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Futebol entendeu que o estádio é seu local mais importante
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Erich Beting

Pode colocar essa na conta da Copa do Mundo. O futebol brasileiro finalmente entendeu que o lugar mais importante que existe é o estádio. Nas últimas semanas, a CBF tem feito um baita esforço para ampliar a média de público do Campeonato Brasileiro. Da mesma forma, os clubes têm se desdobrado para reduzir preços e tentar achar um “valor-ótimo” para assegurar a presença do torcedor no estádio.

Pode parecer estúpido de tão banal que o raciocínio representa, mas o futebol finalmente entendeu que o estádio é o seu local mais importante. E por isso mesmo é possível colocar na conta da Copa do Mundo essa mudança de pensamento.

Com novos gestores nos modernos estádios que ficaram após o evento, constatou-se o óbvio. Cadeira vazia é dinheiro perdido. Hoje, com as novas estruturas, o torcedor naturalmente gasta mais dinheiro quando vai a um estádio novo. Seja pela empolgação que leva ao consumo, seja pela maior oferta de serviços, proveniente de um estádio com mais conforto e pré-disposto a ter áreas de lazer que vão além do assento na arquibancada.

A CBF comemorou, nesta segunda-feira, o fato de atingir 25 mil torcedores de média nos jogos das 11h de domingo. Medida implantada à força no Paulistão deste ano por conta de incompatibilidade de adequação do horário da TV com os protestos nas ruas paulistanas, o jogo das 11h virou hit. A CBF, ágil, percebeu isso e passou a jogar, para os novos estádios, essas partidas. E, assim, está vendo a média de público do Brasileirão aumentar.

Há uma demanda reprimida de torcedores que querem ir ao estádio, mas que estiveram afastado dele por conta do calendário esdrúxulo que tomou conta do futebol nas últimas duas décadas. Ditada pelo interesse da televisão, a tabela de jogos sempre tentou se adequar ao conforto de quem assiste à TV. Os horários pensados para atrair a torcida foram sempre suprimidos.

Agora, porém, há uma nova necessidade no futebol. Os estádios não podem mais ser deficitários. Assim, é preciso fazer com que mais pessoas possam frequentar esse ambiente. E isso significa fazer promoções, modificar horário de jogos para adequá-los às necessidades das pessoas e tentar encontrar caminhos para levar mais gente ao estádio.

O reflexo da mudança de hábito estimulada pela Copa já começa a ser visto um ano após o Mundial. Mesmo à força, o futebol brasileiro vai melhorando. O marketing está começando a querer entrar em campo. Ou, nesse caso, a trabalhar para levar mais gente para o campo…


O patrocínio pontual só vale para time pequeno
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Erich Beting

O Santos conseguiu a proeza de, neste domingo, ter entrado em campo com nove marcas diferentes no uniforme, além do escudo do clube. O feito talvez só não tenha sido maior do que o do empate arrancado em pleno Maracanã contra o Flamengo depois de virar o intervalo perdendo por 2 a 0.

A justificativa do torcedor e da diretoria santista para se defenderem da atrocidade cometida pelo clube é a de que qualquer dinheiro é válido e que, ao fechar os patrocínios pontuais, o Santos engordou o caixa.

Vender patrocínios pontuais só porque o jogo será exibido na TV aberta é uma prática completamente descabida para um clube que disputa a Série A do Campeonato Brasileiro. O valor arrecadado com os patrocínios não chega a representar o salário que se paga a alguns jogadores do time, o que significa que ele não aliviará em nada o caixa.

O patrocínio pontual é uma prática que só vale para time pequeno. Os quase R$ 200 mil que o Santos arrecadou com seis diferentes empresas não compensam o desgaste de imagem que isso gera.

Lance do empate entre Santos e Flamengo. Será que é possível gravar qualquer uma das marcas expostas aí? FOTO: Gilvan de Souza/Flamengo

Lance do empate entre Santos e Flamengo. Quais as marcas expostas? FOTO: Gilvan de Souza/Flamengo

Repare, na foto acima, a quantidade de marcas que estão expostas. Agora imagine isso durante a transmissão do jogo, pela televisão. Qual marca será lembrada? De que forma?

Além disso, alguns dos patrocínios fechados dão a marca do desespero santista. O clube, literalmente, fez valer o bordão “Topa tudo por Dinheiro”. Entregou para marcas que são muito inferiores a ele o direito de ocupar um espaço que deveria ser o mais valioso de um clube centenário e que, entre outras coisas, revelou Pelé, Robinho e Neymar.

Os clubes de maior torcida deveriam entender, de uma vez por todas, que só os pequenos se beneficiam de acordos pontuais. Nem mesmo a receita obtida com os patrocínios no domingo foi suficiente para amenizar a crise financeira do Santos.

Entender qual o seu produto, quem é seu público e qual o potencial do clube para a geração de negócios para um patrocinador são maneiras muito mais eficientes de o Santos vender melhor o seu peixe.

Literalmente…

 


Por que pagar o Pato?
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Erich Beting

Imagine que você tenha comprado um belo carro de luxo, pago bem caro por ele e, no fim das contas, quando você foi dirigir, não conseguiu rolar “aquela química” com o carro. O motor não era tão potente, o combustível gastava mais do que o esperado, o seguro era caro demais, etc. Você decide, então, emprestar esse carro para um cunhado, com a promessa de que, após um determinado tempo, ou o carro volta “amaciado” para você, ou então você revende para outra pessoa com quem ele se dê bem.

Aí, quando o tempo de vencimento desse empréstimo está próximo de chegar ao fim, o carro até que parece mais ajeitado, tem tido melhor rendimento e tal. Mas você começa a alardear para todo mundo que o carro não te interessa e que você quer se desfazer dele de qualquer jeito.

A pergunta óbvia é: será que alguém vai pagar por ele o quanto você pagou ou algum valor próximo disso ou, já que você quer tanto vender, o máximo que receberá será uma oferta bem abaixo do valor de mercado que o carro teria?

É exatamente esse descuido que o Corinthians está tendo com relação à venda de Alexandre Pato.

Há quase três semanas, o presidente Roberto de Andrade declarou, ao programa Seleção Sportv, que “se Deus quiser, teremos a bênção de vender o Pato”. Na última semana, o ex-presidente Andrés Sanchez colocou mais lenha na história, desdenhando do jogador e afirmando que, se ele voltar do empréstimo do São Paulo, vai repassá-lo ao Bragantino, esquecendo-se de que Pato não é obrigado a aceitar isso. Em entrevista coletiva, o atleta saiu-se bem, afirmando que a preocupação dele era com o São Paulo, seu atual clube.

Que Pato não jogará mais pelo Corinthians está mais do que claro. O que resta saber é como o clube espera ganhar um dinheiro que reduza o prejuízo que teve com o atleta se, em declarações, seus dirigentes denigrem cada vez mais a imagem de Pato e o interesse em contar com ele.

A questão não é quem vai pagar pelo Pato, mas sim, do jeito que o Corinthians tornou a situação, por que pagar por ele?


A imagem que resume o atual momento do futebol
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Erich Beting

Acabei não conseguindo, na semana passada, colocar a foto no ar. Mas ela é a síntese do que acontece hoje no mundo do futebol. O protesto dos jogadores panamenhos após a eliminação com dois pênaltis duvidosos (e só coloco duvidoso por não ter havido consenso no debate no dia seguinte na Máquina do Esporte, porque para mim foram pênaltis escandalosamente mal marcados) da Copa Ouro.

Atletas do Panamá protestam, ainda no vestiário, contra dirigentes da Concacaf

Atletas do Panamá protestam, ainda no vestiário, contra dirigentes da Concacaf

O protesto é a síntese do que pensam muitos jogadores sobre como funciona o meio no qual eles trabalham. Só que quando haveria um protesto semelhante a esse, numa manifestação pública de desgosto e revolta contra os dirigentes?

É só lembrar o que fez o time da Croácia no vestiário da Arena Corinthians depois de o Brasil ter ganho o jogo de abertura da Copa numa arbitragem desastrosa. Os atletas arrebentaram os vestiários, mas em nenhum momento expuseram, publicamente, qualquer mensagem contra a Fifa e seus dirigentes. Será que, se fosse hoje, não teriam feito o mesmo comportamento que os atletas do Panamá?

O futebol começa a passar por um período de gigantescas transformações. Uma delas é a manifestação pública dos atletas sobre o que eles pensam. Mudar o comando do futebol de um dia para o outro é impossível. Mas é impossível manter tudo do jeito que era antes…

É, mais ou menos, o que aconteceu com o Brasil após os 7 a 1. Será que o Bom Senso FC chegaria a existir caso o Brasil tivesse perdido num jogo apertado da Alemanha? Será que estaríamos questionando tanto o comando do futebol no país não fosse a goleada que calçou as sandálias da humildade nos torcedores?

Qualquer transformação sem revolução é lenta. Não será de uma hora para a outra que veremos novas caras no comando do futebol. Mas só o fato de os jogadores se sentirem incomodados mostra que muita coisa ainda está para mudar.


Brasil terá um boom de novos estádios em 20 anos
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Erich Beting

Matéria da semana passada na Máquina do Esporte dava conta de que o Atlético Mineiro planeja erguer um novo estádio para o clube nos próximos anos (detalhes aqui). Ao Galo deverão se juntar em breve outros clubes. Eles vão trazer uma nova realidade para o futebol brasileiro nas próximas duas décadas.

Haverá, nos próximos 20 anos, um boom de novos estádios pelo país. Arenas modernas, mais confortáveis, com mais segurança para o público, melhores condições de trabalho para todos e, principalmente, maior geração de receita para os clubes.

O fenômeno segue a cadeia lógica de investimento em estádios que aconteceu primeiro nos Estados Unidos, depois nas duas potências econômicas da Europa (Inglaterra e Alemanha) e, agora, começa a se espalhar pela Itália.

Com a construção das novas arenas para a Copa do Mundo, os clubes começam a perceber que estádio precisa ser uma fonte boa de arrecadação para que isso se transforme em potencial competitivo mais à frente. Com novas instalações, é possível oferecer mais serviços e produtos para o torcedor. Da mesma forma, o novo local traz para os estádios um público que estava distante do futebol, acomodado na poltrona do sofá ou na mesa do bar.

Neste Brasileirão, Palmeiras e Corinthians puxam a fila e mostram a diferença que faz ter um estádio próprio e moderno. Mesmo que ambos ainda estejam em obras, já houve um aumento sensível de arrecadação dos dois times por conta dos novos  espaços. Ainda de maneira errada, baseado apenas na majoração dos preços de ingresso, mas já representando um diferencial para os times, especialmente para o Palmeiras, que em oito jogos faturou R$ 17 milhões em seu estádio.

Com o tempo, os gestores do estádio vão começar a perceber que, mais importante do que ganhar na cobrança do ingresso, é com os serviços que se faz realmente dinheiro no estádio.

É a transformação do conceito de “receita de bilheteria” em “receita do dia de jogo”, com direito a visita a museu, almoço em restaurante (ou lanchonete), estacionamento, loja oficial, quiosque de produtos, etc.

Até lá, porém, o Brasil ainda passará por um processo de construção de novos estádios, baseados na necessidade dos clubes, e não na megalomania de um grande evento. Foi essa transformação que revolucionou o negócio do futebol na Inglaterra, que mudou a cara do futebol alemão e que começa a querer resgatar o futebol na Itália.

O Brasil, como sempre, estará com alguns anos de defasagem em relação à Europa, que por sua vez está sempre atrasada em relação aos EUA. O mais importante, porém, é que o futebol percebeu que, para melhorar, precisa repensar a forma como trata o torcedor, sua principal fonte de arrecadação.


O que mudou nos 7 a 1 foi a autoestima do torcedor
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Erich Beting

Reforma já!

Técnico estrangeiro já!

Muda tudo!

Não foi um apagão!

Fora, Marin!

Abaixo à CBF!

Gol da Alemanha!

Há um ano, ouvíamos, ainda tão atordoados quanto os 11 jogadores em campo naquele fatídico 8 de julho de 2014, algumas dessas frases sendo proferidas por torcedores destroçados pela maior humilhação já sofrida pela seleção brasileira dentro de campo.

E, um ano depois, o que mudou após os 7 a 1?

A percepção geral é de que nada mudou. Saiu Marin, entrou Del Nero. Saiu Felipão, entrou Dunga. Sai Neymar, o time não se acha…

E talvez seja exatamente essa a grande mudança que exista no imaginário brasileiro após os 7 a 1.

De forma visível e palpável, nada mudou. Os dirigentes seguem os mesmos, tentando forçar a não-aprovação de leis que minem o poder quase supralei da CBF na atualidade. O treinador é quase o mesmo, com a diferença de que agora chamaram o pessoal do passado para dar ideias sobre o futuro. O Brasileirão segue a ser (des)organizado do mesmo jeito, sem uma preocupação com o produto apresentado.

Mas, de forma estrutural, muita coisa começa a mudar.

Os jogadores fizeram, após os 7 a 1, a maior mobilização já vista da categoria no Brasil. Cruzaram as pernas e sentaram nos chãos, protestando contra o descaso dos cartolas com o futebol. Viraram uma frente de combate à CBF tão importante a ponto de influenciar a presidência da República a tentar melhorar alguma coisa no futebol.

Os torcedores, a seu modo, também refletem o impacto dos sete gols na cabeça. A crença de que ser apenas o país pentacampeão do mundo já garante títulos e favoritismo ao Brasil caiu pela terra arrasada. A sensação de que não somos mais “o melhor” faz bem para o próprio processo de mudança que precisa acontecer.

No fim das contas, 7 a 1 não foi pouco. E, um ano depois do massacre alemão, o Brasil ainda procura juntar os cacos do maior pesadelo futebolístico da história.

Dá para virar o jogo, mas isso requer muito esforço e trabalho de planejamento no longo prazo. Algo que o Brasil, dentro e fora de campo, na economia e no esporte, na política e nas artes, não está acostumado a fazer.

O que não dá para imaginar é que nada tenha mudado após os 7 a 1. Imagine o que teria de fato mudado se o Brasil tivesse ganho a Copa? Possivelmente, ainda teríamos o mesmo Brasileirão apagado e insosso, mas a sensação era a de que ninguém pode com o único hexacampeão mundial.

A maior mudança provocada nos 7 a 1 foi a diminuição da autoestima do torcedor. E isso é o primeiro passo para, aí sim, mudar mais coisa no futebol brasileiro.


Por que existe um intermediário nos contratos de patrocínio?
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Erich Beting

A pergunta surgiu diversas vezes para mim na última semana, desde que estourou o escândalo envolvendo contratos de patrocínio e mídia no futebol. “Por que é que precisam existir intermediadores nos contratos? Não é possível que uma empresa precise de um terceiro para fechar negócio!”. Em 140 caracteres ou um pouco mais, muita gente ficou revoltada com o modus operandi da corrupção no futebol.

Existem, basicamente, duas situações que permitem a existência de um intermediário na negociação de contratos.

A primeira é a incapacidade de o esporte negociar com as empresas e/ou agências de publicidade. Pelo amadorismo das instituições, elas acabam terceirizando o serviço a uma agência, que vai ao mercado em busca de compradores das cotas de patrocínio disponíveis. Esse modelo é muito usado por atletas e até mesmo por alguns clubes menores, seja do futebol ou de outras modalidades.

É isso, por exemplo, que explica parte do segredo de muitos contratos de patrocínio de atletas e instituições. Mas há o outro lado da moeda…

O segundo ponto é o modelo que foi implementado pela Fifa nos anos 70, sob a gestão de João Havelange, e que passou a ser “regra” em boa parte das grandes instituições do futebol pelo mundo. Em 74, quando assumiu a Fifa, Havelange precisava gerar receita para uma entidade que funcionava praticamente como uma espécie de fornecedora de licença para federações disputarem campeonatos. O brasileiro percebeu que havia um potencial enorme de geração de receita. Em parceria com Horst Dassler, herdeiro da Adidas, entregou os direitos de comercialização da Copa do Mundo a uma agência de marketing. E, então, o negócio cresceu.

O que a Fifa criou, a partir dos anos 70, foi um modelo de completa terceirização dos negócios das entidades esportivas. A Fifa passou a ser “vendida” por uma agência. No começo, a agência ficava com todo o risco do negócio. Ela pagava à entidade e ia ao mercado tentar negociar os direitos de placas de publicidade, patrocínio e TV e, assim, obter seu lucro. Para a Fifa, o negócio não representava risco. Ela recebia adiantado e não precisava se preocupar em “fechar a conta”.

Com o passar do tempo, esse modelo começou a ser visto em diversos outros eventos. E aí surgiu o problema. Sabendo que era um negócio da China para quem comprava, dirigentes começaram a combinar comissões “por fora” para ceder a uma ou outra agência esses direitos. Em 2001, quando a ISL faliu (a empresa criada lá nos anos 70 por Dassler), levou consigo um escândalo de pagamento de propina a dirigentes, entre eles Havelange e Ricardo Teixeira.

Agora, o escândalo revelado tem a mesma origem. Pagamento de comissões “por fora” a dirigentes sobre direitos cedidos a empresas de marketing. Os patrocinadores, muitas vezes, ficam vendidos nessa história. Tentam negociar diretamente com a confederação que organiza o campeonato, mas ela só aceita o negócio se ele for fechado com a agência de marketing que o representa. O dinheiro das empresas é pago de forma correta, conforme contrato. O que acontece depois que ele entra nessas empresas intermediárias é que é o problema.

Por isso mesmo patrocinadores e empresas de mídia cobram, com veemência, uma maior transparência das entidades esportivas. O fim desse modus operandi das agências intermediárias tende a baratear o custo dos eventos. Para quem compra, o melhor é ir direto ao vendedor, sem precisar passar por um terceiro.

O escândalo revelado há quase uma semana promete acabar com um sistema de quase 50 anos que impera no futebol. E vai passar a exigir, nas entidades, gestores cada vez mais qualificados para vender – e entregar – bem o produto.


Nada mais normal que o contrato da CBF com a ISE
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Erich Beting

Espetacular a reportagem de Jamil Chade no “Estadão” sobre o contrato entre a CBF e a ISE, que prevê as condições para a entrega da organização dos amistosos da seleção brasileira à agência do grupo árabe Dallah Al Baraka. O absurdo do contrato está longe de ser a exigência de que o Brasil tenha força máxima nos amistosos. Isso é até meio óbvio, uma vez que você paga pela marca da seleção brasileira e precisa receber por isso.

Até aí, faz parte do jogo. Só faltava, aliás, a ISE assinar um acordo milionário como esse sem exigir tal contrapartida.

Como disse a própria CBF na resposta à reportagem, “se o Barcelona for jogar com o seu time B, sem contar com suas grandes estrelas, como por exemplo (sic) Neymar, Messi e Suarez, suas cotas comerciais serão menores”.

Aí é que entra o “xis” da questão.

O Barcelona seria incapaz de assinar um contrato do porte desse feito pela CBF. O clube espanhol, que está longe de ser um poço de lisura (vide o enrosco que se meteu Sandro Rossell, seu ex-presidente), simplesmente não faria um negócio em que entregaria para promotores a realização de todas as suas partidas amistosas. O clube negociaria, caso a caso, a realização desses jogos.

O absurdo do contrato CBF/ISE é a sua própria existência. A CBF ganharia muito mais dinheiro se deixasse para negociar, jogo a jogo, data Fifa a data Fifa, as partidas que realizaria. Na reportagem do Estadão, o próprio presidente Marco Polo Del Nero gaba-se de que o contrato assegura um dinheiro que a CBF não faria se organizasse sozinha os amistosos.

Ora, se a cota equivale a cerca de R$ 3,5 milhões, no próximo dia 7 de junho, quando o Brasil enfrenta o México no Allianz Parque, a receita de bilheteria deverá ser, no mínimo, o dobro desse valor.

Se realmente houvesse uma preocupação em aproximar a marca da seleção brasileira do torcedor e dar um novo funcionamento para muitos dos estádios construídos para a Copa do Mundo, a CBF simplesmente deixaria de vender seus amistosos para o exterior, passaria a convidar as seleções de todo o mundo para atuar aqui e, assim, faria, só com bilheteria, o dobro da renda obtida no contrato com a ISE.

Logicamente que a entidade teria muito mais trabalho, precisaria de muito esforço para organizar os jogos no Brasil. Ela teria de convidar e pagar cachê a um time do exterior (desconfio que só os de primeira grandeza necessitariam desse tratamento), teria de montar sistema de venda de ingressos, alugar estádio, contratar segurança para a partida, montar um projeto comercial para vender cotas de patrocínio, sentar para negociar com emissoras de TV do mundo todo a transmissão da partida para o exterior, criar ações para engajar o torcedor, etc.

Como a CBF não organiza nenhum jogo de futebol no Brasil, fica difícil ter essa estrutura dentro de “casa” para tocar um amistoso. Muito mais fácil – e rentável – é entregar a um parceiro a organização desses jogos. Afinal, ele se preocupa tanto com a lucratividade do negócio que faz o Brasil jogar no moderno Emirates Stadium, em Londres, com aluguel em libras e público genuinamente nacional.

No fim das contas, nada mais normal que a CBF abrir mão de organizar os jogos amistosos da seleção brasileira. Ela já tem muita coisa para fazer no dia-a-dia organizando as séries A a D do Brasileirão, o futebol feminino, os campeonatos de base pelo país…


Juventus e Corinthians; a interferência da gestão no campo
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Erich Beting

Nesta quarta-feira, a Juventus voltou a uma final de Liga dos Campeões da Europa após dez temporadas. E o Corinthians voltou a ser eliminado em casa por um time de menor expressão na Copa Libertadores, com direito a jogadores expulsos e um pífio desempenho em campo.

Os dois acontecimentos têm, entre si, um ponto em comum. A gestão fora de campo explica, em boa parte, o resultado dentro dele!

A Juventus é, hoje, o único time italiano minimamente bem administrado. Depois da revelação dos escândalos de manipulação de resultados nos anos 2005 e 2006, a Vecchia Signora foi para a Série B, afastou os dirigentes corrompidos e corruptores e, mais além, repensou toda a gestão de seu clube.

Tendo a Fiat como maior acionista, o clube reordenou a casa e tomou uma decisão que explica, em boa parte, o que acontece agora. Em 2008, decidiu que construiria um novo estádio, moderno, para se adequar à nova realidade no futebol europeu. Enquanto os rivais seguiram (e ainda seguem) atuando nos elefantes brancos construídos para a Copa do Mundo de 1990, a Juve passou a atuar num estádio moderno, menor e com maior capacidade de arrecadação.

O estádio ficou pronto em 2011. Agora, a Juventus conseguiu renovar o time e teve verba suficiente para contratar bons jogadores. No ano passado, foi à semifinal da Liga Europa, e, neste, chega à decisão do torneio mais concorrido do continente. Quem sabe, agora, os demais grandes da Itália acordem para melhorar a gestão de seus clubes.

Por aqui, o Corinthians vive a situação inversa. Em 2008, decidiu remodelar a gestão do clube. Ajustou o caixa, renegociou as dívidas e investiu bastante na marca do clube. Aumentou a arrecadação e passou a ser referência. Em quatro anos, conquistou a Libertadores de forma inédita e foi campeão do mundo. No meio do processo, assumiu a bronca de erguer um estádio, antigo sonho e que sempre havia ficado suprimido por devaneios de dirigentes do passado.

O problema, porém, foi que a gestão das finanças descontrolou-se. O clube não soube investir, errou no fluxo de caixa, tomou empréstimos, teve casos absurdos de gestão indevida do dinheiro revelados e, hoje, encontra-se esganado financeiramente. Pior ainda, a conta do estádio começa a ser cobrada. O plano de negócios para pagamento dos empréstimos tomados não parece ser realista, o que faz com que a arrecadação milionária em dias de jogos não seja suficiente para cobrir o que é preciso pagar pelo estádio.

O reflexo se vê em campo.

Para o bem e para o mal, é a gestão quem mais vai influenciar no desempenho dentro de campo. Ainda mais com o futebol cada vez mais profissional, em que o bom atleta terá boa performance se estiver satisfeito no ambiente de trabalho (ganhando bons salários e tendo-os pagos em dia, como é em qualquer segmento de mercado).

Juventus e Corinthians mostraram, nesta quarta-feira, a máxima que consagrou Ferran Soriano, ex-CEO do Barcelona. A bola não entra por acaso. Se o fora de campo não estiver organizado, o que acontece dentro dele dificilmente estará.


O ouro europeu do Brasil no handebol. Alguma novidade?
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Erich Beting

A inédita conquista do ouro pela seleção feminina de handebol no Brasil é europeia. Não há mal algum em constatar o fato e, mais do que isso, não há qualquer problema em aprender com ele. O Brasil é o país campeão do mundo num esporte que sempre foi dominado pelos países nórdicos e/ou anglo-saxões. E o mérito disso é o fato de que o país foi para o exterior para conseguir virar essa potência mundial.

“A verdade é que ainda dependemos de atletas, como essas meninas, que vão para o exterior evoluir. Ainda estamos dez anos atrasados em relação à Europa”.

A frase é de Morten Soubak, o treinador do selecionado brasileiro. Dinamarquês que veio para um ano de estágio no Brasil, há quase 15 anos. Foi auxiliar no Clube Pinheiros, treinou times de faculdade, gostou do país e decidiu ficar. Com a seriedade de um dinamarquês, mas adaptado ao estilo brasileiro, ele conseguiu levar o país ao inimaginável. Agora, traz apenas o panorama real.

Para ser o melhor do mundo no handebol entre as mulheres, o Brasil precisou de um trabalho de planejamento. Levou atletas para o exterior, onde competem em alto nível, procurou participar ao máximo de competições e, também foi importante, há dois anos o país recebeu o Mundial da modalidade. Em casa, mesmo que para pouca torcida, as meninas já haviam chegado até o quinto lugar. A experiência serviu para em Londres, nos Jogos Olímpicos, o time evoluir mais um pouco. E, agora, o resultado máximo apareceu.

Só que a frase de Soubak sobre a conquista é a que mais deve ser levada em conta se o país quiser ser também do handebol, como é do voleibol e do judô e que já foi do futebol e do basquetebol. Sim, é isso mesmo. Só somos o país do vôlei e do judô. Nas outras modalidades, hoje, estamos atrasados em relação ao jogo que é jogado lá fora.

O alerta de Soubak é também o alerta para o futebol, para o basquete, para o handebol, para a peteca, a bola de gude e o que mais quisermos pensar em termos de competição. À exceção do vôlei e do judô, em que as confederações montaram um sistema de aperfeiçoamento técnico que nos equiparou aos melhores do mundo, não há uma gestão que pense estrategicamente no desenvolvimento dos atletas.

Talvez o rúgbi em cerca de dez anos consiga isso, mas o abismo que hoje separa o Brasil das demais nações ainda é muito grande.

Nos demais esportes, e o futebol está incluído nessa conta, o Brasil precisa ir para fora para começar a extrair bons resultados. Nossas ligas estão enfraquecidas, nossa capacidade técnica de formação de talentos parou no tempo, nossa condição para treinamento e desenvolvimento de atletas é precária.

Teoricamente as confederações, no Brasil, têm tanto ou mais dinheiro que as principais entidades do mundo todo. O problema é muito mais de conseguir elevar o padrão do esporte como um todo. O ouro do handebol evidencia isso. Um grupo de atletas que abdicou de morar em seu país para poder ter rendimento e levar o Brasil ao topo. É a prova de que talento existe, mas ele precisa de muita lapidação para poder chegar ao melhor.

O futebol no Brasil vive, hoje, o mesmo problema do handebol ou do basquete. Não temos mais um campeonato forte, que faça com que nossos atletas atinjam níveis altos de competitividade. Para evoluir, é preciso expatriar o talento, o que enfraquece as competições locais, diminui o interesse da imprensa e, naturalmente, o do torcedor.

O ouro do Brasil no handebol é europeu. Assim como a vitória do futebol na Copa das Confederações tem o DNA do Velho Continente.

O Brasil é campeão do mundo de handebol, sim. Mas precisa começar a importar qualidade se quiser manter-se no patamar mais alto dentro da modalidade. Do contrário, será como em várias outras histórias, de vitórias conquistadas por conta de grupos talentosos de atletas que se formaram, e não por um trabalho constante e eficiente de formação de talentos.

Visão estratégica da CBHb e da comissão técnica brasileira que foram buscar, lá fora, o que não se tem aqui. Mas é necessidade de o país usar essa conquista para solidificar as próximas. Ser patriota, afinal, não é bradar que aqui temos o melhor handebol do mundo, mas saber olhar o porquê de essa conquista ter precisado deixar o país para acontecer.