédita da Inglaterra pelo Leicester mostra, mais do que qualquer outra coisa, que o futebol tem condições de se aproximar da igualdade financeira que as ligas americanas têm como princípio e que rege a imprevisibilidade tão característica das competições na América.

Desde sempre, o sistema fechado das ligas é apontado como o maior responsável por permitir que haja uma distribuição mais igualitária de verba entre os clubes. No universo do futebol, a questão de ter séries distintas e acesso e descenso é usada como primordial para que haja clubes mais ricos e outros mais pobres, impedindo que a competitividade entre grandes e pequenos seja maior.

O que aconteceu na Inglaterra, porém, mostra que o futebol pode, sim, ser mais racional e justo na divisão do dinheiro e, com isso, ter maior competição entre os times, deixando o campeonato imprevisível. E isso é ótimo, já que qualquer torcedor pode ter a ambição de fazer uma boa campanha naquele ano, não importa se ele representa um em um milhão ou em 5 mil pessoas.

A divisão mais justa do dinheiro bilionário da TV, na Inglaterra, somada ao fato de que os clubes muito ricos tiveram um ano desastroso tecnicamente, ajudaram a construir um pouco da improvável história do Leicester. Agora, com o título, a equipe do norte da Inglaterra arrecadará quase meio bilhão de reais (veja aqui os números da conquista) só com a grana da televisão.

O dinheiro da TV é, de longe, o maior financiador do esporte. Nos Estados Unidos, é a divisão mais justa dessa verba que faz com que haja maior igualdade entre as equipes dentro de campo e de quadra. No futebol, a política sempre interferiu nessa decisão de como a verba seria dividida. Assim, clubes mais populares quase sempre tiveram fatias mais importantes desse dinheiro.

De uns anos para cá, puxados pela Inglaterra, os demais países e competições começaram a tornar mais igual a distribuição da fatia do bolo da mídia. E isso tem gerado maior competitividade entre as equipes. Agora, a Inglaterra, ao consagrar o seu improvável campeão, mostra na prática aquilo que a teoria indicava.

A partir do instante em que há melhor divisão de receitas, há mais chance de todos fazerem um bom papel. E isso aumenta, substancialmente, o interesse das pessoas na competição. O americano sabe que, por ser um entretenimento, o esporte precisa dar motivo para as pessoas terem o desejo de consumi-lo. O futebol sempre achou que não precisava seguir essa mesma linha de raciocínio.

Os ingleses estão, a seu modo, reinventando o futebol…


TV precisa de bom produto; Champions e Libertadores são a prova
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Erich Beting

Um dos maiores problemas do arrastado Campeonato Estadual com 19 datas no atual calendário brasileiro é que, aos poucos, ele vai se transformando num péssimo produto também para a televisão.

Prova disso foi a audiência de quarta-feira do futebol na TV aberta.

De tarde, Atlético de Madri x Barcelona pelas quartas-de-final da Liga dos Campeões da Uefa atingiu 18 pontos de audiência no Ibope (com 39% das TVs ligadas) em São Paulo e 19 pontos (41% de participação entre as TVs ligadas) no Rio de Janeiro.

De noite, São Paulo x River Plate, jogo decisivo da primeira fase da Copa Bridgestone Libertadores, rendeu 26 pontos no Ibope (com 41% das TVs ligadas) em São Paulo. No Rio, Remo x Vasco pela Copa Continental do Brasil somou 25 pontos no Ibope, com 42% das TVs ligadas.

Os números se assemelham. E mostram que, hoje, a Liga dos Campeões começa a ser um produto tão bom quanto jogos importantes de times brasileiros.

E os Estaduais? Na fase de classificação, à exceção dos clássicos, a audiência dos jogos ficou próxima dos 20 pontos. É pouco, quase nada. Teve jogo com menos de 35% de participação em TVs ligadas.

Com uma concorrência cada vez mais acirrada de outros meios de comunicação e atividades de lazer, a TV precisa de um bom produto para exibir para ter altos índices de audiência.

Nesse cenário, os Estaduais são um estorvo cada vez maior. Ou as federações reduzem o número de datas e deixa os jogos mais importantes ou, rapidamente, começarão a ser colocadas para escanteio pela televisão, hoje a principal fonte de renda dos Estaduais.


O que fizemos nos últimos três meses?
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Erich Beting

Dentro de um período de três meses cabem 1.440 jogos de futebol. Isso também é o equivalente ao tempo de carreira de um jogador como Zé Roberto, que parece ter fôlego infinito para jogar bola.

Durante três meses, o futebol brasileiro viu uma imensa oportunidade para surgir uma nova liderança.

Marco Polo del Nero precisou se afastar da presidência da CBF, tendo de responder a investigação na Fifa e na Justiça dos EUA, impossibilitado de viajar e preocupado mais com a própria defesa do que com o futuro do futebol brasileiro.

Nesse período, o máximo que os clubes (tidos como a tábua de salvação para o futebol brasileiro) conseguiram foi fazer um acordão com as federações estaduais para organizar a Copa da Primeira Liga, torneio que ficou sem pé nem cabeça no meio de um calendário já inchado.

Durante três meses, os clubes não conseguiram minimamente se preparar para mudar. Em vez de se organizarem e mobilizarem para falar mais grosso na relação com as federações e confederações, se perderam numa negociação sobre direitos futuros de transmissão do Brasileirão. Não por estarem planejando o cenário após 2018, mas por estarem desesperados atrás de dinheiro novo para pagar a conta de 2016, que já tem o acumulado de 2015, 2014, 2013…

Durante três meses, os atletas não se organizaram minimamente para fortalecerem seu movimento que pede melhorias e mais bom senso no futebol. Voltaram-se para seus compromissos com a bola, ignorando os cinco meses de salário atrasados na Portuguesa, ou diversos desmandos de dirigentes, clubes e coronéis espalhados pelos rincões do país.

Durante três meses, os gestores esportivos não se uniram para exigir mudanças. Para propor menos mudanças de comando que geram muito desmando, para cobrar mais comprometimento dos dirigentes, para exigir melhores condições nos gramados dos estádios, para propor melhores condições aos torcedores, para transformar o futebol no produto de entretenimento que um dia ele ainda será.

Durante três meses, os patrocinadores não fizeram uso da força econômica para exigir melhorias no produto onde eles investem milhões e precisam de retorno. Não cobraram explicações para a desordem na CBF, não cobraram os dirigentes por aceitarem horários estapafúrdios para o início dos jogos, que afasta público dos estádios e da TV, não exigiram um melhor tratamento ao consumidor do futebol.

Durante três meses, nós da imprensa não nos organizamos minimamente para elevar o debate, para questionar os coronéis (Nunes e quetais), propor novos ares na gestão esportiva, investigar trocas de favores para manter o status quo, impulsionar a criação de um debate que de fato tirasse da zona de conforto a cartolagem furada do comando da bola.

Quem se mexeu nos últimos três meses?

A CBF criou comitês para discutir reformas e melhorias, deu mais autonomia a gente do mercado no comando de áreas estratégicas, como os departamentos de marketing e de competições, buscou algumas alternativas para tentar, enfim, dar uma nova cara para uma desgastada instituição.

Sim, temos o péssimo futebol do time brasileiro pelo caminho. Sim, saíram alguns patrocinadores de renome como Gillette, Michelin e Sadia (todos por mudança de política de investimento da empresa). Sim, algumas decisões do comitê de gestão da CBF são histórias que nem o Gustavo, meu filho de dez meses, acredita ser para valer. Sim, o Coronel Nunes foi uma piada de péssimo gosto durante os últimos três meses.

Mas, por mais incrível que possa parecer, quem de fato se mobilizou nos últimos três meses para mudar um pouco aquilo que é feito no futebol foi a CBF. Tivemos um vácuo de liderança da bola como há 30 anos não se via no país. E o que fizemos para preenchê-lo?

Não adianta espernear pela volta de Del Nero. Ele, naturalmente, sempre foi o presidente da CBF nos últimos três meses…


Quem vai ficar com o Maracanã?
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Erich Beting

A pergunta começa a movimentar os bastidores já há algum tempo, mas vai ganhar ainda mais intensidade após o Flamengo manifestar, publicamente, o desejo de ser um dos novos gestores do Maracanã (veja aqui). Afinal, quem quer assumir a bronca de cuidar do estádio?

O plano de viabilidade econômico-financeira montado anteriormente para o Maracanã é responsável, em boa parte, pelo fracasso que foi os primeiros três anos de administração privada do estádio. Só para se ter uma ideia, havia no plano de negócios a previsão de se arrecadar cerca de R$ 20 milhões por ano com a venda do naming right do estádio. Se já é difícil conseguir esse tipo de receita para um estádio novo, imagine para o maior templo do futebol brasileiro? Nem na Inglaterra, mercado bem mais maduro para o naming right, tiveram coragem de colocar à venda o nome de Wembley. A proporção é exatamente a mesma.

O lado positivo de toda a discussão sobre o Novo Maracanã é que ele, já de cara, quebrou alguns pré-conceitos existentes em relação a estádio/arena multiuso.

O primeiro e mais importante deles: estádio ou arena, tanto faz o nome, é sustentado pelo futebol. Não dá para imaginar que haja outra fonte de receita significativa e constante quanto um jogo de futebol para esses estádios. Megashows só acontecem uma vez a cada trimestre. Ou, na melhor das hipóteses, uma vez a cada bimestre.

Outro aspecto importante deflagrado pelo Maracanã é em parte provocado pela nova realidade dos estádios modernos. É preciso ter evento bom para que o estádio seja aberto. Do contrário, é melhor mantê-lo fechado. Não é todo jogo de campeonato estadual que funciona. Flamengo x Madureira para menos de 3 mil pessoas é partida para qualquer lugar, menos para o “Maior do Mundo”. Isso vale para todos os estádios, velhos ou novos. Os Estaduais têm sua importância, mas, até para o torcedor, essa importância é cada vez mais relativa, só vale para grandes jogos. Então, melhor deixar fechado a perder dinheiro.

O Maracanã é um grande negócio, sobre isso não há qualquer dúvida. A operação do estádio precisa ser mais bem pensada, os negócios precisam ser pensados não sob a ótica magnânima do Brasil pré-Copa, mas sob o olhar do país que aprende, na marra, a fazer com que estádio fique mais cheio ou, pelo menos, dê dinheiro.

Tivemos uma cultura de quase 80 anos na qual o estádio de futebol era visto praticamente como um local que não tem de se preocupar com o cliente. Seja ele torcedor, imprensa, patrocinador ou atleta. É apenas um lugar para ir lá jogar bola.

A nova realidade, que é fundamental para melhorar a qualidade do futebol praticado aqui, é baseada no olhar do negócio. Não aquele negócio predador, em que há alguém interessado em sugar ao máximo o negócio para enriquecer. Mas um negócio que precisa ser lucrativo e, para isso, precisa atender bem o cliente.

Quem vai ficar com o Maracanã precisa ter isso muito claro. Os clientes de um estádio são vários. E cada um deles exige um olhar específico sobre o negócio.

Muitos querem o Maracanã para chamar de seu. Mas são poucos o que sabem que para isso é preciso, necessariamente, trabalhar para fazer com que o Maracanã seja de todos.


Indústria do esporte só será sólida com entidades de classe
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Erich Beting

A notícia de que a Abrarenas chegou ao fim (veja aqui) é desalentadora para o mercado esportivo brasileiro.

Criada há poucos anos, o objetivo da entidade era reunir os gestores de estádios e discutir, sempre em conjunto, temas relacionados aos estádios no Brasil. Temas que iam desde a cobrança de ingressos, a proibição de venda de bebidas alcoólicas, a meia-entrada, o acesso a deficientes, etc.

Ao deixar de existir a associação dos estádios, o mercado esportivo brasileiro dá mais um passo para trás.

No Brasil, até agora, é praticamente impossível existirem entidades representativas de classes no esporte. São raríssimos os casos em que há grupos que defendam interesses de uma classe no país. Esse fato revela algo muito mais delicado para a indústria esportiva brasileira.

Não havendo entidades de classe para atuar, não há uma maior solidificação dessa indústria no mercado.

É só ver o futebol, esfacelado em questão organizacional desde que o Clube dos 13 acabou. Por pior que fosse o C13, ele representava um ponto em que os clubes se uniam e defendiam interesses em comum. Isso é importante para que algumas melhorias aconteçam. Na base do “cada um por si”, os interesses individuais sempre atrapalham o coletivo.

Ou, então, perceber o quão importante foi a criação do Bom Senso, representando os atletas e exigindo melhorias para a indústria do esporte como um todo.

No caso da Abrarenas, o fim da associação revela o sombrio cenário a respeito do futuro dos estádios no país. Ou os novos gestores das arenas passam a ser comprometidos com a melhoria da indústria, ou então teremos várias dificuldades para profissionalizá-la, já que perderemos o bonde da história ao não aproveitar para transformar o esporte num espetáculo de entretenimento.

Já passou da hora de os diferentes segmentos da indústria esportiva (atletas, dirigentes, arenas, executivos de marketing, etc.) perceberem que o crescimento desse mercado só será possível com a união de cada classe. Em bloco, os atletas negociam melhor com os dirigentes, que negociam melhor com as arenas, com a mídia, etc.

A cadeia produtiva do esporte no Brasil já tem hoje um tamanho suficiente para que as entidades representativas de classes sejam formadas. Mas é desalentador ver que fracassou a tentativa disso naquela classe que justamente concentra um dos maiores investimentos feitos no esporte nos últimos anos, que é a de arenas esportivas.

Para ter uma indústria esportiva sólida no país, é urgente que surjam as entidades defensoras de diferentes segmentos dessa indústria. Ou o esporte nunca será, de fato, suficientemente grande para gerar diversos empregos.


O discurso da Copa sobreviverá à Lava Jato?
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Erich Beting

Começou a ruir hoje o discurso de legado gerado pela Copa do Mundo para o futebol. A inclusão da Arena Corinthians nas investigações da Lava Jato é o começo da abertura da caixa preta das construções de estádios no Brasil, a toque de caixa, nos últimos cinco anos.

Ainda haverá muito a ser investigado e, a partir daí, poderemos tirar qualquer conclusão mais detalhada do que ficará após a terra arrasada, se é que de fato ela ficará arrasada, ou só será revirada.

Com a falência das empreiteiras (se não financeira, sem dúvida moral), os estádios que estão hoje nas mãos dessas empresas vão passar para seus antigos donos.

Se eles não quiserem assumir a bronca (e a conta), o que vai acontecer?

Em Cuiabá, onde nenhuma empresa privada quis assumir o risco de gerenciar o estádio, o legado veio menos de dois anos após a Copa. Entregue à gestão pública, a Arena Pantanal definhou em tempo recorde.

As arenas da OAS estão começando a sair das mãos da empresa. Os estádios da Odebrecht, idem. E quem vai cuidar desses aparatos? Comprovadamente, colocar o estádio nas mãos da esfera pública não é certeza de sucesso, pelo contrário.

O tal legado prometido com a Copa do Mundo poderia ter vindo, se não das obras de mobilidade urbana, da melhora do aparato para a prática esportiva. Ao que tudo indica, com a Lava Jato chegando aos estádios construídos para o Mundial, há uma grande chance de mudar de vez os donos dos estádios.

E, ao que tudo indica, isso não significará necessariamente a melhora na gestão dos aparatos.


Tática do Esporte Interativo transforma futebol em incógnita
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Erich Beting

A estratégia do Esporte Interativo de, comendo pelas beiradas, ter um grande número de clubes sob contrato a partir de 2019 para a transmissão do Campeonato Brasileiro na TV paga pode gerar um tremendo enrosco na transmissão do futebol a partir daquele ano.

Sem conseguir fechar com clubes de maior expressão, o canal do Grupo Turner partiu para um interessante contragolpe. Foi atrás de equipes que estão na Série B, mas que nos últimos tempos tem flertado com a Série A, seja em umas duas a três temporadas, seja próximo da tabela de classificação.

O raciocínio do canal é bom. Paga-se uma luva a esses times, que assim têm condições de se reforçarem mais e, dessa forma, há um aumento de probabilidade de eles chegarem à Série A daqui a no máximo três anos, quando começa a valer o acordo que já conta com Santos, Atlético-PR, Coritiba, Bahia e Inter.

Esse é o cenário melhor possível para o canal, mas que pode ser péssimo para o futebol como produto.

Explica-se.

É ótimo ter a entrada de um novo e importante player no mercado. É só ver como foi benéfico para o mercado de TV paga a entrada da Fox há quatro anos. Os eventos foram sendo cada vez mais valorizados dentro das emissoras e, na ponta final, o esporte ganhou mais dinheiro.

Mas, num primeiro momento, a divisão de clubes entre Globosat e Esporte Interativo pode levar a um impasse que inviabilizaria a exibição dos clubes na televisão, o que por sua vez traria um efeito cascata de diminuição da presença do Campeonato Brasileiro na mídia, num momento em que a TV paga deverá ter desempenho de audiência cada vez maior, dada a fragmentação do consumo da mídia cada vez maior.

Uma eventual divisão de metade dos times para um lado e metade para o outro pode provocar uma situação em que a transmissão dos eventos seja colocada num segundo plano. E, aí, é o torcedor quem mais se prejudica. Não, o argumento de que há a TV aberta e o pay-per-view para compensarem isso não vale. Na aberta, é só um jogo por rodada que é transmitido. No PPV, reduz-se ainda mais o alcance dos clubes por conta do alto valor desembolsado pelo pacote.

Se não conseguirmos caminhar para o cenário ideal, que é de união entre os clubes para comercializar pacotes de transmissão, teremos de esperar por um ajuste entre as emissoras que transmitiriam o futebol lá na frente. Em vez do conceito de campeonato exclusivo para transmitir, teríamos jogos exclusivos, como acontece com as ligas americanas e em alguns campeonatos de futebol na Europa.

De qualquer forma, pelo movimento feito agora pelo Esporte Interativo, prever o que acontecerá com os direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro na TV paga a partir de 2019 é uma incógnita. E isso é péssimo para o futebol.


Por que a unidade do futebol brasileiro é urgente
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Erich Beting

A discussão sobre os direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro para a TV paga de 2019 a 2024 tem feito o futebol, de certa forma, evoluir. Como já abordado por aqui, aos poucos os clubes vão percebendo o erro cometido em 2011, quando decidiu-se implodir o Clube dos 13, acabando com uma entidade que representasse as equipes de forma única.

O fim da negociação coletiva fez, também, com que o futebol deixasse de se unir em torno de causas iguais. Na correria por uma fatia maior do bolo da TV, os clubes não entenderam que é fundamental negociarem em bloco para obterem melhores receitas e, principalmente, para se fortalecerem como esporte.

 

Nesta terça-feira, temos na mídia mais um exemplo de como isso atrapalha o desenvolvimento do futebol e, aos poucos, vai afastando o torcedor dos clubes, levando-os para a Europa. Na estreia do Blog do Mauro Beting aqui no UOL (qualquer nepotismo é mera coincidência, mas aproveita e veja o blog dele aqui), foi publicada uma entrevista com Neymar Jr.

E a resposta que ele dá sobre jogar a Liga dos Campeões da Europa ou a Copa Libertadores é assustadora:

“É videogame, é a realização de um sonho de criança… Então escolho a Champions League.”

Neymar nasceu em 1992, mesmo ano em que a Libertadores voltou a ser objeto de desejo do torcedor brasileiro com a conquista inédita do São Paulo. Antes, nossos clubes eram quase sempre figurantes na principal competição do continente, muitas vezes por total desinteresse, já que tínhamos um Campeonato Brasileiro forte e desejado por torcida, mídia e atletas.

Mas Neymar cresceu vendo a melhor fase dos times brasileiros no torneio continental. Pegou a fase áurea da competição para o país, com times brasileiros campeões a pelo menos cada três anos. Mas o Brasil não tinha uma liga, a Libertadores era (e ainda é) uma zona e, assim, não nos preocupávamos com a bobagem de estar com nossos jogadores, times e competições presentes nos videogames.

E aí Neymar cresceu entortando zagueiros nos campos e sonhando em ser o que conseguia no videogame. Jogador do Barcelona, campeão da Liga dos Campeões, ouvindo o hino da competição ressoar dentro de um estádio lotado para aplaudir os melhores do mundo…

Quando Neymar nasceu, a criança no Brasil sonhava em ser Zico, Edmundo, Romário, Neto, Raí, Evair. Jogar no quintal de casa ou no Camp Nou era praticamente a mesma coisa. Não era preciso cruzar a fronteira para consumir um futebol dos sonhos.

Hoje, logicamente, a história é outra. Assim como estavam Romário e Ronaldo lá fora quando Neymar dava os primeiros passos com a bola, nossos craques estão fazendo o pé-de-meia vendendo seu pé-de-obra para o exterior. Mas existe um trabalho de marca gigantesco dos clubes e competições da Europa para que não sejam só os atletas os objetos de desejo do torcedor, mas os times e os torneios, vistos como estrelas de primeira grandeza.

O futebol no Brasil precisa se unir e discutir como fazer para evitar que nossas gerações cresçam querendo ser Neymar. Ou melhor. Querendo estar em Barcelona, em jogar a Champions, em fazer gol no Camp Nou lotado, e não no Maracanã semiocupado por torcedores raivosos de ver um futebol de quinta em plena quarta de madrugada.

No instante em que perdemos fãs para o universo virtual, é chegada a hora de criar um plano emergencial para resgatar a imagem do futebol brasileiro com o torcedor. Não o já formado, que assim como Neymar trocou o time daqui pelo Barcelona.

O resgate precisa vir de lá da base, criando elementos para o jovem se apaixonar pelo futebol no Brasil sem precisar do empurrão dentro de casa. E isso só vira quando o futebol se unir para deixar de perder fãs até pelo videogame…