Negócios do Esporte

Arquivo : janeiro 2013

Teoria da conspiração no Qatargate
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Erich Beting

Atenção, o que você lerá a seguir é uma teoria. Ela está baseada em diversas informações já publicadas, especialmente no livro “Jogo Sujo”, de autoria de Andrew Jennings, e em diversas outras reportagens que saíram em jornais mundo a fora. Não tem nenhuma apuração do blogueiro nessa história, apenas uma análise completa de um cenário que se forma desde os anos 70, quando João Havelange virou presidente da Fifa e Joseph Blatter se colocou como secretário geral e seu natural sucessor.

A Fifa é uma entidade essencialmente política. Por mais grana que ela movimente, por mais negócios que ela faça, quem ocupa os cargos de membros de comitês são indicados políticos. Sendo assim, a disputa que envolve a alta cúpula da entidade é, essencialmente, uma disputa por poder. Muito mais do que dinheiro, o que os dirigentes que lá estão querem é o cobiçado cargo de presidente da Fifa.

Em 2010, durante as reuniões para a escolha das sedes das Copas de 2018 e 2022, outra batalha acontecia dentro da Fifa. No ano seguinte, todos os membros da entidade iriam escolher seu novo presidente. Até o começo de 2011, estavam no páreo Joseph Blatter em mais uma rererereelição, e um novo concorrente, o qatari Mohammed Bin Hammam, presidente da Confederação Asiática.

Hammam ganhou força na época ao conseguir o feito de fazer o Qatar ser escolhido sede da Copa do Mundo de 2022. Turbinado pelos petrodólares do seu país de origem, apresentava-se como potencial candidato à vaga de Blatter. O modus operandi era quase igual ao que ajudou a eleger João Havelange nos anos 70 à presidência da Fifa. Influência em diversas regiões do mundo para brigar de frente com o núcleo duro da Europa, que geralmente se posiciona pró-presidente, ainda mais se ele é um europeu.

O corpo diretivo pós-eleição já estava montado, seguindo esse roteiro: Jack Warner, principal dirigente da Concacaf, garantiria os votos das Américas Central e do Norte. Julio Grondona, da Federação Argentina, e Ricardo Teixeira, da brasileira, assegurariam as escolhas da América do Sul. Na Ásia, Hammam era o grande cara, e ainda contavam com a influência de Sandro Rossel, à época postulante à presidência do Barcelona, mas ex-executivo da Nike e eminência parda em muitos negócios da bola, para angariar votos na África.

Tudo isso, porém, foi desmantelado às vésperas das eleições. E-mails que comprovavam subornos e ligações no mínimo duvidosas de Hammam, Warner, Teixeira e Grondona com diversas escolhas feitas na Fifa, vieram à tona. As denúncias foram tantas que acabaram por minar a candidatura do qatari. Subsequentemente, Warner foi deposto da Concacaf e, pouco tempo depois, foi a vez de Teixeira não aguentar a pressão aqui no Brasil.

Esse cenário é fundamental para analisarmos em qual contexto foi publicado o “Qatargate” pela revista “France Football” nesta semana. O primeiro resultado das denúncias foi o anúncio de Julio Grondona de que, a partir de 2015, sairá da presidência da federação argentina depois de 36 anos.

Mas a grande novidade dessa história é a inclusão de Michel Platini, presidente da Uefa, nas denúncias envolvendo a escolha do Qatar. Até então, ele vinha sendo apontado pelos dirigentes como o cara que estava sendo gabaritado como o próximo grande candidato a suceder Blatter na Fifa.

Tudo leva a crer que a escolha do Qatar como sede da Copa era parte de um plano bem maior, que envolvia a presidência da entidade máxima do futebol. O problema para Blatter não é o que a opinião pública pensa sobre o Mundial ser disputado por lá, mas sim quais os riscos que existem para o seu cargo no caso de a Copa ir para lá. O Qatar 2002 é, hoje, um pepino para Blatter.

Com o Qatargate da France Football, fica cada vez mais justificável uma mudança de sede pela Fifa. E, com as revelações, o maior prejudicado por todas as denúncias é o “homem novo” nessa história, justamente quem mais se fortalecia no cenário político da bola, que era Michel Platini. Ao ser apontado como alguém que vendeu o voto em troca de favores para o governo francês, qualquer pretensão maior no jogo político da Fifa vai se esvair.

A tendência, após essas revelações, é que em nome da “transparência”, a Fifa decida fazer uma nova eleição para a sede de 2022, abrindo novo processo seletivo entre os países. Da mesma forma, Jérôme Valcke deve seguir tranquilo como único possível sucessor de Joseph Blatter, assim como no passado foi para o suíço o caminho natural numa eventual aposentadoria de João Havelange.

Até porque cheira muito mais como mera retaliação por parte do staff de Ricardo Teixeira a revelação feita nesta quarta-feira, em matéria de capa do caderno de esporte da “Folha de S. Paulo”, de que Valcke foi consultor da candidatura brasileira à Copa.

A consultoria foi feita no período “sabático” que ele tirou da Fifa, afastado após descumprir o contrato com a MasterCard para colocar a Visa no lugar, gerar um prejuízo de US$ 100 milhões em multa para a entidade e voltar com um cargo mais poderoso do que tinha antes…

É difícil que Blatter tema Valcke, da mesma forma que é muito difícil que o francês pense em se candidatar à presidência sem a bênção do suíço. Da mesma forma, é curioso que essa história só apareça após a divulgação do dossiê da “France Football” e tente de alguma forma minar o mais do que blindado Valcke.

E, mais curioso ainda, é saber que a Fifa e a “France Football” são sócias na premiação do melhor jogador do mundo.

No fim das contas, o tal do Qatargate fica de ótimo tamanho para Blatter, Fifa e France Football. A divulgação do caso dá a impressão de que não há qualquer ingerência da entidade sobre a publicação. Da mesma forma, abre espaço para que uma nova escolha de sede para 2022 seja feita, ampliando o discurso de transparência que a Fifa tem levantado desde o caso Bin Hammam. E, por fim, a história mina um possível incômodo para a dupla Blatter-Valcke, já que enterra as pretensões políticas de Michel Platini.

É uma grande teoria da conspiração tudo isso. Mas, acompanhando há quase 15 anos os bastidores do esporte, essa é uma história perfeitamente verossímil…


Real e Barça são os mais ricos do mundo; azar da Espanha
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Erich Beting

Na semana passada foi divulgada a lista da consultoria Deloitte com os resultados financeiros dos principais clubes de futebol do mundo. Numa análise superficial, um dado chama muito a atenção. Real Madrid e Barcelona são os dois clubes mais ricos do mundo. E, antagonicamente, isso reflete exatamente o estado de falência em que se encontra o futebol na Espanha.

Desde a temporada 2008/2009, quando os dois clubes espanhóis passaram a liderar a lista da Deloitte, que ficou mais evidente o abismo que existe no futebol local. Só para se ter uma ideia, enquanto a dupla reina absoluta nos times que mais arrecadam do mundo, o restante das equipes raramente estão na lista dos mais ricos. Desde 2005, além dos dois, apenas o Valencia fez parte do grupo dos 20 clubes de maior faturamento. E, mesmo assim, sempre oscilando, aparecendo um ano entre os top 20 e no outro, fora dele.

A situação evidencia o problema hoje vivido pelo futebol da Espanha. O país tem a seleção que é a atual campeã do mundo, o time que mais encanta (Barcelona) e, também, o que mais fatura (Real).

E só isso.

Depois da dupla que dá a falsa impressão de que tudo vai bem por lá, temos um enorme abismo e uma situação de quase falência dos demais clubes. Para piorar o cenário, a crise econômica que afeta cada vez mais a renda das pessoas deixa os clubes em situação de penúria. Real e Barça vivem um mundo a parte, como potências multinacionais que não dependem do país para sobreviver. Pelo contrário, eles sugam a economia da bola espanhola de tal forma que é ela quem assegura o sucesso de ambos.

O contrato de televisão assinado individualmente faz com que Barça e Real tenham mais de 70% da receita de TV de toda a Espanha. Com isso, os demais clubes ficam sufocados, com algum deles partindo de uma diferença de quase 1000% na receita de mídia. Como esses clubes têm ficado restrito à atuação dentro da Espanha, a crise afeta diretamente o patrocínio. O Valencia só entra na lista dos mais ricos porque tem uma projeção internacional que lhe assegura alguns contratos mais interessantes. Para os demais, enquanto a dupla dinâmica assegura acordos de 20 a 40 milhões de euros ao ano, a realidade é composta por negócios de, no máximo, 5 milhões de euros.

Para quem olha de fora, Real e Barça são claros exemplos a serem seguidos. Uma gestão altamente profissional, acompanhada de um processo de internacionalização de marca muito bem sucedido, fizeram dos dois sonhos de consumo de todo torcedor. O custo para isso, porém, foi o uso da força de suas marcas para pressionar o futebol espanhol a ceder aos caprichos individuais de ambos.

A história é muito similar a uma vista aqui pelas terras brasileiras nos últimos tempos. Em breve o clube brasileiro que importou boa parte dos exemplos do que deu certo em Real e Barça deve figurar na lista dos top 20 em arrecadação no mundo. E provavelmente será muito tarde para os demais clubes acordaram para o erro que foi ter aceito deixar de negociar coletivamente o contrato que mais receita gera para um clube, que é o de televisão.


Os pontuais vão chegando ao fim…
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Erich Beting

Maior aberração do futebol brasileiro nos últimos quatro anos, os patrocínios pontuais estão finalmente chegando ao fim. Depois de um período em que as empresas realmente acharam que teriam algum retorno ao investir por apenas um jogo num time de futebol, parece que o mercado de patrocínio esportivo finalmente dá sinais de evolução.

No ano passado já começava a se observar uma tendência para a diminuição dessa estratégia, que talvez tenha atingido seu auge em 2010 e 2011. Durante dois anos, algumas vezes chegou até a ser mais vantajoso para muito clube não ter um patrocinador exclusivo na camisa e optar pela roleta russa do mercado.

Agora, porém, a situação é completamente diferente. E já é possível perceber isso pela movimentação das marcas nos grandes clubes. Depois de regredirmos e poluirmos as camisas, especialmente com o fenômeno Corinthians-Ronaldo em 2009, partimos para um momento em que os próprios clubes perceberam que estavam assassinando sua propriedade mais valiosa e passaram a seguir a máxima de que  “menos é mais”.

Após a Copa, com a tendência de as receitas aumentarem por conta da melhor exploração do espaço físico do estádio de futebol, naturalmente os clubes vão perceber que o patrocínio na camisa tem de ser mais caro e que terá cada vez menos impacto no orçamento total do clube.

Ao mesmo tempo, com a fragmentação de consumo da mídia, as empresas vão dar mais atenção a alternativas de comunicação. O esporte deve ganhar espaço no planejamento das marcas e, naturalmente, o futebol será o carro-chefe dos investimentos.

É bem provável que, com tudo isso, vamos passar a limpar os uniformes. O fim dos aportes pontuais é o início desse processo.

O Qatar é logo ali…
Não tem muito o que falar sobre as revelações feitas pela revista “France Football” sobre o Qatargate, como está sendo chamado o relatório de 20 páginas da publicação dando conta de que houve um grande esquema para a compra de votos para a escolha de Qatar como sede da Copa de 2022.

Os indícios de que certamente havia algo muito maior por trás da escolha surpreendente estavam nos investimentos despropositais feitos a Barcelona (patrocínio da Qatar Fondation) e PSG (compra por um xeque do Qatar) logo após a definição da Fifa.

Até mesmo a saída de Ricardo Teixeira da CBF era indício de que algo tinha dado errado nos planos do trio Teixeira, Sandro Rossel (atual presidente do Barcelona e chefe de campanha do Qatar) e Bin Hamman (líder da candidatura qatari e ex-presidente da federação asiática). Como a própria filha de Teixeira revelou na famosa reportagem da revista “Piauí”, o ex-manda chuva da CBF estava muito ansioso pela candidatura de Hamman para ocupar a vaga de Joseph Blatter na Fifa.

O problema logicamente não é apenas na escolha do Qatar de forma fraudulenta. E muito menos o duelo pelo poder da Fifa. O buraco é muito maior do que aparenta. E envolve muito mais gente que os petrodólares também podem comprar.


A visão do gestor sobre fazer a Copa do Mundo
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Erich Beting

O UOL hoje traz uma interessante entrevista com Ricardo Trade, diretor de operações do Comitê Organizador Local (COL) da Copa do Mundo no Brasil (ela pode ser lida aqui). Mais do que as respostas óbvias que cabem àquele que é o responsável por deixar a Copa do Mundo em pé no país, está a visão completamente diferente de quem não tem vínculo político com o evento.

Baka, como Trade é conhecido no mercado esportivo, tem vasta experiência como gestor no esporte. Trabalhou em diferentes modalidades esportivas, teve uma agência de marketing esportivo que fez da Liga Futsal uma das principais competições do país e foi um dos grandes responsáveis pelo Pan de 2007 ter sido realizado no país.

Como ele mesmo diz na entrevista, sua vida é fazer a Copa do Mundo no país. E, como a maioria das pessoas envolvidas na gestão do evento, a visão sobre a competição é totalmente distinta daquela que as “autoridades” tentam passar. A função do gestor é fazer com que o evento aconteça da melhor forma possível dentro da realidade apresentada.

Por isso mesmo a entrevista feita por Paulo Passos e Vinícius Konchinski merece a leitura. Ela traz uma visão bem diferente daquela dada por Teixeiras, Marins, Rebelos e afins. Não é o discurso vazio de “melhor Copa da história”. Fica aquela sensação de que hoje a função do Diretor Geral da Copa é ser muito mais um solucionador de problemas do que um planejador.

A dica é que o leitor tente se colocar na cadeira do gestor, e não do consumidor, para conseguir entender um pouco sobre esse ponto de vista. Isso não exime o país e muito menos o COL de não ter planejado melhor a Copa. Mas com certeza faz com que entendemos muito mais algumas decisões que precisam ser tomadas para que o Mundial fique em pé.


Sasha, a redentora dos altinhos
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Erich Beting

A notícia já não é nova, mas faltava aqui um comentário um pouco mais aprofundado sobre o fato de a Confederação Brasileira de Vôlei ter convocado Sasha, a filha de Xuxa, para ser uma das atletas da seleção permanente de vôlei de praia que a entidade está formando.

A filha de uma das personagens mais midiáticas do país nos últimos 30 anos ser convocada para jogar vôlei é notícia. Sasha, cujo nascimento foi transmitido pela televisão em rede nacional no jornal de maior repercussão do país (se você estiver lendo isso daqui a 10 anos não vai entender nada, mas foi verdade), carrega o fardo da mãe de ser uma pessoa midiática.

E isso, por si só, já mostra parte do interesse da CBV com a história. Pode não ser tão talentosa assim a “Rainha dos Altinhos” (infame, porém inevitável o trocadilho), mas sem dúvida ela representa uma lufada de novos ventos para o vôlei de praia do Brasil.

A filha de Xuxa ser convocada para uma seleção brasileira de vôlei de praia é notícia. Nem boa, nem má. É simplesmente uma notícia.

Mas uma notícia com um impacto importante para a modalidade. Do jeito que ficou relegado a um segundo plano não só pela mídia na última década, o vôlei de praia brasileiro precisava voltar à grande mídia. Com Sasha, o esporte conseguiu ocupar as manchetes dos principais veículos de imprensa esportiva após muito tempo.

O curioso é que o ocaso do vôlei de praia coincide com um fenômeno que raramente é visto no esporte brasileiro. Ao conseguir um patrocinador fortíssimo, que bancasse um dos melhores circuitos do mundo para os atletas, a modalidade começou a sair da mídia.

As causas são várias. Um pouco de desleixo da CBV, que ao assegurar a autossuficiência da modalidade “largou mão” de promovê-la. Outro tanto de rigidez do Banco do Brasil, patrocinador principal do circuito brasileiro e que, por ter esse status, abre pouco espaço para que outras marcas possam se relacionar com o esporte. E, por fim, e talvez o mais importante, uma fuga das empresas de mídia, que deixaram de lado a possibilidade de transmitir o vôlei de praia.

Sasha surge, agora, como uma tentativa de recolocar o esporte na grande mídia. Na história, o Brasil é o país que mais produziu atletas para o vôlei de praia. Agora, curiosamente, corre atrás de recuperar o prestígio da modalidade junto ao público. E Sasha tem um papel importante nesse sentido.


O que o Fulham pode ensinar ao Juventus
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Erich Beting

As notícias começaram a pipocar nos últimos dias. A primeira delas dá conta de que o Juventus quer reformar a Rua Javari e fazer do estádio um local para 20 mil torcedores, com toda a modernidade que o consumidor no Brasil passará a exigir. A outra é o lançamento de uma camisa comemorativa em parceria com a Umbro, remontando aos anos 80.

Se puder ser traçado um paralelo, a história do Juventus é muito parecida com a do Fulham, da Inglaterra. Time pequeno da maior cidade do país, sempre foi um clube que tinha a simpatia dos moradores, mas não passava de um coadjuvante que sempre beijava a Segundona. Depois, com a profissionalização do futebol na Inglaterra, o Fulham praticamente sumiu, mais ou menos como o Juventus pelas bandas paulistanas, mas ainda longe do grau de profissionalismo dos britânicos.

Nos últimos 15 anos, o Fulham voltou à elite e à cena futebolística do futebol inglês. Essa volta do clube ao topo está ligada diretamente à venda do clube para o bilionário Mohamed Al-Fayed, em 1997. Desde que passou a ter o investimento, o clube cresceu e conseguiu se firmar na Premier League. Seu estádio, o pequeno Craven Cottage, com capacidade para 25.700 pessoas, é uma reforma daquele erguido em 1896. No ano de 2010, atingiu o ápice com o vice-campeonato da Liga Europa.

Apesar de muitos protestarem com as reformas que o Juventus tem programado, o futuro do clube depende dessa nova mentalidade. Potencial para ser consumido não falta. Extremamente simpático para o público, falta ao Moleque Travesso adaptar-se às exigências de mercado. Estádio moderno, gestão pensada no consumidor e time competitivo pode ser a salvação.

Um dos caminhos é achar quem esteja disposto a investir milhões numa mudança por completo do clube. A solução pode estar em ser radical e colocar o Juventus à venda. A história do Fulham pode servir de inspiração. Por mais que os amantes do tempos românticos da bola chiem, essa parece ser a melhor saída para o Moleque voltar a ser Travesso.


Um Palmeiras mais nobre
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Erich Beting

Recebi a mensagem de um amigo palmeirense na madrugada de hoje. “Pelo menos agora teremos um Palmeiras mais nobre”. A brincadeira fazia relação direta com a eleição de Paulo Nobre como novo presidente do clube. Após quase 60 dias da queda do Palmeiras à Série B, finalmente o clube começa a se mexer, com o atraso peculiar que as eleições no fim do mês de janeiro pode proporcionar.

E acabei de ouvir agora a primeira entrevista de Nobre como novo presidente do clube. Nas respostas, parece que, realmente, o Palmeiras terá um futuro mais nobre. Com toda a pressão da mídia para saber quem será contratado para reforçar o time, Nobre mostrou que não está propenso a cometer os erros que destruíram a saúde financeira do clube nos últimos cinco anos. A ordem parece ser, primeiro, organizar a casa. Depois, pensar de que forma pode ser reforçado o time para ter um futuro melhor.

A pressão que a mídia exerce sobre o dirigente é a mesma que o torcedor quer na discussão com os amigos. Um time forte, independentemente do custo. A missão de quem está na gestão do clube é exatamente a oposta. Tentar construir uma equipe vencedora a partir de uma equação financeira sustentável. Sem isso, o futuro passa a ser sombrio.

E o melhor exemplo vem da resposta dada sobre a contratação de Riquelme.

“O presidente gostaria de ter o Riquelme caso ele possa ser útil para o Palmeiras. Sem paixão, sem emoção, uma coisa bem fria”, disse Nobre.

Pelo menos no discurso, parece que, com atraso em relação a outros clubes, o Palmeiras vai começar a colocar em ordem a casa. Resta saber se haverá clima político para que as mudanças sejam feitas. Se não houver, o clube ficará perdido na história de campeão do século. Realmente do século passado.


O grande lance de Armstrong
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Erich Beting

Não tive tempo para comentar antes, até porque não havia muito mais a acrescentar além do que já foi dito. A repercussão mundial da entrevista em que Lance Armstrong confessa ter feito uso do doping não muda a minha opinião sobre o tema (ela está aqui, da época em que o castelo de areia de Lance começou a ruir).

O lance é que Armstrong fez muito pelo ciclismo. Foi o cara que, pela sua história, levou as pessoas a se interessarem pela modalidade. Daí o tombo agora ser tão grande. É aquela ducha de água fria ao vermos um grande ídolo pisar na bola, ou explodir a bola, como ele fez.

O mito ruiu de vez, com toda a mentira perpetuada por ele ao longo do tempo. É a típica situação que nos força a pensar dez milhões de vezes antes de tomar qualquer outra nova atitude ligada ao esporte. Para a mídia, fica a lição de que a palavra não tem qualquer validade, por mais confiável que seja a fonte. Para o patrocinador, idem. E para o torcedor, fica aquela aflitiva dúvida toda vez que vemos um atleta ser tão vencedor como ele pareceu ser.

Por todas as mentiras que fez questão de transformar em verdade, Armstrong não é mais digno de desculpas. O doping é um problema sério do esporte, e não sejamos hipócritas em acreditar que os atletas se submetem ao esforço diário da atualidade sem fazer uso de substâncias suplementares para isso.

Uma coisa só não dá para ser jogada fora em toda essa história. O trabalho social feito em cima da história de recuperação do câncer é o grande lance de Armstrong. Ok, essa história não é mais tão bela quanto antes, mas seria ainda mais injusto com quem consegue viver graças ao trabalho da entidade que tudo virasse pó junto com a credibilidade de Lance Armstrong.

Muito melhor do que oferecer recompensa em dinheiro a seus patrocinadores pelos danos causados seria investir todos esses milhões na manutenção da LiveStrong. Mas, para isso, a melhor coisa que Armstrong tem a fazer é depositar a grana, subir numa bicicleta e se perder pelo meio do Texas.

Quem sabe esse seu novo exemplo faça com que a sociedade se cure desse mal que é o sentimento de que os fins sempre justificarão os meios. O esporte, quando usado para o bem, tem uma força única de transformação da sociedade. Taí uma boa oportunidade para se explorar nos próximos meses.


O risco do patrocínio rotativo do Flamengo
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Erich Beting

“O conceito de patrocinador master é bobagem”. A frase é de autoria de Luiz Eduardo Baptista, vice-presidente de marketing do Flamengo e presidente da operadora de televisão Sky. Na lógica do dirigente, não é preciso um clube fechar com apenas uma marca para o patrocínio principal da camisa, podendo ser feito um rodízio entre diferentes marcas ao longo da temporada.

É exatamente esse conceito que gera um enorme risco para o Flamengo após o acordo com a Peugeot para ocupar a cota máster da camisa (detalhes aqui). O negócio, anunciado na manhã da última quinta-feira, foi feito com base nessa proposta de Bap, como é conhecido Baptista. O Flamengo ainda negocia com outras duas marcas para ocupar o espaço mais nobre da camisa.

Caso dê certo, o Fla conseguirá um feito inédito no futebol mundial. Não há registro de que três marcas aceitaram dividir o mesmo espaço em períodos diferentes de tempo. O motivo é simples. Pagando os mesmos valores, como será feita a divisão de período por marca? Quem fica com a final de um campeonato e quem fica com o jogo que não vale nada?

Até mesmo a publicidade estática na Copa do Mundo sofreu com isso. Os painéis rotativos, que são adotados hoje, causam um problema para as empresas. Os patrocinadores da Fifa, por exemplo, pagam mais, só que correm o risco de, na hora do gol, não serem suas marcas que apareçam atrás das traves. Na Copa do Brasil, por exemplo, um estudo mostrou que o ideal era fazer um modelo híbrido. Painéis rotativos nas laterais do campo e os estáticos atrás das traves, com as empresas pagando mais pelo espaço privilegiado.

Por isso mesmo, o caminho traçado pelo marketing do Flamengo é extremamente arriscado. A não ser que já esteja com outras duas empresas fechadas e, mais do que isso, também cientes desse modelo de exposição, será muito difícil convencer uma marca a patrocinar o clube além da Peugeot.

Outro detalhe importante da história é o contrato da Adidas. Nele, há um limite de marcas que podem ser expostas no uniforme. Uma rotatividade de marcas acarretaria numa impossibilidade de a fabricante atender à demanda. Só que, até pela ideia de fatiar em três o patrocínio, o Flamengo esbarra em novo problema: o contrato com a Adidas rende mais ao clube do que cada um de seus patrocinadores de camisa. E, se continuar nessa toada, fatalmente terá de optar por um ou por outro.

Nos próximos dias a história dos patrocínios no Flamengo devem se desenrolar. Como o próprio clube admite que quer mais “ação” em seu departamento de marketing, fica aquela sensação de que o acordo com a Peugeot foi uma baita resposta ao marketing do clube em 2012. Mas sem o mínimo de planejamento…


O esporte virou a mídia. E a mídia…
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Erich Beting

“Esse contrato acaba fazendo com que a gente faça um trabalho muito mais forte em mídias sociais, pontos de venda e também na ativação do patrocínio para conseguir rentabilizá-lo o máximo possível”. A frase foi dita hoje por Alexandre Estefano, diretor da Penalty, sobre o acordo com o São Paulo (leia a reportagem aqui).

Investindo cerca de 10% de seu faturamento no contrato com o São Paulo, a Penalty abriu mão de qualquer outra ação de mídia para focar os esforços nas ativações dos clubes patrocinados (Ceará, Figueirense, Náutico, Santa Cruz, Vasco e Vitória são os outros clubes no Brasil). No próprio lançamento do uniforme do São Paulo nesta quinta-feira tinham dois torcedores que foram selecionados ao vencerem concursos feitos nas redes sociais da fabricante.

O fato é que, com o advento e fortalecimento das mídias sociais, ficou muito mais fácil para uma empresa se relacionar diretamente com o seu consumidor. E isso, somado ao melhor desenvolvimento do marketing nas entidades esportivas, fez com que o esporte se transformasse na mídia. Um evento esportivo é objeto de desejo de consumo para qualquer um. Clube, atleta ou campeonato fazem com que o torcedor acompanhe com afinco aquele determinado tema.

A partir do instante em que o esporte percebe essa força, ele encurta o caminho para o sucesso de uma ação de marketing de uma empresa. Valendo-se do exemplo da Penalty com o São Paulo, é muito mais eficiente para a empresa falar diretamente com o torcedor são-paulino nas redes sociais do que por meio de um anúncio num site, numa rádio, numa TV ou numa revista. O clube é a plataforma e também a propriedade ideal para fazer essa comunicação.

O exemplo vale também para artistas da música, da televisão, do cinema. Com sua legião de fãs, eles são mais eficientes para convencer as pessoas do que apenas uma propaganda. Ainda mais com a mídia cada vez mais fragmentada em diversos veículos, o sucesso de uma campanha fica bem maior quando existe um vínculo emocional que a indústria do entretenimento pode proporcionar.

Até por conta disso, essa mudança de comportamento das empresas na hora de se relacionar com o consumidor tende a começar pelas empresas de material esportivo. Por viver do esporte, elas tendem a usá-lo melhor como plataforma de comunicação. E, se pararmos para pensar, é cada vez mais pelas mídias sociais que essas grandes marcas procuram o consumidor.

No Brasil, algumas mudanças significativas nos últimos três anos contribuíram muito para que o processo de transformação do esporte em plataforma de mídia para as marcas se acelerasse. O primeiro deles foi a perda de importância da TV aberta. Com a internet cada vez mais forte e a TV a cabo cada vez mais abrangente, a audiência dos canais abertos caiu. O consumidor, aos poucos, se dissipa, dificultando a forma como encontrá-lo. Da mesma forma, o esporte como negócio tem se fortalecido e se preocupado em falar de forma mais calorosa com o torcedor.

As empresas de mídia, nesse processo, viram as intermediárias da união do esporte com o consumidor, só que sofrem com a fuga do anunciante. Ou elas começam a perceber que não podem ser só mídia ou vão perder de goleada para o esporte, o cinema, o teatro, a novela…