Negócios do Esporte

Arquivo : novembro 2011

Neymar turbina renovações no Santos
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Erich Beting

O efeito do “fico” de Neymar já é claramente sentido no dia-a-dia do Santos. Depois de o clube anunciar a permanência do atacante, já foi renovado o contrato com o BMG, apalavrado o novo acordo com a Seara e praticamente certo o negócio com a CSU. No final das contas, o Santos deve chegar a R$ 35 milhões em patrocínio de camisa para a temporada de 2012.

O valor, recorde na história do clube, revela também um dos reflexos da permanência de Neymar na Vila Belmiro. Quando há o questionamento de o Santos ter aceitado deixar o atleta livre da multa rescisória ao término do contrato, em 2014, é preciso analisar diversos aspectos para se dizer se o negócio é bom ou ruim para o clube.

É ruim, sem dúvida, o Santos abrir mão da multa milionária, provavelmente, por todas as condições de mercado, a maior da história do futebol nacional se o negócio fosse concretizado.

Mas Neymar traz não apenas competitividade técnica ao Santos. O clube ganha não apenas dentro de campo, mas se fortalece fora dele também. Hoje o atacante é o maior garoto-propaganda do esporte brasileiro. As marcas que não conseguem estar atreladas a ele têm, no clube, um viés para se associar de maneira indireta ao sucesso do jogador.

Isso representa, para o Santos, um aumento de receita nos contratos de patrocínio. Da mesma forma, o clube ganha dinheiro diretamente com ele na composição do contrato de exploração de imagem. Na renovação com Neymar, acertou-se que o clube ficará com 10% dos acordos fechados, o que representa um ganho direto sobre o sucesso dele dentro e fora das quatro linhas.

Por fim, e só por fim, entra o intangível, que depende muito das estratégias de marketing que o Santos for lançar. Com Neymar, quantos torcedores o clube pode ganhar? Qual o aumento da receita de bilheteria que pode ter? E da venda de produtos oficiais? Tudo isso é intangível, na medida em que depende de um esforço conjunto de clube e atleta.

O primeiro reflexo do fico de Neymar é claro: o clube já ganha mais com patrocínios. Daqui para a frente, o Santos poderá ganhar muito mais do que os 50 milhões de euros de uma multa rescisória. Tudo dependerá do trabalho que será feito com o atleta e com a imagem do time.

Foi pensando assim que os clubes europeus tornaram-se potências globais. Por que um clube brasileiro não pode pensar dessa forma?


O mito Galvão Bueno
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Erich Beting

Ele é um mito. E provou isso mais uma vez neste final de semana. Gostem ou não do estilo de transmissão, Galvão Bueno é um dos caras que melhor consegue manter uma atração ao vivo em televisão aberta no Brasil.

Carismático, polêmico e, sobretudo, empolgado, Galvão consegue passar para uma transmissão esportiva uma emoção que é essencial, principalmente quando se trata de um meio que precisa atingir todo tipo de público como é a TV aberta.

E aí é que entra o ponto essencial sobre o mito que é Galvão. Hoje, ele é um dos poucos narradores na TV aberta que consegue informar e emocionar. Na madrugada do sábado para domingo, ele deu um show à parte na transmissão do UFC, a primeira feita pela Globo. Anunciou a chegada dos “Gladiadores do Terceiro Milênio” (a melhor definição já usada para o que é, de fato, o UFC) e soltou as frases de efeito tradicionais de todas as suas transmissões.

Para quem pensa que isso é só uma bobagem a mais no estilo Galvão de ser, vale pensar. Será que é fácil encontrar um meio de falar para todo tipo de público, como exige a TV aberta?

Principalmente depois do aparecimento de TV a cabo e internet, boa parte do público formador de opinião está muito bem informado antes de qualquer transmissão e, por isso mesmo, prefere o narrador mais técnico e informativo do que aquele “apaixonado”.

Galvão representa uma escola mais antiga de narradores, que precisavam falar com o analfabeto e com o PHd numa linguagem em que ambos entendessem e se apaixonassem. Hoje as mídias se fragmentaram e o consumidor tem muito mais poder de escolha.

Mas Galvão Bueno segue a ser o mito que consegue falar tanto para o analfabeto quanto para o cidadão com dois MBAs nas costas.

Antes que todos saiam atirando contra Galvão e o blogueiro, segue uma sugestão. Coloque-se no lugar do narrador de um evento esportivo que precise, necessariamente, explicar para alguém que nunca viu aquilo na vida, como é que funciona a competição.

Não é fácil, né?

Por isso mesmo, a estreia do UFC na Globo provou, mais uma vez, o quão mítico é Galvão Bueno. Não havia outro nome para promover tanto a primeira exibição da emissora do que ele.


A visão de longo prazo que o esporte precisa ter
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Erich Beting

O UFC abriu mão de ganhar cerca de US$ 40 milhões neste final de semana com a venda de pacotes de pay-per-view da luta entre Cigano e Cain Velásquez. A decisão tomada pelos executivos do UFC tem a ver com a entrada de dois novos parceiros de transmissão da liga. Nos EUA, a Fox Sports vai exibir o combate ao vivo, enquanto no Brasil a luta marcará a estreia da TV Globo no evento.

Em troca da exposição mais ampla que essas duas emissoras vão dar, o UFC abriu mão de uma receita milionária imediata. E o que ele ganha com isso? No longo prazo, a tendência é que, cada um em seu mercado, Fox e Globo consigam ampliar o alcance da liga em seus países e, assim, gerem um aumento substancial de receitas para o UFC.

É exatamente essa visão de longo prazo que o esporte precisa ter. Em vez de olhar o imediato, o esporte tem de planejar a construção de uma marca. Se o gestor se importar apenas com o dinheiro de agora, poderá colocar a perder uma boa fonte de receita no longo prazo.

Essa é a maior dificuldade que o esporte no Brasil tem hoje. Por conta do passado de dificuldade, raramente o gestor tem condições de abrir mão de uma receita imediata pensando em ganhar mais dinheiro depois.

É essa visão deturpada de como é possível fazer dinheiro que leva o futebol, por exemplo, a lotear as suas camisas em troca de um aumento de receita imediata. Em vez de valorizar a exposição de apenas uma marca na camisa, num processo que demora tempo para ser concretizado, o clube loteia o espaço em busca de um dinheiro de curto prazo.

Da mesma forma, diversas outras modalidades não conseguem trabalhar de forma a traçar um planejamento para daqui a cinco, dez anos. Sempre o olhar está sobre a atual temporada.

Como disse aqui outro dia, o UFC é um bom exemplo a ser seguido pelas modalidades esportivas no Brasil. E agora mais um bom motivo foi dado por Dana White e sua equipe. A visão de longo prazo é fundamental para que o esporte fique cada vez mais sólido.


Um novo Neymar
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Erich Beting

Já critiquei duramente por aqui as atitudes irresponsáveis de Neymar enquanto atleta-estrela que é. Especialmente porque percebia, claramente, que pouca ou nenhuma evolução aparentemente acontecia no gerenciamento de sua carreira. Pelo contrário.

Mas, no episódio protagonizado por ele ontem, ao anunciar a mudança no contrato com o Santos, Neymar mostrou a maturidade que tem quando está com a bola nos pés. A começar pela chegada à entrevista coletiva com a camisa e os dizeres “É bom ser o rei”, fabricada pela Nike, patrocinadora do atleta. Mensagem subliminar para o que estava prestes por vir. E símbolo de um cara muito mais maduro do que era há meio ano.

A atitude durante a entrevista também mostrou uma grande evolução. Respostas precisas, diretas, sem demonstrar qualquer medo ou arrependimento daquilo que estava sendo dito.

E, por fim, a mais genial das sacadas, quando foi posar para a foto que rodou boa parte do mundo. Neymar “escondeu” o símbolo do BMG da camisa santista. Atitude inteligente de quem negocia com o Banco do Brasil o contrato que deve fazer com que ele continue a jogar no Brasil.

Sim, é um prejuízo ao patrocinador do Santos, mas é também uma forma subliminar de Neymar deixar o recado para o pretendente comercial. Atitude de quem está pensando antes de fazer qualquer ação.

É um novo Neymar esse que rediscute o contrato com o Santos. O que leva a crer que, mesmo com as mudanças contratuais que podem fazer com que ele saia antes de 2014, a chance de ele cumprir com a palavra que deu ontem é muito, mas muito grande.

Veja abaixo a foto tirada pelo jogador após a entrevista coletiva. Com ele estão Odílio Rodrigues (VP do clube), Neymar pai, o presidente Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro e André de Fazio (presidente do Conselho santista).

Divulgação/Santos Futebol Clube


Neymar e a “sorte” do Santos
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Erich Beting

Neymar com garantia total no Santos até a próxima Copa do Mundo é algo que, até pouquíssimo tempo atrás, era impensável dentro do Brasil. Não tínhamos estrutura, tanto técnica quanto financeira, para conseguir bancar a permanência do maior talento que surgiu em diversos anos no futebol daqui.

Mas o Brasil de hoje bate com orgulho no peito e diz que pode, sim, ser um protagonista mundo afora. O que antes era visto como “loucura” hoje nada mais é do que a realidade brasileira. Não estamos com o país quebrado, temos uma economia sólida, as taxas de desemprego estão em níveis baixíssimos e receberemos em breve dois dos maiores eventos esportivos do mundo.

Tudo isso cria um cenário de absoluta confiança de que é possível mantermos Neymar por aqui. Se, em 2003, não vender Kaká para a Europa era uma “loucura”, hoje absurdo é não pensar em continuar a ter Neymar por aqui.

O futebol entrou, como já falamos por aqui, num círculo virtuoso por aqui. Com a economia em alta, com cada vez mais ricos e menos pobres no Brasil, aumenta-se o poder aquisitivo da população e, consequentemente, sobra mais dinheiro para investir no lazer. E, assim, aumenta o gasto das pessoas com cinema, teatro, compras e, claro, esporte.

Os estádios estão cada vez mais cheios, as vendas de produtos oficiais dos clubes estão a cada dia mais altas, os patrocínios crescem na mesma proporção. Há dinheiro como nunca dentro dos clubes de futebol do país.

O Santos deu “sorte” de ter Neymar exatamente agora em atuação dentro do país. Se fosse há cinco anos, com certeza não haveria como segurar a vontade dos compradores da Europa. Não haveria, dentro do país, um nível de interesse em investir no futebol para segurar Neymar por aqui. Tentou-se algo similar com Robinho, mas não houve sucesso comercial em número de empresas e valores atingidos para que ele pudesse ganhar o tanto que receberia do Real Madrid.

Agora a situação é diferente. Há verba, há interesse e há PIB suficiente para que Neymar não precise ir para o exterior. O que precisa acontecer, agora, é uma união de esforços para que os Damiãos, Lucas e Oscares da vida sigam o mesmo caminho e não precisem deixar o país para ganhar mais dinheiro.

Nunca foi tão fácil fortalecer o futebol brasileiro como agora. A economia local está sólida, os clubes estão com mais dinheiro em caixa e há um sentimento coletivo de que é preciso valorizar os times daqui.

É a hora de o sempre tradicional exportador de pé-de-obra deixar de se ver como vitrine e passar a se enxergar como produto.


O UFC indica o caminho a ser seguido pelo esporte
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Erich Beting

O sucesso que transforma cada vez mais o UFC numa realidade dentro do mercado brasileiro mostra o caminho a ser seguido pelo esporte no Brasil se quiser ganhar espaço mesmo com o domínio absoluto do futebol na preferência nacional.

Neste próximo final de semana será possível assistir à estreia das lutas na Globo, emissora com maior alcance e audiência do país. A ida do UFC para a telinha global é uma vitória do modelo de negócios proposto pelos americanos desde que assumiram a gestão do antigo Pride.

O sucesso do UFC é a essência de como o esporte tem de ser gerenciado pensando no entretenimento do público. A competição dentro de campo, do ringue, da quadra ou da piscina é o grande atrativo, sem dúvida, mas tudo tem de girar em torno do torcedor.

Quem banca toda a estrutura de sucesso de uma liga esportiva (e o UFC é exatamente a aplicação do conceito de liga no segmento de lutas) é o consumidor, tanto que para ele tem de ser dirigido todo o pensamento na organização do esporte.

Uma das chaves para o UFC ter espaço na TV aberta é, sem dúvida, o fato de não concorrer no horário com o futebol. Claro que ajuda, e muito, ter a diferença por conta do fuso horário americano, onde acontece a maioria dos combates, mas também é essencial saber que não é possível brigar com quem é maior.

O modelo americano de gestão do esporte pensa, prioritariamente, em três pilares básicos de sustentação de uma modalidade: divulgação na mídia, o consumidor e a disputa equilibrada para deixar uma competição acirrada e, assim, atrativa para todos.

O UFC é a essência desse modelo. Sempre é criada uma grande história em torno de uma luta, ajudando a promover os lutadores e o interesse do público. Com isso, no dia da disputa, o torcedor não vê outra alternativa a não ser acompanhar a luta.

Por aqui, o conceito de promoção de uma competição esportiva ainda está muito longe do ideal. Com algumas boas exceções (o basquete, com a criação do NBB, passou a pensar muito nessa questão), são raros os casos de ações promocionais eficientes para divulgar um evento.

Para complicar ainda mais essa história, geralmente não nos preocupamos em ver a mídia como uma parceira de transmissão, atendo-se apenas ao quanto ela pode pagar pelo evento, mas não na entrega que é oferecida para aumentar a promoção da modalidade e da competição em si.

Os gestores de clubes e entidades esportivas precisam, cada vez mais, olhar para o UFC sem ver a luta, mas atendo-se a todo o processo de divulgação que cerca um embate da categoria. É o melhor exemplo que temos hoje de como o esporte pode crescer se souber olhar para o entretenimento.


O futebol chega a valores “impagáveis”
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Erich Beting

A Adidas negocia com o Flamengo um contrato de R$ 35 milhões ao ano, entre o pagamento em dinheiro e o fornecimento de produtos. A Nike fecha com o Inter por R$ 8 milhões anuais, também nos moldes de grana e uniformes.

Os dois valores mostram que o futebol brasileiro chegou, finalmente, a valores que são fora de uma realidade de mercado. Assim como acontece na Europa e em outros esportes nos Estados Unidos, como a NFL, o futebol no Brasil está começando a custar muito mais do que realmente ele tem de valor.

Parece difícil entender a lógica, mas esse raciocínio é o que melhor explica a força que o futebol tem para as marcas que estão a ele atreladas. Pensando exclusivamente no negócio, Adidas e Nike deverão perder dinheiro com esses dois acordos (o da Adidas com o Fla ainda está em fase de negociação). Mas, para as marcas, é importante conseguir esse tipo de acordo.

Nos próximos anos, vamos assistir a uma série de novos negócios de patrocínio no futebol, a maioria deles em valores muito acima do que antes era costume se pagar.

Vários fatores explicam essa mudança de patamar do futebol.

O primeiro deles é o aumento do interesse das empresas em investir na modalidade. Com mais dinheiro em caixa, há mais companhias dispostas a bancar valores mais altos dentro dos clubes. E quem puxa a fila, nesse sentido, são as fornecedoras de material esportivo. O aumento do consumo dentro do Brasil faz com que haja mais dinheiro e maior venda de produtos dos clubes.  Como o negócio das fabricantes está ligado diretamente à venda de camisas, são elas as primeiras a pagar mais para os clubes.

Além disso, com mais empresas interessadas em patrocinar, os clubes conseguem forçar a barra na negociação, aumentando os valores. Soma-se a esse cenário um aumento da receita em caixa dos próprios times brasileiros, principalmente por conta do novo acordo de TV. O poder de barganha fica cada vez maior e, assim, mais dinheiro é preciso desembolsar pelas empresas.

Mas por que uma marca decide patrocinar um clube mesmo sabendo que aquele valor que lhe é cobrado não se paga?

Aí entra a velha discussão sobre a reserva de mercado. Uma marca não pode dar brecha ao concorrente. Para não deixar a propriedade patrocinada cair na mão do rival, ela paga um valor superior, só para ter a garantia de que não verá o concorrente beneficiado pela associação com o esporte.

A tendência é que, nos próximos anos, o futebol puxe a fila. As camisas dos principais times do país voltarão a ter apenas um patrocinador (e que pagará dezenas de milhões pelo espaço no uniforme!), os contratos dos fornecedores serão supervalorizados e jorrará dinheiro dentro dos clubes.

Tanta movimentação de dinheiro leva, necessariamente, a um novo patamar de gestão dos clubes. É esse o maior benefício de longo prazo que o futebol terá com essa evolução nos valores de patrocínio.


O balanço do Pan na Record – parte final
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Erich Beting

Para encerrar a análise das transmissões do Pan pela Record, chegamos por fim à análise mais técnica das transmissões, que é a pergunta que geralmente costumo fazer a meus alunos nos cursos de marketing esportivo.

Como gestor do evento, o que você achou?

Essa é a parte mais complicada para analisarmos, que é nos colocarmos na posição de quem precisa dar maior exposição ao evento, aos patrocinadores, aos atletas e passar uma boa imagem para o público que não está presente ao local de competição.

E é aí que fica, para mim, o ponto mais negativo da transmissão do Pan. Caso eu estivesse na posição de diretor de marketing da Odepa, possivelmente teria ficado com uma pulga atrás da orelha por saber que a Record já tem assegurados os direitos exclusivos de transmissão dos Pans de 2015 e 2019.

Não que eu desconfie da qualidade da emissora, mas a impressão é de que houve pouco esforço em divulgar, de fato, que o evento era exibido por ela. Para que o evento tenha sucesso na TV, ele precisa de divulgação. Há muito tempo a Record tem um programa diário de dois a três minutos com curiosidades sobre o Pan e as Olimpíadas. É muito pouco, porém, para quem é o detentor exclusivo para a televisão da transmissão desse evento.

Para comparar com algo que sempre discutimos no blog, faltou à Record a ativação da propriedade que ela detinha.

Apenas na semana anterior ao Pan começamos a ver matérias mais frequentes na grade da emissora sobre o evento. Da mesma forma, alguns anúncios em outros veículos de mídia começaram a pipocar só nessa época. É muito pouco, ainda mais pelo desafio que havia de tirar uma cultura genuinamente brasileira de associar transmissão esportiva com a Globo.

É muita ingenuidade da emissora acreditar que os canais concorrentes dariam ênfase para a competição e que isso levaria naturalmente o consumidor para lá. Nenhum canal no Brasil, seja na TV aberta ou fechada, tem o costume de cobrir o esporte com função exclusivamente jornalística. O interesse comercial existe e é determinante para que uma cobertura tenha maior ou menor exposição na grade da TV.

Não é a Globo a vilã dessa história. As redes públicas de TV, o SBT, a RedeTV!, a Band e todos os outros canais (abertos e fechados) deram para o Pan a mesma relevância que a Record daria se não detivesse os direitos de transmitir o evento. Só se falou dele quando havia algo a ser contado. Uma medalha brasileira, o panorama do quadro de medalhas. E só.

Não tinha sentido deslocar equipe de reportagem e fazer uma cobertura diária da competição se eu não tenho os direitos de transmitir esse evento. Isso só acontece, de fato, na Copa do Mundo. E, quase sempre, é apenas uma equipe formada por câmera e repórter que se desloca até o local do evento.

Nesse cenário, a Record tinha, necessariamente, de investir muito dinheiro num plano de divulgação do Pan. Principalmente porque ela tinha de aumentar a audiência para ela, para os seus patrocinadores e, também, para agradar o dono do evento. E isso incluía a compra de espaço na mídia em outros veículos não-concorrentes, como sites, jornais e revistas.

Se a ideia era o Pan impulsionar a audiência da emissora, era preciso buscar esse consumidor que estava fora da Record. Esperar a mídia espontânea dos demais veículos era muita pretensão, especialmente porque a competição não é um evento de primeira grandeza no segmento esportivo.

Isso não significa, porém, que a aposta da Odepa foi ruim. É bem provável que em 2015 já tenhamos um outro cenário, impulsionado pela manutenção dos direitos na mão da Record e pelo evento ser antes dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Além disso, como primeira experiência a emissora mostrou que é capaz de corrigir o rumo do barco no meio do caminho.

Quem tem de ficar de olho é o Comitê Olímpico Internacional. O Pan serviu para ensinar algumas lições de como aperfeiçoar a entrega para os Jogos Olímpicos de Londres. Afinal, em 2012, o Brasil não conseguirá obter o mesmo bom desempenho de agora. Se a transmissão da TV aberta for calcada no Brasil que dá certo, teremos a impressão de que só haverá vôlei e natação em Londres. E isso é algo que o COI não quer de jeito nenhum.

O primeiro desafio foi cumprido. Resta trabalhar, agora, para ter ainda mais sucesso em 2015. A melhor notícia para a Odepa é que, em se tratando de Pan, por mais oito anos a Record vai investir maciçamente na divulgação do único evento esportivo sobre o qual detém exclusividade na transmissão. Pelo menos ficou claro que é isso que ela tem de fazer.

 


O balanço do Pan na Record – parte II
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Erich Beting

Dando sequência ao balanção das transmissões do Pan na Record, hoje abordamos o ponto de vista do consumidor. Será que apenas a emissora ter sido a detentora dos direitos de exibir a competição foi bom para ele?

A meu ver, o saldo não foi tão favorável assim. Claramente a falta de maior experiência da Record na transmissão pesou, e tivemos de engolir alguns sapos, especialmente nos primeiros dias de transmissões.

Começamos o Pan em meio a um ufanismo que tentasse justificar o slogan “Está com a Record, está com o Brasil”, utilizado em toda a cobertura do evento. Isso causou algumas aberrações durante as transmissões, além de uma tentativa de manipular a informação, com a exibição de reprises como se fossem eventos ao vivo para “manter a emoção”, tática que desde os anos 80 é facilmente desmascarada e condenada pelo consumidor.

Pelo menos esse cenário durou apenas alguns dias da primeira semana de transmissão. Depois disso, as narrações ficaram menos ufanistas e um pouco mais informativas, e toda vez que tínhamos uma imagem gravada sendo exibida, o narrador informava imediatamente ao telespectador.

O maior problema, porém, foi que o Pan teve, efetivamente, muito pouco de informação esportiva. A transmissão do evento foi muito mais uma espécie de reprodução apenas do “Brasil que dá certo”, sem retratar o que de fato vinha acontecendo nas disputas. Até mesmo alguns fiascos nacionais eram relegados a segundo plano para mostrar aquilo que daria uma medalha verde e amarela. Reprises de ginástica artística tornaram-se o hit dos primeiros dias, numa tentativa de ser o novo “curling”, esporte que ganhou fama nos Jogos de Inverno do ano passado.

Mas acontece que o Pan tem muito mais Brasil em disputa e, mais do que isso, uma série de modalidades que são próximas do cotidiano do torcedor. Sendo assim, foi um absurdo ter de engolir as reprises da ginástica apenas porque os índices de audiência estavam sendo mantidos nas alturas.

No final das contas, quem viu o evento pela Record ficou com a impressão de que só o Brasil competia. Os ouros dos americanos, por exemplo, passaram desapercebidos para quem só tinha a TV aberta como opção. Foi até difícil entender como os americanos tiveram mais de cem conquistas ao longo da competição, já que em raras exceções vimos uma vitória dos EUA na TV aberta.

Mas esse é um “mal” causado pelo formato de transmissão na TV aberta. Acostumamos a mostrar não mais o evento, mas apenas o desempenho brasileiro na competição. Esse é o maior problema que há para quem não tem o canal a cabo à disposição. Sim, uma grade de TV aberta tem de ser preenchida pelos mais diferentes programas, atendendo aos diferentes perfis de públicos que passam por ela.

Só que uma das grandes críticas que fazemos à Globo é exatamente por manipular as transmissões esportivas apenas para atender a seus interesses. Ficou claro que, infelizmente, o “padrão Globo de qualidade” também foi adotado pela Record. Poderíamos ter uma excelente oportunidade para desenvolvermos ainda mais uma cultura esportiva na população, mas novamente confundimos evento esportivo com o Brasil que ganha, de olho apenas na audiência e não no compromisso com a informação.

Tivemos também coisas boas durante as transmissões. As narrações foram, aos poucos, tornando-se menos ufanistas e mais realistas, atingindo um ponto de equilíbrio que, se repetido em Londres-2012, será excelente. Da mesma forma, pudemos, enquanto consumidores, ter a liberdade de poder comparar o trabalho de um canal com outro, o que já é um enorme avanço.

Sim, a Globo ainda é soberana no quesito qualidade de transmissão de evento. Mas foi bom poder ter tido essa certeza tendo outra alternativa para acompanhar na telinha.

Amanhã vamos debater aqui a questão que considero o exercício mais difícil de ser feito na hora de mensurar o retorno da transmissão de um evento esportivo. Vamos nos colocar na posição de diretores de marketing da Odepa. E aí, será que foi positivo termos apostado na Record?